Capítulo 11
- É este o teu plano? - sibilou Uma, olhando com irritação para a princesa ao seu lado - Achas que se fosse assim tão fácil a Mal e os outros teriam estado nas confusões que estiveram?
- A Mal e os outros não tinham a Audrey e eu do lado deles. - ripostou Rhiara em resposta, puxando-a para baixo - Vai resultar. Confia em mim.
- Ainda não nos disseste porque é que estamos aqui. - constatou Harry, sussurrando ao seu lado.
- Já disse. Primeiro, vamos distrair a Fada Madrinha com muita conversa fiada, bajulação... - apontou para Audrey, que assentiu - Entretanto, vocês os três... - apontou para os piratas, com um sorriso travesso no rosto - Vocês vão arranjar confusão. Partam qualquer coisa, façam barulho, o que quiserem desde que ninguém saia ferido. A Audrey vai fazer um escândalo, dizer que é inadmissível e ocupar bastante tempo da Fada Madrinha.
- Enquanto tu entras nos aposentos da Fada e lhe roubas a varinha?
Rhiara assentiu.
- Desde o incidente com Mal e os outros, a Fada Madrinha nunca deixa a Varinha fora do quarto. Está protegido com feitiços e sabe-se lá mais o quê. - a princesa retirou algo da bolsa a tiracolo que trazia pendurada - Por isso, tenho isto.
Uma franziu o sobrolho.
- O livro de feitiços da Mal? Como arranjaste isso?
Rhiara encolheu os ombros.
- Pedi-lhe. Estou a rezar para que não seja preciso, não gosto de fazer magia sem saber quais as consequências mas... Mais vale prevenir que remediar.
- Vamos fazer isto ou não? - perguntou Audrey, decidida.
Os cinco entreolharam-se, assentindo. A filha da Bela Adormecida abraçou rapidamente a melhor amiga antes de sair do esconderijo onde estavam, desaparecendo do campo de visão de Rhiara, embora a sua voz se ouvisse ao longe, começando a sua parte daquele plano. Uma acenou brevemente na direção da princesa e Gil apertou a mão de Rhiara, desejando-lhe boa sorte baixinho, os dois esperando que Harry se mexesse para acompanha-los, já que iriam juntos fazer a sua parte.
Harry permaneceu onde estava. Tinha um mau pressentimento e ele nem era dessas coisas. Estava tenso, os olhos azuis fixos no rosto bonito da filha da Rapunzel. Esta inclinou-se para ele, beijando-o suavemente na bochecha, piscando-lhe o olho ao dizer:
- Vai armar confusão, pirata.
E levantou-se, deixando os piratas para trás, ciente do peso do olhar de Harry sobre si.
Os gritos no refeitório diziam a Rhiara que a missão dos seus amigos tinha sido bem sucedida. O objetivo era os piratas fazerem a maior bagunça na cafeteria da Escola de Auradon, enquanto Audrey corria a chamar a Fada Madrinha para impor a ordem e punir aqueles vilões desgraçados. Era essa a narrativa e parecia estar a resultar na perfeição. A Fada Madrinha acabara de deixar os seus aposentos e Rhiara observou-a virar a esquina antes dela mesma atravessar o corredor em direção à porta do quarto da Fada.
Era um quarto simples e sem muito luxo. Uma cama de casal com lençóis de um tom azul-claro, uma secretária cheia de papéis e canetas perfeitamente organizados e um armário branco fechado que Rhiara tinha a certeza estar bem arrumado e com roupas perfumadas. Organizado, simples e delicado.
A princesa fechou a porta atrás de si, observando o espaço ao seu redor em busca do que a trouxera ali. Abriu o armário, encontrando apenas as roupas e os sapatos da Fada, organizados por cores e estações do ano. Os olhos esmeralda de Rhiara franziram-se, começando a preocupar-se. E se a Varinha não estivesse ali? E se estivesse noutro sítio qualquer? Auradon era gigante...
Um pensamento atravessou-lhe a mente. Retirou o livro de feitiços de Mal do bolso e abriu-o, folheando-o rapidamente até encontrar aquele que procurava. Inspirou fundo, esperando que resultasse, já que também ela tinha magia no sangue.
- Doce poeira pousada, mostra-me a Varinha não encontrada.
