CAPÍTULO 01
Como a vida pode mudar da água para o vinho? Até alguns meses atrás minha vida estava uma maravilha.
Até Carlos decidir sair de casa, sem conversa e sem rodeios. Falou que precisava de um tempo. Eu ainda alimento a esperança de nos resolvermos, bem, nosso filho também espera isso. Já está com três meses e ele ainda não pediu o divórcio, estou respeitando o seu tempo.
Eu percebi sua mudança, a alguns meses atrás, não tinha mais tempo para o filho, o que me deixou em alerta, Carlos vivia pelo Caio, seu tempo era dividido entre trabalho e família. E para mim seu tempo também sumiu, chegava tarde e saía cedo, chegou a ter dias que eu não o via. Eu tinha medo de perguntar, porque não queria saber da resposta, mas não demorou muito para ele pedir um tempo, e apenas com essas palavrinhas ele jogou quatorze anos de nós dois juntos fora.
Meu único namorado, meu único homem, foi assim desde meus dezoito anos de idade, era eu e ele a muito tempo.
Estou em frente ao seu prédio, esperando ele trazer Caio, nosso filho tem quatro anos, é o menino mais doce que eu conheço. E posso dizer que forte também, ele já entende bem as coisas e não está sendo fácil conviver em casa sem o pai, o homem que ele esperava chegar do trabalho todas as noite para poder brincar.
Os finais de semana Carlos busca Caio para passar junto dele, ele falhou em alguns deixando Caio triste, falou que era emergência, mas parece que essas emergências estão constantes demais. É aí que meu coração dói, eu não sou burra, e tenho quase certeza que isso tem a ver com uma nova mulher.
Carlos é advogado, tem uma empresa que herdou do pai, que hoje mora no Brasil com a esposa, eles só tiveram um filho, por isso toda a empresa pertence ao meu ex-marido. Sua empresa de advocacia é bem sucedida, mas não é a única em Montpelier(Vermont), existe outra que é gerenciada por três irmãos, dizem que o mais novo ainda faz faculdade, ela é conhecida por dois dos quatros irmãos atuarem bem no tribunal e não perde uma, os Sales são bons no que fazem, não que Carlos não seja, diferente da Sales Advocacia que englobam todos os tipos de casos a de Carlos só trabalha com o penal. O que o deixa um pouco mais atrás.
— Mamãe!
Sou tirada dos meus pensamentos quando escuto a voz mais gostosa que existe, estava escorada no carro esperando meu pequeno que graças a Deus chegou, já estava congelando aqui fora. Estamos no final de março e ainda está frio, logo mais a neve começará a derreter e adeus inverno.
Abraço meu filho lhe enchendo de beijos, está todo agasalhado, sapatos, calça, um casaco de inverno e um gorro.
— Mamãe estava morrendo de saudades, meu amor — falo depois dos beijos.
— Boa noite, Maju.
Escuto a voz que mais me acalmava nesse mundo, hoje ela me deixa nervosa.
— Boa noite, Carlos Eduardo, Caio se comportou direitinho?
— Sim, nosso filho é um anjo.
— É sim, então vamos, dê um beijo de despedida no seu pai, querido.
Caio vai abraçar o pai que se despede com um " até sábado".
Caio já estava bem cansado, já era tarde, chegando em casa fui logo dando seu banho, estava vestindo sua roupa quando ele me fez uma pergunta estranha.
— Mamãe, papai foi embora porque beijou a tia Malu?
Maria Luiza é minha irmã mais nova, nunca fomos as irmãs perfeitas, apesar de eu ter tentado bastante, minha irmã é muito complicada e egoísta, o que torna tudo mais difícil. Meus pais sempre passaram a mão na cabeça de minha irmã, mas ela nunca deu reciprocidade aos sentimentos deles, não sei porquê até hoje ela ainda é tão mimada por eles.
— Como ele beijou a tia Malu, Caio?
— Assim, mamãe.
Caio encostou sua boquinha pequena na minha, foi bem levinho, quase não senti seus lábios.
A ideia de Malu ser a nova mulher de Cadu me causa náuseas, eu sei que ele não teria essa coragem, e nem ela, apesar de tudo.
— Quando foi isso caio?
