10 Dor, Vergonha E Culpa
Aquele carro ainda era exatamente como se lembrava. Os bancos de couro original, macios ao toque, o cheiro da riqueza que exalava em cada centímetro, os tapetes limpíssimos e os vidros reluzentes. No entanto, Joseline não sentia conforto algum. Ao contrário, sentia como se estivesse sentada sobre espinhos pontiagudos, que feriam sua carne e a faziam querer abrir aquela porta e correr para longe.
Desta vez, ela estava sentada no banco do carona. Ao seu lado, exageradamente arrumado e perfumado, Afonso a olhava a todo momento e seu sorriso deixava claro o quão vitorioso ele se achava naquele momento.
Desde o primeiro momento em que pusera seus olhos nela, um tanto perdida e necessitada naquela manhã, soube imediatamente que seria sua. E não a forçaria, não exigiria nada dela. Sabia que sua recusa era apenas temporária. Ela viria até ele. De um jeito ou de outro. E ela foi.
Quando Joseline ligara, dizendo, de forma quase inaudível que iria para a cama com ele, Afonso teve uma ereção e precisou voltar para o banho, de onde havia acabado de sair. Ela o enlouquecia, mesmo por telefone e nem sabia disso.
Não importava por qual motivo ela estava ali, o importante é que estava. E ele mal podia esperar para pôr suas mãos naquela pele negra que o atraía de uma maneira que não sabia dimensionar.
- Peço desculpas por não levá-la para minha casa - disse ele. - Estou com umas visitas que podem ser um tanto... curiosas demais. E eu acredito que você queira manter a discrição. Não é mesmo?
Joseline mal conseguia olhar para ele.
- Sim... - respondeu, fraca.
- Mas não se preocupe, vamos para um lugar muito confortável também. Você vai gostar.
Joseline duvidava muito disso. Ela encarou a noite lá fora, sentindo-se como um condenado à caminho da forca. Fechou os olhos, retendo as lágrimas e firmou seus pensamentos em Pedrinho.
🌻
O apartamento ficava no centro da cidade, no último andar de um prédio enorme. Joseline ficou extasiada com a fineza do lugar: móveis planejados, perfeitamente arrumados, parecendo absolutamente limpos, como se alguém houvesse acabado de lustrá-los.
Sua casinha, onde moraria em breve com Maurício, caberia tranquilamente dentro daquele lugar e ainda sobraria espaço suficiente para construir mais umas três casas.
Lembrar-se do noivo quase a fez vomitar. Pobre Maurício! Mal sonhava com o que ela estava prestes a fazer e ela ainda não sabia se teria coragem de contar.
Joseline sentiu algo áspero contra seu pescoço e ouviu a voz rouca de Afonso dentro de seu ouvido, lhe causando horríveis arrepios.
- Vamos para o quarto, querida.
Ela se encolheu toda, enquanto ele a pegava pela mão e a levava até o quarto, que ficava na primeira porta de um corredor extenso.
Joseline ficou parada na entrada do cômodo, tensa. Seu coração estava na garganta e ela tremia.
Afonso desabotoou as mangas de sua camisa e a olhou.
- Aproxime-se - era uma ordem.
Seus pés pareciam pesar uma tonelada naquele momento. Mas ela se arrastou até a cama, onde ele também estava.
- Tire a roupa.
Os olhos arregalados e seu batimento cardíaco acelerado não a permitiam esconder o quanto estava assustada e com medo. Medo dele, medo do que estava por vir e do que poderia acontecer depois.
" É pelo Pedrinho " disse a si mesma em pensamento.
Demorou uma eternidade para se despir. Soube disso pelos suspiros de impaciência que saíam de Afonso. Entretanto, aquela não era uma tarefa fácil. Jamais havia ficado nua na frente de alguém. Nem mesmo de Maurício. Isso era algo que aconteceria somente na noite de núpcias, quando ele a tomaria para si, a faria mulher e consumariam o amor que sentiam um pelo outro.
Mas agora ali estava ela, tirando a roupa diante de seu chefe, e dentro de alguns instantes se entregaria para ele.
"Por dinheiro."
Joseline engoliu em seco. Pelo maldito dinheiro que pagaria os remédios e talvez, quem sabe, o tratamento de seu irmãozinho. Pela primeira vez, conseguia entender a raiva e a indignação de Jane ao dizer que odiava ser pobre.
A pobreza era uma desgraça, um mal que jamais deveria existir na face da terra e que deveria ser exterminado para sempre.
- Tire toda a roupa, meu bem - ela ouviu Afonso dizer. Ele parecia ansioso por aquilo.
- Eu... não quero ter que tirar tudo... - murmurou, tremendo.
Afonso ia protestar. Pensou em arrancar-lhe a calcinha e o sutiã, deixá-la completamente nua para ele. Mas aqueles olhos de gatinho assustado o comoveram. Sentiu empatia e um pouco de dó.
- Tudo bem - ele se aproximou. - Você é linda de qualquer jeito, Joseline.
Ele tocou o ombro dela, descendo a mão por seu braço e segurou sua mão, levando-a até seu pênis, já duro e pulsante, ainda dentro da calça.
- Olha como você me deixa, garota... - ele sussurrou, beijando-lhe a orelha.
Joseline puxou a mão, bruscamente, enojada e revoltada.
Ela recuou alguns passos.
- Ei, vem aqui - Afonso disse - não foi para isso que viemos pra cá?
Joseline se aproximou, olhando a cama e se sentou nela.
- Será que podemos resolver isso logo de uma vez?
Afonso riu, malicioso.
- Hum, apressadinha você, não?
