39: Despedida I
Christine
Eu queria não acreditar, queria que tudo não passasse de um mero pesadelo. Jeff contou como se tudo o que ele fez não fosse nada, sua voz era fria e impassível, sua expressão não mudou. Eu o encarei, olhei em seus olhos.
— Por que você é tão mal assim? — Minha voz saiu trêmula, quase um fio.
— Nós todos somos o mal, de uma forma ou de outra. — Ele respondeu sem emoção e então se dirigiu a seu irmão. — Era isso o que você queria?
— Não, mas já é um começo — O cano da arma ainda estava apontado para minha cabeça. — Você ainda é o mesmo filho da puta.
Minhas mãos suavam, o bolo que se formava em minha garganta estava quase impossível de conter, a ânsia de vomitar era grande.
— Jeff... Por que?
Ele não me respondeu, eu esperei alguns segundos e então finalmente me contentei com o silêncio. Não havia respostas, por que ele fez tudo aquilo? Por que ele quis, simples! Eu tola cheguei a pensar que ele não mentiu para mim quando me contou tudo aquilo, eu senti receio de magoar seus sentimentos quando na verdade estava sendo enganada.
— Tudo bem, tudo entre a gente sempre foi baseado em mentiras mesmo. — Por mais que eu tentasse me manter calma, minha voz denunciava meu péssimo estado.
Jeff pareceu querer dizer algo, mas manteve sua postura séria. Eu já havia desistido e aceitado, esse final não é muito diferente do que imaginei uma vez, achei que seria Jeff a me matar, mas pelo visto não.
— Espero que entenda, o que eu tenho de resolver é com ele e eu não pretendo te fazer mal algum, mas não posso deixar você ir até terminar isso aqui. — Ele me obrigou a levantar e me segurou ao seu lado, Jeff o fuzilou com o olhar. — Eu não sou como você.
— Se não é como eu, o que faz aqui? — Perguntou sarcástico. — O bebê veio apenas apelar para que eu me sentisse arrependido ou veio para se vingar?
Liu não respondeu, mas pareceu se irritar.
— Você sempre foi assim, não é? Incapaz de revidar, vamos, eu matei quem você amava...
— Eu vou tirar esse sorriso idiota de sua cara. — Jeff sorriu ainda mais.
— Pago para ver — Provocou.
A mira da arma mudou de direção, ele ia disparar. Não sei o que me fez agir, se foi por ansiar me ver livre de sua posse ou pensar em Jeff. Puxei o canivete que havia escondido e cravei em sua perna direita com toda força que consegui, essa foi a distração perfeita e Jeff não deixou passar. Eu me joguei para o lado e assim que me ergui, corri para a escada na de ir ao quarto. Os dois ainda brigavam e assim que toquei na porta, escutei o som de disparos, meu coração se descompassou. Eu não queria voltar lá, me tranquei no quarto, eu só queria que todo esse pesadelo acabasse. Eu precisava ligar para a polícia. Me afastei da porta, me agachei próximo a cama e chorei, chorei sem me conter. O medo me paralisou, eu não escutava mais nada do andar de baixo.
— Christine? — Ouvi ele bater na porta. Era Jeff, isso é um bom sinal?
Eu sabia que ele me escutava chorar, eu não respondi.
— Christine! — Ele gritou. — Abre agora...
"Por que comigo? Por que?"
— Vai tocar fogo em tudo se eu não abrir?
Silêncio. Temerosa, me arrisquei. Me aproximei devagar e destranquei a porta. Eu precisava achar um jeito de sair ou chamar ajuda.
Ele respirou aliviado assim que me viu e tentou se aproximar, eu me afastei.
— Christine? — Eu encarei sua blusa manchada de sangue. — Foi de raspão... — Eu olhei e seus olhos.
— Me deixa sair — Eu não queria me aproximar dele. — Sai do caminho.
Jeff me olhou confuso.
— Como?
— Cadê aquele cara? Onde ele está?
— Dei um jeito nele por enquanto... vem aqui — Eu neguei, à medida que ele se aproximava, eu recuava. — Não comece...
Jeff suspirou sem paciência e avançou em minha direção, no susto tentei me afastar, mas ele me segurou com força pelos ombros.
— Presta atenção, você vai pra casa, não vai contar nada do que aconteceu aqui pra ninguém e não vai voltar, ouviu? — Eu assenti.
— E você? — Me atrevi a perguntar.
— Vou te ver quando encerrar as coisas aqui, não quero nada do passado me perseguindo.
— Não... eu não quero isso, não quero mais ficar com você.
— Que conversa é essa? — Perguntou com ira.
— Foi o que você ouviu — Tomei coragem para dizer o que tanto tinha medo. — Por mais que eu sinta algo por você, não significa que eu devo te aceitar. Eu estou com medo, muito, mas não vou mentir e fugir. Eu não vou te esperar e espero que você vá para o inferno por tudo o que fez.
As lágrimas fluíam por meu rosto, Jeff ficou assustadoramente calmo e por tudo o que eu disse, eu já esperava o pior dele, mas ele apenas olhava fixamente em meus olhos.
