Distâncias
Distâncias
Fiquei um tempo parado na cozinha, pensando no que Max me disse, faziam anos que não via Carolina, sabia o pouco que Thomas me contava de sua vida e às vezes, recebia cartões virtuais em datas comemorativas.
Quase não pensava nela…
quase.
Tomei um banho, e tentei dormir. Mesmo exausto não conseguia, as palavras do Max retumbavam em minha mente como aquelas músicas chatas que você não consegue tirar da mente. Levantei e subi ao estúdio, que agora ficava no sótão, porque meu filho precisava de um espaço extra na casa para guardar suas relíquias de adolescente, que se resumiam em uma caixa de som, uma guitarra (que ele não aprendeu a tocar), uma tv, som, videogame e todos os acessórios que a mãe enviava quase todos os meses, para justificar suas ausências.
No sótão peguei uma caixa velha com fotos e lembranças, e muitos bilhetinhos amarelos que a Carolina deixou como “recomendações” para uma tentativa de superar o meu amor por ela. Folheei alguns deles e percebi, que eu havia estado e todas aquelas situações, e imaginei o que ela havia pensado enquanto escrevia cada um deles. Mas o mais importante foi que ela pensou que eu estaria bem, que extinguiria o amor que sentia por ela depois de fazer aquele número “X” de coisas. E de certa forma, ela não estava errada, estava bem, me sentia feliz comigo mesmo, completo, mesmo sem ela. Mas amores puros e verdadeiros nunca realmente morrem. Mesmo que as pessoas se afastem, que o tempo apague memórias, gostos, cheiros, mesmo que tudo passe, ainda fica um resto de amor. E não estou falando de um anseio romântico, hoje tenho a plena certeza que se visse a Carolina novamente, não sentiria vontade ou mágoa por não tê-la comigo. De maneira alguma consigo me ver dividindo a vida com uma universitária de vinte e poucos anos, ocupada com estudos, festas e quem morreu em tal série de TV, mas mesmo assim ainda não tive coragem de encará-la novamente.
Peguei o celular e corri o dedo na lista de contatos, até parar no nome de Carolina, não tinha sequer ideia se ela permanecia com o mesmo número mas liguei e aguardei ser atendido do outro lado da linha.
一 Alô, aqui é a Carolina, se for importante deixe seu recado 一 ouvi a voz dela num recado automático.
一 Carol, é… Sou eu o Alec, eu só liguei para saber como estava… só… sei lá. 一 desliguei e me senti um idiota.
Desci para meu quarto, fechei as persianas e acabei pegando no sono, acordei horas depois com o barulho estrondoso do videogame de Max. Levantei irritado e quando ia abrir a boca para dar uma bronca, percebi que já estava escurecendo e eu havia dormido o dia todo.
一 Droga… o projeto 一 falei batendo a porta do quarto extra do Max 一 Eu não comprei fones de ouvido?
一 Desculpa eu me empolguei matando zumbis 一 Ele falou.
一 Porque não me acordou?
一 Você não pediu para te acordar 一 ele deu os ombros despreocupado e colocou os fones.
Voltei a cozinha preparei um café, quando ouvi a campainha tocar, era Loise, com uma cara de ressaca num moletom cinza. A levei até a cozinha e lhe servi uma xícara de café. Pediu-me desculpas pelo beijo daquela manhã, que não sabia onde estava com a cabeça e mais meia dúzia de desculpas comuns a pessoas bêbadas depois de fazer algo que não deviam.
一 Eu gostei 一 falo com sinceridade e ela arregala os pequenos olhos castanhos 一 Gosto de estar com você, gosto quando passamos horas conversando ou mesmo discutindo sobre coisas tolas, gosto do seu sorriso e do seu jeito leve e feliz de levar a vida. Eu gosto de você e já que somos frigideiras… — sorri ao lembrar das palavras dela no outro dia e ela sorriu de volta.
Sim, não foi um jeito muito romântico de se iniciar um namoro, mas três meses depois ainda estávamos juntos e muito bem. Quando eu não estava em seu apartamento, ela estava em minha casa e naquela noite tínhamos um jantar em família e eu finalmente seria apresentado como seu namorado aos pais dela. E embora eu já os conhecesse há alguns anos, me senti ansioso como na primeira vez que jantei com os pais de minha primeira namorada.
— O terno ou jeans e jaqueta? — perguntei a Max que revirou os olhos.
— Não vai de terno. Nem de jaqueta.Usa uma coisa mais informal, mas nem tanto, uma camisa, um blazer…. Ir de terno diz “estou desesperado, por favor gostem de mim”, Jeans e jaqueta diz “estou nem aí pro que vocês pensam” e não quer que os pais asiáticos tenham essa impressão.
— E essa? — perguntei vestindo uma camisa azul.
— Perfeito. E a Lou, não tem uma sobrinha gata ou algo assim?
—As garotas do colégio não são o suficientes?
— To sempre aberto a novas possibilidades — Ele disse e Louise abriu a porta.
— Uauu — falou me olhando.
— Não combinamos que eu iria te pegar?
— Eu só vim me certificar que você não ia aparecer de terno.
— Agradeça a mim — Max levantou a mão — E falando em agradecer, você não tem alguma sobrinha, prima que…
— Maximus! — o repreendi.
— Tá bom já entendi e não me chama assim, falou se levantando e saindo pela porta.
Louise se aproximou e ficou na ponta dos pés para enredar seus braços finos em meus ombros.
— Ele anda terrível.
— Ah isso que acontece quando não se castra eles — falou e sorriu — Ele é incrível, tem o seu charme e a safadeza da mãe, é praticamente um Dom Juan. Ainda bem que não tive filhos. — ela riu.
— E quer ter? — perguntei.
— Não… claro que não. Quando era mais nova até pensei mas, eu amo minha vida e um filho complica tudo. Porque você quer mais?一 ela levantou uma sobrancelha.
— Nem pensar…
— Ufa! — Ela respirou aliviada. Vamos logo ou nos atrasaremos.
— Só vou escovar os dentes e colocar os sapatos.
— Certo, te espero no carro. Acho que o Tom está dando uma festa tem um monte de carro estacionando aí na frente, tive que parar em fila dupla 一 ela disse saindo pela porta.
Terminei de me arrumar e desci apressado ouvindo a buzina impaciente de Louise. Na varanda vi a movimentação na casa ao lado, por instantes me peguei pensando se Carolina viria, mas o som do carro me tirou rapidamente dos pensamentos, sorri para ela que gesticulava mostrando um relógio imaginário no pulso e apressei o passo.
A casa dos pais dela ficava há algumas quadras da nossa antiga escola, apesar de um pouco nervoso, bastou a gentil senhorinha de pouco mais de um metro e quarenta de altura, começar a falar sobre literatura clássica americana, para que eu me sentisse em casa. A noite terminou no apartamento de Louise, onde fizemos amor intensamente e adormecemos abraçados.
一 Bom dia 一 ouvi a voz dela pela manhã e senti um beijo com sabor de menta.
一 Bom dia.
一 Preciso que dê o fora, a faxineira chega daqui a vinte minutos e eu fiquei de ajudar a Constance com as redes da empresa.
一 É assim, me usa e me manda embora?
一 Exatamente, anda levanta 一 ela falou puxando os lençóis e eu puxei de volta a trazendo para mim e a empurrando a cama.
一 A faxineira Alec!
一 Disse que temos vinte minutos 一 falei e ela sorriu, mas logo tomou um semblante enigmático.一 Que foi?
一 Recebi uma proposta de emprego, rm robótica.
一 Uauu… não era isso que queria?
一 É mas é meio longe de Jackson…
一 Miami? Já sei Nova York? 一questionei com um sorriso一 Bom Max tá crescendo dentro de três anos vai estar na faculdade, podemos nos ver nos fins de semana até ele ir pro campus 一 falei beijando o seu pescoço.
一 É mais longe que isso. É no Japão 一 ela falou e eu parei voltando o olhar pra ela.
一 Nossa… É bem longe.
一 É uma grande oportunidade…
一 Vai aceitar?
一Não, eu gosto daqui e não tô pronta para terminar a nossa história.一 Ela disse e me sentei na cama.
一 Você sempre quis trabalhar com isso, desde a escola. E também ama o Japão.
一 Mas eu amo mais você. 一 ela falou me dando um beijo 一 Esquece isso.
一 Lou, você quer ir?
一 Pela primeira vez na vida, eu não sei o que eu quero.
一 Então não recusa a proposta, nós damos um jeito.
一 É longe para caralho Alec.
一Não vamos poder nos ver todos os fins de semana, mas… Eu sempre quis conhecer o Japão e fotografar por lá. Somos adultos, nosso relacionamento vai sobreviver a uns três anos sem contato diário.
一 Vai se mudar pro japão, depois que o Max ir para faculdade?
一 Eu sempre quis conhecer o mundo, mas nunca saí do país. O japão é um bom jeito de começar.
一 Aiii, seu desgraçado eu te amo...一 falou me beijando 一 Ainda temos quinze minutos 一 falou puxando o lençol.
Sai do apartamento de Louise pensativo, amá-la era pleno, calmo, tudo parecia se encaixar mesmo nas adversidades, era como o amor devia ser, mas poucas vezes é. Tomei um táxi e desci na frente de casa, Baley veio correndo me recepcionar ainda na calçada, abanando o rabo e saltitando, como se fizesse mais de um ano que não me visse. Os cãe são os melhores professores do hoje que você pode ter, vivem intensamente cada instante, eles não se importam em parecerem tolos, eles só querem mostrar o quanto estão felizes em te ver. Acariciei a cabeça dele e caminhei em direção a varanda, ouvi a voz rouca do Tom me chamar e ao voltar o olhar para o gramado do vizinho, avistei Carolina recostada ao pilar da varanda. Seus cabelos agora estavam lisos na altura do ombro, ela usava um cardigan azul, sobre uma blusinha de tecido leve e uma saia lápis na altura dos joelhos. Uma mulher adulta, com o mesmo olhar jovem e vibrante que me encantava.
一 Porque não veio jantar 一 a voz ressoou em minha cabeça
一 Ah! Eu tive um compromisso 一 falei e a vi caminhar na minha direção.
一 Oi Alec 一 ela falou com um sorriso.
一 Como está Carolina?
一 Bem, muito bem.
一 Ela vai ter um bebê 一 Tom falou sem cerimônias.
一 Pai!
一 Que é? Vou ser avô de novo tenho que contar ao mundo 一 ele disse com um sorriso orgulhoso.
一Que… que bom. Meus parabéns 一 falei no automático ainda um pouco chocado com a notícia.
一 Carol!! 一 ouvi uma voz masculina ecoar dentro de casa.
一 Eu vou lá, Noah não consegue achar nada na própria mala. Até mais Alec.
一 Até 一 falei e vi ela se afastar.一 Quer um café? 一 perguntei a Thomas 一 Minha filha caçula acabou de contar que tá grávida, de um cara que não acha as meias na própria mala, ela mal acabou a faculdade e eu odeio o pai do filho dela, preciso de um conhaque 一 ele falou com sinceridade.
一 Que bom que não disse isso pra ela.
一Pois é, para você ver como se pode ensinar um truque novo a um cachorro velho. Mas isso não vai prestar.
一 Ela vai ser uma boa mãe 一 digo apenas 一 Vem, não tenho conhaque mas dá para batizar o café com vodka se quiser.
Tomei um café demorado com Thomas, e ele me falou sobre Carol. Nos últimos anos, ele evitava falar nela, porque de certa forma, percebeu que era algo que eu buscava deixar para trás. Mas a notícia da gravidez, trouxe o velho Tom cheio de opiniões de volta. Fiquei em silêncio escutando sobre os acontecimentos da vida dela, pelo menos o que ele sabia, afinal eu tinha plena certeza que Carol, vinha omitindo muita coisa do pai. Ou talvez fosse só aquela pontinha de orgulho ferido, ao perceber que tudo estava dando certo entre ela e o canadense.
一 Bom, Tom pelo que me contou. Não tem com que se preocupar, eles estão formados, tem um apartamento, muita gente começa uma família com bem menos que isso.
一 Eu sei, mas filho não é brincadeira. E pelo que vi o Noah não tá nada feliz com essa “surpresa”.
一 Talvez seja só impressão sua.
一 Não, eu vi a cara dele quando ela contou hoje no café da manhã, vi a cara dele quando eu dei os parabéns pra eles, não é o semblante de alguém que está feliz. Ele vai cair fora e vai deixar a Carol sozinha nessa, assim que aparecer complicações. E eu vou ter que aguentar neto chorando nos meus ouvidos. Vai ver se não…
一 Bom, agora não tem jeito. É torcer para o melhor.
一 É. Fazer o que. Mas podia falar com ela não é? Ela te ouve.
一 Faz anos que Carol e eu não trocamos um bom dia Tom, e o que eu ia falar? Ela parece bem, está se preocupando sem motivos.
一 É… Acho que está certo, sei lá acho que é coisa de velho, mas estou com um aperto no peito.
一 Isso são anos de Bacon defumado e cerveja 一 brinquei e ele sorriu.
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