6 • Descontrole
Aviso: o capítulo vai conter um pouco de violência e mais pensamentos negativos do que o normal. Eu provavelmente já escrevi coisas mais pesadas, mas agora vou me certificar de avisar.
Eu sei, demorei muito de novo, mas felizmente hoje o capítulo terá 5k, então aproveitem! :)
Sem mais enrolação, boa leitura! ^^
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Katsuki estava um tanto quanto aéreo. Acordou mais cedo que o normal, consequentemente, indo para sala o mais cedo que o normal também. Quando chegou lá, havia umas poucas pessoas que tentaram puxar algum assunto consigo, mas ele só murmurou xingamentos e se sentou em sua cadeira, apoiando os braços na carteira enquanto deitava sua cabeça, olhando para onde Kirishima sentava.
Aquilo que ouviu na noite anterior ficou martelando em sua cabeça. Tentava encontrar alguma lógica no que Eijirou havia falado, no porquê de estar falando aqueles tipos de coisas. O que houve com ele para ter iniciado um monólogo e tratar-se tão mal? Não importava o quanto pensasse, Katsuki não saberia responder com precisão o que poderia estar acontecendo.
Os minutos foram passando rapidamente, e ao longo do tempo, o loiro explosivo ficava cada vez mais impaciente. Não bastava Kirishima ter agido estranho na última noite, agora ele estava demorando para chegar na aula? A sala já estava quase cheia e o horário em que a aula se iniciaria ficava mais próximo, então onde diabos estava Eijirou? Isso só deixava Katsuki cada vez mais angustiado e preocupado. Algumas pessoas ousavam se aproximar, questionando o porquê de parecer tão ansioso e o loiro gritava, afirmando estar bem enquanto disfarçava a ansiedade que lhe acometia.
Piorou quando All Might chegou na sala, indicando que já era o horário de aula. Viu todos se sentarem em seus devidos lugares, obedecendo ao pedido do herói número um, menos Kirishima. Ele não estava ali, ele não havia vindo na porra da aula.
Por quê? O que caralhos aconteceu? Eijirou poderia até ser burro - segundo Katsuki - e odiar estudar, mas nunca faltou uma única aula. Aquilo deixava tudo mais estranho.
As mãos de Bakugou começaram a fumegar e seu nervosismo ficava mais evidente àqueles que ousassem encará-lo. Estava ansioso, desesperado, preocupado. Era um vórtice de sensações muito intensas para e conseguir caracteriza-las no momento, no entanto, tinha noção de nunca ter se sentido nervoso daquela forma antes. Não por alguém.
Ele provavelmente explodiria metade da sala para ir correndo até o dormitório de Eijirou e arrancá-lo de lá a força se não fosse pela interrupção feita pelo próprio ruivo de dentes pontiagudos. Kirishima abriu a porta rapidamente, ofegante e com uma expressão de desespero estampada em sua face. Logo começou a proferir inúmeras desculpas ao professor, que ficou confuso com aquele atraso logo de alguém tão esforçado como Eijirou, mas não questionou-o, garantindo que não havia problema em ter se atrasado e pedindo para ele ir até sua carteira logo. O ruivo andou constrangido até seu lugar, ignorando os olhares curiosos e, principalmente, o loiro explosivo o fuzilando com o olhar, como se gritasse internamente, questionando onde estava. E bem, não era exatamente mentira.
No fim, Katsuki conseguiu se acalmar, respirando fundo e bufando ao pensar naquele desespero todo que sentiu anteriormente, não parando de encarar Kirishima, como se quisesse garantir que ele estaria lá, de que não desapareceria de repente. Estava um pouco furioso por Eijirou tê-lo deixado tão ansioso, mas mesmo assim, o fato dele estar ali era um alívio.
***
As aulas seguiram normalmente; chatas e exaustivas. A maior parte da sala só nutria algum ânimo quando desciam para as quadras em uma aula prática para o treinamento de herói. Katsuki prosseguiu um pouco ansioso, as atitudes que Kirishima tomava eram estranhas e aquilo estava incomodando-o cada vez mais, era sufocante só observar sem fazer alguma coisa.
Já o ruivo, tentava sustentar uma pose despreocupada, sempre desconversando ou desviando o assunto quando era questionado sobre o que ocorrera para se atrasar, dando desculpas idiotas ou comuns demais e que poderiam até soar convincentes àqueles que não nutriam tanto interesse pelo assunto.
Mas para Bakugou, não passavam de mentiras ridículas, contadas para disfarçar algo maior, algo que Kirishima escondia.
Se recusa a contar a verdade para eles porque ela me envolve, não é? Não quer arriscar que eu seja descoberto, é claro.
