september 23th, 2010
Bad at love, no, I'm not good at this
But I can't say I'm innocent
Not hardly
But I'm sorry
The Prologue
Annabeth
Em quase vinte anos de vida, não houve uma só noite em que eu não tivesse achado o ato de sonhar extremamente curioso.
O jeito que meu subconsciente decidia funcionar sempre havia prendido minha atenção, trazendo memórias antigas à tona e criando situações surreais. Também ficava espantada com como diferentes partes do meu dia se mesclavam e teciam uma realidade extraordinária. Com como pessoas aleatórias apareciam nos cenários mais absurdos possíveis, mesmo que eu não as tivesse visto em séculos.
A mente era um lugar verdadeiramente fascinante.
Então, há alguns meses, comecei a tentar programar meu cérebro para ter sonhos lúcidos, já que, com a velocidade em que meus pensamentos funcionavam, a perspectiva de treinar meu subconsciente para fazer o impossível era, no mínimo, tentadora. Eu poderia esquiar nas nuvens, encontrar a cidade perdida de Atlântida, viajar ao centro da terra ou até mesmo fazer magia.
Todas as minhas tentativas haviam sido falhas até o momento, mas houve ocasiões onde eu percebia que estava em um sonho e acordava, me lembrando de tudo que tinha feito e falado. E, por mais que eu ainda não tivesse conseguido controlar o rumo da minha consciência enquanto dormia, a vida real parecia um sonho o suficiente para me manter intrigada.
Senti o peso do meu corpo bambear no colchão com um movimento e logo abri os olhos, vendo a silhueta de Luke sentada na beira da cama. Os músculos das suas costas estavam relaxados, suaves de uma forma que só uma boa noite de sono poderia proporcionar, e seu cabelo estava completamente bagunçado, amassado pelo contato com o travesseiro.
Me apoiei nos cotovelos e ergui o corpo para cima, vendo um sorriso preguiçoso ocupar seu rosto ao virar a cabeça em minha direção. Depositei um beijo no seu ombro, observando com adoração como sua respiração mudou de ritmo.
— Bom dia, marido - comentei, movendo os beijos para o seu pescoço com leveza. Meus braços passaram ao redor de sua cintura e senti suas mãos se agarrarem a mim.
— Que eu saiba, só vou ser seu marido depois que você me disser sim naquele altar — ele respondeu, virando a cabeça e inspirando com força, como se tentasse sentir o aroma do meu cabelo. — Inclusive, a gente não deveria se ver hoje, não é mesmo? Dá azar.
— Eu não acredito nessas superstições idiotas — respondi, me movendo para depositar um beijo em sua boca. — E de qualquer forma, o casamento já é hoje à noite. O que são algumas horas de diferença?
— Exatamente, o casamento é só hoje à noite — ele comentou, capturando meus lábios em um beijo rápido antes de se afastar. Meu corpo pareceu vazio no mesmo instante, ficando frio com a separação repentina. — E eu ainda preciso resolver muita coisa antes dele. Tenho que passar na casa do meu pai e preciso me arrumar, sem contar todos os paparazzi que eu vou ter que despistar no caminho. Não posso ficar mais tempo aqui na cama com você.
— Nem mais um pouquinho? — perguntei, cruzando as pernas e forçando um biquinho de decepção. — A cama fica tão fria sem você.
— A gente nem deveria ter dormido na mesma cama hoje, Annie — ele franziu o nariz, olhando ao redor do quarto para encontrar os pedaços de roupa espalhados pelo chão. Suas meias estavam emboladas dentro dos tênis esportivos, mas sua camiseta estava jogada na entrada da suíte.
— Pelo menos, depois de hoje, a gente vai poder dormir na mesma cama todos os dias — comentei me espreguiçando, finalmente acordada o suficiente para querer levantar da cama. O sorriso preguiçoso voltou a tomar seus lábios e ele se abaixou para um selinho, logo pegando seus sapatos nas mãos e saindo do quarto com agilidade.
Meu olhar se demorou na porta, como se ainda pudesse vê-lo ali. Como se pudesse enxergar todas as vezes que cambaleamos por aquela mesma entrada, ocupados demais para nos preocuparmos com trancas ou com o volume de nossas vozes. Pensei em como passaríamos por ela em apenas algumas horas, Luke me carregando em seus braços como uma boa tradição de casamento, e o pensamento me fez abandonar os lençóis na mesma hora.
Eu iria me casar.
Peguei meu celular e imediatamente mandei uma mensagem para Piper, calçando os chinelos e correndo para a frente do espelho. Meu cabelo cacheado estava completamente bagunçado, minhas mãos estavam tremendo e minhas bochechas estavam dolorosamente coradas, mas o sorriso em meu rosto nunca havia sido tão sincero. Nem mesmo parecia que havia se passado um ano inteiro desde o momento em que eu me ajoelhei e pedi Luke em casamento naquele restaurante privado.
Nós dois havíamos nos beijado, rido e nos aconchegado um no outro, aproveitando um dos poucos momentos de privacidade que possuíamos.
Nosso relacionamento era perfeito e sempre tinha sido, mas a constante intromissão de terceiros em cada passo que dávamos era algo que nós dois odiávamos. Eu já estava acostumada e não podia fazer muita coisa a respeito, uma vez que essa era uma das consequências de ser uma figura pública, mas Luke se sentia extremamente desconfortável toda vez que uma foto sua aparecia em algum site de fofocas.
"Noivado na área? Cantora Annabeth Chase é fotografada usando anel suspeito no centro de Nova Iorque"
"Imagens flagram Luke Castellan, noivo da cantora queridinha dos Estados Unidos, se encontrando com ruiva misteriosa"
"O fim de um relacionamento? Annabeth Chase aparece sozinha em evento promocional"
Eu entendia, é claro. Devia ser difícil ser sugado para um nível tão grande de exposição quando não era o que você tinha escolhido para a própria vida. Luke era empresário, gerenciava as atividades da sua empresa e analisava o mercado para projetar o futuro do seu negócio. Ele não tinha concordado em ser perseguido por fotógrafos ou em virar alvo de mentiras na internet.
Nossos nomes iam parar nos trending topics toda vez que saímos separados nas ruas e ele tremia com cada explosão de mensagens e notificações.
Cheguei a pensar, em vários momentos quando estávamos juntos, que ele não aguentaria toda a pressão e terminaria o noivado, mas isso nunca aconteceu. Luke sentia a pressão, se retraía e passava longos períodos de tempo trancado em casa, mas não abandonava aqueles que considerava parte da sua família.
E agora eu seria uma dessas pessoas.
Piper chegou em poucos minutos, carregando quatro sacolas em cada braço e afirmando que ela arrombaria a porta do apartamento na base do grito se eu demorasse mais de dez minutos para trocar de roupa e sair de casa. Dentro de cada pacote tinham sapatos, vestidos reservas, itens de decoração e outros objetos que imaginava serem importantes para o meu casamento.
Além de ser minha melhor amiga, Piper também era minha madrinha e estava me auxiliando desde os primeiros estágios de planejamento. Eu não tinha exigido que ela me ajudasse tanto e com tanto vigor, mas fazia parte da personalidade dela: Pipes gostava de fazer o possível e o impossível para ajudar seus amigos.
Ela tinha uma lábia incrível e tinha me ajudado a conseguir preços imperdíveis para o salão de festas e para o buffet, além dos vestidos das madrinhas e de uma equipe qualificada de seguranças para manter os paparazzi do lado de fora. Eu conseguia ver como ela estava ansiosa para me ver casada, como ela ansiava por ver a minha felicidade.
Mostrando que ela não brincava em serviço e que também mantinha suas promessas, Piper chamou meu nome em um grito de estourar os tímpanos.
Assim como o meu noivo, eu ainda tinha milhares de coisas para fazer antes de caminhar até o altar.
Liguei para meus pais no caminho da igreja, por mais que soubesse que eles provavelmente não conseguiriam participar da cerimônia. Meus irmãos, Robert e Matthew, tinham sido os primeiros a confirmarem presença, mas meus pais não tinham conseguido folga do trabalho para voarem até Nova Iorque.
Passei o restante da tarde passando na mão de maquiadores e cabeleireiros, batucando os pés em nervosismo e retorcendo os dedos em cima do roupão de seda customizado. Pessoas corriam de um lado para o outro enquanto um barulho de conversa começava a nascer do lado de fora do ambiente.
Uma rápida olhada para o relógio revelou que já eram 18:53, o que me deixava com apenas sete minutos antes de estar oficialmente atrasada. O volume absurdo das conversas denunciava que mais pessoas que o esperado estavam presentes, o que fez com que o peso de uma bigorna se assentasse em meu estômago.
Me perguntei se Luke já estava lá fora. Se estava suando tanto quanto eu. Se também estava tremendo de antecipação.
— Eles estão prontos pra você, loirinha — Jason chamou, passando pela porta e me olhando com surpresa. Ele usava um terno preto alinhado e uma gravata azul, parecendo mais arrumado do que jamais esteve. Seus olhos brilharam. — Você tá... uau Anna. Você tá linda, irmãzinha.
Tive que lutar para segurar minhas próprias lágrimas, o olhar em seu rosto despertando um sentimento enorme de carinho no meu peito.
— Ela tá um espetáculo — Piper concordou, passando as mãos pelos braços do namorado. — Vai dar tudo certo, Anninha. Respira fundo, faz aqueles exercícios de respiração que a gente conversou, e se agarra no Jason, ele não vai te deixar cair.
O homem riu com o tapa que a mulher em sua frente deu em seu bíceps.
— Tá vendo? Uma montanha de músculos. É só você se apoiar que vai dar tudo certo.
— E já sabe, né? — ele continuou, realmente oferecendo seu braço para mim. — Se tiver qualquer dúvida é só avisar que a gente liga o carro de fuga. Eu tô falando sério, a gente tá aqui pra qualquer coisa.
Não lutei contra meu revirar de olhos, mas dei um beijo em sua bochecha como forma de agradecimento.
Jason foi o mais próximo que eu tive de um irmão depois que mudei de cidade. Ele me ajudou em situações absurdas, apoiou minha carreira e cuidou de mim mais que qualquer um dos meus irmãos de sangue.
Eu nunca conseguiria agradecê-lo o suficiente. Nunca conseguiria agradecer a ele e a Piper por terem sido meus pilares, junto a Luke, quando minha vida virou de ponta cabeça.
A morena saiu da sala, nos deixando a sós na frente de uma escadaria. Confirme descíamos, fiz questão de apertar seus músculos com as unhas, o que arrancou um riso do loiro.
— Você não vai tropeçar, Annabeth.
— Olha, eu acho bom, se não vou colocar cem por cento da culpa em você — ameacei, não totalmente brincando. Uma olhada na sua direção evidenciou que ele estava olhando para mim, uma suavidade orgulhosa no rosto — Obrigada por estar aqui comigo.
— É uma honra te levar pelo altar, maninha.
Uma lágrima escapou no mesmo instante em que chegamos na base da escadaria de mármore. No mesmo instante em que uma melodia instrumental começou a tocar e o conjunto de portas brancas se abriu, revelando o que era para ser o sonho mais doce se tornando realidade.
Ao invés disso, senti uma vontade avassaladora de voltar correndo para o quarto e arrancar o vestido que agora parecia grudar na minha pele.
No fundo da igreja, onde não deveria haver ninguém, havia homens vestindo jeans e carregando câmeras enormes. O segurança prendia um deles pelo pulso, parecendo quase grunhir ao aproximar a face da do fotógrafo.
Quis fugir daquela situação, quis tirar Luke de lá para que ele não se sentisse intimidado no dia do próprio casamento, mas somente aumentei meu aperto em Jason.
A música não parou, e eu também não.
Meu noivo estava lindo e tinha os olhos marejados, por mais que eu pudesse ver que estava se esforçando para manter a atenção em mim. Mais paparazzi se reuniram na porta da igreja, superando o número de seguranças e gerando um barulho desconcertante. Eu quis gritar, quis expulsá-los eu mesma. Mas, mais do que tudo, quis puxar Luke para um beijo e sair logo daquela cerimônia.
Jason me entregou com um beijo na testa e todos os problemas pareceram desaparecer com o azul dos olhos do homem que estava prestes a ser meu marido.
O padre realizou a cerimônia e fez um longo discurso, abrindo para a parte das alianças depois do que pareceu ser uma eternidade. Eu tinha sido inicialmente relutante em me casar em uma igreja, mas ao ver as alianças brilhando na almofada em minha frente, eu soube que não havia outra escolha certa.
— Eu, Annabeth Aretha Chase, aceito você, Luke Henry Castellan, como meu legítimo esposo e prometo amar-te e respeitar-te na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias da minha vida, até que a morte nos separe.
A aliança deslizou com perfeição em seu dedo, sua mão esquerda se agarrando à minha por um segundo a mais que o necessário.
— Eu, Luke Henry Castellan, aceito você... — o brilho de um flash o desconcentrou, o fazendo apertar os olhos com a súbita claridade. — Aceito você... aceito você...
Não aguentando encarar seus olhos em algo que era minha culpa, virei o rosto na direção dos convidados. Todos estavam agora em um silêncio preocupado, olhando para Luke como se ele tivesse crescido seis cabeças nos últimos dez segundos. Pela primeira vez, fui capaz de ver minha família no lado esquerdo do templo. Meus pais tinham conseguido vir no fim das contas, mas pareciam confusos com a demora dos votos.
— Eu, Luke Henry Castellan, aceito você... eu... eu não consigo, Annie. Eu sinto muito.
O peso de suas palavras não fez efeito imediatamente, nem mesmo quando nossos amigos e familiares arfaram em sobressalto. Somente percebi o que realmente estava acontecendo quando Luke retirou de seu dedo a aliança recém colocada e a posicionou na minha palma, parecendo arrependido por um milésimo de segundo antes de virar as costas e marchar para fora da igreja.
Tudo que eu conseguia ouvir era o silêncio chocado e carregado dos convidados, além das vozes dos paparazzi e o zumbido em meus ouvidos.
Também consegui ouvir uma voz singela no fundo da minha mente, uma voz que soava tão sem fôlego como eu mesma me sentia, dizendo para que eu me beliscasse por baixo das camadas do vestido. Dizendo que aquilo só poderia ser um sonho lúcido, um pesadelo lúcido, e que eu acordaria sentido os carinhos do homem que havia me amado pelos últimos anos.
Ainda não conseguia ouvir muita coisa quando Jason me puxou para os seus braços, usando o seu corpo e o de Piper como escudos para tamparem meu rosto chocado e inconsolável da mira dos fotógrafos.
Aquilo era um sonho, e eu só precisava treinar meu corpo para responder aos meus comandos. Por que eu estava demorando tanto para aperfeiçoar essa habilidade?
— Quando eu acordar, você vai ter que me segurar firme, Jay. Quando eu me casar de verdade, você não vai me deixar cair, né?
De alguma forma, a tristeza e a pena em seu rosto tiraram o chão de sob os meus pés. Eu nunca conseguiria sonhar com tanta desolação nas feições dos meus amigos, nunca conseguiria sentir as chacoalhadas do carro de fuga como facas no meu peito se não fosse verdade.
Nunca perderia o ar com tanta violência, lutando para respirar como se minha vida dependesse disso.
Aquilo era a realidade. Eu tinha sido abandonada, fotografada e agora viraria alvo de pena.
Luke tinha ido embora, e eu nunca tinha, com tanta força, desejado estar dormindo.
All my friends, they know and it's true
I don't know who I am without you
I've got it bad, baby
I got it bad
— Tell Me You Love Me
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