XXXIII
Ben dirigiu até o maior porque de Londres. O famoso Hyde Park. Costumávamos ir lá nos tempos da faculdade quando Ben tomava um fora e queria chorar e falar da vida. Foi lá que ele passou a noite quando a mãe morreu. Aquela época foi bem difícil.
Ben era o único filho de Michele, uma inglesa pequena de olhos verdes. O marido morreu quando ela estava grávida. Foi vítima de uma emboscada quando trabalhava na polícia. Michele criou Ben sozinha, com todos os recursos que podia. Mas quando Ben iniciou a faculdade, mais ou menos um ano após, Michele foi assassinada porque reagiu a um assalto. Ficamos todos arrasados. Ben passou a noite no parque e coube a mim ir buscá-lo e aguentar todos os insultos até ele se acalmar e chorar, socando a grama. Choramos juntos, porque eu não me imaginava sem meu pai de uma hora para outra. E Michele era mais que uma mãe para mim. Gostava de ficar vendo ela cozinhar enquanto contava coisas sobre meu passado e ela fantasiava o que Nicolas estaria fazendo naquele momento..
Ele parou o carro e seguimos andando até nosso lugar preferido na grama. Ben estava um tiquinho mais magro, e pálido também. Sentou na grama e esperou que eu sentasse. Era isso, não tinha vinho ou velas ou romantismo ali. Eram duas pessoas magoadas tentando não se magoar mais.
— Marjorie, eu... – Ele engoliu em seco. — Depois que você foi embora eu fiquei pensando em tudo aquilo que me disse. Sobre estar apaixonada por mim. Eu fui um idiota, me senti um monstro que só pensou no próprio umbigo. E pensando bem todo o tempo estive com alguém enquanto você esperava por mim.
Era verdade, mas eu fiquei quieta, esperando o restante.
— Se você tivesse me falado. Talvez..
— Não há talvez Ben. Nos amamos sim, e se James e Helen sair das nossas vidas vamos seguir tentando ser um casal. Até vir a próxima, ou o próximo. – Abracei meus joelhos. — Nosso amor é puro demais para manchar com brigas de casal. Eu aprendi que te amo como parte minha, não um irmão porque até irmãos vão embora. Você é um pedaço meu, assim como sou um pedaço seu.
— Uma costelinha. – Ele fazia palhaçada mesmo em horas sérias.
— Que seja. – Bati no ombro dele. — E você agora tem a Helen, não é uma interesseira.
— Eu pedi um tempo pra ela. – Ele virou de frente para mim — Na verdade, ela me ligou, e te juro. Tenho dó dos pais dos pacientes dela. Aquela mulher é louca.
— Mas você curtiu a loucura dela, quando foi no meu quarto.
— Esquece aquilo. – Ele passou a mão no cabelo. — Aliás, me deixa voltar pra sua vida pequena.
— Você nunca saiu dela Benji.
— Ele adora mudar meu nome. Juiz safado.
Nós dois rimos daquilo. Ben deitou na grama e eu deitei ao lado. Ficamos conversando sobre os últimos dias e pasmem, ele sabia de tudo. Nicolas era um grande fofoqueiro. Contava tudo em troca de dinheiro para comprar besteira na escola.
— Não briga com ele pequena, por favor.
Nicolas estava se tornando um verdadeiro trambiqueiro, tirava dinheiro de um juiz e de um advogado em troca de informações. Ben me disse que Helen só encararia alguma coisa com ele quando nossa situação estivesse resolvida, porque ela sabia a importância da nossa vida entrelaçada. E eu era a única que conseguia conter a infantilidade de Ben.
Ben estava sorrindo agora, e eu também, era muito melhor aquela loucura toda com meu amigo por perto.
— O escritório fechou. – Ele virou o rosto na minha direção. Estava sério. - Hoje recebi a ligação do tribunal, querem que eu me junte a eles.
— Que bom Benjamin. – Não estava bom, ele iria sem mim..
— Mas eu neguei. – Ele disse. — Tinha os contatos dos meus clientes antigos e consegui continuar com eles por fora. Em nome da nossa empresa..
— Legal que esteja abrindo uma empresa com Helen. – Forcei um sorriso digno de filmes de terror.
