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XXV

Os três me observavam com curiosidade. Abaixei a cabeça e esperei o momento de vergonha passar. A verdade? Não sabia o quê fazer. Tinha raiva, muita, e deixar ele me amedrontar seria a minha ruína. Esperei até pouco a pouco cada um voltar em si.

-Vai lá. E acaba com ele. -Helen era a única que pensava em vingança?

-Não! Se ele quiser, ele que venha. Não vai confiar nele Marjorie. Lembra o que ele fez quando te viu arrumando as coisas?

Claro. Eu apanhei feito gente grande, e me arrastei até o carro, quando meu pai me viu queria entrar, mas Rita correu até nós e disse que aquela seria a hora de partir e voltar estruturada.

-Eu vou sim até lá, e saber o quanto ele lembra de mim.  - Arrumei minha roupa e levantei.

Sob os olhares cautelosos dos meus amigos caminhei lentamente até Davi.  Ergui o rosto e sorri desafiadoramente. Quando estava à uns bons passos encostei o dedo médio no balcão e fui arrastando até ele. Era divertido ver a cara do Davi, ele mudou um pouco. Bem como a barba rala deu lugar à uma mais escura e densa, bem aparada. O cabelo liso e escorrido à um penteado mais insinuante, estava bem mais forte e alto. Ainda era o homem lindo que me apaixonei um dia, e me arrependi pelo resto deles.

- Quente aqui não? - Sentei- me na cadeira alta do bar e cruzei as pernas.

-Vejo que não é daqui. -Ele tinha a voz mais grave.

-Não. Você tem o senso bem apurado. -Ele riu. - Sou, vamos dizer, turista aqui. Da onde venho é sempre frio e úmido. Quase nunca uso vestido. - Ele olhou para as minhas pernas. - E você?

- Eu sou daqui mesmo. Digo, sou do Brasil. Fui estudar em São Paulo, agora voltei para fazer residência. - Então ele era como os pais.

-Doutor hein!? Deve ser um arraso para as mulheres. - Brinquei.

-Não, nenhuma havia despertado a minha atenção. Até hoje. - Fingi ficar envergonhada. - Sou pediatra, ou serei um dia. E você?

-Advogada. Trabalho em uma das empresas mais conceituadas de Londres. - Arrisquei um pouco.

-De Londres. Legal, já sei onde passar minhas férias. - Eu ri, de verdade. Quando ele se lembrasse me mim, seria um choque e tanto.

- Então. Aceita alguma bebida? - Ele perguntou.

-Se não fizer mal doutor.- Pisquei para ele.

Davi era muito simpático, era do tipo conquistador, eu observei o quanto ele mudou e ainda era o mesmo menino, medroso. Ele pediu a bebida mais cara. Tive medo do garçom aparecer e estragar tudo falando meu nome. Dei uma olhada para trás, o único que ainda não tirava os olhos de mim era o James, ele tinha uma expressão estranha, como se estivesse sentindo o cheiro de coisa errada no ar.

-E então? - Ele levantou o pequeno copo. - Vamos brindar.

- Com certeza. À nossa eterna juventude e luta pela paz interior, que nossas vitórias sejam mais que nossos inimigos.

Ele pareceu pensar sobre o assunto quando virou o copo de uma vez e bateu com ele no balcão. Sorvi o líquido do meu copo logo depois, e ao contrário não o bati. Pousei ele em cima do balcão e sorri.

- O que te trás aqui turista? - Davi encarou o copo.

-Problemas familiares e o seu?

- Estamos no mesmo barco. - Ele falou.

- Com certeza. -Não pude evitar uma risada.

- Olha. -Ele me encarou. - Sei que posso estar sendo precipitado, mas estou hospedado aqui perto. A gente podia juntar nossos problemas e conversar um pouco mais pessoalmente. O que acha?

- Acho. Que não nos apresentamos ainda. - Falei. - Não vamos nos tratar a noite inteira como Doutor e Advogada.

- Pois bem. Se esse é o caso. - Ele ficou em pé. - Muito prazer, me chamo Davi, tenho vinte e quatro anos, e estudo medicina.

-O prazer é todo meu. -Fiquei em pé. - Sou Brasileira, filha de uma nativa daqui mesmo. Tenho vinte e quatro anos, também. E o mais importante, me Chamo Marjorie Raoni.

Davi pareceu perder o equilíbrio momentaneamente, ele me encarava e fechava o olho, depois voltava a me encarar. Enquanto eu sorria a todo instante.

-Você não se lembra de mim? Justo eu que sou a mãe do seu filho?

-Mas que merda é essa? Você brincou comigo o tempo todo. Merda Marjorie, eu ia te levar pra cama.

-Ia se eu quisesse. - Ironizei. - Mas como não quero, fique a vontade. - Respondi.

-Você está mudada, - Ele tocou meu braço. - Eu sabia que você parecia ela, digo você. Mas não queria aceitar que você estava tão. ....

- Mudada? Eu deveria estar marcada com a surra que você me deu. Ou no mínimo ser uma revoltada drogada, mas não. Parti, mas fiz meu nome.

-Deve ter se casado com algum velho. -Ele me olhou com nojo. - Ou se tornado uma...

- Cuidado. - Senti uma mão tocar meu ombro. - Não fala assim com a moça.

- E você quem é? Ou vamos fazer o jogo dessa aí. - Ele apontou para mim.

-Não! Deixa eu me apresentar. - James passou na minha frente. -Me chamo James, sou Juiz em Londres, e você deveria falar direito com a minha namorada.

Namorada? será que ele pensava que aquela história ainda valia? Penso que sim, pela forma que ele me puxou para perto de si e beijou minha cabeça.

- Sua Vadia, nojenta, me abandonou para ficar com esses tipos. - Davi disse em um inglês perfeito.

Ele não chegou dizer quais tipos eram os meus, porque levou um soco no nariz e caiu no chão choramingando feito uma criança. Me senti péssima por ouvir o nariz dele estralando, provavelmente saindo do lugar, mas gostei de vê - lo engolir às palavras e cuspir sangue.

-Eu vou processar você! -Ele tentava levantar do chão.

- Sob qual acusação? - James limpava a mão em um lenço. - Não ouvi. Sob qual acusação, você vai processar um juiz e uma advogada?

Davi parecia pensar na acusação, mas James passou por ele e jogou o lenço no chão.

- Quando a dor passar pode limpar o nariz com o meu lenço de quatrocentos dólares, e fica para você.
Davi tentava parar o sangue que jorrava do nariz. James estendeu a mão para mim. Pensei em negar, mas teria toda aquela encenação sobre volta por cima, perdida. Contrariando meus sentimentos, aceitei a mão dele...

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