O horário noturno chegou e Kirishima estava andando pelo corredor depois de ter anunciado aos seus amigos que iria ao banheiro. Pensamentos do que houve de manhã vindo à tona, como lembranças frustrantes, que alimentam mais ainda o ódio estranho que vinha sentindo por sua outra versão.
Na verdade, esse ódio não é de agora. Ele existe há muito tempo, mas agora que você pode me ver, fica difícil disfarça-lo.
Mas foi inevitável. Acabou por pensar demais e começou a ponderar sobre os acontecimentos anteriores, pensando sobre as palavras do moreno e se realmente deveria levá-las a sério... e se ele realmente não estivesse tentando o prejudicar quando fizera "aquilo"?
"A luz do sol incide no quarto, atingindo a face do ruivo que dormia tranquilamente, aparentando estar realmente desfrutando de um bom sono depois de tanto estresse mental no dia anterior. Seus olhos se abrem por poucos segundos devido ao incômodo que a luz causava a eles, obtendo a visão do moreno dormindo com a mesma tranquilidade que possuía. Era tão sereno...
Mas mesmo que sua outra versão sustentasse uma aura tão calma, era simplesmente inevitável para Kirishima sentir o ódio lhe corroer, instaurar-se em seu corpo como um parasita e devorar qualquer pensamento positivo que poderia ter. Aquele sua versão... ela o irritava de uma maneira bizarra, e nem mesmo ele compreendia todo aquele ódio, mas sequer o questionava.
Determinou que havia acordado cedo demais, estendendo o braço até a cômoda ao lado da cama e pegando seu celular, preguiçosamente checando o horário para ver quanto tempo ainda teria para desfrutar de seu sono.
No entanto, toda sua sonolência se dissipou quando notou estar cerca de vinte minutos atrasado. Como? Ele havia colocado três despertadores, não havia como não ter acordado com nenhum... tudo bem, talvez fosse possível, mas ele havia dormido cedo, então não fazia sentido.
Se levantou rapidamente, ignorando a presença alheia e saindo da cama às pressas para ir pegar seu uniforme, ainda indignado com o fato de não ter acordado. Se irritou um pouco mais ao ouvir a voz, um tanto quanto preguiçosa, sendo direcionada à si.
- Por que não vai dormir? Você quer e precisa.
- Eu quero, mas eu não posso, tenho que ir para a aula. - explicou, se segurando para não ser rude demais. - Eu acordei atrasado ainda, mas que droga...
- É, eu desativei seus alarmes.
- Você o quê? - a inconformidade estava expressa em seu olhar. Que confissão era aquela? Por que caralhos o moreno havia feito aquilo? - Puta que pariu, por quê?
- Como eu disse, você precisa. Está cansado. Eu sinto esse cansaço. - não havia um pingo sequer de deboche ou mentira em sua voz. Ele contava a verdade, e parecia genuinamente preocupado com si.
- Se você sente isso, não vai te atrapalhar em nada, já que pode ficar aqui descansando o dia todo. - disse de forma frustrada, não compreendendo aquelas ações ridículas. - Pare de se meter na minha vida!
- Mas eu sou parte de você. - Kirishima só se frustrou mais ainda. - Pode parecer que não, mas eu me importo com você... e achei que era melhor descansar ao menos um dia.
- Eu não pedi por esse descanso!
- Será que não? - aquilo pegou o ruivo de surpresa. Kirishima sabia muito bem o quão silenciosamente desejou descansar um pouco mais hoje, sua cabeça doeu tanto por pensar naquele sua maldita versão, martelou tanto as mentiras que contou à Katsuki em sua cabeça... - Olha, eu sei que sou seu motivo de estresse, mas não é isso que eu te desejo.
- Ah, claro. - soltou um riso sem graça, parando logo em seguida com uma expressão amarga, sussurrando com certo asco. - Eu não sou você, eu não sou essa... coisa que você é.
O outro não se demonstrou ofendido ou qualquer coisa do tipo, apenas deitando novamente a cabeça no travesseiro e voltando a pegar no sono. Eijirou, lá no fundo, queria muito ter partido para cima daquele desgraçado por tê-lo prejudicado daquela forma, mas se conteve, focando em vestir o uniforme enquanto ia para o banheiro fazer as necessidades básicas."
Kirishima sentiu a água em contraste com sua face, jogou água em seu rosto para dispersar aqueles pensamentos que só iriam servir para confundi-lo.
Eu não quero te confundir, mas você se recusa a ouvir o próprio lado.
Sairia do banheiro normalmente enquanto ignorava aqueles malditos pensamentos, no entanto, parou de andar ao ver a figura loira entrando no lugar, abaixando a cabeça e procurando esperá-lo passar ao seu lado.
Não aconteceu. Katsuki parou na sua frente.
E aí, vai fugir?
