Capítulo Único: Pierrô enfrenta o raio moralizador
Oi, gente!!! Vim postar minha última comissão dessa leva (vou pausar por um tempinho porque minhas aulas voltaram) e temos uma historiazinha de natal fora de épocaaaa!
Essa fanfic é um pedido que recebi através das comissões que eu abri pra incentivar o #BlackLivesMatter! Vou deixar no comentário desse parágrafo o post no twitter para que você possa entender melhor, mas de uma forma geral, se você fizer uma doação eu escrevo uma fanfic para você! Mesmo que eu tenha pausado, uma hora eu vou voltar, juro!
Muito obrigada por ter doado Pudim_V0ador e espero que goste da sua fanfic!
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Os dedos de Jungkook buscavam as cordas do violão no automático, até porque se tivesse que ter qualquer traço de consciência por trás de suas ações, ele estaria ferrado. A mente já tinha se dispersado há muito, até porque ele não aguentava mais tocar "Noite Feliz". Sentia estar no poço de sua carreira musical.
A falta de atenção também ajudava ele a não pirar completamente com a barulheira que estava o andar do shopping, cheio de crianças catarrentas chorando, fazendo birra ou escravizando os pais enquanto aguardavam sua vez de conversar e tirar foto com o Papai Noel. Jungkook, quando criança, tinha pavor do tal velho de vermelho e mesmo agora, que era adulto, poderia escolher infinitas coisas que preferia estar fazendo a ficar tocando violão ao lado dele.
Mas a vida era daquele jeito mesmo... Nem sempre era possível fazer só coisas que gostava e, definitivamente, não se recusava grana. Na verdade, aquele seu trabalho deprimente de tocar "Noite Feliz" em loop era um bom negócio: não só ganhava uma graninha como tinha uma desculpa pra não ter que comemorar em família. Era impressionante como seus pais sempre caíam na ladainha de que, como era músico, ele sempre precisava de trabalho extra pra garantir seu sustento. Não que fosse rico, claro, mas ele poderia ter se poupado de um programa chato daqueles se não precisasse de um motivo convincente e com álibi para fazer com que sua família acreditasse.
Terminou de tocar a música e, pelo que poderia ser a milésima vez no dia, voltou para o começo depois de coordenar-se com uma moça que o acompanhava tocando um teclado sintetizador. Aliás, ainda achava muito estranho aquele arranjo que o shopping decidiu pra música do evento do Papai Noel. Na verdade, Jungkook tinha certeza que seria muito mais produtivo para a administração do shopping só colocar uma playlist de natal nas caixas de som em vez de contratar uma tecladista e um cara no violão aleatórios para tocar a mesma música pra sempre. Mas estavam pagando, né...
Queria que o resto dos caras de sua banda estivessem lá com ele... Não que pudessem fazer alguma coisa divertida ou tocar um som legal, mas pelo menos não sofreria com o tédio sozinho. Quanto mais tocava "Noite Feliz", mais desesperado ficava para pegar sua belíssima Gibson Les Paul Special Tribute DC, Worn Ebony, pretinha e lustrosa. Não era uma guitarra de riquinho, nem realmente rara, mas amava muito ela, era um ótimo custo benefício.
Só parou de imaginar-se tocando sua doce guitarra com sua banda quando uma movimentação diferente no evento atraiu seu olhar. Uma das pessoas vestidas de duende — que lembravam a Jungkook que sua situação não era tão ruim assim — saiu de perto do Papai Noel para ir até a fila buscar uma criancinha que parecia sozinha. Não sozinha, porque tinha um staff do shopping olhando ela, mas era bem diferente das outras crianças da fila, agarradas nas pernas dos pais.
O rosto da menininha de marias chiquinhas, comportado e até um pouco desanimado, abriu-se em um sorriso quando viu o garoto vestido de duende ir em sua direção. E logo ela, que parecia tímida e independente ao lado do staff, pulou nos braços estendidos do duende, que riu um pouquinho. As outras crianças da fila que até então achavam-se mais importantes por estarem com os pais, morreram de inveja. Queriam ser buscadas por um duende mágico também.
Com um sorriso enorme no rosto, o duende de cabelos loiros ajeitou a menininha em seus braços e deixou um beijo em seus cabelos. Jungkook estranhou o conforto da garotinha, parecendo incrivelmente feliz e à vontade enquanto abraçava o pescoço do mais velho com força, mas longe dele fazer qualquer teoria da conspiração envolvendo duendes. Estava entediado, mas não pra tanto.
A menina tirou foto com o Papai Noel ainda nos braços do duende, que agachou-se ao lado do trono macio e vermelho, cheio de decorações douradas, do velho barbudo. E, depois disso, foi levada para algum lugar por um dos staffs do shopping, dando um último tchauzinho animada.
Jungkook riu ao perceber que depois daquilo todas as outras crianças da fila demandaram que o tal duende as carregasse até o Papai Noel também. Deu uma certa dó e esperou que as costas do duende aguentassem o tranco, mas foi engraçado.
O momento mais feliz da noite de Jungkook foi, obviamente, quando o evento acabou, cinco minutos antes de encerrar o expediente do shopping. Todos continuaram dentro de seus papéis, acenando em despedida para as crianças e seus pais até que o andar esvaziasse. E, depois disso, foi um alívio sem igual.
As pessoas permitiram que o sorriso deixasse seus rostos, as bochechas já doloridas; os duendes que passaram o tempo todo em pé sentaram-se no chão, cansados, e o Papai Noel tirou a barba falsa e o enchimento das roupas, abanando-se de tanto calor. Talvez Jungkook realmente tivesse algum tipo de privilégio naquela situação. O músico levantou-se e apoiou o violão em sua cadeira, querendo passar no banheiro enquanto a gerência do shopping não terminava de finalizar o dia.
E, no meio do caminho, viu o tal duende de cabelos claros indo embora, ainda de fantasia. Será que era a primeira vez que o garoto participava daquele tipo de evento? Provavelmente, ou não teria feito toda aquela cena com a menininha, porque era óbvio que teria que repetir com todas as outras crianças mimadas depois.
— Ei — Jungkook chamou, querendo ajudar. O duende parou de caminhar e o olhou curioso de baixo a cima. — Esse shopping paga logo depois do trabalho, não vai embora agora ou você não vai receber.
— Ah, obrigado — sorriu gentil. Jungkook reparou que um dos dentes da frente era tortinho agora que estava mais perto, mas achou um charme. — Eu vim só por causa de uma menininha mesmo. Eu às vezes sou voluntário de um orfanato e ela falou uma vez que queria conhecer o Papai Noel, mas tinha medo de chegar perto sozinha. Aí ser um duende na verdade me ajudou a fazer isso, eu que preciso agradecer ao shopping pela oportunidade.
— Mas mesmo assim você trabalhou — Jungkook retrucou —, pegue o pagamento, mal não vai te fazer.
— Ah, eu quero ir pra casa dormir... — O homem coçou os cabelos loiros, sem graça. — Pode pegar o meu pagamento por mim se dói tanto deixar nas mãos do shopping — riu —, não me importo com o que você vai fazer com ele. Bem, obrigado pela dica e boa noite.
E, sem mais nem menos, foi embora, deixando um Jungkook completamente embasbacado para trás. O músico não sabia mais o que dizer, aquele cara realmente era muito estranho.
No final das contas, realmente avisou que receberia o pagamento por ele. Inventou alguma desculpa de que eram conhecidos e entregaria depois. O shopping aceitou, afinal, contratava as pessoas ali informalmente e não é como se pudesse pagar em algum outro momento.