A verdade era que eu estava usando todo o dinheiro que guardei todos aqueles anos. Rita e meu pai arcaram com os próprios custos, mas eu precisava pagar a casa, o carro, a escola do Nicolas e a reforma. E isso era bem caro.
— Nossa. – Ele disse. — Minha e sua. E olha, já temos um número bom de clientes esperando por nós e até alguns acionistas, já que a famosa Senhorita Raoni da tribo topa tudo está comigo. Vendi a casa da minha mãe, e acredite foi bem difícil, e comprei um lugar para nós. Se você quiser...
Me atirei em cima dele. Ben me agarrou como se eu fosse uma bola de baseball e apertou bastante. Respirei fundo e tentei falar alguma coisa. Ele beijou o topo da minha cabeça.
— Você merece pequena.
A noite estava linda, eu havia recuperado meu amigo e guarda costas. Ele passava o polegar no meu braço, quem visse de longe parecia pai e filha, um homem daquele tamanho todo..
Meu celular tocou, me afastei um pouco e olhei na tela. Era Helen, senti meu coração disparar imediatamente.
— Oi Helen. – Atendi.
— Sabe que está em perigo, não pode ficar por aí. Nicolas está esperando.
— James. – Falei fria.
— Eu sei que está com seu cão de caça Marjorie.
Ben abriu a boca e disse um palavrão. Segurei a risada.
— Estou indo. Buscar meu filho que deixei com a sua irmã.
A brincadeira acabou. James estava bravo, e Ben usou o caminho todo pra dizer que dá próxima vez daria um soco no meio da boca dele. Um homem banguela não seria tão sarcástico assim.
Por fim acabei deixando meu amigo em casa. Prometemos nos ver no outro dia, ele me advertiu de novo sobre o médico com cara de Minecraft enferrujado e desceu. Voltei o caminho todo escutando Queen porque Fred não se deixava intimidar, e nem eu deixaria. Passei pela portaria e logo estava na casa dele. Desci do carro e escutei Nicolas falando com Harry dentro da casa.
Bati na porta e adivinhem que me atendeu? Ele mesmo, James incorporado no próprio capitão gancho, com a gola do casaco Preto erguida, calça e botas pretas. Respirei fundo, encarnei a Marjorie de antes e falei.
— Boa noite. Helen está por aí?
Ele olhou para dentro, e voltou a me encarar.
— De qualquer forma vim pegar meu filho.
— A senhorita deve saber que estamos no meio de uma investigação, com prisões em massa. Com tudo isso ainda acha tempo para dar uma escapada.
— Olha capitão, – Ele me olhou surpreso. — Se escapar pra você for levar uma mulher até o hospital e esperar uma notícia ruim, então estamos com problemas. E não se preocupe, nunca mais peço para Helen ficar com meu filho. Porque isso te incomoda.
James franziu a testa, me fuzilou com os olhos, deu um passo a frente e fechou a porta atrás de si, eu jurei que ia apanhar.
— Não pareço capitão de nada. – Ele chegou mais perto me olhando nos olhos. — E não disse que Nicolas é um incômodo. Mas Helen foi alvo do ex marido e eu fico pensando quando você será a próxima, porque seu amigo tem a porrada forte, mas não tem o peito de aço.
O ar faiscava a nossa volta. Os homens armados fingiam não nos ver ali, eu não sei se aguentaria muito tempo sem rir no lugar deles. Aliás eu mesma estava quase rindo de nervosismo.
Helen ligou a TV no andar de cima. E de repente eu estava muito ciente do cheiro dele de perfume amadeirado, do hálito fresco, mas eu também não era nenhuma menina boba.
Me afastei dele com a rapidez de uma vizinha fofoqueira.
— Eu não sei o motivo da sua raiva James. E desde que apanhei do meu ex-marido, não corro atrás de ninguém.
— Você é desatenta. – Ele me olhou nos olhos. — Está colocando a vida da minha irmã em risco.
— Ela é bem grandinha James. – Levantei a voz.
— Você não sabe com o que está brincando. – Ele continuou.
— Qual seu problema James?
— Meu problema é você. Você Marjorie, com esse jeito de me ignorar, saindo e me deixando louco.
Nicolas nessa hora abriu a porta e veio correndo com Harry logo atrás, ele me soltou e deu um passo atrás. Nicolas pegou na minha mão.
— Boa noite Marjorie. - James disse.
— Boa noite Meritíssimo...
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