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Capítulo 15


E assim se foi passando o tempo. A paragem letiva parecia nunca mais chegar, mas na verdade só faltava mesmo uma semanita até ao fim do semestre, que voou num instante. Alma e Eduardo iam passar as férias a casa, deixando para trás os colegas no meio daquele grande projeto.

–Sortudos, –comentou Márcio. Carregava as malas de Eduardo escadas abaixo, agora que já estava no dia de ele se ir embora. Temporariamente, é claro! –Quem me dera ir passar as férias a casa.

–Os teus pais estão ocupados? –perguntou-lhe o loirinho.

Márcio encolheu os ombros, fingindo-se desinteressado. –São ambos militares. "Férias" nunca fez parte do léxico deles. Porque achas que me enfiaram num colégio interno?

–Sortudos nada, –queixou-se Alma, atrás deles, levando metade das suas malas e mesmo assim precisando da ajuda de Anastácia para lhe levar o resto. –Vocês é que vão aqui ficar, e com um bocado de sorte ainda acabam o projeto antes de nós voltarmos!

Aquela tinha sido, muito obviamente, a palavra de código que tinham decidido usar quando queriam falar de magia em frente de mais gente. E gente era o que não faltava ali, naquele momento. Parecia que todos os alunos da escola se tinham acumulado no hall de entrada, à espera dos paizinhos ou a acompanhar os colegas à saída.

–Pois, isso também significa que temos de ficar aqui, com muito menos gente, sabendo que a escola continua tão assombrada quanto antes, –sussurrou Anastácia.

–Ela até parece simpática?

–Quando estamos a fazer o que ela quer, –retorquiu, olhando a toda à volta como se a pudesse ver, ou talvez esperando que a multidão a escondesse melhor do que escondia.

Bem, a verdade é que a paranoia da reencarnada estava a chegar a níveis inusitados, ultimamente.

–Mas não se preocupem que nós não vamos fazer nada sem vocês, –disse Márcio. –Fazê-lo só com duas pessoas pode ser perigoso, –disse, virando-se de forma muito óbvia para olhar para Alma.

Em resposta, ela revirou os olhos.

–Já aprendi a minha lição! E já jurei que não ia trabalhar no projeto enquanto estiver em casa, sem vocês. Que mais querem de mim?

–Dois dedos de testa, –respondeu Eduardo.

Isso apenas lhe valeu uma pancadinha na nuca.

Foi assim, no meio de discussões e conversas e estupidezes que o grupo passou o resto do pouco tempo que tinham juntos, antes de as boleias chegarem. A interrupção letiva não era assim tão longa, só um par de semanas, mas pela maneira como os adolescentes falavam até parecia que nunca se iriam voltar a ver!

Estar ali, ouvindo conversas em que não podia participar, flutuando sentada por cima das cabeças dos colegas porque mal havia espaço no chão, só trazia más memórias a Érica.

Nem sempre tinha sido capaz de se juntar aos alunos, fingir estar viva para se esconder entre eles, fingir que era apenas mais uma aluna qualquer. Na verdade, isso foi uma das coisas que demorou imenso tempo a aprender.

Logo depois do acidente, ela era capaz apenas de se manter invisível, —ou até semitransparente, nesse tempo antes de o saber controlar— e nada mais. Tinha perdido a conta ao tempo que passara a treinar antes de conseguir sequer pegar em pequenos objetos, mas lembrava-se bem da dor aguda que sentia de cada vez que o fazia demasiado mal e que acabava com as coisas enfiadas dentro de si, como se tivesse acabado de ser esfaqueada. Tinha-se passado muito tempo, muito tempo mesmo, até ela ser capaz de controlar todo a corpo, de o prender ao mundo físico, e mais ainda até o conseguir fazer com consistência suficiente para se arriscar a estar entre os vivos. Tinha perdido a conta aos anos, ou até às décadas, que passou assim.

Durante esse tempo que tinha passado a treinar, não havia muito a fazer que não espiar os muitos alunos da escola, seguindo-lhes os dramas à procura de entretenimento. Às vezes, imaginava que aquelas pessoas a conheciam, que lhe eram até amigas, e fingia participar das suas conversas, mesmo sabendo que ninguém a ouviria. Fingia que lhe tinham contado os seus segredos, em vez de ela os ter ouvido por estar a ser intrusa nos lugares que eles achavam privados.

E depois do tempo passado na escola, os alunos acabavam os estudos, saíam pela porta fora, e Érica nunca os voltava a ver.

Bem, pelo menos isso era algo que ela não teria de repetir. Os colegas —estes que a conheciam mesmo, que conversavam com ela, que pelo menos sabiam que ela existia— não iam embora tão cedo. Era só uma interrupção letiva! Eles iam voltar. E, aliás, nem sequer se iam todos embora. E, aliás aliás, Érica nem fazia ideia porque se importava tanto, visto que nem sequer gostava deles, só os tolerava por lhe serem úteis.

O dia passou-se, e depois o dia a seguir. A escola estava muito mais silenciosa, agora que a maior parte dos alunos estava algures longe dali, e Érica tinha ainda menos coisas para fazer do que o costume. Aproveitou o tempo, então, para espiar Anastácia.

A reencarnada tinha entrado no hábito de passar os seus dias no sótão, remexendo nos milhares de coisas ali abandonadas. Passou uns dias à procura só nas estantes, lendo livros e manuais escolares já há muito obsoletos, mas depressa se fartou disso e passou a procurar entre as caixas de revistas e de jornais e de livros de BD, entre os montes de trapos que costumavam ser roupa, entre os muitos materiais de desporto que ainda não seguiam regulamentações modernas e entre o imenso mar de objetos aleatórios, desde pequenos autómatas até toalhas de mesa, que seria impossível saber como foram ali parar. E, entre tudo aquilo, parecia estar a encontrar o que queria.

Primeiro, Érica não percebeu bem o que havia de interessante no monte que Anastácia ia construindo a um canto. Um uniforme feminino, dos antigos que se usava no tempo dela. Três ou quatro telas pintadas por alunos. Novelos e novelos de fio de crochet, meio apodrecidos pelo tempo e demasiado frágeis para serem úteis, e três ou quatro agulhas de diferentes tamanhos. Bem, os livros de magia faziam sentido, mas o resto dos manuais antigos não, nem a pilha de jornais idênticos, com a tinta deslavada, que Anastácia passou horas a ler um a um. Só quando a reencarnada começou a procurar numa das estantes de metal que continham ficheiros dos alunos pelo ano em que eles morreram é que Érica percebeu o porquê daquilo.

Eram tudo coisas da Arabela. Bem, nem todas eram exatamente dela; o uniforme provavelmente nunca tinha pertencido a ninguém, e as agulhas de crochet podiam ser de literalmente qualquer aluna da escola, dado o quão comum o hobby era na altura. Mas os manuais? As telas? Pintadas por ela, ou com o nome escrito na capa, junto com aqueles desenhinhos que toda a gente fazia quando estava aborrecida.

A reencarnada não sabia quando parar, pois não? Tinha que ser uma chata do caraças e continuar a investigar um crime mais velho que a sua avó, do qual toda a gente envolvida já tinha há muito morrido. Tinha que continuar à procura do ano certo naquelas estantes, à espera de que estivessem organizadas e não completamente ao calhas, com a esperança de descobrir mais do que já sabia. Os sonhos não lhe serviam para isso? Precisava de mais?

Oh não. Érica tinha-se esquecido completamente de que, algures ali e provavelmente perto do da defunta, estariam os ficheiros dela e de Harlan. Seria terrível se ela os descobrisse, não era? Será que era aquilo que a outra queria?

Érica dirigiu-se ao monte de cenas de Arabela e, sem nem pensar no que fazia, pegou num dos livros para o atirar ao chão. O barulho ressoou pelo espaço, e Anastácia congelou no lugar.

–Arabela? –perguntou, a medo. Ergueu as mãos e virou-se muito devagar.

Érica repetiu o gesto.

Era uma ideia terrível? Claro, obviamente. Mas não era como se a reencarnada não soubesse já da existência de um fantasma, e tudo o que Érica tinha que fazer era distraí-la por tempo o suficiente para que deixasse de procurar o ficheiro de Arabela.

Também era extremamente plausível que a fantasma, ao ver alguém colecionar coisas suas como se de cromos se tratassem, ficasse irada, não era? Talvez exatamente por causa dessa plausibilidade, a reencarnada estava aterrorizada. Olhava os livros estatelados no chão, e depois o sítio onde Érica estava invisível, tremendo mas com demasiado receio para se mover mais que isso, os olhos tão esbugalhados que mais um bocadinho e lhe saltariam das órbitas. Isso era o suficiente, achou Érica. Para já.

–Arabela, és tu? –perguntou a reencarnada, não mais alto que um sussurro. Quase como se esperasse resposta.

Mas, como é óbvio, Érica não disse nada. Da perspetiva de Anastácia, ela estava só a falar com o absoluto vazio do sótão, tentando espreitar para além de onde a sua lanterna o iluminava. Bem, talvez tivesse razão para estar assustada!

–Estás zangada comigo? Se isto te está a incomodar, eu paro! Nem sequer pensei que te podia trazer más memórias, –disse. Depois tremeu menos e pareceu reconsiderar. Era quase como se não acreditasse no que estava a dizer.

Érica não fez nada, decidida a observá-la com cuidado. Algo ali não batia certo.

Anastácia suspirou. –Estou a falar com o nada outra vez, –disse, e voltou a virar-se para a estante.

E o que foi que Érica fez? O que qualquer pessoa com sizo faria, claro! Atirou outro livro, desta vez diretamente contra a nuca da reencarnada.

–Au! –gritou ela, o que não foi surpresa nenhuma. Virou-se, massajando a nuca com uma mão e usando a outra para pegar no livro do chão. Depois atirou-o de volta para a pilha. –O nada está muito agressivo hoje!

Érica semicerrou os olhos. Rude!

Agora mais irritada do que assustada —a última coisa de que Érica estava à espera— Anastácia voltou a virar-se para a estante.

Aquilo foi uma terrível ideia. Érica não podia deixar aquilo acontecer, pois não? Não podia deixar que a reencarnada descobrisse a verdade, especialmente após ter usado os nomes verdadeiros dela e de Harlan, tendo-o posto em perigo também a ele.

Então, sem opções e perante o desinteresse que Anastácia mostrava a todas as distrações que ela tentava criar, Érica tomou uma decisão drástica.

Empurrou a estante para cima dela.

O grito chegou ainda antes do estrondo que a estrutura de metal fez ao bater no chão, abafada pela quantidade absurda de papéis que de lá de dentro jorravam desimpedidos. A reencarnada tinha-se desviado a tempo.

Era muito mau o facto de Érica não saber se essa era uma coisa boa ou má? A estante não era pesada o suficiente para a magoar a sério, só no máximo partir um osso ou dois, portanto não devia ser um pensamento assim tão maléfico.

Magoada ou não, a reencarnada tinha percebido o recado. Arrastava-se para trás, tremendo, gritando, o peso apoiado nas palmas das mãos porque ela ainda não tinha força para o passar para os pés. Quando finalmente o conseguiu fazer, virou-lhe as costas e fugiu a sete pés, o mais rápido que as pernas bambas como varas verdes lhe permitiam correr. Érica nem achou necessário confirmar que ela tinha mesmo corrido escadas abaixo; achou extremamente óbvio que essa seria a única coisa lógica a fazer naquela situação.

Crise evitada, pensou com os seus botões, virando a atenção para o molho de papéis espalhados pelo chão, o monte de montes de processos de ex-alunos da escola. Suspirou. Não achava que a reencarnada voltaria, mas, por segurança, teria que vasculhar por ali para esconder melhor o ficheiro dela e de Harlan. E de Arabela, com certeza, para que a rapariguinha traumatizada não suspeitasse da razão daquele ataque. Mais isso podia ficar para depois. Para já, Érica queria mas é analisar os documentos que Anastácia andava a juntar e que, na sua fuga desesperada, tinha deixado para trás.

Pegou na lanterna descartada algures no chão, aproximou-a mais da coleção de itens, e depois sentou-se no chão para os ver um a um.

Aquilo era o resultado de uma obsessão, quase de certeza. A única razão que Érica podia imaginar para a reencarnada ter aquilo tudo era para um ritual qualquer. Ou talvez para suscitar mais sonhos, avivar mais memórias? Das duas três, mas era mesmo melhor se fosse das duas uma, porque qualquer outra opção só podia ser pior que aquelas.

E, tentando segurar o nojo que tinha por tudo aquilo, Érica começou a folhear os cadernos.

Odiava Arabela, a sério, odiava mesmo. Aquela caligrafia tão limpa lembrava-lhe das horas que esta passava a tomar apontamentos e a passá-los a limpo, a tinta. Que desperdício de tempo! Odiava tudo de Arabela, desde os milhentos pontos de crochet que ela sabia de cor até à mania que tinha de entrançar o cabelo de Érica se ela se distraísse ou adormecesse durante as muitas sessões de estudo que tinham passado juntas. E, acima de tudo, Érica odiava-se a si mesma por ainda se importar com ela.

Os cadernos não tinham nada de interessante ou, pelo menos, nada de novo. No máximo dariam a Anastácia a certeza de que a caligrafia era a mesma dos apontamentos de magia, algo que a reencarnada já sabia. Mas também não foi os cadernos que Anastácia tinha passado horas a folhear, um pouco antes, pois não?

Os jornais estavam gastos, ilegíveis, alguns mais comidos pela traça que outros. Mas um mostrava a data, e outro ainda tinha uma anotação na primeira página, e outro ainda tinha uma parte do corpo do texto, exatamente do artigo que interessava a reencarnada. E Érica sabia exatamente do que aquilo falava.

Esta quinta feira, quatro de Janeiro de 1940, um trágico acontecimento assolou toda a comunidade escolar do colégio Ícarus. Duas semanas após a última vez que foram vistos com vida, o corpo de um dos alunos desaparecidos foi encontrado, já em estado de decomposição. Trata-se de Arabela Cooper. Foi encontrada dentro do edifício da escola, numa sala de arrumações inutilizada. Os outros dois alunos desaparecidos, Harlan Sallow e Érica Finch, continuam a monte, sendo agora suspeitos do homicídio da colega.

Na mesma página, costumava haver uma fotografia deles três, juntos, a última que tinham, tirada muito antes de eles sequer descobrirem que magia existia, quanto mais tudo o que aconteceu depois.

Érica teve que parar por um momento, voltar a trazer a racionalidade à tona. Oh, como precisava de lutar para o fazer, para segurar as lágrimas que ameaçavam atacá-la! Porque, independentemente de quanto tempo se passava, aquilo doía-lhe sempre sempre sempre.

Era aquilo que a reencarnada queria? Fazê-la sofrer? Ou teria um motivo ainda pior que esse para andar a bisbilhotar no que não lhe fazia respeito?

Felizmente, o texto estava demasiado borratado para Anastácia alguma vez ter a capacidade de o ler, naquele jornal e no próximo e no próximo e em todos, e as fotografias também não ajudavam. Eram só três formas amorfas, indistintas, nos poucos em que ainda havia sequer tinta.

Ainda estava a respirar devagar, tentando trazer-se de volta das profundezas do luto para que aquelas memórias a tinham empurrado, quando Harlan lhe apareceu no sótão, os dentes rangidos e os óculos já na mão.

–O que é que fizeste?

–Assustaste-me, –queixou-se Érica, fechando o jornal à pressa para o atirar de volta para a pilha.

–Quero lá saber. O que é que fizeste a Anastácia? –exclamou.

Érica revirou os olhos. –Ela foi-te fazer queixinhas, é?

–Não, ela veio a chorar lá para baixo e depois colapsou no meio do corredor, a dizer que alguém a tentou matar. Podes-me explicar como é que isso aconteceu?

–Mas que dramática! Eu não a tentei matar. E juro que tentei de mil maneiras diferentes dissuadi-la do que estava a fazer antes de tomar medidas tão drásticas!

Harlan ergueu uma sobrancelha. –Medidas drásticas?

Oh, pois, ele ainda não sabia disso. –Foi só um pequeno acidente com mobília. Uma estante de livros quase lhe caiu em cima. Mas ela fugiu a tempo!

O facto de Harlan nem sequer ter ficado surpreendido ofendia-a ligeiramente. Será que esperava tão pouco dela? Ele cerrou os olhos e massajou o espaço entre as sobrancelhas, demorando até falar.

–Pois, a estante espontaneamente decidiu cair, depois de quantos anos aqui em cima?

Érica encolheu os ombros, e ele suspirou.

–Não podes andar por aí a matar pessoas!

–Ela não se magoou!

Harlan abanou a cabeça. –Desta vez não. Mas tu estás descontrolada, Érica, obcecada! O que é que ela pode ter feito para tu quase a teres matado?

Ela olhou-o, pensando nas próximas palavras com muito cuidado. Era preciso muita coisa para o pôr zangado, e até agora ele estava-se a segurar muito bem, mas ela nunca gostava de estar por perto quando invariavelmente acabava por dizer alguma coisa a mais e ser a gota de água que fez o copo transbordar.

–Ok, admito que a minha reação talvez possa não ter sido perfeitamente proporcional...

–Achas?

Ela hesitou. Depois bateu no chão a seu lado, indicando a Harlan que se sentasse. –Não era suposto ela magoar-se, eu juro que nem pensei nisso. Aliás, eu mal pensei. Sabes como eu fico quando fico emocional...

Ele mufou. –Isso é uma desculpa para falar alto demais, não para matar alguém!

–Podes parar de me acusar disso! –pediu ela. –Da última vez que a vi, Anastácia estava vivinha da silva. Eu estava só a tentar impedi-la de descobrir demasiadas coisas. Bem, pelo menos não mais do que já sabe... –voltou a indicar o chão a seu lado.–Anda, senta-te. Eu mostro-te.

Harlan suspirou. Olhou-a de cima a baixo e, talvez apenas depois de decidir que ela não era uma ameaça, suspirou e sentou-se a seu lado. –Espero que isto valha a pena.

Érica pôs-lhe um dos jornais mais bem preservados no colo. Se fosse possível alguém tão branco quanto ele empalidecer, teria sido isso que aconteceu.

–Era disto que ela estava à procura? –perguntou, procurando freneticamente pela página do artigo que falava sobre eles.

Ela abanou a cabeça. –Pior. Não te preocupes que a tinta está demasiado desbotada, não dá para ler nada de jeito. Ela esteve a confirmá-los a todos, –indicou a pilha desempilhada de jornais –eu ainda não tive tempo de fazer o mesmo mas acho que ela não viu nada.

–Pior? –perguntou Harlan. Não parou de vasculhar as páginas, provavelmente desconfiando da palavra da amiga. Dadas as circunstâncias, Érica não o podia culpar.

–Estava a remexer nos ficheiros dos alunos, à procura do de Arabela, suponho. Ainda não procurei na pilha para confirmar se os nossos estavam no mesmo sítio mas, mesmo se não estivessem, os nossos nomes estariam algures no dela de certeza.

–O que é que eu te disse sobre usares os nossos nomes verdadeiros? –ralhou ele.

Aquilo era um ultraje! –Como era suposto eu saber que uma das alunas inscritas este ano ia não só interessar-se por magia como também, sei lá, ser literalmente a reencarnação da nossa amiga morta? Não me poder culpar por não ter previsto essa eventualidade!

Ele sorriu. –Amiga, uh?

Raios. Não, amiga não. Colega, talvez; assassina, rival, pessoa da mesma turma, ser humano que às vezes no passado tinha estado próxima fisicamente dela ou, no máximo, ex-amiga. Nunca amiga!

Vendo as expressões que Érica fazia ao pensar naquilo, Harlan riu-se ainda mais. Só quando ela levantou uma mão para lhe bater é que ele disse –Relaxa! Eu sei o que queres dizer. E suponho que estas sejam todas coisas dela? –perguntou, gesticulando para a pequena coleção de Anastácia.

Sempre subtil, Harlan.

–Sim, –respondeu. –Ou, bem, algumas são, outras são só imitações ou abjetos parecidos. A reencarnada deve estar a colecioná-los há algum tempo.

Ele virou a sua atenção e ergueu uma sobrancelha. –A "reencarnada" tem um nome, sabes?

Ela revirou os olhos. –Sim, e eu importo-me tanto com isso. Sabes de quem estou a falar.

–É sério, –disse ele, olhando-a nos olhos. Pousou o jornal que até agora descansava no seu colo, e virou-se completamente para Érica. –Estás a vê-la como uma coisa, como um objeto ou, pior, como a pessoa que te matou. Mas Anastácia não fez nada de errado.

–Achas normal andar a colecionar coisas que pertencem a um morto?

–Põe-te na perspetiva dela. Ela está só a tentar perceber o que se está a passar! Para ela, o que aconteceu foi –ergueu uma das mãos e começou a contar pelos dedos. –Primeiro teve sonhos proféticos, depois ficou tão cansada de não conseguir dormir que desmaiou de cima de um cavalo, depois descobriu que a escola estava mesmo assombrada, depois começou a estudar magia, depois uma das suas colegas feriu-se demasiado por causa de dita magia... –Pousou a mão no chão, apoiando-se sobre ela para se inclinar para mais perto de Érica. –Ah, e isso é sem contar com o facto de que, sei lá, foi quase assassinada pelo fantasma que se propôs a ajudar?

Ela revirou os olhos. –Nada disso teria acontecido se ela não tivesse sido tão metediça!

–Érica.

–Pois, pois, –aceitou ela, vencida. –Ok, suponho que este ano esteja a ser terrível para ela, mesmo. Eu prometo não voltar a tentar matá-la a não ser que seja em último recurso!

–Érica!

Ela riu-se. –Tudo bem. Eu prometo não a tentar matar de todo! –Ergueu as mãos desarmadas a seu lado em rendição. –Feliz?

Harlan voltou a pôr os óculos na cara, tentando esconder um sorriso. –Suponho que isso tenha de chegar.

Depois levantou-se, sacudiu as mãos e deu mais uma olhada à coleção de coisas ali acumuladas. O sorriso saiu-lhe da face.

–O que sugeres que façamos com isto? Queimamos os jornais?

Érica hesitou, mas acabou por abanar a cabeça. –Não vale a pena. Não há nada reconhecível neles, seja como for, e nenhuma forma de ela os recuperar. Isso se Anastácia —viste, usei o nome dela!— tiver coragem de sequer voltar aqui a cima remexer nisto, depois do que aconteceu.

–Depois do que tu fizeste acontecer, –corrigiu ele.

Ela acenou com a cabeça. –E desde que ela pense que a fantasma é Arabela, não teremos grandes problemas. Ajuda-me só a encontrar os nossos ficheiros nessa confusão toda.

Harlan riu-se. –O que é que te disse quanto a usar os nossos nomes verdadeiros? –repetiu.

Érica riu-se também.

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