LUA CHEIA
Andrej observa a estranha chuva que não para.
Já são quase duas horas da tarde, mas parecem ser nove horas da noite.
Uma densa neblina toma conta de todo o lugar.
O nobre é tomado pela horrível lembrança do Padre Custódio em chamas.
"Como aquilo pôde acontecer?"
Ele está sentado em frente à sua lareira acesa.
Suas mãos emolduram seu queixo quadrado, enquanto ele reflete e conclui que de certa forma foi providencial que o padre morresse.
Agora, o patriarca Alioth poderá ascender seu filho no poder sacerdotal.
- Lira, Lira... Jovem Merak. Se esconda onde quiser... Esteja onde estiver, eu a encontrarei.
Andrej não tira os olhos do fogo.
A janela se abre com força e um vento violento faz com que muita chuva entre dentro do quarto.
— Porcaria! Eu fechei a janela, mas a merda desse vento que não para a abriu!— O nobre vai até a janela para fechá-la.
Está irritado com as forças da natureza.
Quando vira-se, sente seu coração gelar ao ver um grande animal ao lado da lareira... Perto da sua poltrona, há um imenso e negro cachorro de aparência agressiva.
Andrej desembainha sua espada e a sacode tentando parecer ameaçador, porém o animal deita-se em seu assoalho e começa a grunhir.
O nobre franze o cenho.
Olha para sua porta está trancada... Teria que passar pelo animal.
O cão começa a uivar e rosnar. Depois, vira-se, esfregando suas costas no chão.
Novamente o animal começa a emitir um som como se estivesse agonizando.
Há algo estranho acontecendo com a fera.
Ele fixa os olhos no focinho do animal, que está tremendo.
A boca do animal se abre e um antebraço humano sai de dentro da boca do animal.
O braço vira-se para cima, enquanto o animal continua a tremer.
Uma abundante quantidade de gosma sangrenta, é jorrada para fora do cão em convulsão.
Agora são duas mãos, que forçam a boca do animal, de dentro para fora.
Andrej vê enquanto, aos poucos, um corpo de homem sai de dentro do animal.
Um parto sobrenatural na segunda lua cheia.
A cabeça grisalha passa seguida pelos ombros.
Os bíceps, mostram a estrutura musculosa de quem vem.
Andrej fica em guarda com sua espada, pronto para atacar, mas a arma é interceptada por uma adaga que trás esculpida, na extremidade da empunhadura, uma cabeça de dragão.
Em um abrir e fechar de olhos Andrej foi desarmado pelo forasteiro.
— Quem é você?!
— Shh... Não temos tempo para apresentações, estamos perdendo o momento! — Drake segura o homem pelo queixo.
O corpo do animal ainda se convulsiona no chão, está com a pele quase toda flácida.
O homem banhado em sangue, passa a cintura pela boca do cão, e em seguida todo o resto do corpo.
O homem que sai de dentro do cão é quase do mesmo tamanho que Drake.
Só que mais velho, de barba e cabelos brancos, pintados por sangue.
Ele se sacode como um cachorro, jogando sangue para todo lado.
— Andrej, apresento a ti meu fiel guarda costa: Barakj! — Drake olha para o nobre e continua. — Se bem... que nem sempre ele foi tão fiel assim... Mas, somos irmãos, não de sangue, acho que você entende. Não entende...!? Bem, deixarei vocês a sós.
Barakj está parado em frente à lareira.
Nu.
Andrej olha para ele e depois para Drake.
— Eu preciso fazer uma visita a outro Alioth. — Uma gargalhada maldita ressoa das profundezas do tórax de Drake, depois ele some pela escuridão. Como se houvesse uma porta ali, na parede do quarto.
— Meu queixo dói mais que o corpo todo, acredita? — Barakj estrala o seu pescoço.
— Q-quem é você?
— Você não me conhece. — Com um movimento rápido Barakj segura Andrej pelo pescoço e o arremessa contra a parede.
Antes de ele tocar o chão, novamente é segurado pelo pescoço.
- AAAAAAAHHHHHH! - Andrej tem seus dois pulsos quebrados com uma pancada, na quina de um móvel de madeira.
– Como disse, você não me conhece, mas conheceu meu filho e o matou... — A voz de Barakj é tranquila.
Andrej olha para ele sem entender a acusação, mas antes que processe a informação, é arremessado como uma bola de boliche em sua poltrona.
Barakj acomoda o nobre na poltrona.
— Vamos, não durma... Você é durão! — O homem nu, banhado de sangue, vira-se e pega dois atiçadores de brasa feitos de ferro, que são usados para mexer as madeiras enquanto queimam na lareira.
Os acessórios tem formato de espeto.
Sem pressa, Barakj crava um espeto na mão direita e o outro na mão esquerda do homem, transpassando os braços de Andrej e os da poltrona.
O nobre urra de dor. Grita. Sacode-se na cadeira, para então gritar novamente:
— Eu?! Nunca matei seu filho!
— Não se lembra? Ele apanhou tanto, que seu corpo foi velado fechado!
Barakj esmurra-lhe a cara!
— Você matou minha filha... — Andrej leva outro soco.
Com a cara jorrando sangue ele pergunta:
— Sua filha. — Barakj sorri malignante e balança positivamente sua cabeça.
— Você mesmo disse ao padre que a cabeça dela se encontrou com o porrete de madeira que estava em sua mão.
Andrej arregala os olhos.
— N-não pode ser!
O nobre recebe um largo sorriso.
Com esmero, Barakj pega um carvão em brasa e o coloca na mão esquerda do homem, que está com a palma voltada para cima, depois a fecha.
— AAAARRRRRGGGGHHHHH!
— Eu... pago, pago tudo que você quiser.
Barakj tira a brasa e a quebra no chão.
Um fiapo de madeira, com quase vinte centímetros.
Como um lápis.
Andrej vê a felicidade sair do rosto de Barakj, para logo o deixar.
Seu semblante fica pesado.
— Mas, sabe o que me deixa mais irado? Você querer comprar a pureza da minha neta... E como ela não se vendeu, tentou matá-la.
O homem começa a gritar com mais dor quando Barakj enfia o filete de madeira entre as unhas e a pele de seus dedos quebrados.
Andrej não consegue parar de gritar.
— Calma caro nobre, estou começando... Agora vamos para os pés.
Borjan está sentado em sua cama. Preso pelo seu pai.
A chuva não dá trégua, só piora.
Ele soca a parede, levanta-se e quebra o espelho ao se ver refletido nele. Depois grita para si:
— COVARDE!
Lágrimas caem aos montes.
— Calma jovem!
Borjan vira-se assustado.
Drake está em pé ao lado da janela, e vem na direção da luz da vela.
— Meu nome é Drake. Mas, também conhecido como Vlad Tepes. — As íris de Drake estão azuladas.
— O que você quer de mim?
— Posso sentar? — Drake senta-se na cama do rapaz, antes da permissão do jovem. — Eu não quero nada de você.
O jovem o olha sem entender nada.
Drake suspira com desalento.
— Hoje você está só no mundo. Seu pai e irmão estão mortos. Você carregará uma grande responsabilidade.
Borjan fica sem ação.
Pelo tom de voz do homem, ele não está brincando.
Confuso, tudo o que pode fazer é escutar.
— Lira Merak vai sumir por alguns anos, mas, se for o desejo dela, um dia ela poderá ou não te procurar.
O jovem abaixa a cabeça.
O homem o deixa com medo.
— Não tenha medo, se quisesse já o teria matado. — Drake apoia os cotovelos nas coxas e une as pontas dos dedos das mãos enquanto lança a Borjan um olhar indiferente. — Essa cidade a alguns anos não é abençoada com novos nascimentos. Correto?
—S-sim.
Drake percebe que tem a total atenção do rapaz.
— Há dois rios fluentes que cortam a cidade, eles abastecem os cinco poços daqui que são usados para captar água.
Alguém bate à porta de Borjan.
— Meu senhor... Está bem? - Pergunta um dos guardas que não se preocupa de fato.
Drake faz uma gesto como quem diz:
"Pode responder, por favor."
— S-sim... Está tudo bem! Apenas tive um pesadelo.
— Ouço vozes senhor.
— Já disse homem! Eu acordei devido aos pesadelos!
Depois de alguns minutos, Drake continua:
— Na foz desses rios, na parte mais alta, há uma vegetação que está contaminando toda água da cidade, fazendo com que vocês não tenham filhos.
O forasteiro levanta-se para ir embora.
— Essa planta se chama: Flor-da-Boa Noite. Preciso ser mais específico?
O rapaz balança a cabeça negativamente.
— Quando eu sair do seu quarto, você terá um sono profundo. Mas, se lembrará do que conversamos.
Lira anda de um lado para outro.
A chuva é torrencial.
O forasteiro havia pedido para esperar.
A lua cheia está aparecendo e a chuva mingua aos poucos.
Lira escuta batidas na porta.
Ela nada diz. Seu coração está em agonia.
"E se vieram prender-me novamente?"
— Sou eu Lira.
Ela reconhece a voz do forasteiro, corre e abre a porta, dando de cara com um homem que aparenta ter quarenta anos.
Ele tem cabelos e barba brancos.
— Quem é você?
— Posso entrar?
Ele está vestido com roupas de nobre.
— E-eu não sei o que aconteceu mais cedo, pensei que fosse o forasteiro, — A jovem vai atropelando as palavras. — Eu sou inocente!
— Eu sei disso.
— Sabe?
— Sim. — Ela afasta-se para o homem entrar. A jovem se sente segura com a presença dele.
— Eu não tenho muito tempo. Por isso vou encurtar a história. Meu nome é Barakj.
Ele abaixa a cabeça.
A jovem fica sem entender.
— Eu sou Barakj Merak.
Lira arregala os olhos e tropeça para trás, caindo em cima da mesa.
— Meu amor, sou seu avô. Eu não morri. O homem que você viu hoje mais cedo, é meu Mestre. — A jovem está mais pálida que o normal.
— Vlad Tepes?
— Sim.
— O s-senhor é aquele animal?
— Sim! Há cem anos atrás eu o traí. Fui General dele, e o deixei para morrer na mão de seus inimigos. Por um milagre ele sobreviveu à estaca no coração.
Barakj senta na cadeira da mesa.
Sua neta está sem ação muscular na face.
— Ele me encontrou depois de dois anos. Você deve imaginar minha cara de surpresa e medo... Como castigo e para que eu aprendesse a ser fiel, transformou-me eternamente no que você viu... Uma besta que a cada segunda lua cheia do ano, aparece no céu, volto a ser humano, porém ao primeiro declínio, me transformo na besta que viu.
O homem junta as mãos no rosto e chora amargamente!
A neta o abraça.
Eles, choram juntos.
– Preciso que venha comigo. Não tenho muito tempo, logo a lua declinará.
— Para onde?
— Levarei você a um local onde poderá expandir seu poder e aprender a usá-lo.
— Poder? Não estou entendendo!
— Sim, meu amor... Você é uma "Bruja". E, aqui, você nunca estará segura.
A menina ainda abraçada ao avô, sente o corpo dele tremer.
Drake ouve tudo, parado de cabeça para baixo, seus pés estão fixados no teto por detrás da casa.
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