Aquele dinheiro que não lhe pertencia pesava seu bolso de maneira desconfortável, e resmungou quando finalmente deixou o shopping, dando de cara com a madrugada fria. Descolou os esparadrapos que colocara na mão para tampar as tatuagens e vestiu a jaqueta de couro que mantivera escondida até então porque não era exatamente o tipo de traje que chamaria de natalino, e caminhou para o metrô. Estava doido em chegar logo no apartamento que dividia com os caras de sua banda e dormir.
Observou ao seu redor, procurando algo que valesse o dinheiro que não era dele, mas não achou. Provavelmente a melhor forma de lidar com ele seria doar para alguma instituição — talvez até mesmo um orfanato, já que o duende trabalhava em um —, mas não era como se fosse conseguir fazer àquela hora, quando não tinha nada aberto. Aparentemente teria que lidar com a culpa de carregar um dinheiro que não era seu por mais algumas horas e com a cena insistente do diálogo que tivera com o duende em loop em sua cabeça, assim como tocara "Noite Feliz".
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— Um orfanato que eu conheça...? — Namjoon repetiu a pergunta que lhe foi feita na manhã seguinte, enquanto tomava um café.
Se havia uma coisa que acolhia Jungkook eram os integrantes de sua banda. Além de compartilharem a vida e a profissão juntos, também não costumavam comemorar o Natal e tratavam o tal feriado como se fosse um dia qualquer, fazendo com que Jungkook se sentisse menos deslocado.
Claro que cada um tinha seus motivos para tal. Namjoon, o baixista, não comemorava porque achava hipócrita de sua parte participar de uma festividade cristã sendo ateu, por mais que o caráter do feriado agora fosse muito mais comercial. Yoongi, o baterista, foi expulso de casa logo cedo, então não gostava de feriados que eram comemoradas em família. E por fim Hoseok, o tecladista entre eles, simplesmente comemorava tudo o ano inteiro, o Natal não era realmente especial.
E Jungkook... Jungkook talvez só fosse um rebelde sem causa. Ao contrário de Yoongi, seus pais não lhe trataram realmente mal. Apesar de serem conservadores e encherem seu saco, nunca o impediram de cursar e viver de música. Não apoiavam as escolhas que fizera da sua vida, mas também não romperam laços com ele só por causa disso.
Talvez só não gostasse de Natal porque era fútil e irritante. As ceias em família sempre reuniam os parentes que amavam fazer perguntinhas chatas sobre como sustentava-se ou mandavam indiretas para seus pais, como se eles tivessem errado em sua criação para ele ter saído... Daquele jeito. Como se ser músico e possuir algumas tatuagens e piercings definisse algo sobre seu caráter. Ninguém ligava que ele sustentava-se sozinho desde antes de terminar o ensino médio, pagou a própria faculdade e pagava o aluguel do apartamento em que morava. Ele sempre seria o mal sucedido da família.
Natal era sem sentido, porque o feriado que supostamente significava união e paz na verdade só significava reunir-se com gente que não queria. Passou-se o tempo em que tinha a parte positiva — ganhar presente dos pais — e no final era só uma chatisse sem sentido.
— É, tô com um dinheiro extra que não é meu, pensei em doar — Jungkook respondeu, desenterrando a cueca de sua bunda e abrindo a geladeira para procurar algo para comer, o auge da delicadeza na tal manhã de Natal.
— Ensinar como faz pra ganhar dinheiro extra vindo do céu você não quer, né... — comentou o baixista rindo. Arrepiou-se todo ao observar Jungkook, quase pelado e deixando todas as tatuagens à mostra daquele jeito, abrir a geladeira com o clima já frio. Aparentemente sentia por Jungkook todo o frio que o moleque não sentia.
— Ah, foi bem aleatório... Um cara lá que trabalhou na casa do Papai Noel disse que não queria receber o pagamento dele, que eu podia ficar pra mim e foi embora. — Jungkook sentou ao lado de Namjoon à mesa, segurando um pedaço de pizza fria que tinha aparecido magicamente na geladeira, provavelmente obra de Hoseok. — Mas sem condições de eu ficar com esse dinheiro pra mim, peguei porque se não ficaria pro bolso do shopping.
— Que orgulho do meu menino lutando contra as garras podres do capitalismo. Tá certo, o dono do shopping já é rico o suficiente — Namjoon brincou, dando tapinhas nas costas de Jungkook. — Não conheço orfanatos, pra falar verdade, talvez o Yoongi saiba, manda umas mensagens pra ele.
— Não sabia que ele tinha morado em orfanato.
— Não morou... Tipo, uns dois dias no máximo. Quando ele foi expulso de casa conseguiu um lugar pra dormir em um, mas aí as moças quiseram chamar a assistência social para cuidar do caso dele e ele fugiu. Aí arranjou um emprego de menor aprendiz, morou em uns lugares estranhos e... O resto é história que a gente conhece, né.
— Entendi... — Jungkook levantou-se por um momento para buscar seu celular no quarto, sentando ao lado de Namjoon de novo. No final, gostava de estar na presença de alguém.
Mandou a mensagem para Yoongi e, incrivelmente, recebeu a resposta em apenas cinco minutos. Normalmente o baterista não estava acordado àquela hora da manhã, então provavelmente tinha arranjado um trabalho aleatório e entediante para fazê-lo ficar desperto e olhando o celular daquele jeito. A resposta era apenas o link de um endereço no Google Maps. Achava engraçada a objetividade do outro, e até mesmo o jeito que nem perguntou por que pediu tal endereço.
Como não tinha nada para fazer aquele dia, resolveu ir até o tal orfanato depois do almoço para que não tivesse que comer fora e pudesse economizar dinheiro. Passou a manhã inteira tocando sua amada guitarra, o amplificador ligado baixinho pros vizinhos não reclamarem. Definitivamente foi um alívio averiguar que ele ainda sabia tocar coisas além de "Noite Feliz".
Cuidou e limpou o instrumento com uma flanela própria antes de guardá-lo na case novamente. Talvez tudo que não cuidasse na própria vida ele compensasse com o instrumento musical. Nada mais justo, afinal, do ponto de vista prático guitarras eram caras e ele não era lá rico pra poder ser desleixado e do ponto de vista emocional, aquela guitarra era tudo para Jungkook. O primeiro instrumento que pôde chamar de seu — tocou e concluiu seus estudos com uma guitarra velha e surrada que tinha conseguido pegar emprestado com um cara da sala dele —, conquistado com o próprio dinheiro.
Acabou almoçando o resto da tal pizza lá, esperando que Hoseok nem lembrasse dela no final das contas. Com certa preguiça, vestiu-se com as roupas escuras de sempre e saiu de casa para ir pro orfanato doar o dinheiro do garoto desconhecido. Não que soubesse como aquilo funcionava, era só ir lá, bater e dar o dinheiro? Esperava que fosse, não sabia outra forma.
Pegou o metrô para o lugar com facilidade, afinal, ele era no centro da cidade e portanto não faltavam linhas que o levassem até lá. Percebeu que era uma má ideia ir ao centro no meio do feriado de Natal apenas quando percebeu o quão lotada a estação estava e quase desistiu.
Mas já tinha se arrumado e saiu de casa, então resignou-se a viajar espremido entre casais animados e famílias felizes. Sinceramente... Esperava muito que o lado de fora do metrô estivesse melhor do que o lado de dentro, era difícil até de respirar.
E até que estava melhor, mas mais provavelmente porque não dava para ser pior do que dentro do vagão. De qualquer forma, as calçadas largas da avenida principal de sua cidade estavam cheias, pessoas entrando e saindo de lojas e restaurantes, outras conversando em grupos que não pareciam ter propósito claro além de admirar a decoração de Natal caprichada, cheia de luzes coloridas ao redor dos postes e das árvores.