Os fios de cabelo castanhos de Rhiara iluminaram-se, a sua magia respondendo ao feitiço. A pouca poeira que existia sobre o chão moveu-se magicamente, formando linhas pelo chão, como se apontassem para algo. A princesa agachou-se, seguindo a poeira, os joelhos arrastando-se no chão até alcançar o fim da poeira, no meio do quarto. De sobrolho franzido, Rhiara reparou numa ligeira inclinação do soalho, exatamente no ponto onde a poeira acabava. Da sua bolsa a tiracolo, retirou uma adaga e perfurou o chão, tentando levantar aquela tábua, uma tarefa demorada mas por fim bem sucedida.
Os contornos conhecidos da famosa Varinha fizeram-na prender a respiração, surpreendida. Olhou para os lados, tentando perceber se aquilo estava mesmo a acontecer. Não havia feitiços de proteção? Um alarme? Qualquer coisa mais... mágica?
- O mais simples por vezes é a melhor solução... - murmurou Rhiara, pensativa - Embora não esteja bem a ser o caso. Eu depois devolvo-lhe a Varinha, Fada Madrinha, prometo.
Colocou rapidamente a toalha no sítio, apagou as linhas de poeira e pôs-se de pé, saindo porta fora e correndo pelo corredor fora. Um sorriso gigante despontou-lhe no rosto, esperançosa. Estava quase. Iria salvar a sua mãe e ficaria tudo bem.
- Rhiara?
Uma figura familiar surgiu no meio do corredor, fitando a princesa com uma mistura de curiosidade e confusão. Carlos de Vil aproximou-se dela imediatamente, observando-a com preocupação ao perguntar:
- Estás bem? O que estás aqui a fazer? Nós temos estado a procurar pistas da tua mãe mas...
A voz dele esmoreceu lentamente ao ver o que ela segurava nas mãos. Rhiara mordeu a própria língua para não praguejar, amaldiçoando-se a si mesma por não ter guardado logo a Varinha. Colocou-a rapidamente dentro do bolso do seu manto e olhou para Carlos com uma expressão muito séria, a voz firme ao dizer:
- Carlos, tens de me deixar ir.
- Mas... O que estás a fazer? Alguém sabe que estás aqui? Audrey deve estar preocupada... e a Evie...
- Carlos...
- Rhiara, porque é que estás a roubar a Varinha da Fada Madrinha? - questionou o rapaz finalmente, a voz muito séria e os braços cruzados em frente ao peito.
- Eu não te posso responder a isso. - disse Rhiara, pesarosa - Carlos, por favor, confia em mim. Tens de me deixar ir.
- Estás em sarilhos? - questionou Carlos, arregalando os olhos - Precisas de ajuda? Talvez deva avisar o Ben...
- O quê?! Não! - a princesa segurou-o pelos ombros, apertando-o ligeiramente ao dizer - Por favor, Carlos, pela nossa amizade, por tudo o que é mais sagrado... Faz de conta que não me viste, está bem?
- Mas estás a roubar a Varinha... Se alguém me perguntar se vi alguma coisa... Rhia, eu não posso mentir à Jane.
- Não precisas. Só... esquece que me viste. Não é exatamente uma mentira, certo?
O tempo estava a contar e Rhiara remexeu-se nervosamente. Poderia empurrá-lo e simplesmente passar por ele mas Carlos era seu amigo, sempre fora gentil com ela e não era justo fazer isso. Também não era justo pedir-lhe o que estava a pedir mas não tinha outra opção.
- Por favor, Carlos. - implorou, olhando piedosa para o amigo - Se eles perguntarem, diz que fui eu. Não precisas mentir. Mas por agora... Por agora deixa-me ir e dá-me uns minutos para sair daqui. - fez uma pausa, encarando o filho da Cruela de Vil com um pedido nos olhos - Eu preciso que confies em mim. O que estou a fazer é por uma razão muito forte. Tu sabes que nunca faria isto só porque sim.
Carlos permaneceu quieto por uns minutos. Parecia hesitante, olhando para a amiga como se não soubesse exatamente o que fazer. Depois, soltou um suspiro, desviando-se para o lado e tapando os olhos com as maos enquanto dizia:
- Fiquei cego de repente e não vi nada nem ninguém. - baixou o tom de voz, num murmúrio - Tem cuidado, Rhia.
