𝟶𝟻. THE MAJESTIC TWELVE.
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ARGH! Dá pra ver Diego ranger os dentes com força quando Lila pressiona um tecido limpo na ferida reaberta que voltou a sangrar. Há uma pilha cada vez maior de gaze e curativos ao lado deles, mas Evie permanece sentada no sofá, devorando um pedaço superfaturado de bolo de cenoura e chocolate, alheia a toda sujeira enquanto Cinco anda de um lado para o outro, quase formando um buraco no tapete.
— Então você deixou ela ir? — Diego pergunta entredentes. Parece fazer um esforço enorme para não grunhir de dor.
— Olha, a Vanya tinha muita coisa pra pensar. — argumenta ele, tenso. — Mas ela vai voltar. Eu sei que vai.
— Talvez não tivesse sido uma boa ideia levar ela pra falar com o Luther — Evie pondera, arrastando a colher pela porcelana do prato. — Do jeito que ele é estúpido, não tinha como esperar que fosse ajudar, principalmente com Vanya no meio. É claro que ia acabar jogando a merda toda no ventilador logo nos primeiros cinco minutos; se filho da puta voasse não dava pra ver o céu.
— É, é, eu sei — retruca Cinco impaciente. — Não dá pra subestimar a burrice dos outros, você já me falou isso antes.
— Mas e os caras que foram atrás dela? — indaga Diego, roubando um pedaço do bolo e desviando a mão de um tapa quando Evie percebe.
— Os Suecos?
— É, como sabem que não vão atrás dela outra vez?
Elliott surge da cozinha segurando três xícaras, duas de café que entrega para Cinco e para Diego e outra com chá preto, no qual Evie envolve os dedos gelados com muita gratidão. Ela estende o prato de bolo para ele, que aceita umas migalhas na mesma hora.
— Não sabemos.
— Sabe quem mandou eles? — Lila pergunta enquanto coloca um novo curativo sobre o ferimento do Kraken. Parece genuinamente interessada, mas Evangeline não consegue levá-la a sério.
— Ah, nós temos as nossas suspeitas — replica o garoto com um olhar incisivo. A Comissão, é claro. Evie teve dois anos quase sem problemas, mas no momento em que o marido pisa em Dallas, tudo parece retornar e ela precisa voltar a se preocupar com o destino do próprio pescoço. — Mas agora nossa prioridade é encontrar o papai e obter respostas, porque todo o resto depende disso.
— Que aliás, só pra saberem, eu já encontrei... — Diego comenta.
— E deixou ele escapar antes da gente poder conversar — Cinco acrescenta, sem piedade.
— Ele me esfaqueou.
— Tô surpreso de ele ter esperado tanto, Diego. Todo mundo já teve vontade.
Ele olha para Evie, talvez esperando que ela dissesse algo contrário, mas tudo que a garota faz é concordar com a cabeça silenciosamente e bebericar mais um pouco do chá. Mas Lila gargalha como se fosse a coisa mais engraçada que já escutou e estende a mão para um toca aqui com Cinco.
— Gostei! — ela diz.
O olhar de Evangeline se fixa nela à medida que se lembra de alguma das curiosidades históricas que seu avô costumava lhe contar – cumprimentos como aqueles não seriam comuns até o finalzinho dos anos '70. Não era à toa que Cinco fosse tão presunçoso o tempo todo; ele quase sempre estava certo. Quem quer que seja Lila Pitts, não pertence a esse lugar, muito menos a essa década. Eles só precisam de mais um pouquinho para provar e justificar o belo corte na garganta que ela vai receber.
— Que bom que nós sabemos onde o papai vai estar hoje à noite — Cinco comenta, quebrando o silêncio constrangedor que surgiu. Ele puxa o convite do bolso do blazer e estende a Diego.
— Onde conseguiu isso?
— Ev achou no escritório dele. Ele tava ocupado te esfaqueando.
— Haha — Diego faz, forçando uma risada sarcástica. Evie se aproxima dele para reler a caligrafia elaborada no convite. — "Hoyt Hillenkoetter e o Consulado Geral do México em Dallas o convidam cordialmente para um baile."