- Kirishima. - sua expressão era séria, a voz rouca transmitiu arrepios ao ruivo. Bakugou parecia estranhamente calmo, e Eijirou sabia muito bem que quando ele fica assim é porque ele está puto pra caralho. Engoliu em seco, levantando sua face em direção ao outro e tentando erguer um sorriso distraído para disfarçar suas reais emoções. - Me explica o que caralhos tá acontecendo. - seu tom era autoritário.
- Isso é porque eu me atrasei? Eu acordei tarde, bro, só isso. - ele ri, fechando os olhos e sorrindo forçadamente.
- Não, não é por isso. - Katsuki já sabia que o ruivo desviaria o assunto de qualquer forma, então questionaria algo mais preocupante e perturbador que lhe atormentou durante a noite e essa maldita manhã. - Com quem estava conversando ontem a noite? - foi direto, não iria enrolar e nem deixaria que Eijirou adivinhasse sua dúvida com perguntas indiretas, queria arrancar a reação mais genuína possível.
É, Eijirou. Ele te pegou. Acho que não tem como escapar agora...
- O-o quê? - sua voz saiu tremida, seu coração estava disparado contra seu peito, o suor começou a escorrer e a respiração estaria quase falhando se Kirishima não estivesse a segurando. Os olhos de cores vibrantes prosseguiram fixados em si, como se o dissecasse e estivesse compreendendo a verdade. - Você ouviu? - a frase saiu sem querer, e o ruivo condenou-se por soltá-la assim, confirmando exatamente o que Katsuki queria. - Quer dizer... Bakugou, esquece isso, por favor. Não foi nada, tá?
- Nada? Puta merda, Kirishima... - rosnou em indignação com aquela tentativa de escapar, se aproximando, intimidando o outro, tentando de alguma forma, pressioná-lo a contar a verdade, embora essa não fosse a melhor das opções. - Eu quero a porra da verdade, para de ser um mentiroso fodido e me diz o que acontece de verdade!
Ouvindo todo aquele discurso, Kirishima não pôde evitar de sentir-se enfurecido repentinamente, os berros acusatórios lhe atormentavam, levando-o a não conseguir se conter, não dessa vez.
- E depois? Você vai resolver a merda do meu problema? Vai me "apoiar" e dizer que tá tudo bem sendo que você nem sabe o que eu sinto de verdade? Fazer um discurso motivacional como se estivesse salvando minha vida, fingir que se importa comigo pra tirar o peso na consciência? - seus gritos ecoam pelo banheiro, seus olhos ardiam pelas lágrimas que se acumulavam neles, seu coração prosseguia disparado, mas agora havia a sensação do ódio, misturado à satisfação de despejar em alguém todos seus pensamentos amargos. - Quer saber, Bakugou? Eu finjo, admito isso. Todos fingem, então por que não fazer o mesmo?
E esse fingimento te prende em uma bolha cada vez mais densa, fazendo-te não ter mais ideia do que é fingimento e do que não é. Ele está te corroendo, Eijirou, e eu sei disso melhor do que ninguém, mas seu problema é não querer mais ser ajudado.
Katsuki fica sem palavras diante de toda aquela fala. Seus olhos estão arregalados, encarando a figura ruiva respirando pesadamente, como se estivesse segurando-se para não falar mais nada. Os punhos do outro estavam cerrados, uma tremedeira quase imperceptível jazia em seu corpo, mas o loiro mal teve tempo para revidar ou absorver tudo que lhe foi dito, pois Kirishima tratou de se afastar a passos pesados, saindo do banheiro imediatamente e rumando para algum lugar.
Não pensou que ouviria aquilo vindo de Kirishima. Era, de certa forma, perturbador. Levou uma mão às têmporas e massageou, tentando se concentrar em compreender cada palavra que Eijirou disse. Deveria ir atrás dele? Deveria ser tão desesperado àquele ponto quando o ruivo não parecia querer um diálogo ou explicar-lhe a situação? Essa dúvida perdurava, mas a resposta era tão óbvia. Por que se segurar quando Kirishima claramente demonstrou que não estava bem?
Ponderou por um tempo e decidiu que esperaria um pouco, esperaria por Eijirou acalmar-se para tentar entendê-lo. Não seriam aquelas palavras que iriam o impedir de tentar ajudá-lo, apesar delas terem o feito refletir por um tempo. Saiu do banheiro, ainda atordoado, e direcionou-se ao seu quarto, deitando na cama para pensar um pouco mais sobre o que acabou de ocorrer e entender aquele tornado de sentimentos que crescia em seu peito.
No entanto, não demorou muito até ouvir gritos do outro lado da parede. E não só gritos, algo a mais aparentava acontecer.
***
Kirishima estava fervendo de raiva, - o que é muito incomum ao ruivo, que geralmente é tão doce e gentil - com a situação que havia acabado de sair. Por que Bakugou era tão persistente? Sempre admirou aquilo no rapaz, julgando até másculo, mas agora aquilo estava lhe perturbando. Ele amava Bakugou, seu sentimento era tão intenso que doía... porém, apesar de nutrir algo tão forte pelo loiro, sempre tinha a mania de levar as coisas pelo lado negativo. Katsuki era alguém recluso e parecia não dar tanta importância aos sentimentos alheios, o que fazia Kirishima ter ainda mais receio de revelar algo mais sentimental para ele.
Você o ama, mas não sente esse amor sendo retribuído. E não estou falando apenas no sentido romântico.
Adentrou seu quarto, fechando a porta abruptamente e encarando o moreno que jazia em sua cama. Seu ódio apenas se intensificou ao vê-lo tão calmo lhe encarando, como se o lesse por inteiro.
E é verdade, eu posso lê-lo por inteiro, Eijirou.
Sua fúria realmente não possuía controle algum e ver o moreno não ajudava nem um pouco, ainda mais quando a sua maior fonte de estresse vinha dele. Andou em círculos pelo quarto, sentindo o olhar morto do outro sob si. Aquilo era agoniante demais. Parou de repente, não suportando mais controlar todo ódio que devorava seu corpo por inteiro, cerrando os punhos e emitindo um rosnado ao falar:
- Tá olhando o quê?
- Estou me olhando, apenas.
O ruivo deu um passo a frente, não suportando aquelas alegações que tanto andava negando.
- Eu não sou você.
- É sim.
E aquele foi o estopim. Eu sabia que iria acontecer, afinal, eu sei quais são seus pensamentos, mas não pude te impedir. Kirishima começou a se aproximar mais ainda, não hesitando em segurar sua outra versão pela gola da camisa e encará-lo de forma ameaçadora, odiando-o tanto ao ponto de não hesitar em desferir um soco certeiro contra seu rosto - uma pontada de dor surgiu exatamente no lugar onde bateu no outro, mas ignorou -, logo em seguida, arremessando-o contra a cama para continuar a despejar seu ódio.
- Isso não vai resolver nada, Eijirou... - o moreno tenta argumentar, mas não há o que fazer, seu rosto é atingido novamente com um impacto mais forte ainda. Kirishima sente a ardência em sua pele, mas prossegue não ligando para tal.
E eu diria que você até gosta dessa ardência, mas eu só estaria alimentando ainda mais seu ódio.
A outra versão do ruivo se cala, agora com o lábio inchado e um olho roxo, apenas observando-o com o olhar de sempre, sem tentar reagir de qualquer forma. Só serviu como combustível para Eijirou prosseguir com aquela ação totalmente irracional, movida apenas por ódio. Precisava descontar todas suas frustrações em alguém, mas Kirishima odiava machucar qualquer pessoa, ninguém ao seu redor merecia ser alvo de sua fúria.
Ninguém exceto ele.
No fundo você sabe que eu sou parte de você, eu sei disso, sua negação toda é apenas mais uma de suas mentiras.
A cada soco que desferia, sentia a dor reverberar por seu corpo, agora já estava ficando difícil ignorar a maldita dor, mas Eijirou prosseguia o fazendo. Ele odiava aquilo, aquele ser de fios negros, sem graça, covarde e medroso. Ele jamais aceitaria que aquilo era parte dele, ao mesmo tempo em que estava descontando todo seu ódio nele justamente por saber que o moreno era uma parte sua.
Seus gritos recheados de ódio continuaram, não se atentando ao fato de que alguém poderia ouvi-lo, apenas focado em tentar destruir o ser que tanto lhe assombrava. A esse ponto, o moreno estava com sua respiração fraca, tentava segurar os socos desferidos por Eijirou, não obtendo êxito e apenas deixando que o ruivo fizesse aquilo. Ele era a parte fraca, afinal, aquilo era imutável.
- Eu te odeio tanto, mas tanto... - o ruivo grunhe com os olhos cheios de lágrimas, segurando a face alheia e se preparando para desferir outro soco, mas uma interrupção finalmente aconteceu.
- Mas que porra é essa, Eijirou?
Aquela voz grossa soou pelos tímpanos de Kirishima e ele virou-se abruptamente em direção a porta do quarto. Seus batimentos se intensificaram ao deparar-se com a figura loira com um semblante contraído em descontentamento enquanto suas mãos fumegavam, dando indícios de que a porta havia sido explodida.
E para seu azar, não era apenas Bakugou que estava ali.
Viu seus outros colegas o encarando espantados com a cena. Suas mãos estavam machucadas e sangrando. O moreno estava bem visível aos olhos dos outros. O cenário todo era desastroso e não havia como explicar nada.
De repente, o medo se sobrepôs à fúria.
***
Monstro.
