ANTES

2010

A cozinha dos Diaz recendia a gengibre e baunilha, o melhor aroma do mundo, na opinião de Amália. Como diria sua avó paterna, era impossível sentir-se triste depois de comer um biscoito de gengibre preparado da maneira correta.

Era 22 de dezembro, e Amália e Oscar inventaram de fazer os famosos biscoitos como um teste para o Natal. Ansioso, César dançava em volta deles enquanto esperava que a primeira fornada ficasse pronta. Seu namorado (porque agora eles tinham esse título) estava mais alegre e relaxado, como há algum tempo não ficava. No entanto, quando a campainha tocou, e ele foi ver quem era, Amália notou a mudança na sua postura: costas retas, punhos cerrados.

Após dez minutos, Amália finalmente tirou os biscoitos do forno e Oscar não tinha voltado à cozinha.

— Não toque neles, César. Estão muito quentes, você vai se queimar — ordenou, antes de caminhar até a sala e descobrir o que estava acontecendo, afinal.

O que viu não deveria alarmá-la. Era só algum garoto, um pouco mais velho do que eles mesmos. Mas seu cabelo era raspado, várias tatuagens espalhavam-se pelo seu corpo e o garoto se vestia como um cholo, Não poderia haver dúvidas de que era um dos Santos.

—Você precisa cuidar disso, Oscar.

—Mas eu tenho visita...

— Primeiro vai pegar o dinheiro, depois você volta para sua ruca.

— O nome dela é Amália.

O garoto tatuado riu.
— Eu sei que é a garota bonita dos Turner, todo mundo vê vocês dois juntos, não se preocupe, compa. — antes de sair, ele lembrou — Não se esqueça dos negócios, Spooky.

Oscar se virou, suspirando, e deu de cara com Amália.

— Eu não sabia que esse era seu apelido agora.

Oscar sentia que o sangue fugia do seu rosto.

— Amália, eu posso explicar.

— Essas são as famosas palavras de todo mundo quando alguém descobre uma traição.

— Não é uma traição!

— É um segredinho sujo? Você chamaria assim o fato de você estar escondendo de mim que faz parte dos Santos agora?

Ele abaixou a cabeça, mas não negou. Uma parte da mente de Amália se perguntava quando tempo demoraria para ele raspar seu lindo cabelo.

— Será que você poderia ficar um pouco com César?

— Enquanto você vai cometer algum crime?

Ele levantou a cabeça, seus olhos eram tristes e quase imploravam.
— Amália, por favor. É rápido. E depois nós vamos conversar, quando eu voltar. Eu não sei onde minha mãe está, meus tios foram viajar e eu não queria deixá-lo sozinho hoje. Ele só tem sete anos.

— Ok, eu fico com ele. Vai fazer o que você precisa fazer.

Pela próxima meia hora ela se ocupou em decorar os biscoitos de gengibre junto com César, sorrindo para o garoto, enquanto disfarçava as mãos trêmulas. Então ela ouviu o barulho de chave na porta, e saiu correndo, porém não era o namorado, mas era a mãe dele.

A mulher parecia utilizar a parede como apoio.
— Sra. Diaz? — o próprio nome fez com que ela começasse a rir.

— A própria, querida. Quem mais?

— A senhora está bem?

A mulher riu novamente.

— Ninguém está bem nessa família, não desde que ele não está mais.

Ela tentou andar, mas tropeçou em coisa alguma e caiu de joelhos no chão. Amália se apressou a ajudá-la a se levantar. A mãe dos garotos era pequena e magra, e muito parecida com César nas cores. A pele clara, os cabelos e olhos extremamente escuros, era uma das mulheres mais bonitas que Amália conhecia. Mas olhando de perto, ela parecia estar mais magra, mais frágil, de alguma maneira.

— Onde estão meus garotos? — perguntou ela, assim que Amália a ajudou a sentar no sofá.
— César está na cozinha me ajudando a decorar biscoitos.

Ela apenas sorriu, e Amália sentiu certo alívio. As estranhas gargalhadas da mulher estavam começando a dar calafrios, como se por trás delas houvesse algo terrível.

— Ele é tão bonzinho, não é? Não há criança melhor, pena que o pai quase não o conheceu. E Oscar?

— Ele saiu, mas já volta.

A senhora Diaz sacudiu a cabeça.

— Igualzinho o pai, o mais velho. Ele gostava de segui-lo para cima e para baixo, ficava no meio dos cholos, imitava seu jeito de andar. Ele ficou tão triste quando Ray foi preso.

Então ela fixou os pesados olhos negros em Amália, mas era como se estivessem vazios, longe dali.

— Os garotos dessa família, querida... Eles vão partir seu coração.