♪Depois da Valsa
"A música clássica do amor é em tom maior, a romântica em tom menor. O amor moderno é uma fraca melodia, sobreinstrumentada."
— Hugo Hofmannsthal
♪♪♪
Edward afastou seus lábios dos meus e sorriu, fui incapaz de não retribuir o sorriso. Ele havia me beijado, era quase uma declaração. Afinal, depois do que eu dissera, um beijo era realmente algo mais do que apenas um beijo. Mas ainda queria que ele dissesse alguma coisa sobre seus sentimentos por mim.
Não que eu estivesse reclamando do beijo, longe disso. Aquele momento ficaria guardado na minha memória por um longo tempo. Apenas esperava alguma coisa, é ele quem deveria dizer, ou escrever no caso, coisas bonitas, ele é bom com palavras. O mínimo que eu esperava era que falasse como se sentia.
— O que está pensando? — perguntou, enrolando uma mecha do meu cabelo no dedo.
— Nada de mais. — Dei de ombros e olhei para o lado, evitando o olhar de Edward. Havia várias camélias, de todos os tamanhos e cores, em um canto. — São bonitas — comentei.
— As flores? Sim, elas são. — Edward se afastou de mim e colheu uma camélia branca, a ergueu na altura dos olhos como se estivesse analisando-a. — Mesmo que não seja a criatura mais bela deste jardim.
— E quem seria a mais bela de todo o jardim? — Brinquei com sarcasmo. — Deixe-me adivinhar... A Branca Camélia?
— Quase... — Edward se aproximou novamente e colocou a flor atrás da minha orelha. — É a pessoa que a usa a mais bela de todas.
Dei um sorriso sem jeito e encarei o chão. Não sabia o que responder para seus galanteios desta vez e também não estava com muita vontade.
— Lyra. — Ele me chamou, segurando levemente meu queixo para que meus olhos encontrassem os seus. — Por que está tão dispersa?
— Por nada.
Edward continuou a me olhar com insistência.
— Já disse que não é nada de mais.
— Algo está te incomodando, Lyra. Tenho quase certeza, então por que não me conta?
— É uma besteira, não precisa se preocupar.
— Se é algo tão leviano você pode me contar, não?
Desvencilhei-me de seus braços e comecei a andar em direção a cozinha, ponderei se diria a verdade ou não, o que eu esperava dele naquele momento. Optei por dizer, não faria muita diferença e ele provavelmente me acharia uma sonhadora e iludida por romances, mas valia a tentativa.
Parei e o olhei de relance antes de dizer:
— Eu esperava uma declaração da sua parte, mas acho que romantizei demais a situação.
E voltei a andar.
Edward me alcançou rápido, as vantagens de ter passos largos, e logo me ultrapassou, bloqueando a entrada para o cômodo.
— Depois de todos esses dias... O modo que te tratei... Pensei que meus sentimentos já estivessem bastante claros.
— É sempre bom verbalizá-los — murmurei.
— Mesmo que eu declarasse os versos mais bonitos neste momento, duvido que tenham a mesma intensidade e valor sentimental do que se eu os dissesse em outro. — Edward beijou minha testa. — Quando menos esperar irei me declarar, Lyra. E será melhor do que se eu fizesse isso agora, está bem?
— Você é um escritor, espero que me surpreenda. — Sorri e passei meus braços ao redor de seu pescoço.
— Não se esqueça de que eu escrevi uma cena de beijo em um estábulo.
— O som de porcos deve ter deixado tudo ainda mais romântico. — Brinquei e nós dois rimos. — Imagine então o cheiro de rosas! Este deve ser o melhor lugar para beijar alguém com certeza.
— Quer dizer que eu preciso te levar até um estábulo? — disse e em seguida sussurrou. — Porque eu quero muito te beijar neste momento.
Sorri e aproximei nossos rostos.
— Então o que o senhor está esperando?
— Boa pergunta — falou e encostou seus lábios nos meus.
Edward era um fã de beijos lentos pelo que notei. Movia-se com calma e sentia que era isso que fazia seu beijo parecer tão elegante, ou pelo menos era parte do motivo. Era boa a sensação que me proporcionava, uma leveza que não me deixava preocupada com o que aconteceria depois.
Ouvi alguém tossindo do outro lado do cômodo.
— Com licença, pombinhos... — disse Edgar. — Mas eu preciso passar. Depois vocês continuam essa linda história de amor. — Sua voz soava sarcástica como sempre e de bônus ele ainda acabou com o clima.