Com um suspiro de alívio, Rhiara passou por ele, não sem antes lhe dar um abraço rápido e agradecer do fundo do coração aquele gesto de amizade.
Rhiara correu pelos corredores, passando no refeitório. Queria verificar que estava tudo bem e dizer aos amigos que tinha conseguido o que precisava. Quando lá chegou e viu a bagunça que os piratas tinham feito, não conseguiu esconder a risada rápido o suficiente para disfarçar.
Em pé nas mesas, os três piratas dançavam e cantarolavam uma qualquer música de marinheiro, os braços dados e as pernas erguendo-se em sintonia. Os pés batiam em qualquer coisa que encontrassem: talheres, pratos, copos... Um monte de loiça partida jazia no chão do refeitório e ninguém sabia exatamente o que fazer, já que sempre que os tentavam agarrar eles fugiam e esgueiravam-se como só bons piratas eram capazes de fazer. Depois, voltavam ao mesmo, cantando e dançando como se tivessem emborcado vários litros de rum.
A Fada Madrinha encontrava-se ali, berrando e esbracejando para que eles parassem. Ao seu lado, Audrey adotara a sua melhor postura de princesa mimada e protestava, com uma voz falsamente doce:
- É por isto que acho que eles nunca deviam ter saído da Ilha. Que pouca vergonha!
Quem a conhecesse tão bem como Rhiara iria reconhecer a sombra de riso que tentava surgir nos lábios de Audrey mas a princesa mantinha a sua postura, os olhos castanhos fixos na figura descontraída e dançante de Uma enquanto mantinha o seu papel, como se olhar para a pirata a deixasse mais concentrada na sua missão.
Rhiara soltou um suspiro, aliviada. Eles estavam bem. Tinham sido bem sucedidos e a Varinha estava nas suas mãos.
O relógio da torre mais alta do castelo de Auradon deu as doze badaladas do meio dia e Rhiara soube que estava na hora.
Uma troca de olhares foi tudo o que bastou para Harry saber as intenções de Rhiara. A expressão da princesa alterou-se e ela viu-o baixar os braços e arregalar os olhos azuis, o horror espalhando-se pelo seu rosto.
- RHIARA! - gritou, saltando da mesa de imediato.
Rhiara prensou os lábios e correu. Num gesto rápido, colocou a Varinha no bolso de dentro do seu manto vermelho e assobiou, esbracejando para afastar as pessoas por quem passava, empurrando bruscamente as portas da Escola de Auradon em direção à rua.
Maximus apareceu de imediato, respondendo ao chamado de Rhiara e irrompendo pelos arbustos adentro, permitindo que a sua princesa o montasse com rapidez. A filha da Rapunzel afagou-lhe a crina, grata pelo cavalo estar por perto e por aparecer tão depressa.
- Para a Ilha, Maximus.
O cavalo olhou para ela pelo canto do olho, claramente desaprovando o rumo que ela traçara. Rhiara esboçou um sorriso, abrindo a boca para dizer algo mas sendo interrompida pelo som da voz que sempre acelerava o seu coração. Virou-se para trás, vendo o pirata que amava chamá-la, o corpo esguio e veloz tentando alcançar o ritmo de Maximus, numa tentativa vã. Rhiara engoliu o choro, pensando quão injusta tinha sido com ele. Como pudera achar que Harry não tinha sentimentos verdadeiros por ela? Como pudera sentir raiva dele?
- RHIARA! - gritou Harry, correndo atrás dela - RHIARA, ESPERA!
- NÃO POSSO! - gritou de volta, com lágrimas nos olhos - EU TENHO DE FAZER ISTO SOZINHA! - baixou a voz, sentindo um aperto no peito - Lamento muito, Harry...
Ela virou-se para a frente, fechando os olhos para bloquear o som da voz do pirata. Com um grito, incentivou Maximus a acelerar, deixando Auradon para trás, rumo à Ilha, a Varinha firmemente junto de si. O tempo estava a acabar. O sol ia bem alto e, se não chegasse a tempo de fazer o que Gwendolyn queria, perderia a mãe e Rhiara não estava disposta a isso. Também não estava disposta a arrastar os amigos e as pessoas que amava para uma situação em que com certeza seria presa... ou pior.
Ressuscitar almas era um crime e Rhiara estava prestes a fazê-lo.
Quando Harry chegou esbaforido à Ilha dos Perdidos, já Rhiara desaparecera.
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