(14) lisa jenkins.
O professor de filosofia nos odeia. É verdade, ele odeia todos os seus alunos. Ok, eu também não gosto daquela turmina do fundo que usa a aula para mexer no celular, atualizar as fofocas com os amigos ou beijar os namorados ou namoradas. Mas não é justo toda a sala pagar por isso.
— Que cara é essa? — Tracy pergunta quando bato a porta do nosso quarto e me jogo na minha cama.
— Eu tenho um ensaio de filosofia pra fazer em duas semanas. — grunhi, esfregando o rosto com as duas mãos. — 25 páginas falando sobre moralismo social. Nem uma a mais e nem uma a menos.
Tracy ri do meu descontentamento.
— É por isso que eu digo que lidar com números é muito melhor. Mais objetivo. — mostro o dedo do meio pra ela. — Ei, você ficou sabendo da excursão que o reitor do campus tá negociando com uma agência?
— Não. Quando? Pra onde? — questiono.
— New York. — ela responde. Tiro a cabeça do travesseiro, meio espantada.
— Isso é do outro lado do país. — indago. — São, o que? Cinco? Seis horas de viagem?
Tracy bufa.
— Por que você é tão reclamona? Fique feliz, é New York! Alicia Keys não teria uma música sobre esse lugar se ele não fosse simplesmente foda.
— Eu já fui pra lá duas vezes. E, pra ser honesta, eu prefiro muito mais a calmaria de Seattle. — volto a deitar, o braço nos olhos espantando a luz. — Você não disse quando.
— Ainda não tem data, mas parece que vai ser em dezembro. Natal e Ano Novo em Nova Iorque. Times Square, Lisa! Não é fantástico?— ela bate palmas, animada.
— Sim, completamente fantástico. Mas, vem cá, quanto custa isso tudo? Porque o reitor não vai pagar a passagem de ninguém. — ouço Tracy bufar.
— Só o custo da passagem, velha rabugenta! A hospedagem vai ser por conta da agência. — ela responde. — Ouvi sobre três hotéis diferentes. 5 andares vão ser reservados em cada um, com 10 quartos em cada andar, ou seja, 50 quartos. Cada quarto abriga 3 pessoas, e 50 vezes 3 é 150. Então 450 alunos vão.
Suspiro de novo.
— O campus tem, sei lá, uns cinco mil alunos. — digo, e não porque gosto de reclamar, mas porque sou realista. — Não vai rolar, T.
— A sua negatividade me comove, sabia? — ela resmunga. — Temos um mês e meio até lá. Pode relaxar e deixar as coisas comigo, gatinha. Vamos para NY, você vai ver.
— A única coisa que eu vejo é que você é louca, Evans. — retruco, recebendo um tapa na coxa em resposta.
Me dou cinco minutos de descanso antes de pular da cama e trocar a minha roupa da aula por uma calça de moletom velha e a camiseta verde musgo da WSU que eu comprei na minha primeira semana aqui— trinta dólares em uma camiseta que me serviu de pijama.
— Tô indo pra biblioteca, qualquer coisa me manda mensagem. — mando um beijinho para ela e saio do quarto, com uma mochila nas costas.
A casa das meninas era na rua mais próxima do campus, sim, mas a caminhada era grande, principalmente porque a biblioteca era em um dos últimos prédios – e eu ainda não tenho um carro.
É, os meus pais têm dinheiro para um Eldorado e mais seis carros na garagem, para me mandar para uma universidade longe de casa, mas não têm dinheiro para me dar um carro. Eu sei que isso é uma coisa muito Cher Horowitz ou Regina George de se dizer, mas é a verdade. Eu não deveria lutar tanto para ter algo que os meus pais tem em pilhas em casa.
Quando cheguei na biblioteca já haviam se passado quarenta minutos desde que deixei a casa. Meu cabelo estava um pouquinho grudado no rosto por conta do suor, e por isso não pude evitar em dar uma passadinha no banheiro e lavar o rosto.
Encontrei uma mesa vazia e me sentei lá, colocando a mochila na minha frente. De dentro dela, tirei o meu notebook, um caderno pequeno e um estojo. Eu poderia fazer essa merda de ensaio no conforto da minha cama, mas qualquer aluno de filosofia sabe que os livros bons nunca estão no Google.
