Capítulo XVIII - Pedido de partida
Boa leitura :D
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Viktor fitava o céu estrelado naquela noite calma. As aves noturnas cantavam sua trilha sonora. O céu tinha poucas estrelas e uma linda lua crescente a enfeitar o manto azul escuro. Os olhos amarelos sem vida fitavam tudo ali, mas na verdade ele não via nada. Estava, novamente, submerso em seus pensamentos.
Kristen Sartórios.
Aquele nome ficara gravado em sua mente. Ele não conseguia tirá-la da cabeça depois de sua estranha iniciativa de uma apresentação formal. O que ela queria, afinal? Aquela moça o repudiara desde a primeira vez em que colocara seus olhos cristalinos nele e agora simplesmente parecia querer aproxima-se de sua figura.
Devia estar a querer brincar consigo. Mas a troco de quê?
Já a algum tempo ele estava ali, na sacada de seu quarto, com o vento frio tocando sua pele que a muito perdera a proeza de arrepiar-se. Aquela moça mexeu consigo desde da primeira vez em que pusera seus olhos nela naquele cemitério. Desde aquele dia, aquela moça fora sua esperança. Mas logo essa esperança dessipara-se no ar deixando-o novamente em um grande vazio.
— Menino? — Viktor olhou por cima dos ombros e avistou sua amada Margareth parada no meio do ambiente mal-iluminado.
— Não a vi entrar — ele caminhou na direção dela passando suas mãos no cabelo da senhora. Ali ele não lhe causaria dano.
— Não me surpreende. Todas as vezes em que o chamo tu viajas em pensamentos — a senhora sorriu de lábios selados.
— A que devo tua visita? — ele perguntou indo sentir-se na poltrona frente a pintura de sua amada.
— O jantar está posto — ela andara até ele apontando suas mãos no topo da poltrona. Ele soltou uma risada nasalada.
— Achei que nesses anos todos já tiveste descoberto que não necessito de comida, minha querida.
— Eu sei, menino. Mas a menina na casa necessita.
— Não compreendo vossas intenções — ele perguntou franzindo o cenho realmente sem entender.
— Como cavalheiro que és e anfitrião desta morada, acredito que não devas deixar uma dama jantar sozinha— Viktor levantou-se e fitou a senhora.
— Estás a defende-la? Outrora tu eras a primeira a querer que me afastasse da moça.
— Outrora ela era mais arredia e machucava-o. Agora somente enxergo uma moça que fora salva e busca um modo de voltar atrás de suas palavras — ela sorriu de lábios selados.
— As vezes tu pareces o vento: muda de direção sem que ao menos notemos — ele deixou a senhora para trás e fora até a porta da sacada sem que fosse de fato para o lado de fora.
— Apenas estou a dar-te uma sugestão. Não és obrigado a ouvi-la — ela dissera.
Viktor fechara devagar a porta dupla de vidro que dava acesso a sacada privando o ambiente do vento frio que entrava.
— Aguarde-me na sala de jantar — ele sorriu de lábios selados — Em instantes descerei.
A senhora sorriu satisfeita.
***
Kristen fitava seu reflexo no amplo espelho a sua frente. Trajava um vestido creme de mangas cumpridas. Um sutil decote quadrado enfeitava seu busto e seu sua cintura era bem delineada. Em seus pés, calçava uma sapatilha branca muito confortável. Seu cabelo estava solto sobre seu ombro esquerdo.
— Estás muito bela, menina — A cabeça da senhora adentrou uma abertura na porta.
— Sinto-me estranha, na verdade — ela dissera voltando a fitar-se no reflexo. A senhora adentrara o cômodo fechando sutilmente a porta negra atrás de si.
— Não compreendo a razão de tal — a senhora cruzou suas mãos em frente o corpo envolto em um vestido azul escuro de mangas longas.
— Meus vestidos sempre foram o mais simples possíveis. Nesse tecido sinto-me como uma ladra que rouba sua superior e veste-se as escondidas. É como se eu quisesse vestir-me igual uma nobre sendo a maior das maltrapilhas.
— Logo nota-se tua origem humilde. Admiro pessoas que não se deslumbram com o primeiro fio de riqueza que venham a ter. É uma qualidade admirável — a senhora sorriu gentil.
— Nada aqui é meu, Margareth, mas agradeço vosso elogio — Kristen sorriu.
— O jantar está posto, receio que estejas faminta.
— Estás certa. Comeria um porco inteiro sozinha — Kristen riu docemente, a senhora acompanhou.
— Acompanhe-me — Kristen seguira a senhora que abriu a porta dando-lhe passagem.
— Não mancas mais? — Kristen paralisara. Maldições, ela esquecera de mancar.
— Apenas consigo suportar a dor — sorriu falsamente tentando ser convincente. Como pudera ser tão tola?
— Oh, sim — a senhora sorriu indo na frente guiando o caminho.
***
Kristen seguira a senhora por longos corredores, e rapidamente ambas chegaram ao lance de escadas bifurcada que dava para o grande salão. Ali ela preferiu encenar um mancado. Não poderia deixar tão claro que sua perna não tinha nada mais que cicatrizes. Novamente, para uma boa encenação, Kristen aceitou o apoio da senhora a seu lado.
Ao fim da escada puderam-se a andar e não demorou muito para que em um dos corredores a grane porta da sala de jantar materializasse em suas visões. Ao adentrar a sala, Kristen deparou-se com um verdadeiro banquete.
— Espero que não seja muita intromissão de minha parte, mas de fato não compreendo para quê tamanha abundância — Kristen disse já sentando-se sem tirar os olhos da comida.
A senhora riu discretamente.
Ao acomodar-se, Kristen pôs sobre o colo um lenço branco que havia sobre a mesa. A senhora logo fora sentando-se de fronte a si deixando a cabeceira novamente vazia.
— Teu menino não tem fome? — Perguntou esperando a senhora servir-se para logo em seguida fazer o mesmo.
— Posso dizer que não — Margareth serviu-se.
— Ou talvez teu menino simplesmente não sente-se a vontade em minha presença — arriscou ocupando seu olhar na comida por sobre a mesa. Ela sentia algo estranho desde o momento em que tentara aquela apresentação formal com Viktor. Ela havia notado que ele havia estranhado, o que não lhe era algo surpresa, mas mesmo assim, ela havia ficado um tanto triste. Ela lembrava-se que depois daquela pequena apresentação Viktor logo partira deixando-a sozinha por sobre o chão de ladrilhos. Ela sentiu-se triste ali. Sequer em sua presença ele pareceu querer ficar. Aquilo a desanimava.
— Não tenho motivos para evita-la, Kristen Sartórios — uma voz masculina soou no ambiente. Kristen involuntariamente procurou a voz com os olhos cristais e encontrou Viktor na entrada do ambiente. Ela de pronto se sentiu nervosa.
O cabelo areia dele estava solto um pouco acima de seus ombros, trajava uma suéter de azul escuro, quase negro. Mas foi em seus olhos que Kristen perdeu-se sem sua permissão. Os olhos amarelos sem vida estavam lá, fitando-a sem demonstrar nenhum sentimento, sem brilhar ou transmitir vida. Era hipnotizante, misterioso e sombrio.
Os passos de Viktor em direção a mesa era como se estivesse em uma cena lenta, cada passo ou movimento dele podiam ser vistos com extrema minuciosidade. Viktor então arrastou delicadamente a cadeira e lentamente sentou-se na cabeceira que lhe pertencia. Kristen ficara calada, não sabia o que responder nem sequer se deveria responder. Ele, por sua vez, manteve-se quieto, não lhe dirigiu mais seu olhar e também não servira-se de nada que havia ali.
Um silêncio incômodo pairou sobre a sala, parecia tão palpável que Kristen quase podia imaginar-se tocando a parede de silêncio do local.
— Tudo aqui é muito farto, logo nota-se — Kristen comentou como se fosse algo casual, mas na verdade era uma tentativa de quebrar aquela parede incômoda entre eles.
— Nada se estragará, tenha certeza — a voz de Viktor soou indiferente perto de si. Ele não lhe fitou, manteve-se estático em seu lugar sem servir-se de nada.
— Não tens fome? — ela perguntou servindo-se de sopa para não ter que fita-lo indiferente a si.
— Não — ele respondera novamente em tom indiferente, pegando a taça com água e levando aos lábios arroxeados.
— Posso dizer que é um tant.... — antes que Kristen pudesse terminar seu comentário na esperança de uma conversa normal em um jantar casual, a voz de Viktor a interrompeu.
— És bastante curiosa, senhorita Sartórios — Viktor pôs a taça em suas mãos por sobre a mesa.
— É um defeito que tenho — respondeu um tanto sem graça.
— Não o aprecio, devo confessar — o tom de voz de Viktor fora seco, ele não a fitou ou desculpou-se por sua insensibilidade. Kristen de pronto o olhou surpresa. O que havia acontecido? O que havia feito de errado para que ele a tratasse daquela maneira?
Ele não a fitou, lentamente levantou-se afastando a cadeira atrás de si, logo caminhando lentamente até Margareth que o olhava interrogativa e parecia tão surpresa quanto Kristen.
— Irei retirar-me, minha querida. Bom jantar — ele beijou os cabelos da senhora e em passos calmos chegou a porta do ambiente e saiu sem sequer olhar para trás.
Kristen o acompanhou abismada e sentiu um incômodo em si, uma decepção. Agora, além do silêncio, uma enorme muralha de desânimo junto a decepção pairava sobre suas cabeças.
— Menina, eu realmente não sei o que acontecera com o menino. Ele sempre fora muito gentil, mas hoje... — Margareth falava tentando explicar o comportamento de Viktor, que ao que tudo indicava, era tão incomum para ela quanto para Kristen.
— Está tudo bem, Margareth. Ele tem suas razões — Kristen respondeu sem graça lembrando da própria frase que ele havia lhe dito um dia antes. Ela então bebeu um pouco de água — Irei retirar-me. Estava delicioso — ela sorrira rapidamente pondo sobre a mesa o lenço branco que jazia em seu colo e saiu do ambiente deixando a senhora para trás a fitar-lhe com olhar triste.
***
Kristen rodeou o corpo com os braços na tentativa de se sentir aquecida depois do gelo que levara do anfitrião daquela mansão. Ela andava lentamente pelos longos corredores sem um destino certo. O que havia acontecido ali? Por que ele a havia tratado de maneira tão indiferente se somente havia tentando uma aproximação sutil sem repudia-lo ou ofende-lo? O que havia feito de errado?
A cabeça de Kristen dava um nó cego com aquelas perguntas. Ele a havia tratado de uma maneira que jamais fora tratada em sua vida, até ali. Mas ela não conseguia entender porquê. Agora que ela reconhecia que havia errado com aquele homem que lhe salvara de uma alcateia, que a acolhera sob seu teto, que a tratara bem quando a mesma somente o repudiara por ser diferente. Mas agora que buscava um recomeço, que tentava remediar seu erro, ele simplesmente parecia querer distância dela.
Ela não sabia o quê aquele homem era, mas agora que estava disposta a descobrir, a entender, porquê ele simplesmente a repudiara. Assim como ela havia feito com ele no começo.
Talvez ele estivesse querendo vingar-se dela, devolver tudo na mesma moeda, ou simplesmente não gostava de sua presença. Mas, fosse o que fosse que causara aquele comportamento indiferente desconhecido para si até aquele momento, ela agora se sentia repudiada. Sentia-se como uma aberração, alguém desagradável onde ninguém quer aproximar-se, alguém de uma presença suja. Era uma sensação terrível.
Andando pelos corredores dali, Kristen chegou ao grande salão. A lareira estava acesa aquecendo e iluminando o local. As chamas dançavam hipnotizantes. Porém, além do ambiente estar em um clima aconchegante, uma rajada de vento frio adentrava o local. A porta negra estava entreaberta.
Kristen ainda abraçava seu próprio corpo, e caminhou lentamente até a porta do local afim de tranca-la antes de recolher-se ao cômodo do quarto onde dormia nos últimos tempos, porém, ao chegar até o carvalho negro, Kristen viu uma silhueta por entre a fresta.
Ela então abrira uma fresta maior para observar. A alguns metros de si, ao fim das escadas que davam para o chão de ladrilho, estava Viktor fitando o céu. Sua face era levemente iluminada pela luz fraca da lua crescente que brilhava no manto escuro deixando-o ainda mais pálido.
Suas mãos estavam cruzadas atrás de si.
Kristen logo baixou o olhar ainda envergonhada pelo modo que Viktor a tratara momentos antes. Logo Kristen decidiu fechar logo a porta e subir as escadas para pensar melhor em quê havia errado para ser tratada daquela maneira fria, entretanto, antes que de fato trancasse a porta, outro pensamento lhe ocorreu. Melhor do que ficar dando um nó em sua cabeça sobre o que acontecera a melhor opção era perguntar ao próprio Viktor, não era?
Ela ainda ponderou se deveria mesmo ir ou simplesmente fugir do que sua curiosidade implorava que fizesse. Talvez somente estivesse procurando mais motivos para ser rejeitada por ele ou talvez ganhasse a resposta que ansiava ter. Quem sabe Viktor apenas a ignorasse e a deixasse sozinha ou talvez lhe dissesse seus motivos para quere-la longe quando ela somente buscava desculpar-se por seus erros com ele. Tudo era um risco.
Ela sentia-se ansiosa e curiosa ao mesmo tempo que sentia vontade de correr dali e fingir que não fora rejeitada sem razões aparente. Ela tinha vontade de fugir daquela situação, fugir de tomar a decisão de ficar ou simplesmente esquivar-se de seus pensamentos embaralhados. Mas ela não era de fugir. Não quando tudo em si ansiava que ela fizesse o que sua mente pedia.
