06
O alarme do despertador de Minjeong disparou e ela se apressou em silenciá-lo. Não precisava dele. Acordara há uma hora, com a mente em disparada. Com o amanhecer, toda a magia e o mistério da noite se desvaneceram, e viu-se obrigada a encarar o que havia acontecido.
A noção de ter se deixado levar por uma total estranha era mais eficaz para despertá-la do que um balde de água fria.
Onde estava com a cabeça? Jamais havia feito algo assim. Sempre fora muito cuidadosa. E ainda bem que aquela mulher se mostrara complacente e tinha ido embora, mas, e se tivesse se tornado agressiva, seu estômago embrulhava só de pensar.
Quando a encontrasse de novo lhe perguntaria quem realmente era, e rezaria para ouvir a resposta que esperava. E também para que fosse sincera.
Talvez, se tivesse mais preocupada com as questões racionais em relação ao seu aparecimento e não com o que ela lhe provocava, teria tomado mais cuidado. Mas, quando fora a última vez que se sentira fascinada por alguém? Fazia muito tempo. Muito mais do que poderia imaginar.
A quase inexistência de uma vida sexual se devia mais a seu desinteresse do que a qualquer tipo de barreira moral. Os homens e as mulheres, simplesmente, não ocupavam um lugar privilegiado em sua lista de prioridades.
Sempre se perguntava se havia algo errado com ela, especialmente quando via casais de mãos dadas na rua. A maioria das pessoas de sua idade saía com muita frequência, tentando encontrar alguém para casar. Mas ela não. Até agora, não havia sentido a necessidade de estar com alguém, e inclusive tinha pensado na possibilidade de ser assexual.
Assim sendo, a noite anterior havia sido uma autêntica revelação.
Espreguiçou-se, sentindo uma tensão nas costas. Fechando os olhos, tentou se preparar mentalmente para mais um dia de trabalho. Ter que lidar com seu editor-chefe era de longe o que ela queria e essa simples percepção já foi suficiente para desanimá-la.
Com um gemido, pôs-se de pé e foi até o banheiro. Mais uma vez pegou-se pensando sobre a noite anterior. Quem poderia ser Yu Jimin? Como ela realmente conseguira o seu endereço? Porque se recusava a acreditar naquela história sobre seu pai biológico.
Talvez ela fosse da polícia? Nunca a vira, mas não conhecia todo o pessoal da delegacia.
Devia ser uma policial da divisão de entorpecentes. Ou, talvez, uma chefe da SWAT. Porque, sem dúvida, parecia do tipo durona que procurava problemas e fazia os marginais pagarem caro.
Depois de um banho rápido e de um café da manhã ainda mais rápido – composto por um punhado de cereais e uma caixinha de suco – encaminhou-se para a Printed Dreams. A direção da editora, depois de sofrer bastante pressão por parte do seu editor-chefe, decidiu adiar a publicação do manuscrito em que ela vinha trabalhando, mas Minho aproveitou a oportunidade para avançar com o trabalho editorial que estava sib sua responsabilidade. Ainda que também não fosse chegar a lugar algum assim.
Era por essas e outras coisas que a ideia de ir embora de Seul parecia mais atraente a cada dia. Ela suspirou, sequer tinha ânimo para ficar irritada com aquilo.
Ela alongou as costas e passou os olhos pelo escritório.
Por que Yu Jimin não entrara em contato com ela até agora? Na véspera ela parecia tão ansiosa para conversar.
Provavelmente ela desistiu depois do comportamento dela, sempre muito brusca e não deixando ninguém se aproximar. Minjeong desconsiderou os seus sentimentos, pensando que aquilo era ridículo e tentou voltar ao trabalho.
Passara meia hora em sua mesa olhando o protetor de tela com o olhar perdido quando o telefone tocou. Era Somi.
– Tivemos outra noite ocupada – disse ela, bocejando.
– Outro cadáver?
– Não, mas como as investigações não estão avançando muito tivemos que seguir por várias linhas de raciocínio. Estou livre agora se quiser tomar um café.
Apenas dois minutos após desligar o telefone, estava na rua. Decidiu que era melhor ficar fora do jornal do que ter que lidar com toda a falta de ética que existia naquele lugar.
Enquanto caminhava para a delegacia, ressentiu-se do impiedoso frio da manhã e procurou por um cachecol na sua mochila. Como não foi suficiente para abrandar aquele clima, precisou apressar o passo. Foi um alívio entrar na delegacia aquecida e iluminada.
Dessa vez ela teve mais sorte e conseguiu encontrar Somi enquanto ela saía do seu escritório.
A detetive sorriu para ela amigavelmente, passando a mão em seus longos cabelos claros.