Era assim que Eijirou se sentia diante dos olhares que queimavam sobre si, estando completamente exposto aos seus colegas e professores no caminho para a enfermaria, que era onde o moreno estava sendo levado o mais rápido possível. Permaneceu em silêncio, ignorando os questionamentos que eram feitos, ignorando os berros de Bakugou questionando-o sobre toda aquela situação de merda, ele era incapaz de sequer encará-lo após ser pego fazendo algo tão... desumano.
Os questionamentos cessaram quando o loiro explosivo percebeu que não iria a lugar nenhum com seus gritos. Eijirou parecia sombrio e aquilo lhe dava calafrios. Ninguém mais além de Katsuki se atreveu a chegar perto de Kirishima, estavam assustados o suficiente com o ruivo de dentes afiados; logo foram dispersos para seus próprios dormitórios à mando dos profissionais e apenas o loiro, que era teimoso e rebelde o suficiente para ignorar as ordens, prosseguiu seguindo-os até a enfermaria.
O moreno também estava silêncio, completamente quieto, assim como no início, quando estava rodeado de profissionais, no estágio.
Falar em público não é meu forte e essa é mais uma das coisas que você odeia em mim, Eijirou.
Fora posto na maca e a Recovery Girl imediatamente curou seus machucados de forma profissional, mas sem conter sua preocupação quanto a figura que jamais havia visto ali. Ruivo e loiro observaram o processo, lado a lado e sem trocar uma única palavra. Os outros dois professores foram dispensados por Aizawa, que informou que cuidaria das coisas dali para frente, ele observava preguiçosamente os jovens, suspirando por ter que lidar com uma situação complicada em um horário que deveria estar confortável em sua cama, ocultando a preocupação que nutria pelo desastre que ocorreu, se culpando por não intervir antes.
Exatamente, o professor sabia sobre aquilo.
- Kirishima Eijirou. - chamou pelo ruivo, que vagarosamente ergueu a face em sua direção, sem muita vontade. - Não sabemos quais fatores te levaram a agir de forma tão violenta, mas haverá punições pelo seu comportamento. Como está tarde, informarei ao diretor sobre esse incidente e ouviremos o que tem a dizer amanhã. - terminou de informar, se aproximando de Bakugou, colocando uma mão em seu ombro e sussurrando para que apenas ele ouvisse. - Já que insiste em estar aqui, certifique-se que a vítima não seja atacada novamente. - Katsuki faz um leve menear de cabeça, indicando que estava de acordo.
Eijirou conseguiu sentir ódio e desespero. As palavras duras de Shota o irritaram; seria punido por culpada daquele coisa, mas por algum motivo se sentia minimamente seguro pelo fato do profissional não tentar abordar de modo mais efetivo o moreno, não queria que ele fosse tirado de seu lado, ao mesmo tempo em que desejava isso.
No fim, manteve-se em silêncio e Shota deu de ombros, saindo pela porta da enfermaria, já pegando seu celular para fazer uma ligação importante.
Katsuki permaneceu em silêncio também. Como Eijirou não estava afim de explicar-lhe o que ocorrera, se aproximou da maca, fitando o moreno que lhe observava sem muita vontade, mas se encolheu um pouco com a aproximação repentina.
- Quem é você? - questionou-o antes de tudo, observando atentamente cada detalhe no moreno; tudo nele lembrava muito Kirishima, mas não fazia sentido ser ele quando o próprio estava bem ali, ao seu lado. Os machucados na face alheia eram um incômodo, ainda mais quando foram causados por um ser tão dócil que repudiava machucar outras pessoas.
- Eu... - a voz soou baixa, fraca. No entanto, sequer teve oportunidade de tentar responder alguma coisa, pois o ruivo se interpôs na conversa.
- Não importa, Bakubro. - Eijirou se aproxima, suas mãos tremendo em ansiedade, tendo agido de forma impulsiva, temeroso de que o loiro tomasse consciência de que aquele ser desprezível era ele. - Não ouça o que ele diz.
Até em momentos assim pretende me esconder?
Katsuki encara Kirishima com o cenho franzido em descontentamento, a tensão era visível nos ombros do ruivo e aquilo apenas lhe irritava mais ainda. Trincou o maxilar, pondo-se a questionar Eijirou.
- Agora você vai falar comigo, é? - o ódio estava expresso, mas um quê de mágoa escondia-se naquela entoação. Apontou para o moreno na maca e continuou sua fala cheia de ódio. - Você bateu em alguém Eijirou, tem a porra de noção do que isso significa? Você nunca faria uma porra dessas e se recusa a me explicar alguma coisa. - gritou, as faíscas saindo de suas mãos pelo descontrole. - E ainda tem aquela merda toda que me falou no banheiro, o que significa tudo isso?!
