29. Lugar errado, hora errada
"Foda-se seu cavalo branco e a carruagem! Aposto que você nunca poderia imaginar, nunca te disse que você poderia ter isso. Oh, você precisava de mim para sentir um pouco mais e dar um pouco menos... – Need me, Rihanna."
JASON
Depois que deixei a Lizzie na casa da sua amiga, passei em alguns galpões para checar os rendimentos, e vim para a boate. Precisava ficar de olho nos negócios, e deixar algumas ordens encaminhadas. Afinal, a nova carga de narcóticos estava prestes a ser entregue, e eu não poderia arriscar fazer parte da operação, pois os nossos contatos alertaram que ainda haviam dois ou três federais na cidade. Aposto que o Henry era um deles, o filho da puta tinha um bom faro e estava mesmo na pista certa. Claro, isso sem mencionar que o imbecil não parecia ser do tipo que larga o osso tão fácil.
Enquanto se divertia me espancando na cadeia, deixou claro que só estava interessado na cabeça da Allana, mas que também arrancaria a minha caso eu ficasse no seu caminho. No entanto, estava completamente fora de cogitação entregar a mulher do chefe para a polícia, Allana era um membro importante e valioso da Black Wings, a mente brilhante por trás de quase todas as operações desde que chegou a organização. Ela era uma grande estrategista, não era à toa que sempre se encarregava de armar os esquemas, cuidar das rotas e pensar em cada detalhe para facilitar o nosso trabalho.
Em outras palavras, ninguém era tão burro ou idiota de entregá-la assim de bandeja para os federais, e se quisessem mesmo a sua cabeça, os filhos da puta precisariam primeiro derrubar a minha. Acho que isso ficou bem claro para o tio da Lizzie no nosso último encontro, ele daria um pouco de trabalho. Por essa razão era tão importante termos um aliado forte na política, e aí que a corja do Alexander entra em cena. Um homem cujo o passado estava preso em nossas mãos, seria capaz de mudar o foco das investigações para manter sua própria reputação.
– Como pode ver, o nosso faturamento está cada vez melhor, chefe. – disse Joel, chamando a minha atenção de volta para os livros de contabilidade.
– Muito bem, você tem feito um bom trabalho aqui. – apontei com o resto do cigarro para o material sobre a minha mesa, o qual foi apresentado naquela breve reunião.
– Obrigado, senhor. – o vi se endireitar melhor em sua cadeira, enquanto eu dava uma última tragada antes de apagar a bituca de cigarro no cinzeiro.
– Bom, agora que terminamos de discutir sobre as finanças... – assoprei a fumaça para o lado – Quero que me atualize sobre aquele outro lance, como vai a situação da nossa amiga?
– Com relação a isso, eu andei me informando pela vizinhança, e descobri que o seguro cobriu o tal incêndio da casa. – respondeu ele – Para todos os efeitos, um dos aquecedores deu pau e pegou fogo em tudo.
– Eu não sei, essa parada está me soando estranho, acho que tem coisa aí... – virei a dose de whisky garganta a baixo – Mas se essa vagabunda tacou fogo na própria casa, deve ter um bom motivo. Por via das dúvidas, quero que fique atento aos rumores e me avise caso surja qualquer novo boato sobre lutas clandestinas na cidade.
– Sim, senhor. – concordou Joel, prontamente.
– Tá, agora vamos descer, eu preciso dar uma olhada no movimento. – me levantei, apanhando o meu celular.
Enquanto seguíamos para fora do meu escritório, aproveitei para checar as notificações, mas apesar de já ser um pouco tarde não tinha nenhuma mensagem ou ligação da Lizzie. Seja lá o que estivesse fazendo, ainda não havia acabado, o que me fez bufar o ar pelo nariz com força, pois estava louco para apanhá-la e irmos de uma vez pra casa.
Bloqueei o celular novamente, o qual enfiei dentro do bolso, contendo a vontade de ligar no seu número, até porque o combinado era ela entrar em contato quando terminasse por lá. Ao descermos as escadas, Joel se despediu tratando de se dirigir de volta para o seu posto lá fora, e eu resolvi molhar a garganta para passar o tempo.
– Chefinho, você por aqui... – Alice franziu a testa ao me ver se aproximar do bar.
– Por que a surpresa? – me sentei num dos bancos em frente ao extenso balcão de madeira.
– Me disseram que você ficaria na surdina por um tempo. – respondeu ela, e fiz um leve sinal com a mão para a Sue trazer o meu whisky.
– Só vim deixar umas ordens, vamos receber uma carga nova essa semana. – avisei.
– Daquele fornecedor que tentou te matar? – suas sobrancelhas arquearam.
– Tecnicamente foi um dos homens dele que tentou, ele não sabia de nada. – ri anasalado, alcançando o meu copo de whisky assim que me foi servido.