– Temos de deixar de nos encontrar assim.
– Não tenho culpa se nossas rotinas não facilitam isso.
– Acho que vou sair de férias assim que fechar esse caso.
– Falando nisso, você tem algum comentário, detetive?
– Já fizemos uma declaração esta manhã.
– O que, sem dúvida, não esclareceu absolutamente nada. Ora, vamos, não pode acrescentar algumas palavras para mim?
– Não entendo porque você tem tando interesse nisso.
– Talvez porque sou uma cidadã preocupada?
Somi tirou um chiclete do bolso, abriu a embalagem metodicamente, dobrou a tira pálida na boca, e começou a mascá-lo. Minjeong se lembrava de já tê-la visto fumando, porém, nos últimos tempos, não. O que, provavelmente, explicaria tantos chicletes, um atrás do outro.
– Não é como se eu fosse compartilhar essas informações com alguém, Somi – ela disse. – Eu juro.
A detetive assentiu.
– Então, precisamos conversar a portas fechadas.
O escritório dela era aproximadamente do tamanho do cubículo onde Minjeong trabalhava na editora, mas, pelo menos, tinha porta e janela. Entretanto, sua mobília não era tão boa como a dela. A mesa de madeira estava tão gasta que parecia ter sido utilizada como bancada de trabalho por um carpinteiro. Havia partes lascadas na superfície, e o verniz estava tão arranhado que absorvia a luz fluorescente como se estivesse sedento.
Jogou-lhe um arquivo antes de se sentar.
– A vítima mais recente foi encontrada atrás de um monte de latas de lixo. A maior parte de seu sangue terminou na sarjeta, mas o médico-legista encontrou traços de anabolizantes em seu organismo. Estava sem qualquer tipo de identificação, mas isso não é precisamente uma novidade.
– Esses assassinos tem mesmo uma preferencia por dilacerar os pescoços – disse Minjeong, olhando uma horrenda fotografia e deixando-se cair sentada na cadeira.
– E sempre fazem um excelente trabalho em cobrir rastros – Somi soltou um palavrão –, não vamos chegar a lugar algum nesse ritmo.
– Não existe mesmo nada que ligue esse caso aos anteriores?
– Apenas o fato de que as vítimas parecem ser pessoas que não pertencem a sociedade. No último ano foram poucas as que conseguimos identificar.
– Ouvi que a polícia está associando essas mortes ao crime organizado.
– Embora suspeitemos de que tudo isso está relacionado a uma guerra oculta no mundo do narcotráfico, não temos provas concretas o suficiente para apontar culpados – disse Somi, tornando-se pensativa enquanto a olhava. – Importa-se se eu perguntar por quê ainda está tão interessante nesse assunto?
– O que você acha? Tenho que fazer o meu trabalho informativo para que algum colega da editora leve o crédito pelo trabalho editorial na publicação de algum romance policial – ela fechou o arquivo e o deslizou pela mesa. – Encontraram alguma arma diferente durante a investigação?
Os olhos dela se estreitaram, mas não de forma rude. Parecia estar decidindo se a deixaria mudar de assunto.
– Alguma arma? – insistiu ela.
– Uma espécie de adaga foi encontrada em uma das cenas de crime há alguns meses. Tinha vestígios de sangue, mas não o da vítima. Também encontramos resíduos de pólvora em dois lugares diferentes, como se houvesse acontecido uma troca de tiros. Embora seja difícil imaginar que os assassinos quisessem atrair atenção.
– Acredita que casos assim vão continuar a acontecer?
A detetive deu de ombros.
– Provavelmente sim. Nem mesmo o anúncio público da atuação da polícia referente a esse caso fez com que parassem de agir.
Minjeong fechou os olhos, lembrando-se do que sua convidada noturna havia lhe dito, sobre ela estar correndo perigo. Não tinha se atentado a esses fatos até aquele momento.
– Mas pode ser também – disse Somi – que isso seja só o começo de alguma coisa mais séria.
Ela ouviu quando a cadeira da policial deslizou para trás e ergueu a vista enquanto ela rodeava a mesa e se aproximava.
– Acho que estou te devendo um café, não? – Perguntou ela.
– Será? Meio que não me recordo.
– Então isso significa que veio aqui apenas para conseguir informações. – Ela levou a mão ao peito, fingindo estar magoada. – Quanta crueldade senhorita Kim.
Elas sorriram enquanto Minjeong se levantava e as duas se encaminhavam para fora do escritório.
– Você tem algum plano para hoje à noite que não seja trabalhar? – Perguntou Somi. – Sério, falo isso como sua amiga, mas você precisa desacelerar um pouco, Minjeong.