E então, no minuto seguinte, ele já estava sobre ela, desafivelando o cinto de qualquer jeito, e arrancando as peças íntimas de ambos.
Joseline tremia tanto que os lençóis da cama em poucos segundos já estavam desarrumados, sem que houvesse ainda qualquer ação por parte de Afonso.
Ela fechou os olhos e esperou, enquanto rezava baixinho, pedindo perdão.
- Abre os olhos, querida. Olha pra mim.
Ela o fez, piscando, desorientada.
- Você é a morena mais perfeita que eu já vi na minha vida - Afonso a olhava, embevecido. - Que belos olhos você tem.
E então, ele a penetrou, sem aviso prévio, sem dar-lhe sequer uma chance para respirar fundo e se preparar, antes de sentir aquela coisa dura e grossa rasgando-lhe as carnes, forçando sua entrada, machucando-a e fazendo seus olhos arderem.
Joseline rangeu os dentes e, sem querer, agarrou as costas largas e arqueadas de Afonso, soltando um grito de dor do qual ela mesma se lembraria ainda por muito tempo. Uma lembrança lamentável e literalmente dolorosa.
Ela viu o rosto vermelho e suado de Afonso pairando acima do seu próprio rosto, enquanto a barriga grande e cheia de veias pulava diante de si, no vai e vem infindável que a fazia sentir vergonha e culpa.
Joseline sentia a respiração pesada e ofegante do homem em seu ouvido e, quando achou que fosse desmaiar de dor ou vomitar, ele se contorceu todo, e se jogou do lado dela, esbaforido, respirando profunda e rapidamente.
"Acabou. Graças a Deus, acabou. Pedrinho está salvo e vai ficar tudo bem. "
Joseline mal se mexeu, apenas ficou ali, parada, fitando o teto acima deles, sentindo aquela queimação lá embaixo, em seu ventre.
- Céus...! - Afonso soltou um suspiro, ainda se recuperando do ato. - Acho que estou me apaixonando por você.
Ele se virou para ela.
- Foi incrível. Vamos fazer de novo.
🌻
Meia hora depois, Joseline saiu do banheiro do corredor principal. Seus cabelos estavam enrolados no alto da cabeça - não tivera coragem de lavá-los, como havia lavado todo o corpo - como explicaria o fato de chegar em casa, à noite, com o cabelo molhado?
Mas ela se esfregara com avidez, com brutalidade até, como se assim, pudesse retirar a culpa e a vergonha que a consumiam por dentro. Suas lágrimas se misturavam com a água do chuveiro e com o sangue que escorreu por entre suas pernas.
Suja. Era assim que se sentia. Não importava o quanto se limpasse ou se esfregasse, seu corpo estava marcado para sempre e ela não sabia como se livrar de seu opróbrio.
🌻
Afonso a esperava na sala, sentado no belo sofá branco do apartamento. Ele a viu e a chamou.
Joseline caminhou até ele com certa lentidão. Tudo dentro de si doía. Sua alma doía. Era terrível a sensação.
- Tudo bem? - Ele a perguntou.
'' Absolutamente não. ''
Ela assentiu e se sentou no sofá, o mais distante possível, mantendo a cabeça baixa.
- Eu preciso te dizer que eu não só vou te dar um aumento...
Joseline ergueu os olhos para ele.
- Como também vou pagar todo o tratamento médico do seu irmão e do seu pai.
Ela o fitou, confusa, incrédula.
- É - Afonso sacudiu os ombros. - Eu me inteirei de toda a situação. Eles terão todo o suporte e assistência de que precisarem. Vocês não terão mais que se preocupar com nada. Pedrinho será atendido pelos melhores médicos e especialistas e vai receber o melhor tratamento...
Joseline não soube o que dizer. Atônita, sentiu seus olhos serem cada vez mais inundados por uma cachoeira de lágrimas imparáveis e de repente, todo o seu corpo se sacudia num choro alto, forte, sentido.
🌻
O dia seguinte havia chegado. Joseline estendeu o dinheiro para o rapaz do caixa na farmácia e recebeu o remédio em suas mãos. Ela evitou o olhar do atendente. Provavelmente ele a julgava e criticava internamente por ter comprado uma pílula do dia seguinte.
O que será que ele pensava dela? Que era uma irresponsável? Que se deitara com o patrão em troca de dinheiro? Ela tentou impedir os próprios pensamentos. Disse a si mesma que o rapaz era apenas um funcionário, estava fazendo o seu trabalho, pouco lhe importava a vida dos clientes.
Não era como se ela estivesse com um adesivo em sua testa escrito ''CULPADA''. Embora ela o fosse.
Não dormira na noite anterior. Joseline havia se revirado de um lado para o outro da cama. Pensava em Maurício, pensava em Pedrinho, no pai, na mãe, nos outros irmãos e, inevitavelmente, pensava em Afonso.
Ele havia lhe dito que ficara tão empolgado que nem se lembrara de comprar o preservativo e que por isso, ela deveria tomar o medicamento contraceptivo de emergência. E ali estava ela.
Joseline saiu da farmácia e abriu a bolsa para guardar a caixa com a pílula. Só a tomaria quando estivesse absolutamente sozinha e quando tivesse certeza de que ninguém a veria.
- Jô?!?
Joseline se sobressaltou ao ouvir a voz de Laisa e ao vê-la prestes a entrar na farmácia de onde acabara de sair.
Ela se apressou em esconder a caixa com o remédio, enfiando-a de qualquer jeito dentro da bolsa. Mas era tarde demais, percebeu, pela expressão no rosto de Laisa. Ela havia visto.
...
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