Depois de abrir o caderno em uma página vazia e escrever "pontos importantes para a merda do ensaio", deixo as coisas sobre a mesa e me levanto. Vagueio pelos corredores a procura de um em específico, com os livros de filosofia.
Nunca entendi o porquê de eu ter escolhido filosofia, afinal de contas. Era o meu segundo ano, então eu não tinha mais matérias aleatórias como qualquer calouro tem; todas as minhas aulas são voltadas para filosofia, e posso dizer que amo e odeio na mesma proporção.
Enfim, acho o corredor que eu procurava. Empurrei os óculos para cima do nariz e me foquei nas dezenas de títulos. Passei o indicador por cima de muitos livros, ficando com a ponta do dedo cheio de poeira, até achar o certo. A Mente Moralista parou em minhas mãos quando o puxei, olhando a capa e a contracapa.
— Você não tem cara de filósofa. — uma voz diz, e, por um triz, não derrubo o livro no chão.
— Você quer me ver tendo um ataque cardíaco. — murmurei, o peito subindo e descendo com rapidez.
— Eu já disse que você se assusta muito rápido? — Vinnie ironiza, se debruçando na estante vazia. Estamos frente a frente, mas a estante nos separa.
Suspiro, colocando o livro debaixo do braço.
— Como uma filósofa deveria se parecer? — pergunto em resposta à sua afirmação, um pouco tardiamente.
— Definitivamente não como você. — ele tem aquele sorrisinho ladino quando responde. — Sabe, Hannah Arendt, Louise Labé, Olivia Sabuco... Tenho quase certeza de que elas não se vestiam de cheerleader para o halloween e pediam para alguém mordê-las. Peço desculpas se pareci muito surpreso com a sua escolha de curso.
Tenho certeza de que meu queixo estaria no chão se não tivesse um osso no caminho.
— E você estuda o que? Artes cênicas? — cruzo os braços. — Você tem cara de quem gosta de atuar. Ou cantar.
— Se a música é o alimento do amor, não parem de tocar. — ele diz e pisca.
— Shakespeare. Que original. — implico, me debruçando na estante como ele.
— Nada é original na dramaturgia, garota do Arizona. — ele sorri, como está sempre fazendo. — E você está completamente certa.
— Eu costumo estar completamente certa em muitas coisas, então seja mais especifico.
— Artes cênicas é a minha praia. Eu gosto de atuar, e de cantar. Um musical é tipo o conjunto perfeito. — ele mexe os braços. — Mas eu também sou bom em outras coisas.
Ergo uma sobrancelha.
— Tipo tomar um barril de cerveja e dar dez mortais? Não, espera! Já sei! Deixar as garotas obcecadas por você ao ponto de tentar humilhar outra publicamente. Acertei?
— Eu ia dizer que sou bom em filosofia, mas acho que não posso discordar disso também. — ele mexe os ombros. — Ouvi por aí que aquele careca chato passou um ensaio de 25 páginas.
Suspiro em descontentamento.
— Passou. Eu tenho duas semanas pra entregar. — bato a testa na madeira da estante. — Acho que decorar textos deve ser muito mais fácil, não é?
— Definitivamente sim. — ele brinca. — Posso te ajudar, se você quiser.
Levanto a cabeça rapidamente.
— Eu acabei de dizer que sou bom em filosofia, Lisa. Vem, eu vou te ajudar com esse ensaio e você vai tirar nota máxima. — Vinnie dá a volta na estante, me esperando no fim dela.
— E se eu não tirar?
— Então eu te ajudo quando você ficar de dependência. — dou um tapa em seu braço assim que o alcanço. — Você vai tirar nota máxima, não existe um "e se". — ele usa o indicador e o dedo médio para fazer aspas. — Agora vamos. Você lê essa bíblia aí e eu faço umas pesquisas.
Guiei Vinnie até a minha mesa, e ele ri quando lê as palavras que eu havia escrito antes de ir atrás do livro.
Me sentei, colocando o livro aberto bem na minha frente, e Vinnie se sentou à minha esquerda, puxando o notebook para si.
— Se eu não tirar nota máxima — começo. — você me leva naquele parque de diversões novo. A Tracy não tem tempo de ir comigo...
Vinnie sorri, com o lábio inferior mordido, daquele jeito estranhamente atraente que ele faz, antes de me responder.
— Fechado. — apertamos as mãos. — E se você tirar nota máxima, nós vamos do mesmo jeito.
Sorrindo, comecei a ler.
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