Eijirou fica paralisado diante daquelas palavras vindo do loiro, a expressão de desconforto ficava cada vez mais evidente em seu semblante à medida que ouvia as desconfianças de Katsuki. Queria sair dali, senão seria tomado pelo ódio novamente, seu descontrole emocional naquele momento estava muito grande, então não arriscaria descontar sua raiva em alguém, especialmente, em Bakugou. Jamais se perdoaria caso o fizesse.
Precisava esfriar a cabeça, então começou a ignorar o discurso do loiro e andar para fora do quarto, deixando Bakugou ainda mais enfurecido. Katsuki iria segui-lo, mas se segurou, pois talvez não fosse valer a pena. Aproveitaria aquela chance para questionar o moreno, arrancar alguma resposta dele, pois ele certamente deveria saber algo sobre o estado mental de Eijirou.
- Você. - encarou o rapaz de fios negros sob a cama, seus orbes rubis lembram muito Eijirou, mas Katsuki decide não se atentar muito aos detalhes, indo direto ao ponto, perguntando o que desejava de uma vez. - O disse para fazê-lo ficar assim?
O moreno pende a cabeça para o lado e estreita os olhos, um pouco incrédulo com a questão direta, praticamente sendo acusado de ter causado aquilo. No entanto, ele consegue sentir a mistura de sentimentos que os orbes escarlates de Bakugou expressam, encaixando as peças e chegando à conclusão de que o loiro estava extremamente preocupado com o ruivo, e por conhecer apenas a parte alegre, esforçada e gentil de Kirishima, ele pensava que algo que o moreno havia dito pudesse ter desencadeado toda aquela situação.
E bem, ele não estaria errado se pensasse assim.
Um riso sem graça escapou pelos lábios da versão obscura de Kirishima e o loiro franziu o cenho, buscando entender qual era a graça.
- Às vezes você é um pouco óbvio, Bakugou. - a voz estranhamente conhecida chega aos ouvidos do loiro e ele arregala os olhos de imediato, olhando para o moreno embasbacado, desviando o olhar para a porta do cômodo para checar se o ruivo não havia voltado por algum motivo. - Sou eu quem estou falando mesmo. - ele é secado pelo olhar de Katsuki, sentindo-se um pouco incomodado, mas deixando que o loiro explosivo assimilasse a situação.
- Você... puta merda. - analisou melhor a aparência jovial do moreno, buscando por detalhes que o ajudassem a chegar a uma conclusão plausível. Os orbes de cores vermelhas faziam sentido agora, a cicatriz quase imperceptível no olho direto também entrou em seu campo de visão. - Você se transformou nele? Porra, quem caralhos é você pra ousar fazer uma merda dessas... - vocifera enquanto as faíscas proporcionadas pelo suor adocicado surgem em suas mãos. A fúria agora se apossa de seu ser e ele tenta imediatamente, de alguma forma, encontrar algum rastro de culpa do moreno, que pudesse, talvez, justificar o dano que lhe fora causado.
O rapaz se encolhe na cama com certo medo expresso em seu semblante - inevitável, até porque, o medo é algo que Eijirou odeia, então uma característica como aquela fazia sentido -, suas mãos estão levantadas no ar, indicando para que o loiro não se aproxime demais. Quando vê que Katsuki está pouco se fodendo para seus desejos, decide se pronunciar e explicar a verdade de vez, tentando ser objetivo:
- Eu não me transformei nele. Eu sou ele. - pontua de modo objetivo, vendo o outro soltar mais rosnados de fúria. - Sou a encarnação de tudo que Eijirou mais odeia nele mesmo.
- Não minta, seu desgraçado!
- Não estou mentindo, juro. - não há tanta expressão em sua voz, mas seus olhos transmitem uma sinceridade imensa. - Acredite em mim...
Katsuki solta outro rosnado cheio de ódio por sua própria indecisão, fechando o punho e respirando fundo, tentando se acalmar antes de tentar buscar por provas de que aquele rapaz era realmente quem dizia ser.
- Então responde: Por que caralhos ele te bateu?
O moreno engoliu em seco, ponderando se deveria respondê-lo ou não. O que conversava ou o que acontecia entre ele e sua versão original eram coisas bem privadas, e um tanto quanto tóxicas por ambas as partes, principalmente pelo ruivo, já que ele não se demonstra nada contente com sua presença. Ele pensa e chega à conclusão de que poderia ajudar o loiro e ruivo a se resolverem quando acessa a visão e pensamentos de Eijirou, sentindo o arrependimento pela forma que tratou Katsuki tomando seu corpo.
O ruivo estava arrependido, muito mesmo.
Portanto, uma ajuda daquele qual era o único que Eijirou estava minimamente disposto a ouvir poderia ser boa.