– Eu sei, mas não tenho nenhum plano. Devo apenas ficar em casa como da última vez.
Embora não tivessem uma relação estritamente profissional, ela não achou adequado dizer que tinha sim outros planos em mente, como por exemplo... Manter sua agenda livre no caso de a mulher de roupas prestas querer vê-la à noite, além daquela manhã também.
Que boba: um encontro qualquer e já pensava que havia algo entre elas? Tinha de ser realista.
Somi sorriu cinicamente.
– Um dia desses ainda descubro se você não está mesmo é ocupada com alguém.
– Para uma detetive, sinto em lhe informar que não poderia estar mais enganada. Talvez umas férias sejam mesmo bem vindas para você, Somi.
A expressão atenta do rosto de Somi se suavizaram. Quando seus olhos a olharam fixamente, Minjeong pensou que era um desperdício não se sentir atraída por ela.
– E poderia falar com uma das suas colegas de trabalho sobre os métodos suspeitos dela – disse, pendurando a alça da mochila no ombro –, sinceramente, estou até agora tentando entender o que aconteceu.
Somi franziu o semblante.
– Minha colega de trabalho?
– Você sabe. Aquela que parece um pesadelo gótico. Diga-me: ela é da divisão de entorpecentes, não é?
– De que diabos está falando? Eu não conheço ninguém que se enquadre nessas características.
O sangue gelou em seu corpo.
E a crescente suspeita e alarme no rosto de Somi a impediram de tentar lhe refrescar a memória.
Dirigiu-se para a porta.
– Eu me enganei.
Somi a segurou pelo braço.
– Quem diabos esteve em seu apartamento ontem à noite?
Quem dera soubesse.
– Ninguém. Como disse, eu me enganei. Vejo você depois.
Apressou-se em atravessar o vestíbulo, com o coração disparado. Ao sair do prédio, fez uma careta quando a brisa gélida bateu em seu rosto.
Uma coisa era certa: por nada no mundo iria se encontrar com aquela mulher naquela manhã, embora o número dela estivesse gravado no seu celular.
\[...]
Por volta das cinco da tarde, Jimin estava a ponto de explodir. Não pudera retornar ao apartamento de Minjeong como planejara.
E ela não entrara em contato.
O fato de que não tivesse feito isso podia significar duas coisas: ou algo tinha acontecido, ou a estava evitando.
Consultou o relógio de pulso. Faltava muito tempo ainda para que saisse do trabalho.
Foi até o banheiro, passou uma água no rosto, e apoiou os braços sobre a bancada de mármore. À luz colocada perto da pia, olhou-se fixamente, vendo os longos cabelos negros, os traços do seu rosto e seus distintos olhos.
Estava exausta. Não pregara os olhos o dia todo, e a noite anterior tinha sido como um choque de trens.
A não ser pela parte com Minjeong. Aquilo fora...
Praguejou e entregou os pontos.
Que diabos estava acontecendo com ela? Ter se encontrado com aquela mulher fora o pior de tudo o que havia suportado na noite anterior. Graças àquele pequeno momento, sua mente estava dispersa, seu corpo, em perpétuo estado de excitação, e seu humor, péssimo. Pelo menos, ao último já estava acostumado.
A noite anterior havia sido um desastre total.
Depois de deixarem a reunião da Irmandade, Aeri e ela foram ao outro lado da cidade dar uma olhada na oficina mecânica. Estava muito bem trancada, e, depois de examinarem o exterior e forçarem a entrada, haviam chegado à conclusão de que já não era usada como centro de operações. Além disso, o bairro não serviria a tais propósitos. Perto dali, havia duas lanchonetes abertas 24 horas, e uma delas era frequentada por policiais. Estariam muito expostos.
Aeri e ela estavam voltando para sua residência quando encontraram um problema.
A partir daí, as coisas só pioraram.
Em uma viela proxima a zona portuaria de Seul, um lupino civil se encontrava gravemente ferido, com dois Inquisidores junto a ele dispostos a terminar o trabalho. Matar os Inquisidores levou algum tempo, porque ambos eram experientes. Quando a luta terminou, o outro lupino já estava morto.
Haviam se divertido cruelmente com o jovem, seu corpo mais parecia uma almofada de alfinetes coberto de punhaladas pouco profundas. A julgar pelos arranhões nos joelhos e a sujeira nas palmas das mãos, havia tentado fugir várias vezes, arrastando-se.
Imediatamente após eliminarem os corpos dos inquisidores, ouviu-se o som estridente das sirenes da polícia, o que significava que alguém chamara o 911 ao escutar a briga ou os tiros. Só tiveram tempo de colocar o cadáver do lupino no carro de Jimin e partir a toda velocidade.
Na casa de Jimin, Aeri examinou o corpo. Na carteira do jovem havia uma tira de papel com caracteres no antigo idioma. Nome, endereço, idade.
Uma hora antes do amanhecer, levaram o corpo até os arredores da cidade, para uma bela casa situada no bosque. Um casal de lupinos atendeu à porta, e seu patente terror ao encontrar do outro lado dois guerreiros deixou Jimin muito aborrecid. Quando confirmaram que tinham um filho, Aeri retornou ao automóvel e recolheu o corpo. O pai saiu correndo em direção ao filho morto e o tomou dos braços de Aeri, enquanto Jimin segurava a mãe, que desmaiara.
O fato de que aquela morte houvesse sido vingada tranquilizara um pouco o pai.
Mas não parecia ser suficiente, não para Jimin.
Queria ver todos os inquisidores mortos antes de finalmente descansar.
Jimin fechou os olhos, tentando esquecer os acontecimentos da noite anterior.
Uma batida ritmada na porta chamou a atenção, e ela tornou a colocar sua venda e caminhou até lá.
– O que aconteceu, Sunoo? – Perguntou, abrindo a porta.
O assistente entrou com uma bandeja.
– Tomei a liberdade de lhe preparar algo para comer, minha senhora.
Sunoo depositou a bandeja na mesa diante do sofá. Quando ergueu a tampa da travessa, Jimin sentiu o cheiro de frango e ervas finas.
Então, deu-se conta de que estava faminta.
Foi até o sofá, sentou-se, e pegou um garfo.
– Você se empenhou mesmo, não é?
– Oh, sim. Só o melhor para minha senhora.
O assistente aguardou enquanto Jimin se concentrava em separar a carne dos ossos usando os talheres. Boas maneiras eram o seu forte.
– O frango está do seu agrado, lider?
Jimin assentiu enquanto mastigava.
– Você é um cozinheiro muito bom.
– Alegro-me muito que tenha decidido ficar.
– Não por muito tempo. Mas, não se preocupe, terá de quem cuidar – Jimin afundou o garfo em um purê de batata. – E será muito mais fácil conviver com ela do que comigo.
– Prefiro cuidar da senhora.
Jimin limpou a boca com um guardanapo de linho.
– Sunoo, não perca seu tempo tentando me agradar.
O assitente deixou escapar uma leve risadinha.
– Baekhyun tinha muita razão a seu respeito, minha senhora.
– Por acaso ele dizia que sou uma miserável arrogante? Sim, ele era muito perspicaz, isso é certo. Nunca consegui entender por que gostava tanto de permancer ao meu lado.
Ainda que Baekhyun fosse o melhor amigo dos seus pais, ninguém podia ficar tão desesperado por companhia a esse ponto.
– Era por sua causa.
Jimin estreitou os olhos atrás da venda escura.
– Sério?
– Preocupava-se com o fato da senhora ser tão solitária. Vivendo sozinha, sem uma verdadeira companheira, sem um amigo. Costumava dizer que seu isolamento era um castigo autoinfligido.
– Bem, não é – a voz de Jimin cortou o suave tom do assitente –, e se quiser continuar aqui, deverá guardar suas teorias psicanalíticas para si, estamos conversados?
Sunoo estremeceu como se tivesse levado um soco. Fez uma reverência e começou a se retirar do quarto.
– Minhas desculpas. Foi grosseiro e inadequado de minha parte dirigir-me a senhora como fiz.
A porta se fechou silenciosamente.
Jimin se recostou no sofá, segurando o garfo na mão.
Caramba! Aquele assitente as vezes tinha a capacidade de enlouquecê-la. E ela não era solitária, nunca fora.
Infelizmente esse pensamento a vez se lembrar mais uma vez de Minjeong. Esperava que ela estivesse viva e bem. Do contrário, Deus tivesse piedade de quem lhe tivesse feito mal.
E se havia decidido evitá-la? Isso não importava. Voltaria a encontrá-la mais cedo ou mais tarde.
Pensou na pele macia de seu pescoço. Recordou a sensação de seus dedos acariciando-lhe a veia que saía do coração.
Jimin fechou os olhos quando seu corpo começou a se agitar.
Aquela mulher era perigosa para ela. Se a afetava daquela forma sem ao menos estar por perto, podia perfeitamente ser sua perdição.
Jimin passou a mão pelo cabelo. Que maldita ironia que ansiasse por estar com ela coisa que nunca sentira por nenhuma outra mulher.
Droga. Precisava tirar Minjeong de sua responsabilidade, e rápido.
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