Capítulo 07: Não sou criança!
Changbin odiava dias de feira. Ele era obrigado a acordar cedo no fim de semana e agora ainda tinha que fingir que estava de bom humor porque sua mãe estava apaixonada, e ela queria mostrar para Erick que Changbin era um bom filho que ajudava sempre a mãe com um sorriso no rosto. O que, primeiro, era realmente verdade, Changbin sempre a estava ajudando, e segundo, era mentira, ele nunca estava sorrindo, principalmente nos dias de feira.
Era mais ou menos nove horas da manhã de um domingo. Inacreditável. Changbin empurrou o carrinho parcialmente cheio, em uma mão o celular pendia, ele trocava mensagens com os amigos, reclamando que estava acordado no seu dia de folga do colégio, e pior ainda, estava preso com sua mãe apaixonada, seu padrasto sem expressões e o filho estranho dele. Changbin queria ir para casa desesperadamente, descrente que foi realmente acordado tão cedo apenas para bancar a família feliz.
De pouco em pouco, o carrinho foi ficando cheio, Christopher e Miyan trazendo os alimentos enquanto Changbin estava encarregado em apenas empurrar pelos corredores e alas. Erick estava responsável pela contabilidade, o aplicativo da calculadora aberto no celular que segurava, enquanto seguia a futura esposa pelos corredores bem ventilados e cheios de gente.
— Da para você pelo menos fingir que não está achando tudo insuportável? — Miyan reclamou quando retornou com bandejas de carne, depositando tudo no carrinho. Changbin tentou fingir um sorriso, porém se sentiu muito estranho, então desistiu voltando a expressão de cansaço e sono.
— A senhora sabe que eu não gosto de sair dia de domingo. — Resmungou nitidamente mal humorado. Miyan amarrou o cabelo em um rabo de cavalo, a lista de compras jogada dentro da bolsa que carregava na lateral do corpo. Changbin sabia que estava por vir, aquela expressão no rosto dela dizia que ele levaria um sermão.
— Eu sei, Changbin. — Lá vem. — Mas é nossa primeira atividade juntos como uma família, você não pode ao menos fingir que está alegre por sair conosco? Se fosse com seus amigos, você estaria todo sorridente, mas com a gente é assim? Por que você não consegue ficar feliz pelo menos com a gente? Está sempre de mal humor. E você devia tentar ser mais próximo de Erick, desde que ele foi morar com a gente você nunca falou com ele direito.
— Por que eu deveria? E sobre o que a gente falaria? Olha para ele, mãe. — Balançou a cabeça na direção do homem alto e loiro junto a Chan, ele parecia desligado do mundo, embora o filho estivesse falando sem parar. — Ele é estranho.
— Você nunca nem tentou falar com ele! — Ela se exaltou um pouco, chamando atenção das pessoas ao redor. Changbin quis se esconder dentro de um buraco pela repentina atenção que ganhou pelo repentino surto de Miyan. Sempre será assim agora? — Se você ao menos tentar, vai descobrir que ele é uma boa pessoa. E ele é bom pra mim, Changbin. Porque é nítido que você não está nem um pouco feliz com nosso casamento.
— E vai mudar alguma coisa minha felicidade com isso? A senhora nem ligou de me perguntar se eu estava confortável com gente desconhecida morando na nossa casa antes de mandar eles pra lá. A senhora só fez e acabou, nem me perguntou nada. Como sempre faz.
— Achei que você estaria feliz em saber que sua mãe está seguindo em frente, igual Yongjin fez. — Ela parecia genuinamente irritada, embora fizesse um esforço sobre humano para ninguém reparar que estava prestes a começar a gritar com Changbin. Ele a conhecia, sabia que ela nunca teria um surto no meio de uma multidão, porque isso só mostraria que ela era instável e Miyan nunca assumiria para si mesma que não era tão controlada quanto fazia parecer. — Seu pai fez a mesma coisa e você não se importou, então por que comigo é assim? — Changbin encolheu os ombros com a citação do pai, porque sim, ele arranjou uma esposa e teve uma filha, mas isso não o envolveu diretamente, como agora.
— Talvez por que eu não moro com meu pai e sim com a senhora? — Indagou como se fosse óbvio.
— Mas já tomei minha decisão e não vou voltar atrás só porque meu filho querido não gosta disso. — Changbin quis dar de ombros novamente, ciente que essa conversa não levaria a lugar nenhum, mas ele não fez isso, pelo contrário, ficou quieto e apenas ouviu. — Vai pro carro e pensa um pouco nas coisas que você acabou de dizer.
— Não sou criança.
— Mas está agindo como uma sendo tão malcriado. — Miyan o empurrou para o lado e tomou o carrinho que ele levava. — Vá. Por que ainda está aqui? Saia agora, Changbin.
Ele foi — a contragosto — e passou pelas pessoas, desviando de um ou dois carrinhos no meio do percurso até o estacionamento do supermercado. Chateado, Changbin abriu a porta e entrou no banco de trás, os olhos ardendo com lágrimas teimosas, mas ele não chorou. Não era o momento. Estava tão chateado e irritado com ela e consigo mesmo. Por que sou o único incomodado com isso? Será que sou realmente o problema? Pensou, amuado no estofamento confortável do carro de Erick. De braços cruzados e um bico quilométrico adornando os lábios, Changbin quis não ligar mais para essa situação, igual Chan fazia. Ele não queria se incomodar e nem ter medo que aquele cara que se autodeclara noivo de sua mãe seja um completo babaca e estivesse a usando para fins desconhecidos. Changbin já tinha visto Miyan chorar mais vezes por ter o coração partido do que tinha visto ela sorrir genuinamente feliz por algum homem que namorou durante os últimos anos. Ele talvez não devesse estar tão preso nisso, as pessoas são diferentes umas das outras e ele deveria fazer como ela disse, dar uma oportunidade para Erick, mas não conseguia, aquele medo e insegurança em relação a seus padrastos o perseguia como uma sombra que estava à espreita. Não era ciúmes, só era medo. Medo de presenciar novamente Miyan bêbada no meio da madrugada chorando riachos inteiros porque ninguém conseguia amá-la do jeito que ela é. Medo de vê-la deprimida por não se sentir suficiente para ficar sozinha.
Permaneceu no carro para não aborrecê-la mais, mesmo que estivesse calor e ele não quisesse ficar sozinho. Changbin pegou o celular e, para sua infelicidade, estava sem bateria. Ele deixou o aparelho no bolso da bermuda que vestia e estapeou a testa por novamente esquecer de colocar para carregar na noite anterior, vinha dormindo tão mal esses dias com os pesadelos que estava tendo que sempre esquecia de fazer uma coisa ou outra antes de ir para cama. Aquela rotina de sempre esperar Chan dormir para subir na outra beliche estava o desgastando mais do que deveria. Talvez dormir em outra cama acabará influenciando na qualidade do sono que estava tendo, porque a última coisa que Changbin andava fazendo era dormir de verdade. Às vezes cochilava por uma ou duas horas enquanto rolava pelo beliche superior, tentando achar uma posição confortável para descansar, mas tudo que conseguia era ficar ainda mais desperto. E quando menos esperava, era hora de ir para a escola.
Com calor, Changbin escorregou um pouco pelo assento e abriu uma das janelas, embora não estivesse ventando no momento. Abanando a camisa, ele esperou até que sua mãe surgisse com os dois australianos, e ele esperou por muito tempo, mas tudo que conseguiu ver enquanto derretia de calor era a silhueta de Chan vindo em direção ao carro em passos curtos, carregando somente uma sacola de plástico amarelado. Nem sinal de Miyan, muito menos de Erick. Changbin tentou se recompor, passou a mão pelo cabelo e ajeitou a roupa que estava um pouco amarrotada, não queria parecer uma bagunça na presença do garoto.
— Oi, bonitinho. — Changbin ainda odiava os apelidos que ele usava, odiava cada um deles. E Chan parecia ter uma lista recheada deles. Ele abriu a porta e entrou no carro, jogando a sacola no colo de Changbin. — Trouxe pra você. — Changbin hesitou em abrir, mas fez, enfiando uma das mãos dentro da sacola e tirando um picolé, o plástico colorido não especificava o sabor, mas com o calor que o menino estava, até se fosse de milho — pior sabor de picolé, na opinião do Seo — ele comeria. Então, sem fazer cerimônias, ele abriu o plástico e tirou o picolé azul de dentro, mordendo um pedaço generoso. Definitivamente não é de milho. — Te procurei lá dentro e não te achei, pensei que você tinha se perdido.
Changbin evitou falar, não queria conversar sobre o que aconteceu, e torceu para que ele não insistisse. O que aconteceu. Chan não o pressionou para explicar como de repente ele tinha sumido, ele parecia ter entendido o silêncio do menino e decidiu abrir todas as janelas do carro e depois voltar para o assento de trás, onde Changbin permanecia quieto com o picolé já pelo fim. Chan apenas sentou do seu lado e ficou ocupado no celular, quieto de uma maneira que Changbin não estava acostumado. Nas últimas semanas desde que eles começaram a conviver para valer, Chan se mostrou ser ainda mais hiperativo que Jisung, ele falava pelos cotovelos os maiores absurdos que Changbin já ouviu na vida, além de ser irritantemente pegajoso, talvez mais que Minho. Porém, Changbin estava confortável com o carinho de Minho, eles estavam juntos desde a infância, mas com Chan era diferente. Não conseguia aceitar os abraços dele, por isso, em todas as tentativas, Changbin desviava, ou apenas empurrava o menino para longe.
Contudo, o olhando de cantinho, igualmente largado no estofado claro do automóvel, usando uma camiseta preta sem estampa e shorts branco, Changbin cogitou deitar a cabeça no ombro dele. Eles estavam próximos, perto o suficiente para Changbin conseguir ver o que ele fazia no celular — ele jogava um jogo de cartas, talvez fosse paciência ou qualquer outro jogo genérico envolvendo baralho. Changbin nunca foi bom com cartas e truques. Ele quis se aproximar mais um pouco, até estar ombro a ombro, mas não teve coragem. Changbin espiou pela janela à esquerda, checando se sua mãe estava vindo, mas nem sinal. Ficou receoso em saber a reação da mulher ao vê-lo tão próximo ao Bang, embora sua verdadeira pergunta fosse "Como ela reagiria se eu estivesse tão próximo a um garoto?” Changbin sabia que, embora não tivesse muitos exemplos de atração, garotos sempre foram mais bonitos para ele do que garotas. Ele soube disso quando estava no ensino fundamental e achou que estava apaixonado por um colega de turma, naquela época ele nem ao menos sabia que meninos — segunda a sociedade que vivia — não podiam amar meninos, mas gostar daquele garoto — de nome que ele não conseguia lembrar — parecia certo. E esse sentimento durou por pelo menos três semanas, até que o garoto foi embora e Changbin nunca mais o viu. Ninguém além dos seus amigos sabiam dessa pequena paixonite, ele nunca teve coragem de falar sobre esse assunto com Miyan, muito menos com Yongjin.
Changbin tinha receio em ter aquela conversa com Miyan, tinha receio dela nunca aceitar que talvez o garoto fosse realmente gay, embora essa sigla ainda não parecesse certa. Changbin tinha certeza que não era apenas gay, porém pensar muito naquilo o enchia de medo. Se ser gay já era difícil, imagine ser mais do que isso? Changbin não queria sofrer, não queria fazer as pessoas ao seu redor sofrer só porque ele era diferente. Ele virou o rosto quando achou que já estava encarando demais, e respirou fundo, incapaz de acreditar que estava mesmo cogitando a ideia de ficar tão próximo ao australiano. Digo, não era qualquer menino ali, era Chan, filho do seu padrasto novo. O mesmo Chan que o irritou no primeiro dia que se conheceram. E o mesmo Chan que me comprou picolé hoje. Changbin balançou a cabeça, se recusando a ficar tão mole por apenas um picolé.
— Prometi pra mim mesmo que não te encheria o saco com perguntas, mas — A repentina movimentação ao lado fez Changbin retornar a atenção ao rapaz de fios ondulados e negros. — O que a senhora Miyan falou pra você antes? — Os ombros de Changbin murcharam, sendo impossível para ele não demonstrar que estava exausto daquilo tudo. Chan se compadeceu, mas hesitou em tocá-lo, ciente que Changbin não reagiria bem.
— O de sempre. — As brigas entre eles se tornaram tão rotineiras que Changbin parou de precisar explicar todas as vezes sobre que assuntos eles estavam discutindo a Chan quando os dois iam para a cama à noite e tinham curtas conversas no escuro. — Eu sei que deveria estar apoiando ela nessa decisão, mas casamento é algo tão sério. — Changbin suspira, as mãos no colo e os olhos fixados nelas se esfregando numa aflição silenciosa. — Só tenho medo que ela saia machucada de novo disso.
— Ela é adulta, Changbin. Se ela se machucar, vai ser só as consequências dos próprios atos.
— Eu sei. — Encolheu mais os ombros, quase se fundindo com o estofado. — Mas ela é minha mãe, eu me preocupo. Você não tem ideia das maneiras que já vi ela destroçada por causa de homens idiotas que só sabiam brincar com os sentimentos dela, você não tem noção de tudo que já vivi com ela por causa disso.
— Realmente não tenho ideia, mas você precisa deixar que ela quebre a cara se for necessário, Changbin. — Hesitante, Chan tocou o ombro de Changbin, os dedos apenas encostando na camiseta azulada. — Você é só um garoto, e ela é adulta. Deixa que ela faça o que quiser, você não tem obrigação de livrar as pessoas das coisas que elas procuram. — Changbin o olhou, a vista embaçada por lágrimas que insistiam em querer descer. Não posso chorar, não posso. Ele esfregou os olhos, e se recompôs quando o porta malas foi aberto de surpresa, anunciando a chegada de Erick e Miyan.
Eles logo se afastaram, principalmente Changbin, que escorregou para o lado e se conteve o máximo possível. Chan saiu para ajudar o pai a colocar as sacolas de compras na mala e Miyan entrou no banco de passageiro, porém, Changbin preferiu encarar os outros automóveis no estacionamento do que ter que encará-la. O clima entre eles era o pior possível, Changbin colocou o cinto e escolheu olhar através da janela do que os olhos pretos que tentava encará-lo pelo retrovisor do carro. Mesmo após Erick colocar uma música baixa no rádio, o clima não melhorou. Pelo contrário, Changbin se sentiu ainda mais deprimido quando My Way Of Life começou a tocar.
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