— Achei que você tinha saído. — Edward fechou a cara.
— Eu tinha, mas como pode ver já voltei. Agora, por favor, me deem licença.
O escritor soltou o ar lentamente enquanto se afastava da porta, colocou uma mão nas minhas costas e fomos até a sala enquanto Edgar saía da casa e ia, provavelmente, para o jardim.
— Vocês dois brigaram? — perguntei me sentando no sofá.
— Não, ele apenas chegou em um momento que não deveria. — Edward se sentou ao meu lado. — Você ficaria do mesmo jeito se fosse James te interrompendo.
— Na verdade, eu ficaria muito envergonhada. Acho que não conseguiria dizer nada.
— Você ficou toda vermelha quando Edgar chegou. — Ele sorriu.
— Não esperava ser interrompida — murmurei. — E você não tem o direito de achar graça disso!
— Não acho engraçado. — Deu de ombros. — Já falei que te acho linda quando cora, por isso sorri.
Olhei para o tapete persa e todos os seus detalhes deslumbrantes invés de encarar os olhos de Edward.
— Você fica vermelha com muita facilidade, Lyra — comentou. — Vamos. — Segurou minha mão e se levantou. — Vamos para algum lugar que Edgar não nos surpreenda.
— E essa proposta tem algo de indecente, senhor Siwen? — Arqueei a sobrancelha.
— Se a sua definição de indecente quer dizer: "procurar uma música para a sua competição". Então sim, estou propondo algo indecente. — Revirei os olhos em resposta. — Vamos, Lyra. Quanto mais rápido resolvermos isso, mais tempo terá para ensaiar.
— Tem que ser agora? — Protestei um pouco frustrada, não estava interessada em falar sobre partituras naquele momento. — Temos uma tarde inteira pela frente e eu prometi te ajudar com seu livro, coisa que ainda não fiz...
— Então você ficará a tarde inteira aqui? — Sorriu e acariciou a palma da minha mão com o polegar.
— A não ser que o senhor queira que eu vá embora antes.
— Se depender da minha vontade a senhorita só vai embora amanhã — murmurou.
— Duvido que Edgar consiga me aturar por tanto tempo sem uma pausa. — Debochei.
— Então se ele não fosse um problema você ficaria...? — Edward sorriu um pouco malicioso. — Porque se for esse o caso eu faço esse pianista desaparecer em dois minutos.
— Dois minutos é muito tempo, ele corre tão rápido assim? — Brinquei. — Ou você que é muito lento?
— Um pouco dos dois eu diria. — Segurou minha outra mão e me fez levantar. — Mas você ainda não respondeu minha pergunta, querida Lyra.
— A resposta é... — Fiz uma pausa dramática. — Rufem os tambores...
— Pare de enrolar e diga logo.
— Não posso ficar. Você sabe muito bem que ainda é cedo para isso e eu tenho um compromisso com James amanhã de manhã.
— Não precisarei arrumar o quarto de hóspedes, obrigado. — Edward suspirou aliviado
— Sério isso, Edward?
— O que você e seu irmão programaram? — perguntou enquanto ia em direção as escadas, e me levava junto como consequência.
— Ele quer comprar meu presente de Natal. — Dei de ombros. — E pediu para que eu reservasse o fim de semana para isso.
— Tinha que ser o fim de semana inteiro?
— Pare de ser grudento, Edward. Vai assustá-la antes mesmo que comecem a namorar — falou Edgar saindo da cozinha e indo de encontro com a escada também. Notei que tinha um pouco de terra na barra da sua calça.
— Não se esqueça de colocar essa calça dentro da máquina de lavar assim que sair do banho. — Avisou o escritor, entrando em seu modo "mãe protetora".
— Sim, senhor. — Edgar revirou os olhos e subiu para entrar possivelmente em seu quarto.
— Missão maternal de hoje: cumprida! — Brinquei.
— Até você, Lyra? Estou desapontado com sua falta de originalidade para fazer piadas.
— É de família a falta de talento humorístico. — Esbocei um sorriso amarelo. — Acontece, ninguém pode ser perfeito e esse é o meu defeito. — Dei de ombros.
— E essa pose de convencida, a senhorita roubou de quem? Edgar? — comentou indo até a cozinha.
— Eu tentei roubá-la, mas é impossível ser igual a ele nesse quesito.
