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Dr. Elizeu

Elizeu levanta da cama às oito horas.

Sempre foi metódico e não será o acidente que o deixará na cama convalescendo ou morrendo de angústia.

Ele é casado com Janete, que também é médica, tem dois filhos.

Um casal. Monica e Frederico.

São gêmeos!

Eles moram numa mansão em Casa Forte.

Ele tem cabelo crespo, bem cortado e com uma barba meia ruiva e meia preta.

Na verdade, é mais preta que ruiva. O nariz afilado e olhos castanhos.

Há mais de seis meses toda sua rotina mudou. O acidente provocado por um irresponsável tirou a vida das suas pernas e a vida de seu amigo de infância.

Seu filho Frederico é quem todos dia se diverte indo de um lado para o outro em cima de Elizeu, na cadeira de roda.

Porém, diferente dos outros dias, Elizeu amanheceu com um leve mau humor. Ele ainda está se adaptando para voltar a clinicar.

Ou continuar tentando.

— Bom dia querido! — Janete está colocando os pães e café na mesa, quando Elizeu aparece na sala.

— Bom dia Janete. — Elizeu arrodeia a mesa e fica de frente à Janete.

— O que você vai fazer hoje?

— Jogar bola, depois vou nadar, correr e fazer a porra toda, que um cara normal faz! — Elizeu não é ríspido, mas, sua acidez na forma de falar fere Janete.

Ela nada diz.

Sai da mesa e vai à cozinha.

Passa umas orientações para Esmeralda.

Pega o café solúvel e volta deixando perto dele.

Depois, caminha até o quarto das crianças, acorda-las para ir à escola.

— Frederico, Monica está na hora de levantar! — Janete sai puxando os lençóis de cada um!

— Mãe...

— Mãe!

— Crianças vamos, o café está na mesa, alguém quer ovo frito?

— Eu quero papa de aveia. — Pede Monica.

— Meu ovo eu quero com a gema mole! — Frederico fala arrastado, ainda com sono.

— Cada um, vai no banheiro, tome banho e depois coloquem a farda do colégio. Esmeralda, por favor, você pode ajudar as crianças?

— Sim senhora... Vamos galerinha.

Janete volta pra sala e ver Elizeu parado olhando dentro da xícara com café.

A mesa está farta.

Tem mamão, melão, uma jarra com suco de laranja, pão assado na tostadeira, queijo prato, cuscuz e pão fresco.

Eliseu continua inerte.

— Era para Frederico está no carro, naquele dia. — Elizeu deixa de olhar à xícara e passa a olhar Janete.

— Meu amor, não adianta pensa nisso, ele não estava. É aumentar a dor pensando assim.

— Você Fala assim, por que... — Elizeu para e não termina a frase.

— Por que não foi comigo? É isso que você iria dizer? — Ela sai da cozinha, parou de mexer a papa. — O que mais você quer dizer ?

Elizeu abaixa a cabeça.

— Sei o que você está passando! E todos os dias sinto suas dores! — Ela está falando e enxugando as mãos no pano — Sim! Sinto por que te amo, mas, ao mesmo tempo, sei que meu marido é um homem maravilhoso e que não vai se entregar! — Janete espera uma resposta.

Elizeu apenas olha para Janete, olha para suas próprias mãos e diz:

— Eu desejaria um minuto com aquele assassino! Um minuto!

— E o que você iria fazer? Matá-lo? Vingança? Ser igual a ele? É isso que você quer?

— Não é vingança, chama-se justiça!

— A justiça você vai ter daqui há um mês!

— Ele não vai cumprir a pena! Vão estipular uma fiança e ele vai sair.

Elizeu é beijado pelas crianças.

Ele olha para seus filhos e os olhos enchem de lágrimas.

Bebe mais um pouco de café.

Janete agradece Esmeralda e pede para continuar ajudando com a papa.

— Eu te amo! — Janete abraça Elizeu.

— Eu sei... Mas meu coração está azedo! Dolorido! Despedaço igual minha espinha. hoje acordei pensando no acidente.

— Uma hora você vai ter que continuar. A vida está continuando, seus filhos estão maiores que há seis meses atrás.— Janete serve a papa no prato de Frederico.

— Mãe! Eu não gosto de papa! — Reclama o menino.

— Você falou com Mariana ontem? — Elizeu pergunta à Janete, a olhando.

— Sim! Falei! E é por isso que você acordou assim?

— Ela lhe disse que encontrou aquele, — Elizeu percebe o olhar Janete mostrando as crianças — Homem no Restaurante Leite?

— Mãe, Tia Mariana viu quem no Restaurante? — Pergunta Monica.

— É feio prestar atenção na conversa de adulto! E sim, ela contou.

— Ele estava lá... Sorrindo, curtindo a noite, bebendo. Como se nada tivesse acontecido! Ele sabe que com o dinheiro que tem, qualquer fiança, ele vai pagar e responder em liberdade.

— Vamos acreditar na justiça. Senão acreditarmos na do homem, vamos acreditar na divina.

— Se a justiça divina estivesse atenta, ele não teria voltado dos mortos. — Elizeu sai da mesa e vai até a sala de estar.

Pega o controle e liga a TV.

A sala é redonda e tem dois sofás de três lugares. Um de frente para o outro.

Um móvel repleto de livros. Parece com as dos filmes americanos. Vai do teto até o chão. Livro que não acaba mais.

Na sua mesa de jatobá, há uma luminária para leitura, um porta canetas em couro e um risque - rabisque também em couro.

Elizeu suspira ao ver a foto do amigo.

Ele se aproxima da sua mesa, pega o porta retrato.

Levanta a cabeça para o teto e pensa naquele noite.

Não fora uma fatalidade.

Foi uma monstruosidade.

Duas família vítimas de uma mesma pessoa.

Um mesmo monstro.

"Porra amigo...Esse cara literalmente fodeu nossas vidas!"

— Elizeu...— Janete entra na sala sem um pingo de sangue no rosto.

— O que aconteceu? — parando de olhar o porta-retrato.

Ela se perde no tempo, olhando sem piscar para Elizeu.

— Américo Toledo Cavalcanti está no portão lá fora querendo falar com você.

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