- O que acha de perguntar para ele? - questiona retórico e o loiro demonstra-se confuso. - Ele está no banheiro do quarto dele e está realmente mal, Bakugou.
- Mas eu explodi a porta e o banheiro não tem tranca...
- Coisas assim não importam muito quando tudo que você quer é chorar e botar tudo que dói em você para fora. - explica, um pouco triste com sua própria fala. - Ele esqueceu, estava desesperado e angustiado demais para se atentar a esse tipo de coisa.
- Isso é pra me distrair? - perguntou, fuzilando o moreno com o olhar. E se aquilo fosse um plano para ele escapar daquele lugar?
- Não. - sua resposta é simples e ele não hesita nem um segundo em proferi-la.
- Como caralhos sabe disso sobre ele? - questiona incrédulo com a quantidade de informações que lhe eram expostas. Se recusava a acreditar que aquele cara era uma parte de Eijirou, mas então o que explicava todas aqueles informações?
- Porque eu sou ele, oras!
***
A água do chuveiro cai contra seu corpo de maneira incessante, seu barulho abafando os soluços e fungos que o ruivo é incapaz de conter. Seus olhos ardem enquanto as lágrimas escapam por eles, sua respiração falha e, vez ou outra, Eijirou encontra dificuldade em respirar. Os sentimentos estão mesclados em seu peito e ele não sabe o que fazer; o ódio ainda está presente, tanto que ele inutilmente o desconta na parede do banheiro, deixando algumas pequenas rachaduras por conta de sua individualidade.
Estava arrependido, ao mesmo tempo em que estava furioso com o fato de ter cedido ao ódio. Não se arrependia necessariamente de ter batido no moreno, e sim do fato de ter sido visto o fazendo. Não conseguia compreender o porquê de odiar tanto aquela sua outra versão, mas motivos era o que menos lhe importava. Ou você só está os ignorando mesmo.
Não queria ter tratado Katsuki de uma maneira tão fria, de ter o tratado com tanto descaso e tão rudemente. Mas infelizmente, foi isso que aconteceu; seu ódio tomou controle e ele apenas deixou que as palavras saíssem de sua boca, toda sua frustração sendo expressa, tanto verbalmente quanto não-verbalmente. Talvez o loiro nunca mais fosse querer olhar para a cara dele, não quando ele provavelmente já tinha consciência de quem era aquele ser desprezível que não consegue ser feliz o tempo todo. Não quando uma parte de si agia de modo tão egoísta...
Foi disperso de seus devaneios ao ver a porta do seu banheiro se abrindo. Seu coração acelerou de imediato, começando a entrar em desespero pela invasão de privacidade, procurando pelo porquê de ter alguém por lá e se lembrando de que seu quarto não havia mais porta. Merda.
Enxergou os fios loiros junto a face conhecida surgindo na entrada do banheiro, ficando ainda mais desesperado e tentando deixar que ele visse o mínimo possível de suas partes íntimas enquanto questiona rapidamente:
- Por que está aqui, Bakubro? Eu tô tomando banho! - o repreendeu, limpando as lágrimas em sua face - embora a água já fizesse esse trabalho - e segurando a vontade de continuar chorando. Aquilo era humilhante.
Katsuki não falou nada, parando por alguns instantes, mas logo balançando a cabeça em negação e respirando fundo antes de dar mais alguns passos para frente, abrindo a box vagarosamente com sua visão concentrada na face de Kirishima, que alimentava cada vez mais o temor em seu peito com a aproximação, inutilmente pedindo para que o loiro saísse.
Aquelas íris escarlates fitavam-no com uma intensidade absurda, como se estivessem tentando decifrar o que sentia. Era desconfortável, ao mesmo tempo em que também podia ser tentador.
- Porra, você tá chorando mesmo? Agora que confirmei isso não vou sair até você me contar que merda tá acontecendo.
- Chorar? - ele pergunta, sentindo o desespero em imaginar que Katsuki já tivesse compreendido sua situação. - Eu não estou chorando.
- Não é o que parece. - afirma com convicção, mantendo sua atenção nos olhos inchados do ruivo à sua frente, tendo certeza absoluta de que o moreno na enfermaria não estava mentindo.
- Ele te disse isso? - viu-se enfurecido novamente, já fazendo suas suposições. Será que foi correto supor isso logo de cara, Eijirou? - Ele mente, Bakugou. Não acredite nas mentiras dele.
- Eu nunca mencionei ninguém. - sua fala é simples e sua expressão está neutra, mas logo estreita os olhos em direção a Kirishima e o vê arqueando as sobrancelhas, agora preocupado e parecendo buscar incessantemente por uma desculpa plausível em sua cabeça. - O que ele me disse era verdade, acho que não é ele quem está sendo desonesto aqui.