— Hoje de manhã quando ela foi embora, ela dormiu lá na casa do papai também, eles não sabem que eu vi isso mamãe, é nosso segredo tá?
Sinto meus olhos lacrimejando, eles realmente são capazes de fazer isso? Caio não ia inventar uma coisa dessa, tenho certeza que não. Sinto uma dor no meu peito, um nó na garganta, uma vontade louca de chorar e gritar, mas não posso, não na frente do meu filho. Meu filho! Como deve está a cabeça do meu menino vendo o pai beijar a tia. Carlos foi longe demais.
— Filho, vamos dormir que amanhã você tem aula.
— Boa noite, mamãe.
— Boa noite, filho, te amo.
Deixo Caio na cama e saio do seu quarto. Não sei como me controlei, eu esperava tudo, mas fui trocada pela minha própria irmã, com tantas mulheres, tinha que ser justo minha irmã. O que o Carlos estava pensando?
Tudo bem que Carlos é um homem bonito, educado, mas é meu marido, ou era, Malu não podia fazer isso comigo, eu jamais faria a mesma coisa. Isso tudo para que!? Por dinheiro? Ou realmente é amor?
Vou para o banheiro tentar me acalmar com um banho, mas é inútil, minhas lágrimas se misturam com a água, aqui eu posso chorar, posso gritar, estou sozinha. Tento organizar meus pensamentos, tento pensar em algo que me faça acreditar que tudo isso é mentira, tem que ser mentira. Depois de quase uma hora embaixo do chuveiro resolvo ir para cama, o cheiro de Cadu ainda está aqui, o que é mais triste, tudo aqui me lembra ele. Fico deitada olhando para o teto e fazendo a única coisa que consigo agora, chorar.
Depois de toda uma guerra feita por Caio para não ir para a aula, deixei ele na escola, de lá sigo para meu trabalho.
Trabalho com eventos, eu organizo festas de todos os tipos, da mais simples a mais chique, de festas de criança a festas de empresas. Não sou muito conhecida, mas o fato de eu estar casada com Carlos me ajudou bastante na divulgação, não posso negar.
Minha microempresa está indo bem, não tenho do que reclamar. Trabalho com minha amiga Laila, fazíamos um curso de decorações juntas e acabamos nos tornando amigas, foi quando fiz a proposta dela vir trabalhar comigo, desde então nós duas damos conta da MJ decorações.
Quanto o sinal está fechado pego um pequeno espelho na minha bolsa e me olho, a maquiagem cobre as marcas escuras embaixo dos meus olhos, consequências de uma noite mal dormida, péssima na verdade. Sinto vontade de chorar só em pensar, respiro fundo e me acalmo, chorar não vai adiantar e nem mudar nada. Sigo com esse pensamento até o meu trabalho.
— Bom dia, flor — Falo sorrindo para minha amiga que já está em sua mesa quando chego.
— Bom dia, patroa, tenho uma novidade.
— Por favor, que seja algo bom.
Mas uma notícia triste eu não aguento.
— Vamos organizar a festa dos Sales.
— Qual o real motivo da festa?
— Não sei, no e-mail só falou que queria algo elegante e discreto, deixou tudo em nossas mãos, até o buffet.
— Vamos dar conta, quando será a festa? — Pergunto sem animação.
— Sábado que vem, temos que correr contra o tempo.
— Como sempre.
— O que houve, amiga? — Ela me olhou preocupada, sei que o profissionalismo aqui acabou, o modo ativo de melhor amiga foi ativo.
Conto o que meu filho falou, pensei que ela ia dizer que não devíamos acreditar em criança ou algo do tipo mas me surpreendo com sua resposta.
— Crianças não mentem, Maju. E bom, Carlos vinha dando motivos, eu acho que isso pode ser verdade.
Fico pensando na possibilidade e isso não me agrada, tento me concentrar no trabalho mas é impossível, não quero ir para casa ou vai ser pior. Tomo um tempo e depois volto a planejar a organização do próximo evento, tenho que ocupar a mente.
Depois do expediente fui deixar Laila em casa e agora estou a caminho da escola de Caio.
Quando estacionei o carro vejo Carlos trazendo nosso filho no colo.
— Boa noite, Maju — Carlos diz e passa por mim para colocar Caio em sua cadeira.