— De fato, ninguém ganha dele. — Edward riu. — Aceita um café, Lyra?
— Não consigo recusar uma boa xícara. — Sorri. — Mas você já vai fazer um? — perguntei quando o via pegar algumas coisas no armário.
— Claro! Café é a melhor solução para os problemas da vida.
— Concordo, é uma bebida dos deuses. Como é possível existir pessoas que não gostam de café?!
— O Edgar detesta café, deve ser por isso que ele é tão amargo.
— É a melhor explicação para o mau humor dele. — Dei uma risadinha.
Enquanto Edward terminava de preparar a melhor bebida de todos os tempos, a campainha tocou de modo insistente. O escritor soltou o ar de uma vez e andou com passos apressados até a sala para atender quem quer que fosse. O ouvi conversar com alguém enquanto andava de volta para a cozinha.
— E como andam as coisas com a... — falou James ao passar pela porta. — Lyra! Que surpresa te ver por aqui, irmãzinha.
— Boa tarde para você também, James. Tudo bem?
— Estou ótimo e você? Como anda o relacionamento?
— De fato, discrição não é o forte dessa família — disse Edward indo finalizar seu café.
— Você não negou o que eu falei e a Lyra está parecendo um pimentão, então acho que vocês já avançaram um pouco as casas. E que bom! — exclamou. — Já estava mais que na hora! Agora me contem: como aconteceu?
— Você quer mesmo saber? — perguntei com um sorriso travesso e meu irmão assentiu. — Tudo bem, vou contar.
— É sério, Lyra? — Edward arqueou a sobrancelha e virou as costas.
— Edwen está vermelho, que gracinha! — James comentou.
— Como você sabe? — Baixei meu tom de voz.
— Ele escondeu o rosto para que ninguém visse. — Nós dois começamos a rir.
Edward voltou para perto segurando duas xícaras de café e me entregou uma.
— Obrigada. — Agradeci e o escritor respondeu tomando um pouco de sua bebida.
— E onde está a minha xícara?! — reclamou meu irmão. — Que falta de educação, Edward! Nem oferece para o cunhado!
O escritor revirou os olhos e foi servir o desesperado que continuou a reclamar até que tivesse uma xícara cheia em mãos.
— Você já fez as perguntas que queria — disse Edward. — Agora é a minha vez.
— E o que você deseja me perguntar, Edwen?
— Eu e a Lyra... Qual sua opinião sobre nós?
— Os dois sabem que eu sou a favor, tanto que eu estava reclamando da enrolação de vocês. Que pergunta estúpida — respondeu bebendo quase metade da sua bebida.
— Só queria confirmar — falou o outro na defensiva.
— O que você veio fazer aqui, James? — questionei.
— Preciso conversar com Edgar. Falando nisso, onde ele está? — Terminou sua xícara o mais rápido possível. — Não posso demorar, preciso voltar para o consultório.
— Lá em cima, no quarto. Quando subir, peça para que ele coloque aquela calça cheia de lama na lavanderia, por favor.
— Pode deixar, mamãe. — James bagunçou meu cabelo carinhosamente e disse. — Quer que eu te leve quando for embora? Eu sei que você precisa ensaiar para a competição...
— É por isso que estou aqui, Edward está me ajudando com isso.
— Sabe o que isso me cheira? Heloisa e Abelardo — comentou. — Mas vou fingir que acreditei e subir para falar com aquele professor demônio. Até mais, casal.
Revirei os olhos e bebi um pouco de café. O som de chuva me chamou atenção para a janela e fui até lá para observar a água que caia e ia de encontro com as plantas do jardim.
— Sabe o que falta? — falei e olhei para Edward. — Um bom livro.
— De fato, já temos o café e a chuva, só falta encontrar a história perfeita.
— Eu já sei qual seria a escolha perfeita!
— Acho que sei qual é...
— Vamos, Edward... Por favor... — Pedi de um jeito que só depois notei que havia soado infantil.
O escritor sorriu e beijou meu rosto.
— Vou buscá-lo. Se quiser, pode ficar na sala esperando, não vou demorar.
— Está bem.
Saímos da cozinha e antes que Edward subisse as escadas, segurei seu braço.
— O que foi? — perguntou.
Fiquei na ponta dos pés para beijar sua bochecha.
— Só queria fazer isso antes. — Sorri e notei que ele estava vermelho.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro