10 - Frutas desconhecidas
As estrelas surgiram deslumbrantes aquela noite, em seu brilho e claridade.
Jimin e Jungkook tinham percorrido mais quilômetros do que poderiam avaliar de algum modo e finalmente pararam para descansar, eles haviam dado o pé daquela parte do planeta visto que foram enxotados e volte e meia alguns soldados a mando de número dois os ficavam tacando pedras.
A noite estava fresca e balsâmica, o ar puro, o céu totalmente sem nenhum sinal de que alguém no universo viria os resgatar.
Uma quietude maravilhosa estendia-se sobre o mundo, e uma calma mágica combinava-se com as doces fragrâncias dos bosques, o barulho sossegado dos insetos e a luz brilhante das estrelas aliviava seus espíritos agitados. Até Jungkook, que já tinha visto mais mundos do que poderia enumerar numa longa tarde, estava tentado a pensar se aquele não era o mais bonito em que já tinha estado.
Durante todo aquele dia tinham passado por vales e montanhas verdes, ricamente cobertos de gramados, flores de essências exóticas e árvores altas repletas de folhas, o sol os tinha aquecido e brisas suaves os mantinham frescos, Jungkook Começava a achar que gostava dali.
Ele também gostava da companhia de Jimin, ele era algo interessante de se ver e também de conviver, os dias não eram entediantes, sempre havia Park para o fazer rir de algo ou contar coisas que gostava ou deixava de gostar, Jungkook estava cada vez mais interessado nisso, e Jimin também mostrava interesse em saber sobre os gostos de Jungkook, ambos ensinavam um ao outro sobre seus mundos e preferências.
Ainda que o ar da noite estivesse fresco eles se deitaram sobre a grama macia e apreciaram o belo tapete brilhoso que era o céu acima deles.
Jimin de repente cortou o silêncio:
— Sabe, durante meus anos na NASA eu fui privado de muita coisa, mas olhar o céu por grandes telescópios ultramodernos era um privilégio que só eu sempre possuí. Era a única coisa boa que eu tive e os outros garotos não. Me lembro de que quando a vida ficava difícil eu corria para a sala onde sabia que um telescópio esquecido ficava, então mirava para o céu, e somente de observar esses belos astros luminosos já me fazia feliz.
Jungkook conseguia imaginar perfeitamente um mini Jimin triste, amoado e sozinho indo até um telescópio observar o céu enquanto se animava lentamente. Ele só queria poder de alguma forma mudar o espaço temporal inteiro da teia cósmica para poder voltar ao tempo e estar com Jimin em todos os momentos difíceis da vida em que ele já teve de passar:
—- Devo confessar que sempre estive lá em cima, agora vejo, nunca olhei para as estrelas como deveria... É tão... — Jungkook soltou um suspiro, desses que os poetas soltam na hora de compor — Lindo.
— É... É sim. —- Disse Park, e sua voz rouca denunciava que já estava com sono.
O betelgeusiano se aproximou um pouco ficando em uma distância consideravelmente curta do Terráqueo então sorriu ao sentir o cheiro do pantano ao qual caíram na queda da nave.
Eles ainda não haviam se banhado, havia lodo e lama grudados em suas peles:
— Precisamos de um banho.
Jimin soltou um riso se virando para Jeon, agora ambos estavam deitados de lado e de frente um pro outro:
— Sim. Precisamos.
De repente os olhares se conectaram, e permaneceram ali, divagando sobre o olhar de cada um, Jungkook tinha as orbes extremamente negras e brilhantes, enquanto que os olhos felinos de Jimin eram com uma leve pitada amendoada, Jungkook acariciou com cautela o rosto de Park, sentindo a espessura de sua pele macia na ponta de seus dedos:
— Eu gostaria que um dia você pudesse parar de me odiar.
— Acho que depois desse tempo convivendo aqui com você consigo te entender um pouco mais.
Jungkook arregalou os olhos por um momento, ele não sabia o que dizer, mas também compartilhava do mesmo sentimento, desde o momento em que viu o terráqueo o encarou como um sério problema, e a cada enrascada que Park os colocava ele se tornava um fardo maior, mas agora Jungkook o entendia.
Park era apenas um ser perdido em uma realidade que ele jamais pensou existir, ele viu todo o seu mundo conhecido literalmente explodir diante de seus olhos, Park foi tão forte durante todo este tempo, mais forte do que Jeon jamais seria.
— Eu pensei que iria te odiar para sempre, mas talvez isto tenha mudado. — Foi tudo que Jimin disse.
Jeon o observou um segundo, Jimin era um humano bonito, soube disso no momento em que aquele capacete horroroso de astronauta terráqueo foi tirado de sua cabeça:
— Sabe Jimin, acho que mesmo depois que sairmos daqui eu não gostaria mais de explodir planetas.
Park o olhou um tanto surpreso, Jeon continuou:
— Quando eu os explodia não pensava em todas as vidas que estariam vivendo lá, você me fez olhar para tudo isto e me sentir arrependido por cada mundo que destruí. Então, muito obrigado Jimin... Eu acho.
Jimin deu um meio sorriso, realmente jamais esperaria aquilo de Jeon Jungkook, o betelgeusiano arrogante ao qual odiou no primeiro momento em que o mesmo abriu a boca:
— E no fundo — Continuou Jeon — Eu só fazia isto para agradar meu "pai", não é como se eu acordasse de manhã e dissesse: hmm belo dia para destruir um planeta. Eu fazia tudo para ser reconhecido por ele, queria ser mais do que o bichinho do meu irmão, eu queria que ele me visse como útil, eu queria a aceitação dele.
— E agora não quer mais? — Inqueriu o Park.
— Sinceramente depois de todo esse tempo já não importa.
Jimin o encarou surpreso:
— Você deve ter batido forte com a cabeça na queda.
Jeon soltou um riso:
— Pode ser. Mas eu não quero mais ser como antes, sabe? Apenas isso.
— Sei — Jimin assentiu sincero — Mas você também não precisa se culpar tanto, isso é o que te ensinaram desde que nasceu, você meio que não conhecia o outro lado da moeda, sua mente se moldou a ser o que era.
— É por isso que me sinto grato. Por você me mostrar o outro lado da moeda.
Jimin riu-se:
— Tá, de nada.
Jungkook sorriu e Jimin o olhou por uns instantes, por baixo daquele sorriso Jungkook parecia muito desamparado, parecia até mesmo que sua criança interior estava a mostra, aquela que estava sempre procurando atenção e amor, foi por isso que simplesmente disse:
— Eu posso te dar um abraço?
Jeon piscou um tanto confuso, um abraço? Ninguém nunca lhe ofereceu algo do tipo. Jungkook não precisou sequer responder, Jimin já conseguia ler perfeitamente a confusão em seu olhar, o terráqueo simplesmente o tomou nos braços o abraçando fortemente.
Jungkook ficou breves segundos congelado, com os olhos arregalados diante daquele contato, os braços de Jimin eram tão quentes e confortáveis que Jungkook se sentiu seguro.
Jimin se afastou e Jungkook corou ao encara-lo, enquanto isso, as borboletas no estômago do Park estavam histéricas:
— Boa noite Park — Disse Jeon e se virou para o outro lado, atordoado demais com o que sentia.
Jimin piscou como se estivesse voltado a realidade:
— Boa noite, Jeon.
Jimin não sabia como lidar com aqueles sentimentos estranhos que vinha sentindo desde que se tornava mais próximo de Jeon. Ele não sabia o que fazer com eles.
Se virou de barriga pra cima e encarou o lindo tapete luminoso que era as estrelas acima de si, e com essa imagem seus olhos foram se fechando lentamente até cair no sono de vez.
Então os dois dormiram profunda e confortavelmente a céu aberto.
{•••}
Acordaram algumas horas depois com o orvalho da manhã. Sentindo-se repousados mas com fome.
Desde que tiveram ali estavam se alimentando de pãezinhos que Jungkook tinha achado na nave e enfiado em sua mochila, e então sem opção os comeram no café da manhã, antes de continuarem a marcha de exploração.
Não falaram sobre a conversa que tiveram na noite passada, nem sobre o abraço, o silêncio desconfortável reinava entre ambos que ficavam extremamente nervosos até mesmo quando suas mãos se resvalavam sem querer.
Até agora vinham andando a esmo, mas então resolveram pôr-se firmes em direção ao leste, achando que se iam explorar aquele mundo, deviam ter uma idéia clara de onde tinham vindo e para onde estavam indo.
Pouco antes do meio-dia, tiveram a primeira indicação de que o mundo em que o tinham pousado não era desabitado: o relance de um rosto observando-os por entre as
folhas chamou suas atenções.
Desapareceu no instante em que os dois o viram, mas a imagem que ambos tiveram era a de uma criatura humanóide, curiosa de vê-los mas não assustada.
Meia hora depois tiveram o relance de outro rosto, e dez minutos mais tarde, mais um.
Um minuto depois encontraram uma grande clareira e pararam.
A frente deles, no meio da clareira, estava um grupo de cerca de duas dúzias de homens e mulheres. Ficaram parados e quietos encarando Park e Jungkook.
Em volta de algumas das mulheres amontoavam-se crianças pequenas e atrás do grupo, um decrépito
aglomerado de habitações feitas de barro e galhos.
Jimin e Jungkook seguraram a respiração não sabendo o que esperar deles.
O mais alto dos homens tinha pouco mais de um metro e meio, todos andavam um pouco curvados para frente, tinham braços alongados e testas curtas, e claros olhos brilhantes com os quais olhavam fixamente para os estranhos.
Ao ver que não carregavam armas nem faziam qualquer movimento em sua direção, os intrusos ali ficaram um pouco mais tranquilos.
Por um tempo os dois grupos ficaram se entreolhando, sem que ninguém se movesse. Os nativos pareciam confusos com os intrusos, e ao mesmo tempo que não mostravam nenhum sinal de agressividade, definitivamente não
estavam emitindo nenhum convite.
Nada acontecia.
Por dois minutos completos nada aconteceu. Após dois minutos, Jeon achou que era hora de algo acontecer:
— Olá — Disse.
As mulheres puxaram as crianças para mais perto delas.
Os homens não fizeram qualquer movimento compreensível, mas sua disposição no todo tornava claro que a saudação não era bem-vinda - não era hostilizada de maneira alguma, apenas não era bem-vinda.
Um dos homens, que estava pouco à frente do restante do grupo e que portanto devia ser seu líder, deu um passo à frente. Seu rosto era calmo e tranquilo, quase sereno:
— Ugghhhuuggghhhrrrr uh uh ruh uurgh — disse calmamente.
Isso tomou Jungkook e Jimin de surpresa.
Tinham se acostumado tanto a receber uma tradução instantânea e inconsciente de tudo que ouviam através do aparelho instalado em seus ouvidos, que até já haviam esquecido de que era possível ouvir alguém falando e não entender.
Vagos significados nebulosos surgiram no fundo da mente do betelgeusiano, mas nada que ele pudesse agarrar com firmeza. Imaginou, corretamente a propósito, que aquele povo não tinha desenvolvido ainda mais do que os rudimentos da linguagem, e que o aparelho tradutor era portanto incapaz de ajudar.
Deu uma olhada para Jimin que estava tão perdido quanto ele, Jungkook já havia tido aula de línguas primitivas e tentou assimilar aquilo que achava que era em sua mente:
— Acho — disse Jeon com um canto da boca — Que ele está perguntando se não nos importariamos em dar a volta ao redor da aldeia.
Pouco depois, o homem criatura prosseguiu:
— Ruurgggghhhh urrrgggh; urgh urgh (uh ruh) rruur-ruuh ug.
Jimin franziu o cenho completamente perdido:
— O sentido geral — Disse Jungkook -, pelo que posso entender, é que temos toda a liberdade de seguir viagem por onde quisermos, mas se déssemos a volta ao redor da aldeia em vez de atravesa-la, nós os deixaríamos muito felizes.
— Então, o que devemos fazer?
— Acho que vamos deixá-los felizes — disse Jungkook.
Devagar e atentos deram a volta no perímetro da clareira. os nativos o fitavam fixamente.
Jimin e Jungkook continuaram andando até sair da vista dos nativos, eles foram ficando cada vez mais longe, então continuaram sua viagem através da floresta.
A umas centenas de metros da clareira depararam subitamente com uma pequena pilha de frutas colocada em seu caminho - frutinhas que se pareciam notavelmente com amoras e framboesas e umas frutas polpudas de casca verde que se pareciam impressionantemente com pêras.
Até o momento, tinham evitado todas as frutas que tinham visto, apesar das árvores estarem carregadas delas, mas seus estômagos já não aguentavam mais pãezinhos murchos.
Jimin até mesmo salivava de vontade e Jeon não estava diferente enquanto tinha os olhos fixos nas frutas:
— Encare desta maneira — Disse Jeon Jungkook — Frutas em planetas estranhos podem fazer você viver ou fazer você morrer. Portanto, a questão, quando você se mete com elas, é saber quando você vai morrer enquanto não morre. Pensando assim você não cai na tentação de comê-las. O segredo da viagem de carona saudável é comer porcaria.
— Ou seja os pãezinhos murchos. — Disse Jimin com um bico insatisfeito.
— É... Vamos Park. — Jeon tentou o empurrar para contornarem a pilha, mas o Park parecia irredutível em permanecer ali.
E Jungkook não estava fazendo esforço nenhum para o empurrar a continuarem a andar, ele também encarava a pilha:
— Mas elas parecem tão boas... — Disse o Jeon.
— Sim... — Respondeu o Park.
— Encare desta maneira — disse Jungkook depois de um tempo — ahn... É...
— O que? — Disse Jimin, encarando nada mais que a pilha de frutas.
— Estou tentando pensar numa maneira de encarar que queira dizer que no fim a gente acaba comendo.
— Ahm, entendi. — Jimin assentiu — Então por que a gente só não come de uma vez?
— Comer?
A luz do sol atravessava as folhas e lançava um brilho sobre as coisas
que pareciam pêras. As coisas que pareciam framboesas e morangos eram mais rechonchudas e carnudas que quaisquer outros que Jimin já vira, mesmo em comerciais de
sorvete:
— É — Disse o terráqueo — A gente pode pensar nas consequências depois.
— Talvez seja isso que eles querem que a gente faça.
— Eles?
— É, você sabe, alguém colocou essas frutas aí. Nessa pilha.
— Está bem, encare desta maneira...
— Começou bem — encorajou Jungkook.
Jimin apertou os olhos tentando se concentrar, pois o aroma também era muito bom:
— Estão aí para a gente comer. Não importa se são boas ou ruins, se eles estão querendo nos dar comida ou nos envenenar. Se forem venenosas e a gente não comer, eles simplesmente vão nos atacar de algum outro jeito. Se a gente não comer, a gente sai perdendo de qualquer forma.
— Gostei do seu jeito de pensar — Disse Jungkook que só esperava uma brecha para poder comer aquilo, hesitante, ele apanhou uma das coisas que pareciam pêras:
— Foi o que eu sempre achei sobre o Jardim do Éden — Disse Jimin observando o fruto em suas mãos.
— O quê?
— O Jardim do Éden. A árvore. A maçã. Essa parte, lembra?
— Não faço ideia do que esteja falando — Disse o betelgeusiano.
— Esse Deus põe uma macieira no meio de um jardim e diz "vocês façam o que vocês quiserem, ah, mas não comam a maçã". Surpresa surpresa, eles comem e ele pula de trás de uma moita gritando "Peguei vocês!". Não teria feito muita diferença se eles não tivessem comido.
— Por que não?
— Porque se você está lidando com alguém que tem o tipo da mentalidade de quem deixa um chapéu na calçada com um tijolo embaixo para os outros chutarem pode ter certeza que ele não vai desistir. No fim ele te pega.
— Do que você está falando? — Disse Jeon que estava achando tudo aquilo insano.
— Esqueça.
Mas Jimin pensou mais um pouco sobre o caso e acabou dizendo:
— Sabe, este lugar até que parece sim o Jardim do Éden.
Jungkook deu de ombros mais interessado em dar uma mordida na coisa que parecia uma pêra:
— É uma pêra — Ele disse.
Momentos depois, quando tinham comido tudo, Jungkook virou-se e gritou como se tivessem nativos escondidos entre as árvores:
— Obrigado. Muito obrigado. Vocês são muito gentis.
Pelos oitenta quilômetros seguintes em sua marcha rumo ao leste eles continuaram encontrando os presentes de frutas estendidos em seu caminho, e uma vez ou outra perceberam um nativo os observando entre as árvores; não tornaram a fazer contato direto, apenas ignoravam eles e voltavam a andar.
Resolveram que gostavam de uma raça de pessoas que deixava bem clara sua gratidão por ser deixada em paz.
As frutas acabaram após oitenta quilômetros porque era onde começava o mar.
Jimin correu na frente sorrindo, ele gostava da sensação da grandeza do mar, era bonito, gostava do barulho e do cheiro da água salgada, ele gostava mais ainda porque lhe lembrava da terra, por breves segundos ele até poderia fingir que estava em casa.
Jungkook sorriu observando Jimin correr eufórico, e por uns instantes um pensamento doido surgiu em sua mente: Talvez eles pudessem mesmo ficar naquele mundo pra sempre, juntos.
Então foi neste momento que Jungkook começou a sentir os primeiros efeitos colaterais das frutas em seu organismo, ele sentiu perder as forças de seu corpo e caiu de joelhos naquela areia branquinha:
Tentou se manter sobre seu corpo fraco e trêmulo, mas tombou para frente caindo de bruços, apertou a areia branca em seus dedos, tentando se levantar.
Jimin estava molhando os pés na borda do mar, se virou sorrindo procurando Jungkook para ver se ele não queria se aproximar também, e notando sua falta passou os olhos por toda praia o procurando.
E assim que o viu daquela forma, seu sorriso murchou gradativamente, estampando em sua face a mais genuína preocupação.
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