Estou imóvel, não sei como reagir, não sei o que falar. Carlos nota meu rosto e meus olhos cheio de lágrimas, ele não é burro, já se deu conta que estou sabendo.
Seu rosto diz tudo.
— Merda! Olha Maju, eu ia te contar, não queria que soubesse por outra pessoa.
— Outra pessoa? Seu próprio filho que me falou Carlos, seu próprio filho! — Eu levantei a voz pela primeira vez para Carlos.
— Ele viu né! — Diz olhando para cima. — Eu disse a ela que não era uma boa ideia…
— Para, Carlos, eu não quero saber! É demais para mim, só toma cuidado com o Caio, ele é uma criança, não merece essa confusão. — Falo me virando para entrar no carro.
— Maju, espera!
Parei
— Você está chateada comigo e a Malu?
— Chateada? Eu tô com raiva de vocês dois, não tô mais conseguindo olhar na sua cara Carlos, vocês dois se merecem.
Entrei no carro com tanta raiva que bati a porta com força. Caio deu um grito de susto.
— Filho desculpa.
— Você estava brigando com o papai?
Fecho meus olhos procurando forças para não mentir e nem para chorar.
— Foi só uma pequena discussão, filho.
Ele não disse mais nada. A raiva não tinha passado, uma lágrima escorreu pelos meus olhos, apertava o volante com força, limpei meu rosto, eles não merecem minhas lágrimas, que raiva que estou daqueles dois.
Não percebi que o sinal fechou, parei o carro bem na linha de pedestre, senti um impacto vindo de trás, alguém bateu no meu carro, deve ter feito um estrago. Olhei logo para caio que estava assustado, saltei do carro e fui pegar meu filho.
Alguém também saiu do carro parado atrás do meu, seus passos eram rápidos e logo chegou até nós.
Pego Caio no colo e começo a perguntar:
— Você tá bem? Está doendo em algum lugar?
— Estou bem mamãe, quem fez isso no seu carro ?
Olhei para o lado e um homem charmoso estava parado perto de nós, não disse uma palavra. Tenho a impressão de já tê–lo visto em algum canto. Alto, muito alto, forte, seus olhos eram de um azul hipnotizante, seus cabelos pretos estavam uma bagunça realçando ainda mais sua beleza.
Sales, ele é o mais velho dos irmãos Sales.
— Ele está bem? — Pergunta olhando para Caio.
Fiz que sim com a cabeça.
— Você sabe que, o que acabou de fazer foi errado e perigoso, né?
Penso em Caio, podia ter acontecido alguma coisa com ele, se tivesse acontecido eu não iria me perdoar.
— É, eu sei, mas o sinal fechou, tive que parar.
Olhei para a traseira do meu carro e estava um pouco destruída.
— Você vai pagar isso! — Falei para o Marcos, se não me engano é assim que ele se chama.
Ele me olhou surpreso.
— Mas foi você quem parou o carro de uma hora pra outra!
— Mas foi você quem bateu, poderia ter acontecido alguma coisa com meu filho.
Ele me encarou e depois olhou para o Caio.
— Tudo bem, qual o seu nome? — Me perguntou.
— Maju, eu sou o Caio.
Meu filho falou todo homenzinho para o cara na nossa frente.
— Oi Caio, eu sou o Marcos.
Falei!
Ele estendeu a mão para meu filho, Caio fez o mesmo.
Marcos foi até seu carro e falou com o motorista que lhe entregou um pedaço de papel e depois voltou para perto de nós.
— Vá nessa oficina amanhã, vou avisar ao dono que você vai passar por lá, pode deixar por minha conta. Tenha uma boa noite Maju, desculpa esse incômodo, tchau rapaz — Ele falou bagunçando o cabelo de Caio.
Olhei o papel que ele me entregou, tinha um endereço.
Entrei no carro com Caio no meu colo, já estava perto de casa, não estava ligando se eu ia ser parada e levar uma multa, só queria meu filho ali pertinho de mim.
Eu sei que tinha um pouco de culpa nisso, não prestei atenção, mas foi ele quem bateu, e podia ter machucado meu filho, só de imaginar me dar um calafrio.
Já eram dez da noite, Caio já dormia, já eu, ia custar a dormir, Cadu e Malu não saiam da minha mente, acho que vou precisar de terapia, aqueles dois conseguiram arruinar minha vida.
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