– Tá, e você acredita nisso? – questionou ela, em tom sarcástico.
– Não, mas precisamos do filho da puta vivo por enquanto, então vou...
– McClain, que saudade! – fui interrompido por uma voz feminina aguda, e logo pude sentir braços a minha volta, me apertando com força – Eu fiquei tão preocupada, mas voltou inteirinho pra mim, você sempre volta.
– Eu não acho que ele voltou exatamente pra você, amada. – debochou Alice, fazendo sinal para Sue encher o seu copo.
– Como assim? – Shely me largou apressada e, sem lhe dar muita atenção, tomei um gole da minha bebida – Você ainda está brincando de gato e rato com aquela tal de Lizzie? No início eu até entendi seu fetiche pela namoradinha sem sal do seu irmão, mas agora... Sabe há quanto tempo já não me procura mais?
– Já passou pela sua cabeça que eu estou num relacionamento sério agora, Shely? – me virei para encará-la.
– O que você quer dizer com isso? – a vi cruzar os braços – Por acaso está namorando de verdade com aquela vadiazinha?
– Ela tem um nome, e para o seu bem é melhor chamá-la por ele. – interrompi breve o movimento com o copo até a boca – Na verdade, quando for se referir a minha mulher, deve usar um tom cordial, como "Srta. Lizzie", "Sim, senhora?", "No que posso ajudar, madame?"... Não sei se ainda não notou, mas é bom começar a ser simpática com ela, caso queira continuar trabalhando aqui.
– Está dizendo que vai me colocar na rua se eu não fizer isso? – Shely cerrou o cenho, completamente indignada.
– Bom, a Lizzie não vai muito com a sua cara, e eu não quero arranjar problemas com a minha patroa, então é melhor fazer o que eu disse. – expliquei – Seja uma boa menina, Shely, não vai arrancar nenhum pedaço seu.
– Então, nós dois...
– Desencana, nunca teve essa de "nós dois", e eu não preciso mais dos seus serviços. Estou muito bem servido, se é que me entende. – falei de uma vez, não tinha paciência para rodeios – Está livre para faturar o quanto quiser durante a noite.
– Eu não sou uma prostituta! – de repente, ela pareceu extremamente ofendida.
– Ora, me desculpe. – pedi em tom sarcástico – E qual seria o outro termo para uma vadia que abre as pernas por dinheiro?
– Eu nunca cobrei um centavo de você. – seu olhar desabou pesado, como se realmente estivesse magoada.
– Mas sempre aceitou cada depósito na sua conta de muito bom grado, o que dá no mesmo, não acha? – indaguei, ainda sem dar muita atenção.
– Não vou fazer programas com os seus clientes por dinheiro. – Shely tornou a me encarar, com o rosto vermelho de raiva.
– Sei que você precisa da grana, mas o corpo é seu, então decida o que vai fazer com ele. – dei de ombros, passando a beber mais um pouco do meu whisky.
– Não pode falar assim comigo, eu não sou uma qualquer! – berrou a loira invocada – Muito antes dessa Lizzie, fui eu que fiquei do seu lado, nas noites boas e ruins. – seu tom foi se tornando pesado, à medida que a sua voz embargava pelo choro preso em sua garganta – Mesmo que ache, não fiz isso pelo seu dinheiro, eu fiz porque...
Shely se auto interrompeu ao notar que alguns olhares a nossa volta se dirigiam a ela naquele momento, e isso acabou me irritando um pouco.
– Por quê? Anda logo, termina de falar de uma vez! – exigi, chamando a sua atenção de volta a mim.
– Eu me apaixonei por você, droga! – lágrimas rolaram pelos seus olhos, as quais ela nem sequer tentou secar – Sou completamente apaixonada, desde o dia que me trouxe pra cá, como pode não perceber? Como pode me tratar assim?
– E agora acho melhor eu ir dar uma voltinha. – Alice se retirou de fininho, levando consigo apenas o seu copo agora cheio.
– Eu sei que você não sente o mesmo por mim, mas estava tudo tão bem até aquela... Aquela sonsa da Lizzie aparecer. – Shely passou a me encarar de forma ainda mais feroz – Agora você só tem olhos pra ela, e age como se eu não existisse, como se os meus sentimentos não tivessem valor algum!
– Espera aí, você está mesmo dizendo que é apaixonada por mim? – perguntei, e ela assentiu, me arrancando uma fraca risada anasalada.
– Qual é a graça nisso, McClain? – ela pisou forte no chão, muito irritada por sinal.
– Não quer que eu acredite nesse seu papo furado, né? – arqueei as sobrancelhas – Qual é? Vadias espertas não se apaixonam pelo cara que paga o salário.
– É, talvez eu seja a droga de uma vadia burra então! – berrou Shely, ainda mais alto, enquanto tentava secar suas lágrimas.
