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Capítulo XIV - Verdade Nua e Crua

- Gostaria de juntar-se a nós, Channing? - Dra. Maylor perguntou amavelmente ao homem que permanecia estático, poucos passos depois da entrada da biblioteca.

- Eu... - Ele ponderou por um instante antes de continuar. - Bem, não quero atrapalhar. Só estava de passagem e não fazia ideia de que estariam aqui.

Alice revirou os olhos e voltou-se na direção da terapeuta, com um suspiro impaciente.

- Acho que será bom para todos nós se tivermos uma versão bilateral sobre o assunto. - A mulher incentivou, ignorando o olhar de reprimenda que Alice lhe oferecia. - O que acha?

- Não sei... - Ele hesitou. - Alice?

- Tanto faz... - A jovem desdenhou.

Ele deu de ombros, mas não se moveu.

- Se Alice não se incomoda, insisto para que fique, Channing. - Pontuou a ruiva.

Sem falar nada, o ator caminhou discretamente até o sofá e sentou-se ao lado de Alice. A jovem não conseguia olhar para ele, tamanha irritação que arrebatava seu íntimo. Não queria que ele estivesse ali, e não calculou bem as consequências de tê-lo envolvido em sua consulta médica assim, abruptamente.

- Como você está? - Maylor concentrou-se em Channing.

- Eu... - Ele pensou um pouco antes de responder. - Culpado. Impotente. Consternado...

- Preso. - Alice resmungou.

- Ansioso, inquieto. - Ele ignorou sua alfinetada e concluiu o raciocínio.

- São muitos adjetivos, não é? - A mulher ruiva observou, mas os olhos estavam fitos nos de Alice.

- O que espera que eu diga, Dra? Que sinto muito por ele? - Alice inquiriu. - Não sinto por ele.

- Ninguém espera isso de você, Alice. Você é a vítima aqui!

Channing tomou a frente e respondeu, virando o corpo no sofá para encará-la e obrigá-la a olhar em seus olhos claros. O cenho franzido, numa mania que ele não percebia, mas que fazia parte de sua personalidade. Observar isso fez um pequeno sorriso brotar nos lábios da jovem.

- Qual a graça? - Ele quis saber.

- Sua sobrancelha está franzida. - Ela explicou e ele fez uma expressão confusa. - Você sempre faz isso e eu acho engraçadinho.

- As coisas não estão engraçadas por aqui, você sabe.

- E o que quer de mim, Channing? - Ela voltou-se na direção dele, finalmente disposta a conversar. - Não sinto que sou eu mesma, não sou capaz de superar este problema. Sinto como se fosse um peso na sua vida, uma eventualidade que você não consegue controlar.

- Controlar você seria impossível mesmo! - Ele devolveu, irritado.

- E pra que você quer me controlar?

- Pra você comer? Pra você sair de dentro desta casa? Pra você voltar a ser sociável, como era no início? - Ele despejou as palavras de uma vez só.

Alice o encarou assustada com a sinceridade repentina, mas ele sustentou o olhar, então ela voltou-se para Maylor, que permanecia alheia, como se não estivesse presenciando a discussão de ambos.

- Eu preciso voltar a ser sociável para você esquecer a culpa que sente?

- O que você quer que eu faça, Alice? - Channing escondeu o rosto entre as mãos. - Eu cometi um erro. Fui o infeliz que atropelou você, mas eu não decidi isso! Estou arrependido, mas não sei o que posso fazer parar reparar isso. Me diz então! Diz o que você quer!

- Nada! - Alice começou a sentir o queixo tremer, involuntariamente. - Eu não sei... É tudo confuso e sombrio na minha cabeça.

- Então deixa eu te ajudar. - Ele pegou a mão dela e prendeu entre as dele. - Como posso ajudá-la?

- Alice... - A Dra. Maylor chamou atenção da jovem, que a olhou imediatamente e puxou a mão que estava presa pelas de Channing. - Diga a ele o que estava falando para mim. Conclua seu pensamento.

- Eu não posso... - Ela sussurrou, baixando os olhos.

- Por que não? - Maylor e Channing perguntaram ao mesmo tempo.

- Porque é errado.

Channing levantou-se de um salto. Virou-se na direção dela e esticou o dedo em riste, olhando-a fundo dentro dos olhos escuros.

- Você é muito covarde. Como as coisas não ficaram claras mais cedo? Errado? Errado? Isso é o melhor que você consegue imaginar? Por Deus! Você se intitula escritora, deveria ser mais criativa. Não existe certo ou errado no que estamos vivendo, existe verdadeiro ou falso. - Ele passou a mão pelos cabelos, num gesto de impaciência. - Isso aqui é a coisa mais falsa que já vivi, e olha que minha profissão me permite muitas loucuras. Mas você conseguiu superar todas as realidades alternativas que já vivi!

Alice recebeu o impacto das palavras dele, mas não teve tempo de digerir, porque ele deu as costas para as duas mulheres e começou a andar em direção à porta.

- Espera um pouco! Você não vai sair assim! Você não vai jogar este monte de lixo em cima de mim, e simplesmente sair de cena! - Movida pela raiva, Alice ergueu-se do sofá, e seguiu atrás dele, deixando Maylor chocada e sem reação. - Channing! Eu estou falando com você! - Ela apressou o passo e segurou no braço dele.

O moreno paralisou no mesmo instante que a mão fria e macia tocou seu braço.

- Olha pra mim! Você vai olhar para mim enquanto brigo com você!

O homem virou-se na direção de Alice na hora, encarando-a chocado.

- O que foi? Você está passando mal? - Ela não estava compreendendo a expressão de assombro no rosto dele. - Channing, você está pálido, perdeu a cor, o que está havendo?

Depois de um minuto de silêncio na biblioteca, um grito agudo e desesperado, seguido por um enorme barulho de bandeja caindo no chão e de porcelana se quebrando, chamou atenção de todos. Lois estava parada alguns metros à frente do casal, perto da porta de entrada.

- Você está de pé!!! - Lois conseguiu gritar. - Você está andando! Você está andando outra vez!!!


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