— Eu vou quebrar aquela promessa que te fiz. — Eu me arrepiei, ele prometeu que não ia me machucar, prometeu cuidar de mim. — Você tem sorte...
Eu fechei os olhos esperando pelo pior, mas o que ele fez, me foi totalmente inesperado. Eu senti seus lábios nos meus, inicialmente de forma gentil. Eu reagi e como se estivesse desesperado, seu beijo se tornou urgente e agressivo.
Eu gelei ao escutar um barulho alto no andar de baixo, algo ruim ia acontecer. Jeff pareceu ignorar o barulho e ao me soltar, ele encarou minha barriga por alguns segundos, mas logo se afastou saindo do quarto. Fiquei sem entender o que havia acontecido até ele voltar com uma mochila que eu acredito já ter visto antes.
— Pega — Ele me jogou a mochila sem cuidado algum, eu a agarrei desajeitadamente, era pesada — Vê se não vai perder isso... — Eu continuei parada sem entender o que estava acontecendo.. — Anda porra, vem logo.
Me apressei em seguir ele. Saímos do quarto indo em direção ao andar de baixo, Jeff assim que pôs os olhos na sala praguejou e me agarrou pelo braço. Eu notei a mancha de sangue no chão e um forte cheiro de álcool no ar.
— Vai logo — Ele abriu a porta da rua e me arrastou até o carro. — Vai pra casa e...
Ele me deu as chaves e parou de falar. Era isso? Nunca mais nos veríamos?
— Ele deve ter ido embora... — Jeff negou.
— Ele não ia desistir tão fácil assim de mim, assim como ele sabe que eu também não vou fugir deixando ele novamente para trás — Meu peito se apertava e eu não sabia o motivo — Vai logo, antes que eu me arrependa e te prenda no quarto.
Fitei seu rosto e sussurrei um "Adeus", abri a porta e joguei a mochila no banco do passageiro, dei partida, não queria demorar mais nem um minuto ali.
(...)
Minha mente ainda estava inquieta, descansei a testa no volante e respirei fundo. Meu Deus, o que eu ia fazer? Um pouco mais calma, eu finalmente me senti curiosa sobre o que havia na mochila que recebi. Assim que a abri, fiquei chocada. Por que ele me daria tanto dinheiro assim? Como eu ia explicar isso à minha mãe? Minha ficha caiu quando percebi que estava sozinha, talvez eu nunca mais fosse ver Jeff. Por que eu estava desconfortável com isso? Não é o certo? Não foi o que eu quis? Mesmo depois de tudo o que descobri, meus sentimentos ainda eram contraditórios, por que? Eu deveria me preocupar? Provavelmente aquele cara não vai me procurar, acredito que eu talvez não precise ir a delegacia. Se bem que a última vez eu decidi não fazer isso e acabei com um louco atrás de mim. Respirei fundo novamente e peguei a mochila, saí do carro e andei em direção a porta. Com sorte, talvez minha mãe estivesse em casa.
Jeffrey
Me incomodou vê-la partir, mas sabia que seria difícil para ela digerir o que tinha descoberto sobre mim e que no momento tudo estava um caos. Eu daria um tempo, um tempo para ela processar o que aconteceu. Eu não queria isso, mas sei que no momento não tenho escolha. Preciso me livrar de uma pedra em meu sapato.
Eu não o matei, achei que ele não acordaria tão cedo com a surra que dei e isso me daria tempo, claro, não foi fácil derrubá-lo mesmo com a perna machucada, ele era resistente. Eu não sinto medo, não me sinto mal pelo que fiz. Se ele tivesse me escutado, talvez hoje não estivéssemos nessa situação. A casa está em um silêncio sepulcral, isso não me incomodaria em outra ocasião, mas antes que eu pudesse pensar em algo, sou pego de surpresa. Sinto algo me atingir, eu caí.
— De nada... — Me virei, Liu me encarava com um olhar debochado enquanto segurava algo que não conseguia identificar. — Eu fui bonzinho em deixar vocês se despedirem, não é?
Minha cabeça doía infernalmente e minha visão estava turva, fui atingindo novamente. Tentei me erguer, mas estava zonzo. Bebida foi jogada em mim, Liu estava me encharcando de álcool.
— Eu fiquei três semanas internado por sua culpa. — Eu o encarei e despretensiosamente Liu acendeu um isqueiro. — Um ano fazendo terapia e depois disso... eu percebi que o que me traria paz não seriam as terapias e sim ver você pagar pelo que fez. Te vejo no inferno, Jeffrey.
Eu tentei me afastar, mas já era tarde. As chamas dançavam sobre meu corpo como labaredas do inferno, impossíveis de se apagar por mais que eu tentasse. O desespero e a adrenalina me consumiam, meu corpo ardia, queimava. Era como se o próprio satanás estivesse me vendo queimar. Naquela noite meus gritos foram com certeza música para o seus ouvidos. Em algum momento eu ouvi sons de disparos e uma voz. Eu a teria reconhecido se estivesse preocupado com isso, mas no momento me perguntava se conseguiria sobreviver aquilo.
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