Seguiu o GPS por entre a multidão até chegar em algumas ruas mais calmas e menos movimentadas, mais perto da área residencial do bairro. Concluiu sua jornada na frente de uma casa contornada por um muro alto e amarelo.
Refletiu se estava no lugar certo, afinal, a rua toda estava silenciosa e também não existia nenhuma placa escrita "orfanato" ou algo do tipo. Bem, quando refletiu melhor não achou que seria uma placa muito legal também. Porém, logo um barulho que parecia um sinal se fez ouvir e, seguindo ele, gritos animados e infantis. Jungkook arrepiou-se ao ouvi-los, lembrando dos pestinhas do shopping na noite passada, mas pelo menos estava no lugar certo.
Tocou a campainha, sem saber mais o que fazer. Foi atendido após alguns minutos por um cara alto de sorriso quadrado que parecia ter dificuldade em controlar as crianças que estavam curiosas em saber que campainha fora aquela.
— Boa tarde, posso ajudar? — perguntou educadamente, com um sorriso amarelo por estar impedindo as crianças gritando "Tio TaeTae, deixa eu ver!" de saírem.
— Boa tarde, eu gostaria de fazer uma doação... — Jungkook respondeu diretamente. O homem não ficou tão surpreso, em geral eles recebiam bastante coisa em épocas festivas, principalmente Natal. — Como funciona, eu te entrego o dinheiro?
— Ah, depende... Aqui não funciona assim, só um segundo... — Ele fechou a porta por um momento porque não conseguiria segurar as crianças e anotar em um papel ao mesmo tempo, mas logo abriu ela de novo e estendeu a anotação que fez a Jungkook. — Essa é a conta do banco do orfanato, recebemos depósitos e transferências por lá.
— Entendi... Obrigado — Jungkook aceitou o papel, percebendo que algumas crianças que conseguiam apinhar-se na porta olhavam com curiosidade a tatuagem em sua mão.
— Nada, muito obrigado pela doação e feliz Natal para você! — O homem abriu seu sorriso quadrado e Jungkook aqueceu-se com aquele gesto. As crianças, só de ouvirem por trás da porta, seguiram suas palavras e também desejaram um feliz Natal em coro, mesmo que não desse pra ver a maioria delas.
— Feliz Natal! — Jungkook respondeu alto para que elas pudessem ouvir também, estranhamente cativado com a educação delas. Talvez ele fosse precipitado demais em ter as julgado antes.
Como já estava lá na rua, Jungkook caminhou tranquilamente até o banco para fazer o tal depósito, querendo resolver aquela questão de uma vez e colocando um pouco do dinheiro que recebeu pelo seu próprio trabalho também. Felizmente, ao contrário dos restaurantes, a agência estava relativamente vazia e conseguiu resolver tudo em poucos minutos.
Mas logo depois arrependeu-se de ter resolvido tudo tão rápido, porque não tinha mais nada para fazer naquele momento e queria ocupar-se com mais alguma coisa pra fazer valer aquele tempo que gastou arrumando-se e pegando o metrô lotado pra chegar até lá. Era meio estúpido, mas faria com que ele sentisse que não perdeu a viagem, afinal, poderia ter feito aquele depósito do lado de sua casa até de pijama se quisesse.
Então começou a caminhar pelas ruas, sem objetivo claro além de evitar aglomerações grandes demais que lhe deixavam desconfortável. Vagou por alguns minutos entre as ruas pequenas até um borrão mais claro atrair curiosamente sua atenção, mesmo que em um primeiro momento não soubesse o porquê.
Virou-se para encarar melhor o que chamou sua atenção, dando de cara com os cabelos loiros do tal duende do Papai Noel. Não que ele estivesse vestido de duende naquele momento, claro. Curioso com a coincidência e sem mais nada para fazer, seguiu o garoto rapidamente antes que o perdesse na multidão.
Acabou seguindo-o por bons metros de calçada. Não queria parecer um stalker, mas não é como se estivesse perto o bastante para chamá-lo para conversar. Não que soubesse por que queria chamá-lo também. Talvez porque o diálogo entre os dois ainda rodeasse seus pensamentos e o intrigava, talvez para contar que o dinheiro foi doado e aliviar sua consciência de ter recebido o pagamento pelo trabalho do outro, afinal, poderia nunca mais dar de cara com ele na vida.
Continuou seguindo quando ele afastou-se das áreas mais cheias do bairro, caminhando em direção à periferia. Jungkook achou curioso observá-lo sem a fantasia de duende, os cabelos loiros e brilhosos soltos, a roupa verde e vermelha brega substituída por um casaco preto de pelúcia que parecia ser quente e calças da mesma cor.
Diminuiu sua velocidade quando pareceu que o homem tinha chegado em seu destino e ficou sem saber o que fazer naquele instante. Arriscou aproximar-se para chamá-lo, sem querer parecer um stalker estranho. Foi uma situação bizarra, porque o não-mais-duende aproximou-se da porta de uma casa e Jungkook correu pra abordá-lo antes que alguém atendesse.
— Oi, coincidência, né? — Jungkook bufou com a mini corrida, o loiro tomou um susto ao vê-lo. — Não te encontrar aqui, porque eu acabei te seguindo, mas há umas três ruas atrás foi coincidência mesmo te encontrar.
— Oi... — o loiro respondeu aturdido e o músico quis morrer, era realmente péssimo em apresentações. — Por que você me seguiu?
— Ah... — Jungkook corou ao perceber que realmente aquilo tinha soado muito estranho. — Sei lá... Acho que eu gostaria de te contar que eu doei o dinheiro do seu pagamento de ontem... Então acho que eu te segui pra prestar contas?
O não-duende gargalhou, de forma leve e límpida, tanto que precisou tampar o rosto com as mãos pequenas para tentar controlar a risada, decepcionando o músico que buscava ver aquele dente torto novamente. Jungkook era tão estranho que chegava a ser engraçado.
— Mas eu te falei que você poderia fazer o que quisesse com o dinheiro!
— Como se fosse fácil assim! — Jungkook resmungou. — Você por acaso ficaria tranquilo em receber dinheiro que não é seu e ir comprar um x-tudão?
— Por que um x-tudão? — o loiro continuou rindo, as bochechas vermelhas de frio aquecendo-se.
— Desculpa, foi o primeiro exemplo que consegui pensar... — Jungkook respondeu, um pouco envergonhado. — Eu não falo muito bem em situações de pressão...
— Ai, ai... — Suspirou, tentando controlar o riso. — Bem... Obrigado, fico feliz que você tenha doado o dinheiro, de verdade. Agradeço a prestação de contas também.
— Ah... Não foi nada. — O músico queria se enterrar no chão de tanta vergonha, não sabia para onde ir agora.
Ficaram os dois alguns segundos parados olhando um para o outro, sem saber o que fazer, um tanto sem graça. Jungkook imerso em pensamentos de que, de fato, não deveria ter perseguido o garoto impulsivamente e o não-duende achando curiosas demais as atitudes bobas do cara que mais parecia um badboy, cheio de piercings no rosto e tatuagens na mão que agora não estavam escondidas.
Foram salvos pelo gongo quando quem parecia o dono da casa finalmente atendeu a porta, parecendo um pouco esbaforido. O cabelo castanho um pouco bagunçado, olheiras cansadas, mas a postura animada e altiva. Jungkook encarou o desconhecido demoradamente, porque era tão bonito que ficou refletindo se era um modelo.
