XII - O Preço
Helena estava parada no batente das portas do refeitório. Já tinha depositado a bandeja na bancada e apenas observava o outro lado do refeitório. O objeto de sua atenção era Gil, que comia com um grupo pequeno de amigos. Não que Helena tivesse deduzido o tipo de laço pela forma como interagiam. Em geral, eles pouco falavam com a garota, dando à Helena a impressão de que ela era mais uma intrusa do que alguém próximo.
Eles também eram o motivo pelo qual Helena estava parada, sem fazer coisa alguma. Sabia o que tinha que fazer: pedir desculpas à Gil pelo comportamento grosseiro. Ela, entretanto, não imaginou que talvez tivesse que interagir com outros, mesmo que a interação em questão fosse um simples "Com licença, posso falar com a Gil?".
"Você consegue, Helena. A Gil merece um pouco de esforço", falou mentalmente para si mesmo. E uma grande parte dela sabia que era verdade. Parte grande o suficiente para que ela movesse os pés em direção à mesa. Será que alguém poderia escutar as batidas do seu coração? Ela apostava que até um humano normal sentiria o cheiro do seu medo.
Antes que pudesse pensar em desistir, ela já tinha chegado ao seu destino. Assim que parou, 5 pares de olhos se viraram, sendo um deles os de Gil. Ficou zonza porque os outros quatro eram incandescentes e mudavam de cor a cada cinco segundos.
Helena abriu a boca, fechou e abriu de novo. Não conseguiu pensar em nada que não fossem aqueles olhos.
– Helena? – Gil a chamou quando ela estava prestes a desmaiar. Se concentrar nas pupilas escuras da menina era uma benção. – O que você está fazendo aqui?
– Eu... ahn... posso falar com você?
– Eu não sei... – Ela se virou para uma garota que estava ao seu lado. Não conseguiu ver o rosto dela, apenas um véu de longos cabelos dourados. Tentando não perder o foco de novo, ela se concentrou em Gil.
– É só um minuto, prometo que não vai se arrepender. – Helena insistiu, já ficando nervosa com os olhares que ela sabia que estava recebendo.
– Escuta aqui, você não é a garota que chamou todo mundo de aberração? – Um dos rapazes da mesa apontou para ela.
Embora seus olhos também variassem de cor, ele tinha um rosto extremamente bonito. Tão bonito que parecia deslocado no meio de todos aqueles adolescentes. Não os daquela mesa, Helena percebeu. Todos ali eram anormalmente bonitos, fazendo Gil e o resto da escola parecerem medíocres.
– Eu estou achando que a nossa Gil aqui não quer falar com você. – Ele continuou, ainda apontando o dedo para Helena.
– Isso é um problema meu, Dimitri. Pode deixar que eu resolvo. – Gil o cortou, se levantando. Ela acenou para a garota ao seu lado, que devolveu o gesto, e depois pegou Helena pelo braço.
Embora ainda estivesse assustada, a garota não pôde impedir que algumas palavras saíssem da sua boca.
– O que eles são?
– Ahn?
– O que eles são? Ninguém pode ser tão bonito assim por nada. – Disse, olhando por cima do ombro. Os alunos da mesa as observavam sair do refeitório.
– São metamorfos. – Respondeu com a voz emburrada.
– Eu sinto muito – Helena disse ao notar o tom da menina – eu não quis ofender. Não sabia que era errado perguntar...
– Ah, pelo amor de Deus, não é errado. Pare de agir como se isso importasse pra você. – Gil cuspiu assim que elas pararam em um corredor vazio. – Veio para pedir desculpas?
– Na verdade sim. – Disse, surpresa.
– E o que me faria crer que são sinceras? Ninguém pode mudar tanto em poucas horas. – Ela disse, cruzando os braços.
– Eu sei, eu fui uma babaca. Eu não devia ter agido daquela forma com você e com Caroline. Eu machuquei os sentimentos de vocês e, na hora, eu sabia que estava fazendo. Só que eu estava com medo e chateada e estressada...
– Isso são justificativas. – Gil a cortou.
– Como disse?
– São justificativas e – respondeu mais lentamente – justificativas não são desculpas. Não importa o quão triste, chateada ou estressada você esteja, isso nunca te dá o direito de machucar outra pessoa. Não é justo descontar nos outros qualquer que seja a injustiça que tenham feito contra você. Isso não te dá o direito, Helena.
– Me desculpa. O que eu fiz foi errado e eu sei disso. Você tem todo o direito de não me perdoar, porque eu, de fato, não mereço. Mas eu vou fazer o que estiver ao meu alcance pra poder reparar o meu erro. – Helena respondeu, desolada. Sabia que Gil estava certa e, só agora, percebia o quanto ela tinha sido estúpida. Agora só restava esperar poder consertar o que tinha feito.
– Seja minha amiga, então.
– Ser sua amiga? – Helena repetiu, confusa. Na verdade, vinha fazendo bastante isso.
– Você disse que quer reparar o seu erro. Como pessoa prejudicada, eu decido como será feito. – Gil disse, decidida, e estendeu a mão. – Seja minha amiga. Esse é o meu preço.
– Mas... mas eu não mereço!
– Não é sobre você, é sobre mim. Vamos, não seja egoísta.
A garota deixou que um sorriso se abrisse em seu rosto. Embora estivesse tentando parecer determinada, os olhos de Gil estavam suspeitosamente brilhantes. Lentamente, Helena ergueu seu braço e apertou a mão da outra.
Imediatamente o aperto de mãos se tornou um abraço e, pela primeira vez, Helena não sentiu medo.
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