Sem muito sucesso, percebendo que o choro apenas piorava com os soluços, ela me encarou tristonha por mais alguns segundos, como se esperasse que eu dissesse mais alguma coisa. Bom, não foi o que aconteceu, porque eu não tinha nada a dizer, pelo menos nada que fosse lhe fazer se sentir melhor. Ao entender isso, Shely sacudiu a cabeça e se virou apressada, seguindo entre as mesas em direção ao camarim. Apenas observei em silêncio, até que sumisse por completo de vista, então tratei de virar garganta abaixo o resto da dose de whisky em meu copo.
– Mas o que merda foi isso? – praguejei em voz baixa, batendo o copo vazio sobre o balcão.
– A menina está de coração partido. – respondeu Sue, que havia prestado atenção em toda aquela conversa – Sabe que ela acha que tem uma dívida com o senhor, e às vezes os sentimentos se confundem.
– Claro, e a culpa disso é minha agora? – cerrei os olhos.
– O senhor manteve relações sexuais com ela por meses... Não dormia com nenhuma outra além dela, pelo menos até agora, ou não? – questionou a velha senhora atrás do balcão – Vamos lá, seja honesto, você cuidou da Shely desde que a trouxe para cá, e costumava ser bem generoso nos pagamentos. A certo ponto, se tornou previsível que uma garota assim, sob as circunstâncias com as quais veio parar aqui, se sentisse especial.
– Eu nunca disse que ela seria mais do que sexo fácil pra mim. – dei de ombros, ainda tentando não me importar com aquilo.
– Estamos falando de uma moça jovem, cheia de ideias e esperanças na cabeça. – contestou Sue – Acredito que acabou se iludindo com uma falsa expectativa que o senhor projetou nela sem perceber.
– Fala sério! Acha mesmo que a Shely está apaixonada por mim? – levantei o olhar outra vez para encará-la – A Shely? Qual é?
– Sr. McClain, eu acho que já sabe a resposta. – ela se aproximou, limpando o balcão com uma flanela laranja – Diminuir os sentimentos dela agora, só porque você não sente o mesmo, não vai mudar nada.
– Isso não parece bom. – neguei com a cabeça – Eu não imaginei que chegaria a tanto. Acha que eu deveria ir falar com ela?
– Eu acho que pode ser uma boa ideia. – Sue recolheu o meu copo vazio – Mas tenha paciência, os dois tem grande parcela de culpa nisso.
Assenti para mim mesmo, não dava para ficar ali e fingir que nada demais havia acontecido, precisava fazer algo a respeito, tentar consertar o estrago talvez. Eu ainda não tinha ideia de como lidar com essa situação, mas receio que o primeiro passo fosse encontrar a Shely para termos uma conversa. Sem dizer mais nada, me levantei daquele balcão, tratando de seguir em direção ao camarim onde as minhas funcionárias costumavam se produzir, pois foi para lá que a vi correr instantes atrás.
Dei uma boa olhada pelo corredor, a fim de checar se não havia mais ninguém, até que passei para dentro da sala aparentemente vazia. Soltei a respiração com força, enquanto caminhava em passos lentos, onde aquela maluca havia se metido? Será que ainda estava na boate? Mas eu não a vi sair, então... Tive os meus pensamentos interrompidos ao ouvir um fungado, como se alguém chorasse baixinho atrás de uma porta. Devia ser a Shely, ótimo! Só Deus sabe o quanto eu odiava lidar com o sentimentalismo das pessoas, definitivamente isso não era pra mim.
– Shely? – chamei pelo seu nome, mas não obtive respostas – Anda, aparece logo, eu sei que você está aqui.
– Vai embora! – finalmente ouvi sua voz soar com clareza.
Ela estava trancada no banheiro.
– Qual é? – me aproximei da porta – Quero conversar com você.
– Eu não tenho nada pra falar com você! – ralhou lá de dentro, com certa dificuldade pelo choro.
– Mas foi você que berrou lá fora que estava apaixonada por mim, não foi? – indaguei, tratando de girar a maçaneta para conferir se a porta do banheiro estava aberta, por sorte sim.
– Isso não importa mais. – Shely, que estava sentada no chão abraçando as próprias pernas, nem mesmo percebeu a porta abrir – Você nunca vai ficar por mim. Eu sou só a droga de uma prostituta pra você.
– Olha, a verdade é que uma garota esperta como você, não deveria chorar por um fodido de merda feito eu. – passei para dentro daquele cômodo apertado, e seu olhar assustado logo se dirigiu a mim – Sabe do que estou falando, esteve ao meu lado todo esse tempo...
– Eu não posso mandar nos meus sentimentos, achei... – ela desviou sua atenção para a parede de azulejos brancos a sua frente – Achei mesmo que se apaixonaria por mim, que seria comigo como é com a Lizzie.
– Eu nunca te prometi isso. – me aproximei devagar – Nem mesmo cogitava sentir algo assim antes dela.
– É, fui eu que me ferrei sozinha. – a vi tentar secar as lágrimas que, a essa altura, rolavam feito cascata.
– Também não foi o que eu disse. – me sentei ao seu lado – Eu gosto de você, é uma boa amiga quando não está enchendo o saco. – ri fraco, me acomodando melhor no chão gelado – Só que também é gostosa, e eu posso ter confundido as coisas.
– Do que está falando? – seu cenho franziu em total confusão.
– Você sabe, a gente transava e eu te dava dinheiro... – dei de ombros – Achei que ficasse pela grana, enquanto você achava que era o meu jeito de demonstrar algum tipo de sentimento ou que me importava.
– Eu soube que não era desde a primeira vez que a Lizzie pisou aqui, bastou te ver olhar pra ela. – com as costas da destra, ela coçou o nariz – Você nunca me olhou daquele jeito nem por um segundo, mas acho que tentei me convencer do contrário, era mais fácil.
– Sinto muito, de verdade. – fui o mais sincero que pude – Você é uma garota bacana, parceira, leal, bonita e inteligente. Merece alguém que possa te valorizar.
– O que está acontecendo? – Shely riu amarelo ao me encarar outra vez – Impressão minha, ou o terrível McClain está se importando com mais alguém além dele mesmo?
– Hey, não ferra! – rolei os olhos.
– Não é isso. – ela negou com a cabeça – Essa garota está mesmo mexendo com você, não é?
– Eu não sei, ela... – fiz uma curta pausa, a fim de usar melhor as palavras – Estar com a Lizzie me faz querer ser um cara melhor, e eu não consigo explicar essa merda.
– Nossa, como eu odeio essa garota! – resmungou de muito mau humor – Odeio porque em todo esse tempo, não consegui ser nem metade do que ela é pra você.
– Não é assim que as coisas funcionam. – neguei com a cabeça – A gente não escolhe quem ama, lembra?
– Então você a ama? – suas sobrancelhas arquearam.
– Pode apostar que sim. – respondi sem nem pensar duas vezes – Eu mataria por ela, e morreria por ela. É, eu morreria de bom grado se soubesse que isso garantiria a sua segurança.
– Sendo assim, acho melhor essa Lizzie tratar de te fazer muito feliz, ou juro que eu vou acabar com a raça dela. – Shely bateu sutilmente o seu cotovelo em meu braço.
– Eu não sei não... – um riso anasalado me escapou – Estou ensinando boxe pra ela, então acho que você precisaria comer muito feijão pra conseguir bater de frente.
– Você me ensinou a atirar, lembra? – se gabou a garota chorosa ao meu lado.
– É, eu vou chegar lá com a Lizzie também. – garanti – Você vai ficar bem?
– Acho que consigo sobreviver. – ela secou as lágrimas nos cantos dos olhos.
– O lance de fazer programas... Você sabe que nenhuma garota aqui é forçada a dormir com os clientes, né? – tentei me redimir pela brincadeira de mau gosto lá fora.
– É, estou sabendo. – a vi assentir.
– Então, pode só dançar como sempre fez, e se alguém tentar te tocar diz que é exclusiva do chefe. – lancei a ideia no ar – Não pretendo trazer a Lizzie aqui, então ninguém vai saber que você está mentindo.
– Promete que não vai trazer mesmo? – seus olhos ganharam brilho outra vez.
– Relaxa, eu não quero ela metida nisso. – expliquei.
– Tudo bem. – disse ela, parecendo um pouco mais tranquila do que instantes atrás – Já que está sendo legal comigo, será que eu posso te pedir só mais uma coisa?
– E o que você quer? – apoiei meu antebraço esquerdo sobre o joelho, no segundo em que tornei a encará-la.
– Eu quero... – suas bochechas enrubesceram, e só então percebi o quão próximos estávamos – Quero muito que você me beije.
– Ah, Shely, pelo amor de Deus! – me levantei apressado, antes que aquilo fosse mais longe.
– Você nunca me beijou. – se queixou ela, também tratando de ficar de pé.
– E não é agora que eu vou fazer isso! – justifiquei o óbvio.
– Mas eu... – Shely me agarrou pelo braço – Eu sempre quis te beijar.
– Já está errado aí, será que não percebe? – tentei me soltar, mas ela apenas se chegou mais – Afeto a gente não pede. Não é assim que funciona.
– O que tem demais? É só um beijo. – num movimento rápido, ela ficou nas pontas dos pés, e esbarrei contra a parede quando me inclinei para trás – Ou será que você está com medo de perceber que também sente alguma coisa por mim?
– Tá maluca? – cerrei os olhos ao sentir os seus lábios se esfregarem em beijos repentinos pelo meu pescoço, e rapidamente lhe empurrei para longe – Quer parar com isso, garota?! Eu acabei de dizer que amo outra mulher.
– Eu sei, eu ouvi, mas ela não está aqui e eu não conto se você não contar. – pude vê-la sorrir sacana, à medida que se reaproximava – Pelos velhos tempos, vai?
– Vê se sossega, eu não vou te beijar. – precisei segurá-la pelos ombros, para manter certa distância.
– Tem certeza? – insistiu Shely – Eu beijo muito bem...
– Que bom pra você, mas realmente não estou interessado. – neguei com a cabeça.
– Poxa! – ouvi a sua respiração soar mais forte – Você não cansa de pisar em mim, não é?
– Eu não estou pisando em ninguém, mas se está se sentindo assim, é mais um motivo para começar a mudar certas atitudes, não acha? – questionei em tom reflexivo – De repente, quem sabe, começar a se dar mais valor pode te fazer bem.
– Agora está dizendo que eu não sei me dar o valor? – as lágrimas tornaram a alcançar os seus olhos.
– Você precisa mesmo que eu diga com todas as letras? – arqueei uma sobrancelha, e o seu olhar logo desviou do meu – Foi o que pensei. – larguei os seus ombros, em vista de que ela parecia ter desistido das investidas – Bom, como eu já falei antes, você é uma garota bacana, Shely, só precisa pôr um pouco de juízo nessa cabeça.
– Acha mesmo que um dia eu vou encontrar alguém que me ame tanto, quanto você ama essa Lizzie? – a vi fungar com o nariz.
– Sinceramente? – meti as mãos para dentro dos bolsos da minha jaqueta – É, eu acho que sim.
– Não, você só está sendo condescendente... – ela cruzou os braços, antes de voltar a me encarar muito chateada – Está com pena de mim agora, não está?
– Acha que é digna de pena? Não seja patética! – ralhei, já perdendo a pouca paciência que me restava – Você se apaixonou por alguém que não te ama, mas e daí? Pode ficar se lamentando agora, ou fazer algo a respeito. Só não espere que eu me compadeça, porque isso não vai rolar.
– Ai, meu Deus! O que foi isso? – notei um fraco sorriso faceiro surgir em seus lábios – Essa Lizzie está mesmo te transformando num idiota bonzinho.
– Vai se ferrar! – esbravejei, sentindo o sangue esquentar nas veias.
– Nada disso, você está preocupado comigo. – aquilo soou como um grande feito – Veio atrás de mim porque se importa com os meus sentimentos, se sente responsável...
– Vê se não enche, eu vim porque você saiu do bar que nem uma doida. – dei de ombros.
– Tá, mas você nunca se importou com isso antes...
– E não me importo agora. – menti na cara dura.
– Não pode tirar isso de mim, McClain. – antes que eu pudesse impedir, Shely me agarrou num abraço apertado – Você está sendo bonzinho comigo, queira admitir ou não.
– Tá legal, essa conversa aqui já deu. – pousei as minhas mãos em seus ombros outra vez – Vamos lá, eu tenho mais o que fazer.
Interrompi o contato ao ouvir o barulho de mensagens chegando no meu celular, e ela recuou dois passos para trás sem que eu precisasse dizer mais nada. Assim que retirei o aparelho do bolso, vi de imediato pela barra de notificações que se tratava da Lizzie avisando que eu já poderia buscá-la na casa da sua amiga, o que me fez agradecer internamente. Aquilo sim era uma boa notícia, estava mesmo em tempo, e eu só queria passar o resto da noite ao seu lado.
Sem me estender, me despedi da Shely que estava muito pegajosa hoje por conta do lance de estar apaixonada e tal, e passei pelo bar para deixar algumas ordens que não consegui mais cedo. Assim que entrei de volta no meu carro, tratei de ligar o rádio e colocar o cinto de segurança antes de dar partida e sair da vaga o mais rápido que podia. Afinal, não queria pegar trânsito e acabar me atrasando ou demorando mais do que o esperado, fora o fato de que eu não via a hora de estar com a Lizzie de novo, só nós dois.
Era insano o jeito que ela fodia com a minha cabeça, e o quanto eu adorava me perder nela. Passaríamos a noite lá em casa hoje, então o meu plano era apanhá-la primeiro para descobrir se já havia jantado, pois decidiríamos entre pedir um lanche ou comprar alguma coisa no caminho. Batucava com os dedos no volante ao ritmo da melodia de "Baby" do Savage Baby que tocava na rádio enquanto eu dirigia pelas ruas da movimentada Shadowntown. Apesar de já ser um pouco tarde, a cidade estava acordada e pelo que pude observar durante parte do percurso, os negócios da BW estavam a todo vapor.
Haviam pontos de tráfico espalhados por todo o território agora, e o nosso pessoal não era de brincar em serviço, os lucros estavam disparando cada vez mais. Tenho que admitir que as drogas do Alexander eram mesmo de alta qualidade, o desgraçado estava cumprindo com a sua palavra, mas eu também sabia que esse não era motivo para abaixar a guarda. Muito pelo contrário, quanto mais a Black Wings crescia em vendas pela região, mais cautelosos tínhamos que ser, nada de chamar atenção.
A certo ponto, me concentrei apenas no caminho e por sorte não peguei muito trânsito, então logo estava estacionando em frente a casa da amiga da Lizzie outra vez. Olhei em direção a porta, onde algumas pessoas conversavam, mas ela não estava no meio da galera, o que me fez supor que ainda estivesse lá dentro. Por esse motivo, desliguei o carro, tratando de alcançar o meu celular no bolso, a fim de dar um toque no seu número para lhe avisar que havia chegado e estava a sua espera.
– Hey, a gente não morde! – ouvi alguém dizer após dar dois toques na janela do meu carro, e ao olhar de lado notei que era o Dylan – A little Liz tá lá dentro, sai aí pra gente bater um papo.
– Ah é, eu já estava saindo. – menti, tratando de retirar o cinto de segurança enquanto guardava o celular de volta no bolso da jaqueta.
– Tenho que dizer, você está bem de vida, hein... – ele pareceu impressionado ao ver o interior do veículo quando eu abri a porta.
Bom, não era pra menos já que se tratava de uma BMW i8, que por si só já era um carro luxuoso e bem chamativo, mas que estava ainda melhor depois de algumas mudanças que fiz após a compra. Sacudi a cabeça, retirando a chave da ignição enquanto pensava em algo para dizer, à medida que descia do veículo.
– Ah, isso? Que nada... – bati a porta, sorrindo amarelo – Peguei emprestado de um amigo.
– Conta outra, gatinho, não precisa mentir pra mim. – Dylan deu dois leves tapas em meu ombro esquerdo – Aliás, todo mundo aqui sabe que você nada na grana. E é bom mesmo que saiba que a minha amiga vale diamantes, adoramos o anel que deu pra ela. É disso pra cima, meu bem, ou rala peito.
– Olha, você tem razão, a Lizzie é rara e preciosa, então o que eu puder fazer por ela, tenha certeza que farei. – assenti para mim mesmo ao lembrar daqueles olhos verdes hipnotizantes.
– Que bom que pensa assim, porque ela vai te pedir um favorzinho hoje, e é muito importante que...
– Esse bêbado saidinho não está te importunando, está? – sua fala foi interrompida pela Emily que se aproximava meio preocupada – Me desculpe, mas quando esse daí enche a cara, fica muito pior que o normal.
– Mas eu só estou cuidando dos interesses da sua despedida de solteira... – Dylan colocou a mão na frente da boca, como se estivesse sussurrando para eu não ouvir – Obviamente o nosso JayJay aqui não vai dizer não, quando a Liz pedir com jeitinho mais tarde como a gente combinou. Sabe, depois de agradar esse marginal gostoso na cama, mas não custa dar uma adiantada no assunto, né?
– Do que ele está falando? – cerrei o cenho, um tanto confuso com a informação perdida.
– Nada, não liga pra esse maluco. O Dylan fala coisa com coisa quando está bêbado... – Emily me olhou um tanto constrangida, depois o encarou irritada – É melhor calar essa boca e deixar o Jason em paz, seu surtado!
– Nesse caso, acho que você pode ficar tranquila, eu acabei de chegar e a gente só estava trocando ideia numa boa. – meti as mãos para dentro dos bolsos da jaqueta, sem entender muito o rumo daquele assunto – O seu amigo aqui estava me dizendo que a Lizzie ainda está lá dentro...
– Ah é... Você conhece aquela lá, não para quieta. Aposto que está na cozinha se ocupando em organizar a bagunça que fizemos. – Emily abraçou o Dylan pelos ombros – Você não quer entrar?
– Claro, por que não? – concordei, meio sem saída.
– Certo, vem comigo. – pediu ela, sorrindo um pouco mais leve.
Contudo, ao se virar já foi logo chamando um tal de Logan que conversava com o Noah na porta de casa, e que se eu não me engano era o namorado do Dylan. Educadamente, cumprimentei todos que conversavam parados na porta de casa, e fingi não notar alguns olhares de medo que se dirigiram a mim, era quase inevitável. Após deixarmos o seu amigo bêbado com os demais, eu tratei de acompanhá-la para dentro de casa, e não pude deixar de notar o mar de sacolas espalhadas pela sala e escadaria. Aposto que aquelas eram as tais lembrancinhas com as quais a Lizzie disse que viria ajudar...
LIZZIE
Alguns minutos mais cedo...
A pausa para o lanche não demorou muito, e segui conversando com outras pessoas enquanto organizava as lembrancinhas da Emily. Aquilo levou quase a noite inteira. Quando terminamos, o grande relógio na parede marcava 11:00pm, mas deu uma sensação de orgulho ver tudo prontinho e muito bem embalado no final. Enquanto todos se despediam, me apressei logo em mandar uma mensagem para o Jason, avisando que ele podia vir me buscar, depois me levantei recolhendo alguns copos que ficaram sujos sobre a mesinha de centro, os quais lavava agora na cozinha. Não me parecia justo deixar a bagunça para os noivos.
– Ai, que susto! – apertei o copo que ensaboava, ao ver o Jordan sair abruptamente do banheiro que ficava no corredor entre a sala e a cozinha.
– Foi mal, acho que a porta emperrou. – ele pareceu perceber, e eu o encarei por um ou dois segundos.
– Tá, sem problemas. – assenti, voltando a me concentrar no que fazia – Não tive chance de falar antes, mas parabéns pelo lance com as faculdades, espero que dê tudo certo.
– Valeu, estou de saída agora. – o vi tropeçar nos próprios pés ao dar um passo à frente.
– Você não devia ter bebido tanto, não está em condições para dirigir. – enxaguei o último copo, o qual rapidamente coloquei emborcado no escorredor, e me virei alcançando um pano de prato para secar as mãos – Vem, senta aqui. Vou preparar um café reforçado pra você.
– Não quero café. – rosnou Jordan, como um cão bravo.
– Eu não perguntei se você queria, mandei se sentar. – apontei em direção a pequena mesa redonda com os olhos, antes de seguir até o balcão onde avistei a cafeteira e as cápsulas.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos, parecia estar processando a informação, até bufar o ar com força pelo nariz e, assim como uma criança birrenta, se adiantou para a mesa com certa dificuldade, afundando na cadeira ao se sentar ali. Sacudi a cabeça para os lados enquanto preparava o seu café, antes de ir embora falaria com o Noah para deixá-lo dormir aqui hoje ou pelo menos lhe dar uma carona para casa. Jordan não tinha a mínima condição de dirigir sozinho essa noite, ou receio que pudesse causar um acidente grave.
– Então... – ele quebrou o silêncio, após alguns minutos – Você e o Jason estão brincando de casinha?
– Olha, não começa a agir como um babaca outra vez. – neguei com a cabeça, me obrigando a não olhar em sua direção – O Jason e eu estamos namorando sério agora, e não quero ficar em pé de guerra com você.
– Ah, você me chuta pra dormir com o meu irmão gêmeo, e eu tenho que levar isso numa boa? – ouvi o arrastar da cadeira, e apoiei minhas mãos sobre o balcão – Eu vi vocês na droga do seu instagram a semana inteira, consegue pelo menos imaginar como é estar no meu lugar? Porra, isso dói, Lizzie!
– Eu nunca quis magoar você. – encolhi os ombros, sentindo o peso da culpa recair sobre eles.
– Que se dane! – Jordan chutou a cadeira com raiva, o que me fez estremecer num susto e me virar apressada – Estou cansado desse seu joguinho. Você não ama o fodido do Jason, só está com ele porque eu comi a vagabunda da sua amiga, e se quer saber talvez eu devesse comer ela de novo. O que você ia achar, hum?
– Vá em frente, eu não estou pedindo pra você me esperar. – franzi a testa, incrédula com o que ouvi – Não é como se eu fosse me arrepender de estar com o Jason a qualquer momento... E mesmo que me arrependa um dia, não vou correr para os seus braços, as coisas não funcionam assim.
– Então por que faz essas merdas? – o vi cerrar os olhos – Por que finge que se preocupa comigo?
– Não estou fingindo, você foi uma parte importante da minha vida. – tentei explicar da forma mais clara que conseguia.
– Você ainda é a parte mais importante da minha, Lizzie. – disse ele, em tom tristonho – Eu te amo.
– Jordan...
– Não, me escuta. Só me escuta... – ele se apressou em minha direção – Recebi propostas de bolsa em onze universidades diferentes, mas você sabe que só uma me interessa. A nossa, a qual escolhemos juntos. Lembra dos nossos planos, não lembra?
– As coisas mudaram, Dan. – cruzei os braços para soar um pouco mais firme.
– E podem mudar de novo. – suas palavras soavam em certo tom inconformado – Eu estou aqui, e ainda amo você com todas as minhas forças, linda.
– Você está bêbado, não sabe nem o que está falando, então volta pra mesa que eu vou servir o seu café. – lhe dei as costas, a fim de encerrar aquele assunto.
– Não faz assim. – ouvi seus passos pesados se aproximarem mais – Sei que você também se lembra da gente, que ainda pensa em mim como homem, que se sente atraída quando estou perto.
– Isso não é...
