Bônus Dois
Miguel Martins Reed:
Dois meses depois......
Enquanto eu estava sentada na sala de estar, mastigando algumas frutas frescas, meus olhos se fixaram no retrato da minha família. A gravidez trouxe uma nova onda de desejos, especialmente por frutas doces, e eu me encontrava devorando-as com frequência. Lembrei-me de uma vez em que, sem pensar, acrescentei ketchup e um pouco de mostarda em uma fatia de melancia. Os gêmeos me olharam com um misto de nojo e incredulidade, incapazes de compreender por que eu faria algo tão estranho. Elsie, curiosa, decidiu experimentar, mas após a primeira mordida, sua expressão de repulsa dizia tudo. Ela me olhou como se eu tivesse perdido o juízo.
Rosângela, sempre atenta, percebeu o desconforto das crianças e explicou a eles sobre os desejos inesperados que podem surgir durante a gravidez.
"Esses desejos são resultado de uma combinação de fatores," ela disse com sua voz calma e segura. "O primeiro é emocional. Especialmente na primeira gravidez, o corpo da mulher passa por mudanças significativas, e com isso vêm as incertezas sobre os novos papéis sociais e afetivos que ela vai desempenhar como mãe. Essas mudanças podem causar uma regressão psicológica, fazendo com que muitos comportamentos, incluindo os hábitos alimentares, mudem drasticamente. É por isso que às vezes surge uma vontade quase incontrolável de comer coisas inusitadas."
Ela continuou, com uma expressão que misturava conhecimento e carinho, "O segundo fator é hormonal. Durante a gravidez, os hormônios HCG e progesterona, que regulam as funções do corpo, provocam diversas alterações no organismo, incluindo o apetite. E, por fim, a falta de alguns nutrientes pode intensificar esses desejos específicos, como o que você viu com a sua mãe."
Enquanto Rosângela falava, lembrei-me das histórias que ela costumava contar. Durante a gravidez de Eric, ela teve um desejo incontrolável por morangos e jacas. Já na gravidez de Mark, as coisas ficaram ainda mais estranhas: ela queria mastigar gelo, comer terra, e até sentia uma vontade inusitada de dar uma leve batida na cabeça do marido por qualquer coisinha que a irritasse.
Alisson, que estava ouvindo com atenção, me lançou um olhar horrorizado, enquanto meu padrasto, sempre prático, interveio, explicando que essas vontades, especialmente o desejo por coisas como terra, podiam ser um sinal de deficiência de ferro no organismo.
A sala estava cheia de risadas e olhares cúmplices, mas por dentro eu sabia que esses momentos, apesar de estranhos, faziam parte da jornada única e transformadora que eu estava vivendo. Cada desejo estranho, cada reação inesperada, era um lembrete da nova vida que crescia dentro de mim, e isso, acima de tudo, me enchia de uma alegria indescritível.
**************
Olhei para o meu pai, que estava deitado no sofá da sala, com a cabeça repousando no colo do meu padrasto. Ele acariciava os cabelos do meu pai com um carinho tão natural que quase parecia uma cena de um filme antigo, repleta de ternura e tranquilidade. Era um daqueles momentos que aquecem o coração, onde o amor se manifesta nos gestos mais simples.
Meu esposo havia saído há pouco tempo, atendendo ao meu pedido de comprar mais frutas. Eu praticamente esvaziei a geladeira, devorando a maioria delas com um apetite voraz, algo que parecia ser uma constante nessa fase da gravidez. A verdade, porém, era que eu precisava de um momento de paz. Alisson, ultimamente, andava um tanto quanto grudento, o que me irritava um pouco. Entendo sua preocupação, mas estou grávido, não incapaz. Ainda sou perfeitamente capaz de cuidar dos meus próprios assuntos, e essa atenção excessiva, por mais bem-intencionada que fosse, começava a pesar.
A casa estava mergulhada em uma calmaria rara. Pietro havia saído com Manoel para um encontro romântico, o que me fez sorrir. Fazia dois meses que eles começaram a sair juntos, e eu não poderia estar mais feliz por eles. Comemorei discretamente quando finalmente soube que tinham marcado um encontro especial; eles merecem toda a felicidade do mundo.
De repente, ouvi as vozes das crianças vindo da cozinha. Elas estavam implorando para Rosângela fazer um bolo. Fazia tempo que não comiam um doce, e o pedido era feito com tanta sinceridade e expectativa que era impossível não sorrir. Imaginei o cheiro doce e reconfortante do bolo se espalhando pela casa, trazendo mais um toque de conforto àquele dia tranquilo.
Por um breve momento, tudo parecia no lugar. O amor estava em cada canto, nas pequenas coisas. Enquanto meu pai e padrasto compartilhavam um momento de carinho, as crianças ansiavam por um simples prazer doce, e eu, mesmo com as pequenas frustrações do dia a dia, sentia que havia uma beleza especial na simplicidade de tudo aquilo.
— Eu não vou fazer, vocês ainda podem ficar sem doces por um tempo, especialmente depois do que fizeram com o Andrea — Rosângela respondeu, sua voz firme e determinada. — E os seus pais concordam comigo. Agora, por favor, vão incomodar seus avós, porque estou bastante ocupada com o preparo da comida.
— Mas por que você não fez igual quando o tio Mark e a tia Bianca estavam aqui? — Adele perguntou, com uma pontada de curiosidade.
— Porque aquela comida era para eles, e não para vocês dois, que comem demais e ainda por cima assustaram o meu namorado — Rosângela respondeu com um sorriso, claramente satisfeita com o rumo que as coisas estavam tomando. Ver minha família unida e em harmonia era um alívio enorme para mim.
— Mas a Elsie não fez a mesma coisa! — Giulio argumentou, tentando encontrar uma brecha.
— Ela sabe se controlar e tem autocontrole — Rosângela retrucou, sem perder a paciência. — E sei que estão usando ela para me convencer, mas conheço vocês dois muito bem.
— Que coisa feia de dizer, você pode magoar a gente assim — Adele reclamou, fazendo uma cara de drama.
— Para com o drama — Rosângela disse, rolando os olhos com uma risadinha. Nesse momento, Elsie surgiu e se sentou ao meu lado, e eu a beijei nos cabelos, sentindo uma onda de amor por minha filhota.
— Miguel — Meu pai e meu padrasto me chamaram quase ao mesmo tempo, suas vozes soando um pouco preocupadas. — Não está sentindo nada molhado aí embaixo?
Meu pai se levantou rapidamente, olhando para Dener com um olhar alarmado. Dener imediatamente foi pegar o telefone.
— Não, por quê? — Perguntei, mas então olhei para baixo e vi que o chão e a almofada do sofá estavam úmidos. Uma contração forte me atingiu de repente, e demorou apenas alguns segundos para eu entender o que estava acontecendo. Meu pai, desesperado, começou a gritar para Dener ser mais rápido.
Meu bebê estava para nascer.
— Meu... Deus... do... céu — murmurei, começando a me levantar do sofá, o coração disparado de excitação e medo. — Meu bebê está vindo para o mundo!
Meu pai apareceu ao meu lado em um piscar de olhos, já com a bolsa do bebê e uma mala com minhas roupas. Ele passou uma Elsie confusa para os braços de Rosângela, enquanto eu tentava me manter calmo.
— Que gritaria é essa? — Rosângela perguntou, entrando na sala junto com os gêmeos, que observavam a cena com olhos arregalados.
— O papai fez xixi no sofá e no chão! — Giulio exclamou, apontando para mim com um dedo acusador.
— Garoto, isso não é xixi — Rosângela disse, balançando a cabeça com um sorriso de entendimento. — A bolsa estourou!
— Vamos, temos que ir logo para o hospital! — Meu pai falou, já me ajudando a me locomover com a pressa de quem sabe que o tempo é crucial. — Alguém ligue para o Alisson e diga para nos encontrar no hospital!
O caos se instalou na sala por alguns instantes, mas no meio de toda a correria e das emoções à flor da pele, eu só conseguia pensar em uma coisa: meu bebê estava prestes a chegar, e nada mais importava.
****************
Saímos de casa em uma correria, Dener dirigindo o mais rápido que podia, enquanto eu tentava controlar meus pensamentos e emoções. Meu bebê parecia estar com uma pressa enorme para conhecer este mundo e sua família, e isso me enchia de uma mistura de excitação e ansiedade.
Chegamos ao hospital em quarenta minutos, e mal tivemos tempo de respirar antes de eu ser levado para um quarto. Assim que entrei, me trocaram para uma roupa hospitalar, e a realidade da situação começou a se instalar ainda mais profundamente em mim.
Meu pai permaneceu ao meu lado, marcando o tempo das contrações com uma seriedade que mostrava sua preocupação. Quando a médica entrou para me examinar, senti um alívio temporário, até que ela me informou que a dilatação estava em apenas dois centímetros e que precisaríamos esperar até chegar a dez. Minhas esperanças de um parto rápido foram por água abaixo naquele momento.
As contrações começaram a vir com intervalos de dez minutos, e eu, involuntariamente, quase esmaguei a mão do meu pai a cada onda de dor que passava pelo meu corpo.
— Desculpa — eu dizia repetidamente, entre um gemido e outro. Meu pai, com um sorriso forçado que claramente mascarava a dor, apenas balançava a cabeça.
— Cadê o Alisson? Quando eu mais preciso dele, ele não está aqui? — perguntei, sentindo a frustração e a preocupação crescerem dentro de mim.
— Ele me mandou uma mensagem, disse que está a caminho o mais rápido possível — papai respondeu, tentando me acalmar. — Mas ele acabou pegando um trânsito pesado.
Eu não sei o que aconteceu a seguir, mas a próxima contração veio com uma intensidade que me fez apertar a mão do meu pai com tanta força que, por um momento, jurei ter ouvido um osso se quebrar.
— As contrações estão diminuindo pra quanto tempo agora? — perguntei, olhando para ele, que estava visivelmente lutando para não entrar em pânico pela dor na mão.
— Cinco minutos? — ele respondeu, mas sua voz tinha um tom de incerteza, como se ele estivesse fazendo uma pergunta ao invés de me dar uma resposta.
A cada momento que passava, a situação parecia mais intensa e caótica. Eu só conseguia pensar em Alisson, na dor das contrações e no fato de que, a qualquer momento, meu bebê finalmente estaria nos meus braços.
No momento em que a porta se abriu e Alisson entrou, um sorriso iluminou seu rosto, trazendo um alívio imediato ao meu coração. Atrás dele, a médica entrou na sala, mas antes que qualquer palavra pudesse ser dita, meu pai desmaiou ali mesmo.
O caos seguiu. A médica imediatamente chamou ajuda, e levaram meu pai para outro lugar, enquanto ele balbuciava palavras desconexas. Eu queria rir da situação, mas a dor era intensa demais para permitir qualquer outra emoção.
Alisson, sempre tão calmo e presente, se aproximou e tomou minha mão com um toque firme, mas suave. Seus olhos estavam cheios de amor e preocupação, e ele gentilmente afastou um dos meus cabelos que estava colado na minha testa suada.
— Em breve, nosso filho ou filha estará em nossos braços — ele sussurrou, sua voz era um bálsamo para minha dor.
— Muito em breve... — tentei responder, mas fui interrompido por uma nova onda de dor. A contração veio forte, e involuntariamente, apertei a mão dele com toda a força que tinha. Alisson não soltou um som de dor, mas vi em seu rosto que ele sentiu a pressão.
Mesmo assim, ele não reclamou. Pelo contrário, ele se inclinou, pressionando a testa contra a minha, seus olhos fechados por um momento, compartilhando aquele momento de intensidade comigo. O simples ato de estar ali, ao meu lado, me deu forças que eu não sabia que ainda tinha.
— Vai dar tudo certo, Miguel — ele murmurou, a respiração dele misturando-se com a minha. — Eu estou aqui, e não vou a lugar nenhum.
Sua presença, o calor de seu toque, a forma como ele olhava para mim... tudo isso fazia com que a dor fosse um pouco mais suportável. Mesmo com as contrações apertando meu corpo, havia um conforto indescritível em saber que não estava sozinho. Estávamos nisso juntos, e logo, muito em breve, nosso bebê estaria em nossos braços.
As contrações continuaram, cada vez mais intensas, a cada quatro minutos, até que o intervalo se reduziu para apenas um minuto entre elas. A dor parecia consumir todo o meu corpo, e o cansaço começava a me vencer. Mas Alisson estava ali, sempre ao meu lado, segurando minha mão, me dando forças com cada palavra de encorajamento.
Quando a médica finalmente voltou e anunciou que a dilatação tinha atingido os dez centímetros, senti uma onda de alívio misturada com medo. Era hora. Eles me levaram para a sala de parto, e cada passo parecia uma eternidade, como se eu estivesse caminhando para o momento mais difícil e mais importante da minha vida.