Elliott, que está recostado na soleira da cozinha, escutando a conversa com vivo interesse apesar da lista telefônica aberta nos braços, é o primeiro a se manifestar com o nome familiar.
— Ô! Espera. O Hoyt Hillenkoetter? Tá falando sério?
— Conhece ele? — pergunta Cinco, interessado. Evie sorri para Gussman, porque sabia que ele reconheceria.
— Temos que ir. — Lila fala a Diego, erguendo os olhos do convite. — Vai ter uma torre de frutos do mar.
— Não, o Hillenkoetter é um dos Doze Majestosos — esclarece Elliott, os olhos arregalados de excitação por finalmente poder falar de algo que conhece muito bem. Quando percebe que ninguém além de Evie ouviu falar da teoria, ele continua: — É um comitê secreto. Cientistas, militares, Estado Profundo. Ninguém sabe exatamente o que fazem.
— Espera aí, são do governo? — Diego interrompe, mais interessado do que nunca. Praticamente dá pra ver as engrenagens girando dentro da sua cabeça.
— Governo paralelo — corrige o homem, vasculhando os papéis em uma das mesas atulhadas. Evangeline se levanta para ajudá-lo, fuçando as gavetas, ansiosa para mostrar que se importa. — E o Kennedy foi o primeiro presidente a tentar expor tudo isso, mas não se pode mexer com esses caras.
— Achei! — a garota exclama, surgindo de uma das pilhas de jornais em um canto, brandindo a fotografia acima de sua cabeça. — É essa. E esse aqui, ó — ela aponta diretamente para o primeiro homem à direita de todos os outros sentados ao redor de uma mesa. — Esse aqui é o Hoyt.
Cinco, Diego e Lila se aproximam para dar uma boa olhada na foto, e é a mulher quem aponta um pequeno detalhe bem visível:
— Só têm onze.
— É porque só identificaram onze até agora — Elliott afirma sem dúvidas.
— E o décimo segundo? — Kraken pergunta, observando cada um dos rostos na imagem.
Os dois irmãos Hargreeves se entreolham. Se existe alguém que pode dizer o tipo de homem que Sir Reginald é, todas as sete crianças que ele comprou são exatamente os azarados certos a serem interrogados.
— Se vamos a uma festa, temos que nos arrumar! — declara Lila feliz enquanto arrasta Evie para o quarto de Elliott. — Ah, isso vai ser demais, eu sempre quis ter uma irmã mais nova!
Evangeline revira os olhos com tanta força que acha que pode ter visto o próprio cérebro, mas comemora fracamente apenas para não ser mal educada. Ela é mais velha que Lila por umas boas décadas, e a mera ideia de chamar outra pessoa de irmã incomoda mais do que deveria. Especialmente quando a tal substituta é uma espiã traidora. E mesmo assim lá está ela, deixando que Lila brinque de vesti-la como se fosse a porra de uma boneca, da mesma forma com que a garota costumava fazer com Anneliese Leatherman.
— Você é filha única? — pergunta Evie, sondando. Se Lila for mesmo da Comissão como Cinco acredita, resta saber apenas porque foi colocada em campo como espiã e não assassina.
— Isso aí — ela confirma, vasculhando o armário de Elliott com um entusiasmo exagerado. Não demora muito até encontrar as caixas escondidas nomeadas simplesmente como "Eleanor" e vasculhar cada peça de roupa lá dentro. — Eu ficava pedindo pra minha mãe pra ela me dar um irmão menor, mas ela sempre dizia "Lila, você dá tanto trabalho que serve por duas crianças ao invés de uma só, não começa" e aí eu ficava quieta.
Ela puxa um vestido azul-esverdeado sedoso com o decote quadrado e se olha no espelho, dando um giro rápido antes de olhar para a garota.
— O que você acha?
Evie encolhe os ombros com pouco interesse, mas sai para buscar seu vestido azul preferido e o par de sapatos que mais adora. Ela volta pouco tempo depois com as duas caixas debaixo do braço e as joga em cima da cama. Não é muito ligada nas tendências em geral, mas tem certa noção do que é esperado de alguém com sua idade aparente na década em que vive. Além do mais, sua mãe sempre adorou fazer compras e levá-la para comprar peças novas – querendo ou não, Evie sabe mais sobre moda do que gostaria.
— Eu não sou muito de me vestir como se fosse aparecer numa revista de moda — explica, colando o vestido no corpo e se pondo diante do espelho —, mas fiz Elliott comprar isso aqui assim que vi num brechó. Aí foi só ajustar e pronto.
Lila acena, entusiasmada com a visão do vestido, e a ajuda a se trocar. O corpete é justo e com um corte em formato de coração que é sobreposto por um tecido azul-claro, criando a ilusão de um decote alto sem mangas, e tudo é de um tom azul pastel tão suave que faz Evangeline parecer quase... etérea. A dupla toma um minuto ou dois para ajustar as camadas de tule, e quando finalmente param lado a lado na frente do espelho, Evie se sente mais bonita do que em muito tempo. Lila, no entanto, a faz se sentar numa penteadeira antiquada – outra relíquia da época em que Elliott e Eleanor eram casados – e imediatamente pega uma escova, começando a desfazer os nós no cabelo da garota.
— Então, parece que as coisas entre você e o irmão do Diego andam bem sérias, hã? — brinca ela, brandindo a escova como se fosse uma arma. — Eu tenho que dar a vocês, crianças, a conversa sobre sexo?
Apesar do vermelho que inunda as bochechas de Evangeline, o olhar dela permanece impassível ao encarar Lila no espelho. Ela nunca foi alguém que se envergonha por pouco – entre ela e Cinco, ela sempre foi a mais descarada, mesmo durante o apocalipse –, e se recusa a agir como uma pré-adolescente ingênua.
— Acho que seria melhor você ter essa conversa com o Diego — retruca, alisando o tecido da saia conforme Lila puxa e repuxa mechas de seu cabelo em tranças diversas. — Eu e Cinco sabemos o que estamos fazendo, diferente do Diego que age como uma criança obcecada com um brinquedo novo.
— Não sabe o que tá fazendo, é? — a mulher responde erguendo as sobrancelhas, largando a escova na penteadeira quando se dá por satisfeita com o penteado. — Não foi isso que pareceu ontem de noite.
Evie faz um som de vômito por reflexo, se levantando aos tropeços. Lila gargalha com a expressão enojada da garota, mas a ajuda a calçar os sapatos brancos de salto sem mais reclamações, e apesar de encarar a longa queimadura visível em alguns pontos, não faz perguntas incômodas. Evangeline decide que se a mulher maluca não fosse uma espiã, poderia ter sido uma amiga decente. Está prestes a sair do quarto quando a outra aponta diretamente para o broche azul caído em cima da cama.
— Qual é disso aqui que você sempre usa? — Lila pergunta, segurando o objeto na mão. Evie se adianta e arranca-o dela, com uma agressividade e uma superproteção que não havia demonstrado até agora.
— Nada não — diz ela bruscamente, prendendo o broche no vestido na altura do peito. — Só uma lembrança de família.
Mas é mais do que isso. É tudo que resta dos Leatherman, que lhe foi tirado e que ela não tem como recuperar. É uma lembrança de suas últimas vítimas, do casal e da menininha, aqueles que foi forçada a matar antes de ficar presa nessa década. Evie acha que manter uma parte deles consigo é a única coisa que impede que os rostos deles apareçam em seus pesadelos, como a longa fila de vítimas que fez nos meses trabalhando para a Comissão. Ela ainda se lembra deles, de todos eles. Nas piores noites, ela se vê em um túmulo, paralisada enquanto jogam pá após pá de terra sobre ela – de leve no início, como o toque da chuva, depois em punhados pesados que enchem sua boca e roubam o ar de seu peito. Pode ouvir as pessoas rindo – garotos, garotas, mulheres e homens. Silhuetas contra o céu azul do crepúsculo, seus rostos perdidos em sombras. Não acha que tem como se esquecer desse tipo de coisa. Quando você mata alguém, mata uma parte de si mesmo também.
Ela sai do quarto rapidamente, ainda com o rosto afogueado, e avisa Diego para arranjar um terno decente no armário de Elliott. Quando ela e Cinco finalmente são deixados sozinhos na sala, o garoto aproveita a chance para olhar para sua esposa – realmente olhar, na verdade, e apreciar o quão bonita ela está. Ele sempre achou que Evie ficava fantástica em qualquer coisa que usasse, mesmo que fosse um saco de batatas, mas agora que a tem de volta, não quer desperdiçar palavras, mesmo que isso nunca tenha sido seu ponto forte.
— "Bonita" não chega nem perto, Ev — ele diz, segurando a mão dela entre as dele, olhando bem naqueles olhos azuis.
O rosto de Evie enrubesce novamente, mesmo que por uma razão completamente diferente. Ele a escuta rir, vê o sorriso dela. É o tipo de sorriso que transforma o rosto de alguém, que enruga o canto dos olhos e faz covinhas aparecerem. Que coloca estrelas nos olhos. A coisa mais bonita que Cinco já chegou a ver.
— Sério? — ela provoca, dando uma volta rápida. — Por um momento eu pensei que fosse sofisticado demais pra mim.
— O que é sofisticado? — desdenha Cinco. — Você poderia usar só uma pena e continuaria sofisticada.
— Pois então me arranje uma pena.
Já é finzinho de tarde quando eles chegam perto do Consulado do México. Em sua posição atrás de uma parede de tijolos baixa, Evie nota os carros caros que começam a lotar a rua, com homens e mulheres vestidos em seu melhor. Só de olhar dá pra ver que é o tipo de festa que sua mãe era convidada e que levava os filhos ocasionalmente, com ordens expressas de não tocarem em nada serem sempre gentis e amáveis; Evangeline detestava essa festas por ter de conversar com sei lá quantas pessoas apenas para entretê-las. Ela preferia estar em casa durante os jantares íntimos que seu pai fazia com amigos escritores e professores, adultos que a tratavam como uma deles em uma versão miniatura, não com socialites estúpidas que reclamavam do atraso da empregada em servir o chá e usavam brincos de diamantes tão caros que poderiam alimentar uma família de oito pessoas por seis meses inteiros.
Com cuidado, os quatro pulam o muro de pedra e se escondem atrás de um dos carros pouco depois de seus donos já terem entrado.
— Qual é o plano? — Lila pergunta em voz baixa, agachada como os outros três.
— Nos infiltramos, identificamos, extraímos, voamos. — responde Diego imediatamente, observando o fluxo de pessoas entrando no consulado. Cinco parece entender imediatamente, mas ela e Evie se entreolham, confusas.
— Do que ele tá falando?
— Algo sobre ir embora o mais rápido possível — chuta Evangeline.
— Encontramos o velho e damos o fora — Cinco traduz, mais para benefício da esposa.
Diego zomba, impaciente.
— Foi o que eu disse — diz, condescendente. — Vem comigo.
Ele se adianta, deixando os três para trás. Cinco e Evie não se mexem, e Lila se vira para eles, indicando a porta da frente com a cabeça.
— Podem ir — ela para quando percebe o olhar do garoto, e imediatamente assume uma expressão de inocência. — O que foi, não posso ser educada?
— Para com isso. Tá? — Cinco interrompe bruscamente. — Meu irmão idiota pode até acreditar em você, mas eu não confio de jeito nenhum.
— Muito menos eu — admite Evangeline com um sorriso afiado.
— Ai, que menino sem fé — Lila diz debochadamente para ele, e então se vira para a garota. — E quanto ao poder feminino ou algo assim?
— Enfia ele no cu.
O casal espera que ela se afaste antes de seguir na direção de Diego, e Evie aceita o braço que Cinco lhe oferece quase imediatamente, tentando se concentrar no novo ponto de equilíbrio que sempre encontra ao lado dele. Ele faz um show ao entregar o convite ao guarda, antes que liberem a entrada do grupo na festa. Música mariachi é tocada por músicos no salão de baile em algum lugar próximo, acima das conversas dos ricos espalhados por toda parte. Garçons estrategicamente posicionados fazem suas rondas com bandejas de petiscos e bebidas. Encontrando o funcionário mais próximo, Cinco pega duas taças de champanhe e dá um gole rápido antes de entregar a segunda taça à Evie.
— Não tô achando o papai — Diego avisa.
— Ah, fica atento pros Doze Majestosos — Cinco diz a ele. — Ev e eu vamos subir, nos vemos lá em cima.
Evangeline olha bem para Diego antes de deixar que o marido pegasse sua mão.
— Sei que faz parte da sua personalidade mais do que qualquer outra coisa, mas tenta não se meter em problemas ou fazer nada estúpido, tá?
O casal serpenteia pela multidão de mãos dadas, e Evie termina de beber o resto de champanhe da taça com um único gole antes de entregá-la ao próximo garçom que passa. Parados quase no topo da escada da forma mais discreta que conseguem, ela dá um olhar melancólico na direção da pista de dança. Embora ela detestasse a maioria dos locais que sua mãe a levasse quando criança, adorou ter aprendido a dançar, especialmente músicas mais lentas.
— Se der tempo, podemos dançar depois — Cinco sussurra, com uma pontinha de culpa. Ele aperta a mão dela brevemente, chamando a atenção da garota novamente. — Ei.
Evie revira os olhos para ele, levemente divertida.
— Você não dança.
— Por você, eu danço. Mas só uma vez.
Ela o dá um olhar muito breve do que espera ser interpretado como entendimento hesitante, não como a súbita agonia de sempre. Ultimamente parecia que ela estava sempre variando de um hedonismo dionísio a uma melancolia artística. Nesses momentos, Evie se perguntava se aquela insuperável vontade de morrer era o que os artistas renascentistas sentiam no seu auge.
— Vamos lá, temos trabalho pra fazer.
Puxando-o pelas escadas, eles percorrem o corredor vazio com ouvidos alertas, e a primeira pista que os levam ao seu alvo são as vozes murmuradas por trás de uma porta aparentemente comum. A mão de Cinco aperta brevemente a de Evie antes que eles desapareçam, apenas para ressurgirem em um armário de casacos dentro da sala. Espiando por entre as ripas que permitem uma visão clara o suficiente, Evangeline conta todos os presentes reunidos. Os Doze Majestosos. Montague, Vandenberg, Hunsaker, Bush, Berkner... quem diria que o mundo é comandado por um punhado de homens brancos em ternos focados em defender unicamente os próprios interesses?
— ...O presidente continua a fazer perguntas sobre Roswell e outros locais de quedas de naves. E, como sabem, não podemos permitir que ele se meta em nossos negócios. Confirmei que a comitiva vai virar à esquerda na Elm Street. Nosso pessoal vai estar lá.
O olhar dela se foca em um homem em particular, ainda de pé. Evie percebe quem é antes mesmo de ver o brilho de um monóculo em sua mão, antes dele falar com aquela voz que assombrava seu marido todos os dias nas terras áridas do fim do mundo:
— Senhores, acho que não é o momento para esse plano de vocês.
— Não temos como errar.
Cinco o reconhece imediatamente.
— Pai? — ele murmura. Então os cabides atrás deles batem, e a tábua range debaixo de seus pés, chamando a atenção de todos.
Sir Reginald Hargreeves parece ouvir o som no mesmo momento, e quando se vira para encarar o filho e a nora que não sabe que existem, tem um atiçador de lareiras em mão.
— Shh! — avisa o homem, que se aproxima lentamente do armário.
Evangeline aperta o braço de Cinco enquanto tenta acalmar a respiração, e há um momento, um momento real mesmo em que ela pensa que Sir Reginald a vê, realmente a vê, até que o garoto finalmente os teletransporte para o corredor novamente. Por um segundo eles respiram aliviados, tendo escapado do quase ataque, então se viram e dão de cara com alguém. Cabelos quase brancos de tão louros, olhos azuis muito claros, grande como um gigante. Apesar de nunca ter visto qualquer um deles pessoalmente, Evie soube quem era imediatamente.
— Merda — o casal diz em uníssono, antes que o Sueco imediatamente avance no garoto, praticamente o jogando contra a parede. Cinco consegue se teletransportar a tempo, mas o gigante não tem pena de Evie quando a dá um golpe tão forte que a faz se desequilibrar e bater a cabeça com tudo no chão.
O mundo parece se tornar difuso e doloroso, e Evangeline tem certeza absoluta que ganhou uma concussão, mas através da névoa de dor ela vê Cinco avançando na direção do Sueco, pulando nas costas dele e tentando quebrar o pescoço do homem. O garoto percebe tarde demais que é um jogo perdido quando o gigante loiro se recompõe e o empurra com brutalidade.
— Ah, merda — é tudo que ele consegue dizer antes de ser apagado com um soco.
Evangeline é despertada imediatamente com a visão de seu marido caído, e uma onda repentina de raiva e desespero toma conta dela. Se recuperando o mais rapidamente possível, ela se levanta e, percebendo que ainda está fraca demais para partir para o combate mente a mente, retira os sapatos dos pés e bate os saltos com toda força na cabeça do Sueco. Ele se desequilibra e quase cai com a força do impacto, mas se vira, os olhos pálidos estreitos em raiva quando se levanta e vai para cima dela. Distraia, Evie pensa, se atrapalhando com suas saias por um momento. Cinco teve tempo suficiente para ensiná-la mais do que básico sobre autodefesa, e durante a Comissão ela só perdia para ele, que havia sido criado como uma arma antes mesmo de aprender a andar. É uma pena mesmo que esse corpo adolescente não tenha a menor chance contra um homem adulto.
Antes que perceba, antes que sua visão tenha a chance de parar de se duplicar, ela pega impulso e corre na direção do Sueco bem quando ele vem em sua direção, aproveitando a oportunidade para se abaixar e deslizar por entre as pernas dele. É claro que não dá certo, porque no instante em que tenta alcançar Cinco, o Sueco a agarra pelos cabelos e a bate com brutalidade contra a parede. Evie permanece lá, machucada e sem fôlego, dolorida além da conta e com um possível ferimento na cabeça, e não consegue se mexer nem para reagir ao marido sendo espancado.
Diego aproveita essa oportunidade para finalmente aparecer, e ele se adiante até eles sem nem titubear, mas os outros dois Suecos surgem, o afastando. Pouco tempo depois é ele quem está apanhando feio; um deles o enforca com um cinto e o outro não tem piedade em acertar um golpe atrás do outro com uma soqueira de ferro particularmente cruel.
Lila é a próxima da festa a entrar no segundo andar, e paralisa imediatamente com a visão dos três Hargreeves, antes de ignorar – hesitante, é claro – os pedidos de ajuda de Diego e correr até os dois adolescentes. A mulher usa sua velocidade para pular na mesa mais próxima e agarrar o lustre, impulsionando suas pernas ao rosto do homem. Suas coxas envolvem o pescoço do gigante, sufocando-o, enquanto ainda mantém o controle sobre a luminária.
Assim que nota o garoto fora de perigo, Evie corre até ele, forçando-se a ser útil, verificando os machucados dele.
— Você tá bem? — ela pergunta alheia a todo o resto por um momento. Sua cabeça dói devido ao impacto, e seus pensamentos parecem tão confusos que não tem certeza do que está acontecendo.
— Eu vou ficar — Cinco responde, passando os dedos de leve por um calombo na cabeça dela com óbvia preocupação. — Você está?
— Eu tô respirando, não tô? — replica a garota, retórica. Então se vira quando Lila finalmente larga o lustre, empurrando o Sueco com os pés. Ela dá uma rápida olhada nos adolescentes e sorri, presunçosa.
— Não tem de quê.
Aproveitando a chance, Cinco empurra o homem pela janela, ouvindo o vidro se despedaçando e o som do corpo dele atingindo as pedras do calçamento lá embaixo. Seu olhar pousa em um casal parado perto do estacionamento, a silhueta do homem delineada pela luz da rua. Voltando-se para a esposa, ele agarra a mão dela antes de se teletransportar para o gramado, puxando-a consigo conforme grita o nome do pai e cita A Odisseia em grego antigo. Sir Reginald olha para os dois quando o escuta, e há um momento, um curto momento, em que Evie olha nos olhos dele e acha que ele a reconhece, que reconhece Cinco também, mas ele entra no carro logo em seguida. O casal permanece lá, parado, sem outra opção senão verem sua única esperança indo embora.
— Era ele? — pergunta Diego ofegante quando finalmente se junta a eles. Parece sujo, desgrenhado e com respingos de sangue no terno de Elliott, mas bem num geral. Lila vem logo atrás dele.
— Era — responde Cinco, meio vago. — Olha, eu tô começando a achar que o nosso pai tá evitando a gente.
— Pelo que eu saiba, ele sempre foi assim — diz Evie a ele, e recebe um aceno de cabeça.
— Pessoal, eu odeio bancar a chata, mas tá na hora da gente cair fora — Lila interrompe, segurando aqueles saltos altos vermelhos nas mãos.
— Quando você diz "a gente" tá se referindo a quem mesmo? — o garoto indaga em tom agudo. Dá pra ver a veia latejando na testa dele, a raiva reprimida de alguém prestes a explodir.
— Eu acho que eu fui bem clara.
— Escuta, eu não sei quem você é ou de onde você veio — ele começa em tom perigoso —, mas o que quer que seja, é melhor voltar pro seu buraco.
— Ela tem razão — Diego concorda. — Temos que sair daqui.
— Eu acabei de salvar sua vida, seu pirralho de merda — Lila exclama, gesticulando com as mãos. — Se eu não tivesse me metido, só ia sobrar seu blazer e umas meias ensanguentadas.
— Isso não é verdade! — protesta Evie, embora não seja verdade. Suas palavras passam despercebidas pelos outros, até por ela própria quando percebe o sangue pingando de seu nariz. Estanca o sangramento com os babados de seu vestido azul, manchando o tecido claro de vermelho.
— E esse é o problema — diz Cinco. — Você é boa demais, faz perguntas demais. Você sabe demais. Luta como quem sabe o que tá fazendo.
— Ele tem razão — Diego diz, quieto. Parece levar tudo de si para admitir isso, admitir que pode ter depositado a confiança na pessoa errada.
— Então, porque eu sei me defender, eu sou uma vilã?
— Quem quer que seja, tá me atrapalhando — o olhar do garoto permanece fixo no da mulher, intenso e firme. — Se eu te vir outra vez, eu te mato.
Ele passa como um furacão por eles, ainda de mãos dadas com a garota, e só para quando já estão a quase um quarteirão do consulado, esperando impacientemente que Diego se junte a eles. Evie o convence a dançar ao som de Elvis Presley quando já estão na segurança do quarto dela na casa de Elliott, quando os outros já estão dormindo e Luther, a visita surpresa da noite, ronca audivelmente na sala.
₍ 001 ₎ É... oi 👋 eu disse que tinha mais um capítulo saindo, não disse? Enfim, como vocês estão? Eu espero que bem, porque a minha vida tá um caos. A nova temporada sai quinta-feira! Não tenho palavras para descrever o quão animada eu estou! Quais as teorias de vocês? Eu não sei de nada, apenas que finalmente o Viktor não vai ser a razão do fim do mundo dessa vez. Duas temporadas foram o suficiente para ele.
₍ 002 ₎ Caso tenham gostado, curtam e comentem e me digam suas teorias! Estou ansiosa para trazer mais capítulos, então nos veremos o mais cedo possível.
©lovingclare.
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