– Não mente pra mim! – estremeci dos pés a cabeça ao sentir suas mãos pousarem em meus quadris, à medida que o seu corpo se colava ao meu – Sei que no fundo ainda é minha, e sinto a sua falta todos os dias, então para com essa merda. Volta pra mim, linda?
– Jordan, me larga! – tentei me soltar, apressadamente.
– Não, eu preciso... – sua voz rouca soprando ao pé do ouvido, fez eriçar os pelos da minha nuca – Preciso de você, Liz.
Seus lábios macios tocaram o meu pescoço em beijos molhados, me deixando tão nervosa que não conseguia ao menos raciocinar. Enquanto isso, suas mãos deslizavam pelas laterais das minhas coxas, as quais apertaram firme antes de subir os seus toques por baixo da minha saia. Engoli em seco quando Jordan me puxou para trás, fazendo o meu traseiro esbarrar contra o seu quadril, e logo começou a se esfregar em mim. Aquilo me despertou gatilhos que me sufocavam por dentro, que dilaceravam o meu peito e, por alguns segundos, fiquei completamente imóvel.
"Me dá um beijinho, vai? Não dá uma de difícil agora... Shh... Eu preciso garantir que você ainda é minha...", senti o suor frio surgir nas palmas das mãos com a amarga lembrança da noite que Luke e o seu amigo nojento tentaram abusar de mim. Acho que, apesar de tudo, eu não imaginava que o Jordan também fosse capaz de me tocar dessa forma, sem o meu consentimento. Mas, ao ouvir um estalo ecoar dentro da minha cabeça, rapidamente recuperei os movimentos do meu próprio corpo, e o empurrei como pude, me livrando apressada dos seus toques. Em seguida, me virei de frente pra ele outra vez, agora bem mais assustada.
– O que pensa que está fazendo? – questionei, sentindo o sangue esquentar nas veias – Eu mandei você me soltar, não ouviu?
No entanto, Jordan não quis nem saber e, antes que eu pudesse me afastar, sua mão esquerda alcançou minha nuca, me puxando com certa urgência em sua direção. Tentei empurrá-lo de novo, mas foi tudo muito rápido e, de um segundo ao outro, seus lábios avançaram contra os meus. Arregalei os olhos pelo susto que tomei com aquele movimento brusco, pois não esperava nada parecido com isso vindo da sua parte, apesar de saber o quão bêbado ele estava. Sua destra tornou a agarrar os meus quadris, e sem outra saída dei um passo para trás, o que me fez esbarrar no balcão.
Por mais que eu tentasse repelir aquele contato indesejado, Jordan era bem maior e mais forte do que eu, então nem se quer se movia. Sem conseguir pensar direito no que fazer, talvez num reflexo involuntário, tateei uma das minhas mãos pelo tampo do balcão, enquanto continuava me esforçando para se desvencilhar do seu corpo que prensava o meu. "Quando é preciso se defender, também temos que pensar rápido porque a força nem sempre basta...", ouvi a voz do Jason ecoar nas minhas lembranças no exato momento que alcancei um copo, o qual estourei ao bater contra a lateral da cabeça do seu irmão que me soltou abruptamente.
– Mas que porra... – Jordan segurou a sua própria cabeça que sangrava pelo atrito com o copo de vidro que se partiu.
– NUNCA MAIS ME TOQUE ASSIM, EU FUI CLARA O SUFICIENTE OU SERÁ QUE VOCÊ QUER MAIS? – gritei enfurecida, após limpar minha boca com o antebraço.
Sem dizer mais nada, ele cambaleou para o lado até esbarrar num dos banquinhos de metal, que foi ao chão provocando um enorme estardalhar pela cozinha. Em sequência, seu olhar se dirigiu fulminante em minha direção, mas tentei não demonstrar medo ou fraqueza, apesar de estar extremamente assustada agora. Acho que eu ainda não conseguia assimilar o que tinha acabado de acontecer, afinal o que havia dado nele para agir assim comigo? Pensando nisso, não demorou muito para as lágrimas quentes alcançarem os meus olhos.
– Liz, o Jason... – Emily fez uma curta pausa ao adentrar a cozinha e dar de cara com aquela cena – Ah, bom, eu só queria avisar que o Jason chegou.
Respirei fundo, assentindo e me apressando em secar as lágrimas nos cantos dos olhos, mas assim que dirigi minha atenção para o lado, senti um buraco se abrir embaixo dos meus pés ao ver o Jason adentrar a cozinha, se adiantando só alguns passos à frente da Emily. O semblante em seu rosto foi mudando, endurecendo pela raiva que surgia à medida que o seu olhar se atentava a cada detalhe, e receio que não demorou muito para a sua ficha cair...
[...]
🦋. Quem aí já está preparada para o barraco no próximo capítulo??? 🤭🤭
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