Quantas vezes encontrou-se em situações difíceis e conseguiu escapar de um modo ou outro? Várias vezes, e aquele pensamentos lhe dera a coragem que precisava para abrir a porta e pôr seus pés para fora. Assim que o fez, o vento frio daquela noite mal-iluminada tocou sua pele eriçando seus pêlos e bagunçando seus cabelos ruivos assim como o vestido creme que trajava. Lentamente ela caminhou em direção aos poucos degraus que a levaria até Viktor que parecia não notar sua presença até ali.
— Está uma noite muito bela — ela comentou optando por uma abordagem sutil. Se ele lhe ignorasse agora, com certeza não valeria a pena tentar perguntar nada a ele sobre seu modo indiferente.
— Como todas as outras — ele respondeu indiferente sem fita-la. Embora tenha a tratado novamente friamente, ela agradeceu por ele não ter simplesmente ignorado sua abordagem.
— Não pude deixar de notar que não sou a única que aprecia esse manto escuro tecido pelos Deuses — ela fitava o céu abraçando seu corpo.
— É sempre uma bela paisagem a ser admirada — respondeu simplesmente.
— Viktor, — ele a fitou ao ouvir seu nome, ela manteve seu olhar sobre o céu — também não pude deixar de notar que minha presença parece lhe ser incômoda.
— Haveria motivos para tal? — ele ergueu a sobrancelha.
— Esta é uma resposta que anseio ter — ela o fitou. Viktor por um instante manteve seu olhar amarelo sem vida sobre os azuis cristais dela, mas logo abaixou o olhar privando-a de seu contato.
— Não tenho nada contra tua presença, senhorita Sartórios, mas somente creio que não devo aproximar-me de alguém que logo deverá partir.
Foi inevitável o cenho de Kristen franzir. Logo deverá partir? O que aquilo significava?
— Deverá partir? — ela perguntou o fitando interrogativa. Ele olhava para um ponto qualquer ao longe.
— Já pude notar que tu sequer mancas com tanta frequência, suponho que estejas curada — Kristen ainda fitava Viktor, ele então moveu sua cabeça também fitando Kristen com suas íris vazias — A verdade é que tu não quem pensei que fosse E admito que fora um erro tê-la trazido para cá.
Ela estava nervosa, sentia sua mão suar sem sua permissão. Acima disso estava a interrogação a esmagar sua cabeça com força. Por que ele mudara de opinião tão rápido? No entanto, antes que pudesse falar algo a respeito, ele finalizara sua frase.
— Tu deves ir. Teu lugar não é aqui, criança.
— Estás a expulsar-me? — Kristen perguntou sentindo um nó em sua garganta.
— Estou a devolver-lhe a liberdade. Tu deves partir — ele respondera simplesmente fitando as árvores longes. Kristen não soube como reagir. Ele a estava expulsando de sua morada e nem sequer lhe disse o motivo. Uma decepção cresceu latente em si, uma mágoa, uma desilusão ao notar que sua tentativa de ter um bom relacionamento com o homem que salvou sua vida fora vã. Viktor não a queria ali. Viktor não queria sua amizade.
Ao mesmo tempo em que uma tristeza crescia em si, uma revolta também pedia para fazer morada em seu ser. Ela estava tentando desculpar-se, tentando entender tudo ali, tentando começar de um modo civilizado uma amizade com aquele ser tão enigmático ao qual fizera tanto mal, mas ele simplesmente estava a privando da chance de livrar-se de sua culpa!
Ele simplesmente a queria longe.
Ela baixou seu olhar, e cerrou os punhos. Estava decepcionada, magoada. Viktor não a fitou. Ela então rodou os calcanhares e subiu com passos pesados os degraus dali. Quando ela estava próxima da porta, próxima de adentrar a mansão, uma revolta misturada a uma mágoa apossou-se de si, e antes que notasse, já estava gritando.
— Eu irei partir, senhor Greembell, deixa-lo-ei em paz e não retornarei. Não irei ficar sob o teto de alguém que repudia minha presença.
Viktor não moveu-se, somente a voz calma dele soou aos ouvidos de uma Kristen magoada ferindo-a ainda mais.
— Que assim seja, senhorita Sartórios.
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2904 palavras
Olá, olá Jubinhas do meu 💗
Vocês estão bem? Cá está mais um capítulo de MI e por favor não me matem😂😂 eu sei que vocês querem o casal juntos, mas esse afastamento deles é muito importante para fatos futuros, vocês vão ver.
💗 Muito obrigada pelo carinho de todos vocês com MI, vocês são incríveis, tenho nem o que dizer 👏💗💗💗😍
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Até logo 💗
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