Parte I
As águas batem no casco do navio, a agitação no porão e o odor horrível dos tripulantes. Se continuar assim por muito tempo eu não irei aguentar essa viagem.
Quanto tempo faz que partimos da ilha?
Dez... onze...
Ou... quinze dias?
Havia perdido as contas, nada se encaixava realmente no lugar.
Estava confusa. Não são as águas do mar que me deixam assim. Não, aquelas águas trazem um conforto e, ao mesmo tempo, guiam minha mente para as coisas que estão encobertas há anos.
Verdades ou mentiras?
Crueldades ou salvação?
Poder ou amor insano?
Fecho meus olhos e deixo meu corpo sentir a brisa da manhã. As vozes que se aproximavam me fazem segurar as caixas que estavam para cair quando uma onda bateu no casco da embarcação. Arrumo os objetos e torço o nariz com o fedor de peixe podre.
— Marujo, vá limpar o camarote do capitão, ou andará na prancha!
— Sim, senhor — respondo abaixando a cabeça e seguindo o meu caminho.
Odiava ter que fazer aqueles serviços nojentos e mais ainda ter que dormir na rede perto do bando de porcos que bebiam, cantavam e falavam depravações o tempo inteiro. Minha paciência estava por um fio. Toco o metal frio em sua bainha escondido dentro da calça. Foi um erro embarcar, porém, era isso ou ser pega antes mesmo de conseguir fugir.
As terras ficaram para trás. O amontoado de árvores e seus segredos escondidos em seu centro. A cabana, o sangue, as súplicas de misericórdia, as lágrimas e os sacrifícios. Tudo uma loucura que não tem explicação. Por quê?
Limpava o camarote enquanto o capitão comia seu desjejum e jogava os ossos da ave sobre a mesa. Seu mastigar revirava meu estômago. A boca aberta com a baba e restos de comida sujavam os lábios ressecados e o queixo barbudo. Tudo ensebado.
— Você é o primeiro marujo que realmente faz um trabalho descente. Depois que terminar de empilhar os livros, vá lavar minhas ceroulas, elas estão duras. Não esqueça de jogar os restos de comida para o felino. Rose deve estar faminta.
O embuste sai e continuo ali, por mais que arrumasse aquela merda, era só ele entrar que tudo virava uma porquice.
Ao olhar o amontoado de roupas, a bile sobe a garganta e não consigo evitar regurgitar. Para minha sorte, o líquido amarelado era tão pouco que nem sujou o chão.
Quanto tempo fazia que não colocava um alimento na boca? Não sentia fome, apenas dores no corpo e um bocado de sentimentos que tentava controlar a todo custo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro