35: Menino?
Jeffrey
Se livrar de um corpo não era tão fácil, mas também não era algo impossível. Desmembrar e enterrar em uma cova funda num lugar afastado e deserto me era sempre a melhor opção. Isso quando eu não estava sem paciência e deixava o corpo em qualquer lugar, mas Spencer sempre reclamava pois segundo ele "Sem provas, sem crime".
Ele não gostava de carnificina, portanto quando precisava se desfazer de alguém, se desfazia do cadáver em um dos seus barris ácidos. Ele dizia que era uma opção rápida, fácil e que não deixava provas. Retirei o cadáver da cadeira. O coloquei na mesa de metal empurrando para o lado alguns objetos que estavam nela. As entranhas escapavam pelo corte que fiz em seu estômago. Sem me importar muito, as recolhi. As ferramentas maiores ficavam em um armário amplo de metal, peguei uma motosserra portátil, havia também serras e um cutelo.
Comecei pelos braços, na altura dos ombros, cortei o braço esquerdo e logo depois o direito. Segui para as pernas, na altura do joelho eu cortei uma e depois a outra. Cortei as coxas deixando apenas o tronco com a cabeça que deixei por último. Ao cortar a cabeça, desliguei a motosserra. Fitei o cadáver desmembrado, ver pessoas mortas ou ter contato com sangue e órgãos nunca me abalou, de modo que às vezes me pergunto se eu seria um bom profissional em alguma área voltada para isso.
Como um médico legista, perito criminal ou até mesmo coveiro. Dei de ombros, precisava apenas diminuir o tamanho do infeliz para facilitar meu trabalho na hora de me locomover e quando fosse enterrá-lo. Peguei um saco preto resistente, também no armário de metal e comecei a ensacar os pedaços. Coloquei dentro de mais dois sacos para ter certeza que nada fosse vazar. Minha aparência não era das melhores, já que estava sujo de sangue. Fui até uma pia no fundo da sala, lavei as mãos e os antebraços. Com o auxílio de um pano sequei as mãos e limpei os resquícios de sangue em mim, ao menos o que eu conseguia.
— Hora do passeio Carlos. — Peguei o saco com certa facilidade, estava acostumado com isso e me retirei da sala.
(...)
Demorei a chegar em casa, tive de procurar um bom lugar para o Carlos. Tinha de ser um bom local para que não o encontrassem, pelo menos não tão fácil. Se bem, eu acho que ninguém vai procurar por ele. Entrei em casa silenciosamente, era tarde, mas Christine poderia estar acordada. Subi para o quarto, ela estava dormindo e ao que tudo indicava, tranquilamente. Fui ao banheiro. Retirei a roupa suja, entrei no box. Precisava me livrar de qualquer resquício de sangue antes de me aproximar de Christine.
Esfreguei meus braços e mãos com a esponja de banho, lavei os cabelos.
Sai do box ao terminar, me sequei com paciência e subi para me trocar. Vesti uma calça moletom simples e então finalmente pude me deitar. Christine despertou quando me deitei ao seu lado.
— Jeff? — Perguntou sonolenta. — Que horas são?
— Volte a dormir. — Ela se aninhou em meus braços. — Você não quer perder o sono, não é?
Ela negou. Fechou os olhos e voltou a dormir. Eu a olhei por algum tempo antes de sentir sono e finalmente apagar.
(...)
Christine
Hoje é o dia que vou saber o sexo do bebê. Eu estava e estou curiosa, mas não tive coragem antes. Não sei qual vai ser a reação de Jeff. Minha mãe parecia estar ansiosa assim como eu, eu disse que diria a ela o resultado pessoalmente, tinha dias que não a via e estava com saudades.
Vesti uma blusa de manga comprida e uma calça legging para não me apertar. Prendi meu cabelo num rabo de cavalo e passei perfume, peguei minha mochila e desci.
— Você ainda não foi se trocar? — Jeff que estava cochilando no sofá levantou-se num pulo. — Te dou dez minutos, não demore.
Ele subiu para se trocar. Quando desceu, pegou seus pertences e nós saímos de casa.
— Temos mesmo que ir tão cedo? — Reclamou.
— Cedo? São nove da manhã e outra, você não dormiu direito porque voltou tarde para casa. — Ignorei sua má vontade e o empurrei até o carro.