- Não... - ele sussurra, de cabeça baixa, negando aquela acusação. Quer continuar bancando o mentiroso mesmo? Ele fechou seus punhos, vendo a água escorrendo por seu corpo e respirando fundo antes de tentar tomar alguma atitude. - Vai embora, Bakugou. Eu quero ficar sozinho.
- Não vou... não quero te deixar sozinho aqui, porra. Olha pra você, tá-
- Eu tô bem. - forçou seu sorriso. - Eu só me descontrolei por coisas bobas, mas juro que não vai acontecer de novo, não se preocupe.
Aquele sorriso falso novamente. Como caralhos o ruivo era capaz de fingir em um momento desses? Em jogar promessas vazias no ar de forma tão fria e relaxada, como se não tivesse feito nada de errado... Kirishima estava mais estranho do que nunca.
- Para de fingir, seu idiota. - disse entredentes, contendo sua fúria com todo aquele descaso. Sem perceber, começou a se aproximar de Eijirou, deixando-se tomar pela necessidade de abraçá-lo ao menos naquele momento, de protegê-lo do que quer que estivesse passando por sua mente naquele momento.
- Vai embora! - no ápice de seu desespero, acabou por agir de forma defensiva para afastar Katsuki e ativou sua individualidade, cravando seus dedos endurecidos nos ombros alheios para empurrá-lo para trás, consequentemente o machucando. Vendo a expressão de dor tomando a face do loiro, percebeu o que causou e se afastou de imediato, encostando as costas contra a parede e encarando-o aterrorizado. - Droga, desculpa...
Agora você se sente ainda mais monstruoso, não?
Ele vê algumas gotas de sangue escorrendo pelos braços alheios, ficando ainda mais atordoado com o que acabou de fazer. Não pôde mais conter as lágrimas que acumularam-se em seus olhos, sentindo-as deslizarem por sua face junto a água quente.
Ele machucou Katsuki.
Você machucou Katsuki.
Ele havia acabado de ferir aquele que ama, e isso doía mais do que a ardência que proporcionou a si mesmo há algum tempo atrás.
Isso é um problema, não?
A culpa tomou controle de seu corpo, fazendo-o continuar pressionando-se contra a parede, proferindo inúmeros pedidos de desculpa e puxando os fios rubros com certo ódio. Ele queria sair dali, não queria encarar a expressão de ódio que lhe seria direcionada, - embora pensasse que merecia muito - não queria correr o risco de machucar Katsuki uma outra vez.
Ele tinha que...
Seus pensamentos repletos de ansiedade cessaram ao sentir seu corpo ser envolvido pelos braços do loiro. Suas sobrancelhas arquearam em surpresa, mas também em dúvida, não fazia sentido algum ser abraçado depois de ter feito algo tão terrível, muito menos por Katsuki. Onde estavam os gritos cheios de ódio? Sequer viu a expressão de Bakugou, pois o mesmo encaixou sua face na curvatura de seu pescoço. Podia sentir o coração acelerado em seu peito, ficando ainda mais ansioso com a ação completamente inusitada do loiro explosivo, sem contar o quão terrível o tom avermelhado da água fazia-o se sentir.
"O que isso significa? Ele estava tão bravo e pretende me esmagar até a morte?" - o ruivo pensa, prendendo o ar nos pulmões e mantendo a expressão chocada, ainda sem retribuir o abraço.
Não, Katsuki não seria capaz de matar alguém dessa forma, ele tende a ser mais... explosivo.
"Eu realmente não esperava isso dele... tem algo de errado nisso..."
Talvez você só devesse considerar algumas outras possibilidades, Eijirou...
Vendo que o loiro não pretendia soltá-lo e até mesmo intensificou o aperto, Eijirou ficou paralisado com inúmeras possibilidades invadindo sua mente. O calor daquele abraço era bom, mas o fato de não saber o que aquilo implicava o trazia certa angústia.
Isso até o momento onde Katsuki sussurrou em seu ouvido:
- Pode chorar, não vou te julgar.
E naquele momento, todas as resistências do ruivo foram quebradas. Inúmeros soluços escaparam junto às lágrimas incessantes, a situação poderia ser estranha e um tanto quanto inapropriada, mas só o fato de estar sendo acolhido nos braços de Katsuki o fez se sentir confortável para deixar as coisas que o afligiam saírem.
Enfim, algum progresso. Ainda não é o suficiente, mas já é algo.
****************
Pois é, as coisas foram tensas (eu espero), mas agora que tudo foi descoberto, o Eijirou não vai ter que lidar com tudo sozinho, se sobrecarregando, como ele estava fazendo.
O resultado desse capítulo não me agradou tanto quanto pensei, mas acho que é melhor postar logo do que ficar me remoendo em ansiedade.
Enfim, obrigado por lerem e perdão pela demora! ♡
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