Encarei meu reflexo no espelho. Não era para eu parecer bem. Contudo, era para parecer pelo menos melhor do que estava.

Observei meus ombros magros, os olhos um tanto fundos, o cabelo sem brilho e a boca pálida. Se não fosse pela maquiagem...

Um movimento sutil na porta do meu quarto chamou minha atenção, estava entreaberta e ele estava lá. Encostado no limiar, as mãos nos bolsos da calça social e uma expressão complacente, e um tanto sofrida, no rosto.

Não me levantei da penteadeira, continuei encarando meu reflexo. Pelo espelho, o vi se aproximar lentamente até parar às minhas costas.

Não precisei falar nada, tampouco ele pediu isso. Bastava apenas as lágrimas nos meus olhos e o balançar de cabeça.

Lorenzo repousou as mãos sobre os meus ombros e se abaixou para beijar o topo da minha cabeça, longa e docemente.

— Você é extraordinariamente estonteante, Mila — sua voz pareceu preencher todo o quarto. — Nada do que você diga, ou o que pense, vai mudar isso.

Senti seu calor ser transmitido para mim.

— Eu vejo força em você, e isso é lindo.

Virei-me no banquinho e o abracei apertado. Fechei os olhos quando ele também me envolveu nos braços. Permiti que, por um momento, compartilhássemos o mesmo sentimento.

Pedi a Lorenzo um minuto para eu terminar de me arrumar e então desceria. Ele assentiu, não sem antes olhar para trás para ter certeza de que eu ficaria bem sozinha.

Era o dia do casamento de Giordana. Eu já estava com meu vestido longo azul, meu cabelo preso em tranças adoráveis feitas por Martina. Mas, ao invés de enxergar a beleza que havia ali, só conseguia ver o abalo da minha saúde frágil.

Suspirando, tratei de me recompor.

Lorenzo não pensou duas vezes em aceitar o convite como meu acompanhante. Disse que seria uma honra ser visto ao meu lado, o que fez-me gargalhar.

Agora, olhando para ele, sempre me esperando pacientemente ao pé da escada, tive certeza que a honra seria toda minha. E a coragem que ele transmitiu foi o suficiente para acender um sorriso no meu rosto.

A cerimônia começaria no final da tarde, o sol conferindo um tom alaranjado a tudo ao nosso redor. Pelo tempo que teve para organizar tudo, Giordana fez um ótimo trabalho.

As cadeiras dispostas no gramado extenso estavam enfeitadas com fitas de cetim brancas, flores de tons suaves e vermelhas estavam por todo lugar, luzes amareladas tornavam o ambiente extremamente agradável. E, claro, a família italiana e grande da noiva deixava o clima animado, ainda que a festa não tivesse começado.

Fiquei maravilhada com a decoração, apostando que eu estaria babando enquanto admirava.

De braços dados com Lorenzo, caminhamos até nossos lugares, bem como os outros convidados faziam.

— Ela não é aquele tipo de noiva que atrasa muito, não é? Porque eu estou faminto! — Lorenzo sussurrou para mim.

Tive que cobrir a boca para abafar uma gargalhada alta, atraindo olhares curiosos.

Enquanto esperávamos Giordana, Lorenzo falava das coisas ao nosso redor e apostava em qual das senhorinhas bem arrumadas seria a sortuda que pegaria o buquê. Isso me fazia rir de verdade, e concluí que era exatamente o que ele pretendia fazer.

Concordamos sobre quem pegaria o buquê quando a música começou.

Ela estava radiante. Sem dúvidas a noiva mais linda que já vi. Giordana andava com passos firmes e um sorriso confiante no rosto, trocamos acenos quando ela passou por mim. Paolo secava lágrimas dos olhos, claramente emocionado por ver sua amada noiva caminhar até ele.

Caçoei baixinho dos olhos marejantes de Lorenzo diante das palavras bonitas do padre. Ele implicou comigo de volta, cutucando minhas costelas para fazer-me cócegas.

A cerimônia foi encantadora, principalmente o momento em que a noiva jogou seu buquê e a senhorinha que Lorenzo e eu apostamos agarrou-o ainda no ar. Rimos com isso.

Encontramos Francesca e Fillipo, e até mesmo Valenccio apareceu. Os noivos, com sorrisos enormes, nos cumprimentaram.

— Ragazza*, mal posso acreditar que este dia é real! — Giordana me abraçou forte.

— Fico tão feliz por vocês. — Retribuí sua animação. — Espero que você não se esqueça de nós!

Ela gargalhou.

— Eu estaria louca se fizesse isso!

Após muita conversa, a festa foi liberada, e Lorenzo praticamente correu para a mesa de comidas, mostrando que não estava brincando quando disse que estava realmente faminto. Me curvei de tanto rir ao vê-lo disputando lugar com os outros italianos.

Nos sentamos em uma das longas mesas e dividimos as comidas do prato. Mais tarde, houve a dança dos noivos e a pista foi aberta para os demais convidados.

É claro que Lorenzo não perdeu a oportunidade e me convidou para dançar. Meus amigos se juntaram a nós nas músicas animadas, e assim dançamos por um longo tempo.

Depois vieram as músicas lentas, para acalmar os ânimos e dar chances aos casais.

Não pude deixar de corar quando Lorenzo, elegantemente, tomou minha mão e começou a me conduzir pela pista. Quando isso acontecia, eu sentia algo diferente em mim, como se ambos fôssemos envolvidos em um mundo apenas nosso. Como se até mesmo a atmosfera ao nosso redor mudasse, se tornasse mais doce e calma.

Mal notamos quando a chuva começou, dispersando a maioria das pessoas que estavam a céu aberto. Diferente dos demais, eu e Lorenzo não procuramos por abrigo, sequer corremos da chuva. Continuamos a dançar uma valsa que se intensificou, demonstrando tanto do que sentíamos.

As gotas beijavam minha pele aquecida, proporcionando frescor. O som da tempestade estava misturado à música e às batidas violentas do meu coração. Os passos bem executados de uma dança de cumplicidade e emoção.

Naquele momento, éramos apenas nós e a chuva. E nada nunca me pareceu tão certo e bonito.

Eu me senti linda, e esqueci de tudo o que pudesse ter pensado antes. Nada importava agora. Apenas os olhos sorridentes dele. Apenas o encaixe perfeito de sua mão na minha.

Paramos ofegantes, e encharcados pela chuva, ao findar da melodia. Embalados em felicidade e algo mais.

Recuperei o fôlego antes de dizer:

— Gosto de dançar com você.

Os ombros de Lorenzo subiam e desciam rapidamente devido a respiração acelerada. Ele abriu um sorriso grande enquanto segurava minhas mãos.

— Gosto de você — confessou confiante.

Quis dizer o mesmo, juro que quis. Mas minha boca ainda não sabia pronunciar aquilo que tomava meu coração.

Contudo, isso não pareceu incomodá-lo. Lorenzo ergueu uma das mãos, repousando-a suavemente na minha bochecha. Fechei os olhos diante da calidez do toque.

Tudo foi interrompido por alguém chamando meu nome.

— Mila?

Mas não era a voz de Lorenzo.

Ao abrir os olhos e me virar, deparei com Jean, também encharcado pela chuva. Ele havia cortado os cabelos que antes caiam em cachos por seu rosto e ombros, agora estavam bem menores. Os olhos ainda os mesmos, escuros como a noite. Mas agora com uma dor escondida neles.

Jean se aproximou apenas alguns passos para poder ser ouvido.

— Desculpe, eu não queria...

— Atrapalhar? — Lorenzo completou. Apertei sua mão em um sinal de que não começasse uma discussão.

— Eu... não sabia que estaria aqui hoje — foi o que consegui dizer diante da situação.

— Voltei mais cedo para o casamento, pena não ter conseguido chegar antes. — Aquilo não era sobre o casamento, notei. Jean passou as mãos pelos cabelos e olhou ao redor antes de dizer: — Preciso falar com os noivos, nos vemos depois. — O sorriso foi o que mais doeu.

Assenti e o vi partir antes mesmo que eu pudesse dizer que havia sentido saudades.

Lorenzo assumiu aquela postura séria, apesar do pequeno sorriso que me ofereceu quando o olhei.

Antes, um impasse atormentava meu coração. Eu não sabia o que ele queria, ou quem. Entretanto, agora, era claro como água.

Porém, eu ainda sentia certo peso. Porque, bem como anteriormente, se escolhesse um lado, magoaria o outro. Não era diferente agora, mesmo quando não tinha a mínima intenção de ferir um deles.

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TRADUÇÃO DAS PALAVRAS COM ASTERISCO*

Ragazza - Moça; menina