Ele assentiu enquanto abria a porta para mim.
— Ah Jeff, você pode finalmente ir conhecer minha mãe? — Eu entrei no carro. — O que você acha? Pode ser essa semana?
— Ela já não me conhece? — Ele colocou seu cinto e logo depois o meu. — Não sei se é uma boa ideia.
— Claro, a primeira impressão que ela teve de você foi... ruim. — Ele respirou fundo. — Sei que você não gosta, mas...
— Por favor, agora não. — Ele me interrompeu. — Pensamos nisso depois, tudo bem?
— Certo, desculpe. — Me senti contrariada.
Percebi que Jeff não estava muito afim de conversar e me calei. Fomos em silêncio até chegar na clínica. Eu estava um pouco chateada pelo que houve anteriormente, eu não queria que ele fosse tão afastado, eu gostaria que minha mãe tivesse uma visão diferente dele para que ela não se preocupasse ou pensasse que fiz uma má escolha. Ela é tudo o que eu tenho de família. Odiei o silêncio incômodo que se instalou entre nós já que estava acostumada a estar sempre conversando.
Ele só falou comigo quando já estávamos na sala para o exame.
— Está nervosa? — Eu assenti. — Relaxa.
Ele segurou minha mão e seu toque me trouxe conforto. Ficamos mudos enquanto víamos as imagens no ultrassom.
— Parabéns, é um menino. — Eu encarei Jeff que estava paralisado. — Perfeitamente saudável.
— Sério? — A doutora assentiu.
Sua reação me fez rir, ele me olhou.
— É um menino...
— Só agora caiu a ficha? — Perguntei.
Jeff beijou minha mão, parecia estar bem com a notícia. Quando o exame terminou, eu fiquei conversando um pouco mais com a doutora já que tinha algumas dúvidas. Jeff não perguntava nada, mas parecia atento à conversa.
— O que acha da gente fazer algo para comemorar? Sei lá, podemos sair. — Eu sugeri ao sairmos do consultório. — Espero que nosso menino esteja feliz também.
— Vamos onde você quiser.
— Amanhã, vou me encontrar com minha mãe.
— Só com ela? — Perguntou imediatamente.
— E com quem mais seria? — Ele suavizou sua expressão.
— Eu só fiz uma pergunta.
Preferi ficar quieta, não queria estragar meu bom humor.
(...)
Jeffrey
Eu admito que gostei quando escutei Christine dizer "nosso menino", ao invés de "meu filho".
Ela parecia entusiasmada, falou bastante sobre o que faria para o bebe, disse que queria que a cor do quarto dele fosse em tons pastéis, que ia comprar muitas pelúcias. Fomos a um restaurante, depois andamos um pouco. Eu estava a maior parte do tempo calado porque eu estava gostando de escutá-la.
— Claro e não vamos esquecer o mais importante. — Ela me guiou até um banco próximo e nos sentamos. — Que nome vamos escolher para ele?
Me lembrei da conversa que tivemos e do nome que eu gostaria que ele tivesse.
— Você não pensou em algum?
— Não, eu não sou tão criativa. Você não tinha um em mente?
— Sim. — Ela me olhou curiosa. — Nosso filho pode se chamar Adam?
Christine sorriu, confesso que era um nome simples, mas sempre achei bonito.
— Claro. — Ela encostou a cabeça em meu ombro. — Posso reformar o meu quarto?
— Seu quarto? — Ela assentiu. — Quer que o seu quarto seja dele?
— Sim e não, vai ser o nosso quarto, pelo menos até ele ficar grandinho.
— Achei que o quarto seria do bebe, você não quer mais dormir comigo? — Isso não faz muito sentido ao meu ver.
— Moramos na mesma casa, mas temos quartos separados e nem sempre dormimos juntos, eu achei que você gostasse assim. — Ela deu de ombros.
— Adam vai ter o quarto dele e nós vamos ter o nosso. — Respondi. — Na verdade eu ainda acho que devemos mudar para outra casa, talvez uma maior.
— De novo com isso? Para que uma casa maior se essa está perfeita?
— Está bem, como você quiser. Sei que não tenho escolha.
— Não fale assim. — Ela me repreendeu.
— Desculpe.
Ficamos em silêncio, apenas olhando a movimentação do local, cada um com seus pensamentos. Christine estava tão amável ultimamente que algo me parecia errado, algo no fundo de meu ser dizia que eu não merecia isso. Isso me era tão estranho, a única vez que eu senti algo parecido foi a anos atrás, por que me sinto incomodado?
— Jeff? Podemos ir? Está ficando frio.
Eu assenti. Me perdi novamente em pensamentos inúteis, coisa que não vai me levar a lugar algum.
— Está preocupado com algo?
— Eu? Não, por que?
— Você ficou sério e pensativo do nada.
Eu me levantei do banco e dei a mão a ela.
— Não é nada, vamos para casa?
(...)
Christine
— É um menino. — Minha mãe sorriu e me abraçou. — Vai se chamar Adam.
Eu a encontrei em um restaurante no horário de almoço. O clima estava chuvoso, mas isso não tirou meu bom humor, eu fiquei ansiosa, queria dividir com ela o que pra mim, era uma boa notícia.
— Vai dar tudo certo. Claro, vai ser difícil pois nada no mundo são flores, mas com paciência tudo se ajeita. É importante que seu namorado esteja com você, afinal, é um trabalho conjunto e ele tem de estar presente. Eu sei o quanto a ausência de um pai pode ser ruim.
Lembrei-me de meu falecido pai, crescer sem ele foi doloroso para mim. Eu tinha uma família perfeita, mas pouco pude aproveitar isso. Minha mãe tinha formação, mas parou de trabalhar assim que me teve, com a morte de meu pai, ela voltou a trabalhar. Não tínhamos parentes próximos então eu passava a maior parte do tempo com uma babá, já um pouco maior, eu passava meus dias sozinha ou na casa de amigos quando não estava na escola, às vezes aos finais de semana minha mãe me levava a algum lugar. Ao terminar o ensino médio com dezoito anos, meu círculo de amizades diminuiu. Os poucos conhecidos eram amigos para apenas um saída. Quando cansei disso, apenas cortei contato com todos.
— Eu sei. — Respondi saindo de meus pensamentos, minha resposta saiu vaga.
— Ainda espero pelo dia em que vou conversar direito com esse rapaz, malmente o vejo com você. — Revirei os olhos, por que minha mãe tem de trazer esse assunto à tona?
— Jeff está sempre comigo, exceto quando vai trabalhar, obviamente. — Sua expressão era de desconfiança.
— Eu espero, as vezes me sinto como uma estranha em sua vida, você mal compartilha as coisas comigo, não sei nem mesmo o seu endereço.
Um silêncio incômodo pairou sobre nós, quando ela percebeu que não ouviria uma resposta de mim, ela continuou.
— Você saiu de casa tão abruptamente, eu tinha esperança que voltasse, eu sei que provavelmente não vai já que está grávida, vai preferir ter o seu espaço e vai seguir sua vida. — Ela suspirou. — Mas saiba que sempre estarei de braços abertos caso precise, posso não ter sido tão presente, mas sou sua mãe.
Ela sempre foi uma ótima mãe, eu deveria valorizar mais isso.
— Eu te amo. — Ela tocou minha mão sobre a mesa. — E apesar de tudo estou feliz.
— Eu também te amo. — Eu respondi.
Conversa vai e conversa vem, mudei o foco do assunto perguntando sobre como ela estava, conversar cara a cara sempre será melhor do que por mensagens, eu estava com saudades.
— Não há nenhuma novidade para contar... — Ela deu um pequeno riso. — Mas estou seguindo o conselho de uma amiga e tenho saído mais, segundo ela, eu me dedico muito ao trabalho.
— Eu concordo, eu sempre disse isso, mas você nunca me escutou. Comece algum hobby ou vá a encontros, dê uma chance a algum rapaz legal.
— Christine, eu já estou ficando velha. — Sempre a mesma desculpa. — Gosto de como estou.
Minha mãe pouco se envolveu com outros homens. Sempre achei especial a relação de meus pais, mas nunca entendi o porquê dela mãe não se permitir seguir em frente, meu pai não gostaria que ela passasse o resto da vida sozinha.
— Velha onde? Idade é apenas um número.
— Você é jovem, eu não tenho mais idade para isso. Quero ter bastante força e tempo agora, para mimar meu neto quando ele nascer.
Eu me senti genuinamente feliz com isso.
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