— Finalmente você chegou, Jimin! — ele falou, com um pouco de revolta em sua voz. Jimin... Jungkook aproveitou o nome até então desconhecido do não-mais-duende nos próprios pensamentos. — Bom que você trouxe um amigo pra ajudar, as coisas aqui estão uma correria...
— Jin, ele nã- — Jimin tentou explicar que Jungkook estar lá era uma coincidência, mas foi empurrado junto com o outro para dentro da casa antes que pudesse completar.
— Vocês podem começar a organizar as marmitas nas caixas pra gente conseguir transportar. — Apontou para uma pilha de papelão antes de entrar na casa apressadamente, onde era possível ver mais uma bela quantidade de pessoas correndo de lá para cá.
Jimin virou-se para olhar Jungkook, morto de vergonha por ter enfiado o garoto naquela situação sem querer. Não que o homem do x-tudão parecesse muito chateado com os acontecimentos, observando curiosamente os arredores em busca de pistas que explicassem o que estava acontecendo.
— Desculpa... — Jimin pediu, tímido. — Vou caçar o Jin para te tirar daqui.
— Ah, relaxa, eu não tinha nada pra fazer hoje mesmo. — Jungkook deu de ombros. E era verdade. Por mais que não estivesse muito animado para fazer nada em específico, também não estava desanimado a ponto de não querer fazer nada, até porque seu maior objetivo era fazer o ato de sair de casa valer à pena.
Se voltasse pra casa provavelmente ficaria tocando sua guitarra, seria xingado pelos vizinhos por estar fazendo barulho em pleno feriado e depois restaria apenas ficar largado de cueca em sua cama refletindo com o que deveria ocupar-se até o tempo passar de tal forma que não adiantava mais fazer qualquer coisa e simplesmente ir dormir. Uma bela forma de passar o Natal.
— Em pleno Natal? — Jimin perguntou desconfiado. — Não vai comemorar com ninguém?
— Não — respondeu Jungkook simplesmente. — E aparentemente vocês também não, então não sei por que estou sendo julgado por isso. Só me diz o que eu tenho que fazer.
— Você é estranho...
— Posso até ser — o músico concordou. — Mas acho que nessa situação eu estou apenas agindo como o desocupado que eu sou.
O homem-não-duende pareceu de aceitar de alguma forma tudo aquilo, talvez porque tivesse percebido que não adiantava muito tentar entender ou argumentar. Por fim, foi fazer o que o levou até ali: trabalhar.
— Bem, você caiu de paraquedas no meio de uma espécie de evento beneficente... — explicou enquanto ia arrumar as caixas de papelão para que conseguisse colocar coisas dentro delas. Jungkook seguiu como uma sombra, afinal, não conhecia mais ninguém ali. — A gente arrecadou dinheiro para fazer marmita para alguns moradores de rua e a gente vai distribuir hoje.
— Você é todo cheio das caridades... — Jungkook comentou enquanto ajudava a montar as caixas de papelão no quintal estranhamente grande da casa.
— Você que fica fazendo doações e prestando conta por aí...
— Fiz doações com seu dinheiro, não tem muito mérito nisso, né — Jungkook acabou rindo.
— Você podia ter comprado um x-tudão... — contra-argumentou Jimin. — Tem lá seu mérito apesar de você não querer assumir ele.
— Posso ter mérito, mas ele é muito menor do que o seu e apenas acrescenta ao começo da discussão de que você é todo cheio das caridades...
— Nossa! — Jimin interrompeu a discussão ao perceber um fato aleatório. — Eu não sei seu nome!
— Verdade, né? — Jungkook riu. — Mas sei que o seu é Jimin.
— Como você sabe?
— O tal de Jin te chamou assim... — gargalhou mais ainda com a completa confusão e até mesmo medo na expressão do outro. — Sei que te segui até aqui e tal, mas eu realmente não sou stalker.
— Ah, faz sentido... E o seu?
— Será que eu deveria falar? Na ficção personagens misteriosos não revelam o próprio nome... — Jungkook fingiu uma cara de pensativo. — Nessa noite tão especial acho que estou me sentindo meio misterioso mesmo...
— Se você não disser seu nome eu vou te chamar de "garoto do x-tudão", aí é escolha sua — Jimin devolveu, deixando Jungkook boquiaberto com a implicância do garoto que parecia estar dentro do esteriótipo de gentil e inocente até então.
— Pode me chamar de Jungkook então... Mas fica o mistério se esse é meu nome mesmo...
— Fala menos, garoto do x-tudão, você é muito lerdo montando caixa, se concentra!
— Não lembro de ter te dado essa intimidade — Jungkook tentou falar sério, fechando a cara. Jimin só riu dele, sem nenhum respeito.
— Não lembro de você ter me dado seu nome.
— Ai, meu nome é Jungkook mesmo! — bufou frustrado, mas percebeu que a linha de produção de caixas do Jimin realmente estava bem mais avançada do que a sua. — Nem era pra eu estar aqui, dá um desconto, o que custa?
— Estou só implicando, me desculpa — Jimin voltou a rir baixinho, ainda montando caixas como se fosse profissional naquilo. — Obrigado por estar ajudando apesar de tudo, Jungkook.
O músico quis enterrar-se no chão com o jeito que gostou de ouvir seu nome ser pronunciado na voz doce do outro, ainda mais depois do tom de provocação que recebera ao ser chamado de "x-tudão". Resolveu focar mais em sua tarefa para não pensar demais naquelas coisas que faziam com que se sentisse idiota, tipo o encantamento pelo dente torto.
Quando todas as caixas estavam montadas, foram até o interior da casa descobrir onde estavam as marmitas já prontas. Apesar da noite de Natal estar congelando, a cozinha estava quente, lotada de pessoas e de panelas enormes exalando um cheiro gostoso. Jungkook ficou admirado, não só com o jeito que todo mundo cumprimentava Jimin — provando, de vez, que ele era todo cheio das caridades —, mas em como aquelas pessoas conseguiam fazer uma comida de aparência tão gostosa em tanta quantidade. Toda vez que algum dos caras de sua banda tentava fazer comida pra todo mundo ficava uma gororoba... Tem que ter habilidade para cozinhar para muitas pessoas.
Para evitar ao máximo que a comida esfriasse, Jimin e Jungkook só carregavam de cada vez a quantidade necessária para encher uma caixa, fechando-a com cuidado antes de pegar mais uma leva. Foi assim até encherem as dez caixas disponíveis.
— É muita marmita... — Jungkook falou impressionado quando fez uma conta rápida de padeiro da quantidade de porções em cada caixa ao fechar a última que faltava.
— Pois é, é muita gente — Jimin concordou, espreguiçando-se para tentar alongar as costas ainda doloridas de ter carregado um tanto de criança na noite anterior. — A gente vai passar debaixo de dois viadutos e, se sobrar, provavelmente vai para um abrigo que ajudamos durante o ano... Pelo que eles disseram, esses últimos meses eles receberam uma quantidade boa de doações, então não estão precisando tanto de reforços.
— E como vocês vão levar isso?
— Em uma caminhonete.
— Teria sido esperto se a gente tivesse colocado as caixas lá de uma vez, não? — Jungkook sugeriu com sinceridade.
— É verdade... Acho que eu sou burro — Jimin gargalhou. — Sempre carreguei as caixas cheias lá pra dentro.
— Tudo bem, a gente faz isso de novo, fica a dica para a próxima — Jungkook riu. — Onde tá a caminhonete pra gente ir colocando as coisas?
— Tá na garagem, vou pegar a chave com o Jin.
— É uma boa, posso manobrar pra mais perto também.
Jungkook até o momento tinha achado uma insistência boba de seu pai ensinar ele a dirigir, jurava que o homem tinha feito aquilo para poder completar algum ritual macho clássico de pai e filho, mas repensou seus julgamentos ao manobrar a caminhonete com tranquilidade até perto das caixas. Bom que Jimin estava lhe ajudando porque tinha aprendido a dirigir um corsinha e não tinha a mínima noção do tamanho da caçamba, mas deu tudo certo.
Depois disso passaram um bom tempo colocando as caixas com dificuldade nas caçambas — eram pesadas! — antes de receber reforços do pessoal que estava cozinhando antes. Com o trabalho pronto, ficaram esperando o resto da galera da cozinha terminar de arrumar e lavar as coisas lá dentro.
Seguindo o fluxo, Jungkook encontrou-se sentado no banco do meio de um carro qualquer, espremido entre Jimin e outra mulher que não conhecia, mais avulso do que peça de brechó. As pessoas conversavam com naturalidade, como se fizesse sentido ele estar ali no meio, e riam animadas de besteiras da vida e seus planos para as férias. O músico não sabia se deveria sentir-se um intruso ou divertia-se com as conversas, o clima confortável lembrando-lhe da sua banda.
— Ai, x-tudão, você é grande demais, se segura aí ou vai me sufocar — Jimin reclamou quando o carro fez uma curva mais brusca e, sem estar segurando-se em nenhum lugar, Jungkook caiu em cima de Jimin. A mulher do outro lado, ouvindo o lamento do loiro, pareceu aliviada com o fato da curva ter sido para aquele lado.
— Você está sendo fresco, não sou pesado assim — retrucou enquanto segurava os bancos da frente para poder equilibrar-se de volta.
Não demorou muito para chegarem no primeiro viaduto. Jin dividiu organizadamente o grupo de pessoas para distribuir comida, deixando, para alívio de Jungkook, ele junto de Jimin. Pegaram algumas marmitas na caminhonete e começaram a andar para onde foi apontado.
Jimin parecia acostumado a fazer aquilo, pois andava com confiança debaixo do viaduto escuro e que, sendo sincero, Jungkook não gostaria de atravessar à pé em alguma outra situação. Apenas deixou que o menor liderasse a empreitada, já que não sabia o que fazer.
— Boa noite — Jimin sorriu para uma família encolhida contra um dos pilares de concreto que sustentava o viaduto. — Aceitam um jantar?
Entregou com cuidado as marmitas, desejando um Feliz Natal. Jungkook sempre esquecia-se de que era Natal. Tentou repetir o que Jimin fez para um homem sentado sozinho e ficou muito feliz quando deu certo e recebeu um Feliz Natal de volta. Nunca pensou que seria tão bom ouvir aquele cumprimento do feriado ao qual nem dava tanta importância.
Foram e voltaram até a caminhonete várias vezes até conseguir distribuir a todas pessoas em seu setor. No final, sentaram ao lado de um homem enquanto esperavam o resto do grupo terminar de distribuir a comida. O morador de rua prescrutou os dois por alguns segundos entre as colheradas que dava em sua marmita, como se avaliasse algo. Parecendo satisfeito, achou os dois merecedores de suas histórias e escolheu uma temática.
— Era uma noite fria que nem essa, sabe? — começou a falar, atraindo a atenção dos outros dois. — A cidade estava cheia de luzes coloridas também. Parece até que é a mesma coisa, mas essa noite não tem a magia da presença dela...
Jimin e Jungkook ouviram curiosos o que o homem barbudo contava. Era similar a um conto de Natal e aquilo dava uma certa magia e encantamento proveniente de fábulas que aqueciam corações, de uma forma que era um mistério se aquela história era verdade ou não. Talvez aquilo que fizesse o conto falado tão instigante de se ouvir. Talvez independente daquilo tudo ter acontecido ou não, a veracidade era criada nos sentimentos que carregava, sejam eles provenientes de memórias ou não.
— E quando nos encontramos novamente naquela praça... — O olhar do homem foi atraído para a movimentação atrás dos dois jovens que o escutavam tão avidamente. — Fim.
— Calma, o que aconteceu quando vocês se encontraram de novo? — Jungkook perguntou, sedento pelo final daquela história, quase revoltado sem entender a interrupção.
— Seus amigos estão esperando vocês — o homem riu um pouco e apontou o grupo deles reunido perto dos carros.
— Mas e o fim da história? — Jungkook insistiu.
— Já dei um fim pra ela por enquanto, você não ouviu? — o sem-teto disse, rindo. — Falei "Fim". Se eu falei fim é porque acabou.
— Mas não acabou de verdade!
— E alguma história acaba de verdade? A vida é feita de continuações nas quais forçamos finais que não existem, porque o universo continua existindo e se ele existe, carrega pedaços do que já passou por ele — retrucou o homem, deixando os outros dois jovens quietos.
— Quero ouvir a continuação um dia... — Jimin falou, dando um sorriso fraquinho correspondido pelo homem.
— Talvez você ouça. A vida é feita de encontros e de praças, que nem a dela. — Deu de ombros e ergueu as sobrancelhas. — Agora acho que é hora de vocês irem ouvir outras histórias. Agradeça os outros pela comida também.
— Tchau, senhor — Jimin despediu-se com um certo respeito. — E Feliz Natal.
— Feliz Natal — repetiu Jungkook, o coração ainda martelando de curiosidade, sendo acalmado aos poucos pelo jeito que seu peito era preenchido pelo deslumbramento que aquele pequeno recorte tão inesperado e significativo em seu dia causou.
No segundo viaduto ouviram mais histórias, menos saudosas e mais cruéis. Menos fábulas e mais realidades, mas não deixavam de ser pedaços de consciência que estavam sendo registrados no universo. Jimin e Jungkook torceram, no fundo, para que a continuação delas fosse melhor do que já tinha passado, pois tudo que podiam oferecer além daquilo no momento era a comida e sua escuta paciente.
Jin dispensou todos depois daquilo porque iria entregar as marmitas que sobraram no abrigo e depois iria para casa e o grupo dispersou-se. Como Jungkook não sabia muito bem onde estava, seguiu Jimin enquanto o menor pegava carona em um outro carro para um lugar que não sabia onde era também, fingindo que estava tudo certo.
Dessa vez quem teve a má sorte de ficar sentado no banco do meio foi o não-duende. A viagem daquela vez foi mais silenciosa do que a de ida, os voluntários em um misto de cansaço e reflexão da realidade dura em que viviam, mas com um certo contentamento de ter amaciado minimamente ela. Mesmo sendo um completo desconhecido ali no meio, Jungkook novamente não sentiu-se desconfortável. Talvez gostasse daquele grupo que mal conhecia.
— X-tudão... — Jimin inclinou-se até o ouvido de Jungkook para sussurrar, arrepiando o músico com a proximidade. — Eu te levo até o centro, fica tranquilo.
Jungkook corou ao perceber que tinha sido lido tão facilmente. Mas não detestou porque se Jimin não tivesse percebido que ele estava completamente perdido, talvez nem chegasse em casa. Imagina Namjoon, Yoongi e Hoseok procurando ele em plena noite de Natal? Pareceria coisa de filme.
Jimin pediu para o motorista encostar em uma avenida uns quinze minutos depois. Jungkook reconhecia ela, mas ainda não conseguia localizar-se. O loiro o empurrou pra fora do carro, já que estava no meio do caminho — e, de acordo com Jimin, sendo um lerdo! —, e saiu logo depois, despedindo-se de quem continuou no carro.
— Caralho, já são 22:48... — Jungkook comentou espantado ao ver as horas brilhando em um relógio digital pendurado em um poste.
— Passa rápido, né? — Jimin suspirou. — É muita coisa e muita gente ao mesmo tempo... Foi sua primeira vez fazendo algo do tipo?
— Foi — o músico riu —, queria ter sido caridoso conscientemente, mas acho que mesmo tendo sido arrastado pelo fluxo foi maneiro.
— Desculpa por isso. — Jimin coçou a cabeça, sem graça, antes de começar a andar para levar Jungkook até um ponto que ele conhecesse.
— Tá se desculpando por quê? Acho que eu me expressei mal. Queria dizer que eu pareceria uma pessoa muito mais maneira se eu tivesse sido caridoso de propósito, sabe? Não tem o mesmo impacto falar "fui super legal, mas só porque eu sou desocupado e segui o fluxo".
— Acho que sim, se você fizer caridade por ego, né, pra contar pros outros — Jimin pontuou. — Você ter ido com a gente simplesmente por ir soa muito melhor aos meus ouvidos. Mas aí eu acho que é preferência minha.
— Hm... Obrigado então, eu acho... — Jungkook respondeu um pouco envergonhado, ficando em silêncio logo depois.
Continuaram caminhando pela calçada cheia da avenida, lado a lado, às vezes sendo ofuscados pelos faróis dos carros. Aquele tipo de feriado era mesmo uma bagunça. Apesar do ambiente cheio, os dois pareciam conscientes até demais da presença um do outro, como se apenas esta chamassem-lhe atenção, ficando nervosos.
— Desculpa ter te atingido com meu raio moralizador — Jimin quebrou o gelo com uma risadinha baixa após observar o semblante reflexivo de Jungkook e deu um tapinha leve nas costas dele.
— Soa muito masoquista dizer que eu gostei? — Jungkook riu após despertar-se do mergulho na própria mente. — Me deu algo pra pensar só. Faz sentido o que você falou, mas nunca pensei nisso até porque eu nunca tinha participado de outra ação solidária.
Jimin parou de andar quando passaram do lado de um fast-food que estava relativamente vazio se comparado à quantidade de pessoas na rua. Talvez restaurantes mais chiques fossem os mais visados quando o assunto era jantar de Natal, ou talvez só tivessem dado sorte mesmo. O loiro apontou sugestivamente para o local e Jungkook concordou com a proposta silenciosa.
Pediram suas respectivas comidas para viagem e Jungkook deixou-se ser levado a algum local que Jimin parecia determinado a chegar. Logo encontrava-se sentado em um banco de concreto em uma praça menos movimentada por estar mais longe das ruas principais do bairro. Talvez Jimin estivesse levando à sério demais seu combinado com o morador de rua, mas poderia ser apenas coincidência também.
— Só não é um x-tudão — Jimin comentou despretensiosamente enquanto assistia Jungkook morder o hamburguer que pediu.
— Por isso que podrões são melhores do que fast-food — respondeu. — Não entendo esses bairros de rico sem nenhum podrão... O urbanismo municipal não sabe reconhecer o valor de um belo estabelecimento com as paredes caindo.
Jimin riu e os dois ficaram em silêncio novamente. Não sabiam bem o que fazer, porque ao mesmo tempo que os últimos acontecimentos e conversas foram naturais, ainda eram desconhecidos. Ou já poderiam considerar-se conhecidos? Quando terminou de comer sua batata frita, o loiro encarou Jungkook novamente, o olhar repousando no que chamou sua curiosidade o dia inteiro, mas não teve chances de falar.
— Meio melancólica, né? — Jimin apontou a tatuagem na mão de Jungkook. O músico puxou a manga de sua jaqueta para cima a fim deixá-la mais visível.
— Pode ser — Jungkook concordou —, até porque é o olho do Pierrô, o palhaço triste. Mas o personagem dele também é considerado lunático por confiar nas pessoas cegamente mesmo sendo feito de... Palhaço. Desculpa a piada ruim, juro que foi sem querer. O Pierrô sempre é feito de bobo e é alvo de prendas, mas mesmo assim acredita. Quando eu descobri o resto da história dele, ela me fez pensar um pouco, então acabei tatuando.
— Hm... — Jimin segurou a mão de Jungkook entre as suas por impulso, contornando a lágrima preta do olho tatuado ali com suavidade, refletindo ele mesmo sobre a história do palhaço considerado triste, mas crente na boa índole das pessoas. — Então você tatua coisas que te fazem pensar?
— Gostou? — devolveu travesso. — Vou tatuar seu raio moralizador também.
— Jungkook! — o loiro reclamou, mas acabou caindo no riso, sem aguentar. — Por que você é assim?
— Ah, esperado que uma pessoa com uma tatuagem de palhaço seja uma palhaça. Ou eu peguei errado o espírito da coisa?
— Você tem mais tatuagens? — Jimin perguntou curioso e Jungkook concordou com sua cabeça. O músico tirou sua jaqueta, refletindo se aguentaria o frio ao céu aberto, mas o olhar de Jimin em cima de sua pele lhe deu um calor diferente.
— Isso é aquele negócio de matemática, né? — Jimin passou os dedos em uma tatuagem no antebraço de Jungkook. Se parasse para pensar um pouco, nunca que o loiro tocaria tanto alguém que mal conhecia, mas apenas estava seguindo o fluxo dos acontecimentos sem refletir demais.
— Sim, a sequência de Fibonacci — Jungkook sentiu cócegas enquanto os dedos de Jimin contornavam as linhas que pareciam formar a concha de um caracol. — Na música ela representa alguns acordes que soam bem aos ouvidos. Nunca gostei muito de matemática quando era moleque, mas música e a matemática têm tanto em comum que não consegui fugir. Obrigado por tudo, Pato Donald no país da matemágica.
— Ah, verdade... Você estava tocando violão aquela vez no shopping. Então você gosta de música...
— Eu sou músico — Jungkook explicou. — De verdade, formado em música, ganho dinheiro para me sustentar com música. Mas não costumam acreditar que ser músico é uma profissão em vez de um hobbie, a não ser que você seja famoso, claro...
— Confesso que não sei muito sobre música, mas acho bonito... — Jimin murmurou, os olhos passeando pelo resto do braço de Jungkook, coberto por uma arte de um metrônomo e uma ampulheta. O loiro tinha quase certeza que aquele instrumento tinha alguma coisa a ver com música também, mas não sabia muito.
— Me acha bonito? Obrigado, também me acho — Jungkook provocou, fazendo com que Jimin revirasse os olhos impaciente por impulso, mas depois afastasse suas mãos ao perceber que estava sendo meio íntimo demais.
— Metido — reclamou, porque se respondesse a pergunta com sinceridade ficaria com vergonha. Jungkook era muito bonito.
— Desculpa — riu.
E o silêncio tomou o ambiente novamente. Ao contrário de antes, não comiam nada, e talvez aquilo deixasse a situação ainda mais estranha. Não tinham mais nada a tratar por ali, mas nenhum dos dois queria ir embora também.
— Então... Você curte Natal, né? — Jungkook tentou quebrar aquele desconforto.
— Sim, você não?
— Sei lá, sempre achei meio vazio — murmurou de volta, sentindo-se um pouco envergonhado apesar de não saber o porquê. — Se eu faço alguma coisa é ir a uma ceia chata na casa dos meus pais e não sei se isso é meu passatempo favorito.
Jimin olhou Jungkook demoradamente, parecendo pensativo, antes de voltar a olhar para frente e largar o peso de seu corpo no encosto do banco de concreto, suspirando. Olhou o céu, com poucas estrelas visíveis porque tudo ao redor deles estava muito iluminado.
— Você não acha uma época comercial demais também? — Jungkook perguntou, curioso em saber qual era o olhar de Jimin sobre aquilo.
— Ah, é bem comercial, né — Jimin não podia deixar de concordar. — Acho que pessoalmente eu não ligo tanto pro Natal, mas gosto que ele seja um motivo para celebrar.
— Como assim?
— Querendo ou não é uma época que as pessoas se unem para celebrar algo, é um dia diferente. Eu só notei quando eu comecei a ser voluntário do orfanato, as crianças esperam muito o Natal chegar... Às vezes, na vida, a gente precisa de algum motivo pra celebrar. Se não é a realidade ou acontecimentos corriqueiros, uma data especial ajuda, independentemente se ela é comercial ou o real significado dela. É uma coisa diferente, elas ficam animadas e aguardam ansiosamente. É um dia bom.
— Não tinha pensado assim... — Jungkook murmurou, o olhar perdendo-se no céu também. — Talvez eu precise ressignificar as coisas. Acho que eu até tenho motivos para comemorar, mas não o faço.
— É subjetivo, você não é obrigado a comemorar nada, né — Jimin riu baixinho. — Às vezes não é o seu jeito, e faz parte.
— Nah, acho que eu gostaria de poder comemorar mais coisas do que eu faço atualmente. Até o Natal mesmo.
— Sério? — Jimin perguntou curioso. — O que te fez querer comemorar ele?
— Quero comemorar o Natal como o dia que eu colecionei novos pedaços de consciência que eu não sabia existirem. Acho que o dia hoje cultivou um pouco mais o Pierrô dentro de mim, eu tenho a impressão de que nos últimos anos eu entrei em um fluxo de descrença e deixei essa inocência boba morrer um pouco.
— É bom ouvir os outros, né? — Jimin sorriu gentilmente. — O mundo parece ficar maior. Ou o mundo que costumamos considerar nosso diminui... Não sei, acho que é tudo questão de perspectiva.
— Você participa de caridade o ano todo? — perguntou e Jimin acenou com a cabeça. — Não é doloroso demais? Tipo... Ver isso tudo o tempo todo.
— Acho que sim, mas não é como se fosse deixar de acontecer também... — o loiro refletiu. — Não é porque ignoramos moradores de rua no nosso dia a dia que eles deixam de existir ou de sofrer. Gosto de reconhecer a existência dessa dor, mesmo que às vezes não possa fazer muito sobre. Acho que é tipo aquela história da árvore...
— Que história da árvore?
— Se uma árvore cai na floresta e ninguém está perto para ouvir, será que ela faz um som?
— Faz, né?
— Na verdade não faz porque cientificamente o som só existe quando chega ao nosso cérebro através do ouvido captando as vibrações no ar provocadas pela queda da árvore.
— Você é biólogo, é?
— Sou redator — Jimin riu, talvez feliz em compartilhar um pequeno traço de si. — Mas essa questão da árvore é mais filosófica do que biológica ou física mesmo... Mas no final a questão é, se algo não é percebido ele pode considerar sua própria existência?
— Preciso de exemplos, me perdi um pouco — Jungkook falou envergonhado.
— Imagine que você exista, que nem faz hoje. Mas ninguém conversa com você, quase como se fosse invisível. O que você acharia da própria existência?
— Não sei... Um pouco vazia...?
— Eu sou do time de que existir é ser percebido. Então se eu percebo e ouço a dor dos outros, eu garanto pra eles que eles existem. Não sei... As crianças acho que passam menos por isso, mas sempre que eu converso com moradores de rua eu tenho essa impressão...
— Acho que realmente são pessoas mais invisibilizadas. Porque a maioria das pessoas acha doloroso reconhecer esse tipo de existência... — Jungkook começou a pensar mais, tentando colocar sua própria opinião nas informações.
— Te atingi com o raio moralizador de novo, né? — Jimin virou-se para olhar o músico e riu ao ver o semblante contemplativo e concentrado do outro.
— Natal é data de celebrar o raio moralizador agora também — brincou, despertando-se momentaneamente da própria mente. — Eu realmente deveria tatuar, você me faz pensar muito.
— Desculpa... A gente nem se conhece e eu joguei um monte de coisa na sua cabeça. — Jimin voltou a ficar sem graça.
— Para de pedir desculpas, acabei de dizer que quero tatuar o raio moralizador em mim. Se isso não representa o quanto eu gostei, não sei mais o que dizer! — Corou um pouco ao ter confessado o tanto que gostara daquele dia.
— Você é estranho, x-tudão — Jimin gargalhou, daquele jeito límpido dele e deixando à mostra o tal do dentinho torto que tinha cativado Jungkook desde a primeira vez que se viram. — Onde vai tatuar o raio moralizador?
— Não sei, onde você acha mais impactante? — Entrou na brincadeira, agitando-se por dentro quando os dedos de Jimin voltaram a passear pela pele de seu braço.
— Que tal aqui? Que nem aquelas tatuagens de "Fulaninho, amor eterno". — Passeou o dedo por um espaço que restava imaculado no antebraço de Jungkook.
— "Raio Moralizador, amor eterno"?
— Palhaço!
— Para você é Pierrô, mais respeito, por favor — Jungkook assumiu um tom metido, mas não aguentou por muito tempo e os dois caíram na risada de novo.
— Ai, x-tudão, por que você é assim?
— E você não gosta? — Jungkook levantou uma das sobrancelhas, meio provocador, meio ansioso pela resposta da própria pergunta que fez.
Jimin encarou os olhos do outro por um momento, subitamente sério. Vasculhou tudo que as íris gentis cor de chocolate refletiam, emoldurados pelos cabelos da mesma cor e o tal piercing na sobrancelha que erguia. Acabou sorrindo fraquinho.
— Gosto... — confessou, sem saber muito bem por que estava o fazendo para um completo desconhecido.
— Já que a gente tá em clima de Natal e tudo mais bem que podia ter um pé de visco por aqui, né.
— Por quê? — Jimin perguntou mesmo sabendo a resposta, porque tinha muita vontade de ouvi-la em alto e bom som.
— Porque agora você me encheu de vontade de te beijar... — Jungkook comentou desprentensiosamente. — Um clichê de Natal não faria tão mal assim, não acha? Você já ressignificou esse dia para mim, que nem nos contos de desenhos animados, e me fez pensar. Me deixa tatuar esse pensamento em meus lábios pelo menos?
— Você vai tatuar "Raio Moralizador, amor eterno" na sua boca então? — Jimin debochou, as bochechas coradas e o coração acelerado. O sorriso em seu rosto só abriu mais ainda ao ouvir a gargalhada gostosa do músico com a brincadeira.
— E o Pierrô é feito de palhaço de novo... — Jungkook riu, aceitando sua derrota. Jimin xingou-se interiormente ao perceber que aquilo pareceu uma recusa ao beijo. Droga, e o homem cativante em sua frente tinha sido tão romântico...
— Aquilo ali é um visco? — Jimin apontou para uma árvore a alguns metros deles. Jungkook acompanhou o olhar para onde ele apontava.
— Acho que é só uma árvore normal mesmo... — Jungkook respondeu confuso.
— É um visco, tenho certeza que é! — Jimin emendou, apressado, e levantou-se. — Vamos lá olhar de perto e ver se é mesmo.
Ainda perdido com o que estava acontecendo, Jungkook pegou sua jaqueta e seguiu Jimin até a tal árvore. Árvore que definitivamente não tinha um visco.
— Acho que não... — repetiu Jungkook, observando mais de perto.
— Claro que é, x-tudão! Tá se fazendo de maluco? — Jimin gargalhou alto com o semblante perplexo do outro. Jungkook o encarou, tentando entender o que Jimin queria dizer e o redator aceitou que deveria ser mais óbvio. — Já que estamos debaixo de um visco a gente tem que se beijar, né...
— Meu Deus! — Jungkook finalmente entendeu. — Que visco lindo! Esse visco é tão... Visco. Muito viscante esse visco, não sei como não percebi antes.
Jimin riu baixinho antes de aproximar seu corpo do de Jungkook. Subiu as mãos pelos braços ainda descobertos e tatuados, refletindo se ele não estava sentindo frio. Mas tudo que Jungkook sentia era calor, o coração martelando forte em seu peito com os toques do outro.
Levou as mãos até a nuca do outro, sentindo os cabelos curtos da nuca dele fazerem cócegas nelas. Jungkook automaticamente buscou a cintura de Jimin, talvez um pouco hipnotizado pela naturalidade na qual mergulhava ao estar perto do não-duende que conhecera na noite anterior.
E olharam-se, silenciosamente, os rostos tão perto um do outro que os hálitos que compartilhavam os aquecia um pouco. Jungkook suspirou, sentindo-se incrivelmente cheio com o dia que tinha passado, para o qual tinha planos tão vazios. Sorriu, porque sabia que aquilo tudo era por causa de Jimin.
Quem tomou a iniciativa foi Jungkook, mas para surpresa de ambos ele não uniu seus lábios, a boca pousando na bochecha quentinha e macia de Jimin. Deixou um beijinho tímido antes de afastar seu rosto para poder encará-lo nos olhos novamente.
— Obrigado, Jimin... — murmurou baixinho, como se fosse um segredo. Levou os dedos até o rosto do outro, como se buscasse verificar se Jimin não era uma ilusão de fábulas e contos de Natal que desapareceria após ressignificar aquela data boba, deixando-o apenas com a lição de moral encravada no peito.
— Pelo quê? — o loiro perguntou confuso. Jungkook não aguentou, dando outro sorriso de puro deslumbramento.
— Não sei se sou capaz de racionalizar tudo em palavras, mas me sinto grato por muitas coisas... Vamos resumir que estou te agradecendo por esse dia, acho que a maior parte dos agradecimentos se encaixa em coisas que aconteceram hoje.
— Ah... — Jimin suspirou, subitamente tímido. Logo ele, que não sentia-se tímido em levar Jungkook debaixo do visco imaginário, no máximo nervoso. Engoliu em seco, porque era fácil assimilar seu interesse no homem por seu carisma, humor e aparência, mas o encantamento que fingiu não perceber e ficou claro com o jeito que seu corpo estremeceu com o agradecimento sincero, com o tom de voz grosso murmurando-lhe baixinho e gostoso... Deixava Jimin desestabilizado.
— Falei demais? — Jungkook riu baixinho, sentindo-se tímido com o silêncio alheio também. Distanciou os corpos, sem saber se ainda poderiam estar tão desinibidamente agarrados daquele jeito depois de seu agradecimento estranho.
— Talvez — Jimin riu também —, pensei que quem falasse demais aqui sou eu.
— Mas eu não tenho o raio moralizador, né...
— Obrigado, Jungkook — Jimin subitamente devolveu. Ambos ficaram em silêncio novamente. — É que... Foi legal passar o dia com você.
— Fofo... — Jungkook mordeu os lábios para não rir de novo. — Não precisa corresponder meu agradecimento bobo... Só aceite ele.
— Mas eu queria... — Jimin admitiu, olhando para o lado.
— Não achei que você fosse do tipo tímido — Jungkook provocou.
— Não sou!
— Não?
— Não, foi só um... Sei lá, x-tudão, não complica! — Cruzou os braços, revirando os olhos.
— Poxa... Estava gostando tanto de ouvir você me chamar de "Jungkook"... — reclamou, fingindo-se de manhoso.
— Que pena — Jimin retrucou e riu, preso na montanha russa entre naturalidade e tensão que os dois encontravam-se.
— Será que depois de hoje... Ainda vou ter chances de ouvir você me chamar pelo nome? — Voltou a ficar sério, falando baixinho e esperançoso.
— Depende, se você me irritar, não. — Jimin brincou mesmo que assumisse um tom sério também. Esperava que Jungkook entendesse o que queria dizer. — Mas vou te chamar de "x-tudão" pelo menos.
Jungkook arregalou os olhos com a frase, derretendo-se em um sorriso que foi compartilhado por Jimin logo depois, feliz em ser ingênuo e continuar acreditando, como o bom Pierrô que era. Voltaram a aproximar-se, como se fazer aquilo fosse óbvio, e acomodaram-se nos braços um do outro.
— Quer dizer que eu vou poder celebrar o raio moralizador ao vivo? — Jungkook murmurou, aproximando os rostos.
— Você quer? — Jimin riu fraquinho, tímido com a proximidade e com o jeito que o músico parecia gostar daquele seu lado tão... Pesado. Deixou seu nariz arrastar-se no do outro, achando diferente o jeito que o piercing de argola que Jungkook possuía lá arranhava levemente sua pele.
— Pensei que isso já tivesse ficado claro... — Aproximou as bocas, suspirando de vontade ao encostar levemente nos lábios macios de Jimin, segurando a cintura por cima da jaqueta felpuda com mais necessidade.
— A gente fala demais... Foco no visco imaginário — Jimin provocou um pouquinho, encarando o fundo dos olhos redondos e bonitos de Jungkook antes de fechar os próprios e ultrapassar a distância que já quase não existia entre seus lábios.
O peito dos dois fazia um bom esforço para suportar as batidas fortes dos corações, deixando os corpos quentes apesar da noite fria, enquanto beijavam-se lenta e curiosamente. Como se aquele beijo pudesse revelar detalhes um do outro que ainda não conheciam, mas morriam de vontade de serem apresentados a eles. Não se importariam de distribuir viscos imaginários em qualquer ambiente que compartilhassem, desejosos de partilhar mais experiências daquele tipo.
E não havia lição de moral a ser aprendida, apenas emoções a serem sentidas. Por estarem juntos de forma inusitada, por terem vivido belos momentos naquela data, por presenciarem juntos dolorosos recortes de consciência de histórias que não tinham final, mas esperavam ouvir uma boa continuação.
Afastaram-se esbaforidos do beijo, encostando as testas. Estavam afoitos para provar mais, conhecer mais, mas pelo menos sabiam que mesmo que aquele dia tivesse um fim, tal fim não existia de verdade, e poderiam construir uma continuação que deixaria o rastro de suas existências no universo, pois, naquele momento, percebiam-se.
Olharam um para o outro e riram, como se compartilhassem o mesmo pensamento. Porque talvez tivessem percebido-se desde aquele encontro tão inusitado no shopping e existiam um para o outro desde então, assim como o som da árvore. E talvez a coincidência de terem reencontrado-se fosse apenas questão de tempo porque talvez buscassem aquela existência pelo canto dos olhos.
Mesmo que aquilo fosse apenas questão de tempo, Jimin segurou a nuca de seu Pierrô com mais força, feliz dele ter o visto no Natal, uma noite na qual podia inventar um visco e unir seus lábios novamente.
⇢🍔⇠
Hshaushauhsau bem, ficou meio longuinha, né? Deixei os jikook soltos demais enquanto fui escrevendo e acabou que eles falam demais..... Enfim, espero que tenham gostado desses dois implicantezinhos!
Muito obrigada de novo Pudim_V0ador por ter pedido!! Amei muito escrever e espero que você tenha gostado!
Beijinhos de luz e obrigada por ler!
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