Os minutos seguintes foram os mais desafiadores que já enfrentei. A dor era insuportável, a fraqueza se espalhava pelo meu corpo, e parecia que eu não tinha mais forças para continuar. Mas a voz suave de Alisson ao meu lado me ancorava na realidade, me lembrando que eu era capaz, que estava quase lá.
— Você consegue, Miguel. Só mais um pouquinho... — ele dizia, ecoando as palavras da médica, mas com uma doçura que só ele tinha. Suas palavras eram uma tábua de salvação em meio à tempestade de dor que eu enfrentava.
E então, de repente, a dor deu lugar a um som que mudou tudo: o choro de um bebê. O som era como música para meus ouvidos, e quando a médica anunciou que era um menino, senti uma alegria indescritível tomar conta de mim. Alisson, com lágrimas nos olhos, se inclinou e beijou minha testa suada. Mesmo exausto e sem forças, consegui esboçar um pequeno sorriso.
— Eu te amo... — sussurrei, minha voz quase falhando, mas carregada de todo o amor e gratidão que eu sentia.
— Eu também te amo — ele respondeu, sua voz embargada pela emoção.
Naquele instante, apesar de toda a dor e exaustão, eu sabia que tudo valera a pena. Estávamos juntos, e nosso filho havia chegado ao mundo rodeado de amor.
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Depois de me levarem de volta para o quarto, não demorou muito para que trouxessem nosso filho. Quando a enfermeira colocou aquele pequeno ser em meus braços, segurei-o com toda a delicadeza que ela havia me ensinado. Era difícil acreditar que aquele bebê, tão pequeno e frágil, era nosso, o resultado de tanto amor e expectativa.
Olhei para o rostinho dele, tão perfeito, e uma onda de emoção me inundou. Inclinei-me para mais perto, sussurrando com todo o carinho do mundo:
— Bem-vindo ao mundo, Adrian Martins Reed.
O nome soou suave em meus lábios, como se tivesse sido feito para ele desde sempre. Alisson, ao meu lado, não conseguia tirar os olhos do nosso filho. Seus olhos brilhavam, refletindo o amor e o orgulho que transbordavam de seu coração.
— Bem-vindo, filho — ele disse, com um sorriso que parecia iluminar todo o quarto.
Aquele momento, com Adrian em meus braços e Alisson ao meu lado, era tudo o que eu poderia ter desejado. Era a concretização de um sonho, o início de uma nova jornada, e eu sabia que, juntos, enfrentaríamos tudo o que a vida nos reservasse.
Enquanto segurava Adrian, um sentimento de paz profunda tomou conta de mim. Ele era tão pequeno, tão vulnerável, e ainda assim, cada parte dele parecia perfeita. Seus pequenos dedos se enrolaram ao redor do meu, e eu mal podia acreditar que aquele serzinho fazia parte de nós.
Alisson se inclinou mais perto, observando cada detalhe do nosso filho com uma mistura de espanto e ternura. Eu podia sentir o calor de seu corpo ao meu lado, uma presença reconfortante que tornava aquele momento ainda mais especial.
— Ele tem os seus olhos — Alisson comentou, com a voz suave, enquanto seus dedos acariciavam delicadamente a testa de Adrian.
Eu sorri, ainda meio surpreso com a realidade diante de nós.
— E acho que o seu queixo — acrescentei, observando como o pequeno traço dava um toque especial ao rostinho do nosso filho.
Alisson riu baixinho, um som cheio de alegria e admiração. Ele se aproximou mais, colocando um braço ao redor dos meus ombros, como se quisesse nos envolver em um casulo de proteção e amor.
— Nunca imaginei que sentiria algo assim — ele sussurrou, beijando o topo da minha cabeça. — Ver você segurando nosso filho... é como se tudo no mundo estivesse exatamente onde deveria estar.
Senti meus olhos marejarem com suas palavras. Havia algo de mágico na forma como tudo havia se encaixado, como se cada passo até aqui tivesse sido necessário para chegarmos a este exato momento.
— Estamos prontos para isso? — perguntei, minha voz carregada com uma mistura de emoção e incerteza.
Alisson olhou para mim, seus olhos fixos nos meus, e eu vi toda a confiança e o amor que ele tinha por nós dois.
— Se estivermos juntos, eu sei que estamos prontos para qualquer coisa. Vamos aprender e crescer, todos nós, como uma família.
Eu não podia concordar mais. Adrian se remexeu em meus braços, soltando um pequeno som, e isso fez com que ambos sorríssemos novamente.
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Gostaram?
Até a próxima 😘
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