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🖋️ • Ré

A gente nunca sabe quando é que a vida vai dar aquelas viradas de cabeça pra baixo e transformar tudo à nossa volta numa casa nova. É estranho pensar nisso. Pensar tipo: "nossa, dois meses atrás eu não era assim". Não dá pra prever mudanças, você só sente quando elas chegam. E às vezes isso pode até demorar. O acaso é estranho, mas gosto dele. Veja bem, no dia em que eu o conheci, estava sentindo tudo, menos bom humor. Coisas boas nem sempre vem com os sorrisos mais abertos.

Deveria estar de tarde, pelo o que me lembro. O sol bem alto no céu, quase no horário de ir embora. Eu não tinha nada pra fazer, e mesmo assim a cabeça estava tão cheia que me sentia ocupadíssima. Ficava remoendo o passado que eu não podia mudar. Nem sequer consegui escrever meus remorsos, porque como eu sei (e espero que você também saiba), há um tempo para tudo nessa vida. Não pude escrever meus remorsos naquele dia, mas cá estou falando sobre eles agora. Se for para dizer meus sentimentos na verdade crua, que seja. Falarei bem alto que é pra eu também me escutar.

O peso do dia, das letras perdidas, do vinho quente e dos papéis rasgados subiu-me na garganta. Me doeu a alma aquela tarde. Às 17:00 horas de uma quinta-feira calorenta, eu disse pra mim mesma que precisava me virar com as letras logo, pra conseguir vomitar minha angústia.

Mas não pude escrever nada. O grito é um direito meu, mas não gritei. Sequer voz eu tive pra isso. Soquei meus travesseiros e arrumei a cama, tomei um banho gelado e lavei os cabelos, porque tinha um compromisso pela noitinha. Não é um compromisso muito "meu", porque eu não queria ir. Não queria deixar meus remorsos para encarar os de outras pessoas. Mas eu fui.

Peguei um vestido roxo escuro naquela noite, não estava ligando pra psicologia das cores. Os cachos no alto da cabeça e os fones sempre na bolsa. Bruna tinha me mandado uma mensagem naquela manhã; disse que queria me mostrar uma coisa legal. Já escrevi sobre Bruna antes, mas menti seu nome. Agora digo que é Bruna, Bruna Luana. Ela não gosta do Luana, diz ser exagero. Mas vou deixá-lo aqui mesmo assim. Pois bem, ela tinha me dito que encontrou algo bonito e silencioso. E eu odeio quando ela diz isso.

Acontece que eu não gosto de não gostar de escutar coisas demais. Queria gostar. Queria fingir que sou daquelas escritoras que se trancam no escritório, colocam música clássica para tocar e bebem muito café. Mas eu não tenho músicas, porque eu não consigo escutá-las, e muito menos gosto de café. Deus me livre de gostar, peço perdão aos outros escritores por isso.

Enfim, deixe eu voltar ao meu ponto antes que eu fuja dele para reclamar de coisas vãs. Pois então, Bruna Luana me chamou para assistir uma peça de teatro.

Enquanto eu colocava os fones e descia pelas escadas, tentei imaginar como diabos funcionaria um teatro "silencioso". Mesmo os teatros mudos nos quais eu já ouvi falar sempre tocam músicas. Apesar de que eu nunca fui a um espetáculo desses, coloquei na cabeça que qualquer coisa que envolvesse humanos demais fazia barulho demais.

Com um tempo, enquanto sofria com as crises, aprendi a mudar o foco dos meus olhos. Do mesmo jeito que o olfato afeta teu paladar, o lugar para onde você olha também afeta sua audição. Seu cérebro vai prestar mais atenção para um ponto que você estiver olhando, e consequentemente, vai ignorar um pouco o seu redor. Aprendi isso sozinha, e funcionou pra mim. Se não funcionar pra você, obviamente é porque temos cérebros diferentes.

Segui até meu carro com os olhos travados na maçaneta, e em mais nenhum outro lugar. Escutar a maçaneta destravando, apenas a maçaneta. Nada além dela. E depois de entrar no carro, fiz o mesmo com o volante. Nunca olhando para os lados sem precisar, nunca ouvindo demais. Três respirações, contando de um até dez.

Mas, ignorando essas pausas dramáticas, eu não quero ficar falando o tempo todo sobre essa minha rotina sem saber ouvir, porque, veja bem, pra mim é a coisa mais normal do mundo. Escrever sobre colocar meus fones no instante em que entro na avenida já é minha rotina. E acho que se eu ficar escrevendo minha rotina, isso aqui não vai prestar. Eu não gosto de rotina, muito menos de escrever sobre ela. Escrever rotinas arranha a carne pelo lado de dentro do corpo e faz com que eu me canse de mim.

O teatro fica no centro da cidade. Que lugar nojento. Papéis jogados no chão, gente andando para lá e pra cá, cheiro de restaurantes recém abertos, fumaça saindo dos carros, e toda essa porcaria de cidade grande. Mas de qualquer forma, quando estacionei, vi que Bruna me aguardava na entrada do prédio.

Ela usava aquelas habituais calças jeans e um salto confortável. Eu diria que aquele estilo de blusa fica horrível em qualquer um, mas em Bruna ele cai muito bem. Talvez porque Bruna goste daquele estilo. Quando uma mulher está confortável em sua própria pele, você pode sentir o peso de sua majestosa postura bem de longe. Acho chique essa coisa de se achar, e muito bonito também.

Afastei os fones por um instante, para conseguir ouvi-la.

— Roxo? — Ela olhou para o meu vestido, levantando o canto do lábio num sorriso. — Você 'tá uma gracinha.

— Obrigada. O que é que você me arranjou dessa vez?

— Eu? — Apontou pra si mesma, sorrindo largo. — Vem, vamos descobrir. — Começou a andar para dentro do edifício antigo, e eu fui seguindo ela. — Uma das minhas pacientes está participando da peça. Ela não participa de peças já faz um bom tempo, mas estava tão feliz que me convidou para vir assistir o espetáculo hoje.

— Entendi. — Bruna sempre mantinha aquela postura ereta, como a de quem é confiante de si mesmo 100% do tempo. — E como vão as coisas no seu consultório novo?

— Vão bem. Tem alguns outros psiquiatras no mesmo andar, o lugar é todo arrumadinho. Te levo pra conhecer o prédio novo depois.

Ela parou de frente ao moço na recepção, que tinha aqueles bigodes à moda antiga, com direito a uma charmosa curvinha nas pontas. Bruna entregou a ele dois ingressos, e após rasgá-los e devolver os papéis a ela, nos deu espaço para passar.

Não vou ficar citando muitos detalhes do teatro, porque bem... era um teatro. Com as cadeiras não lá tão confortáveis e um palco grande, com as cortinas vermelhas ainda fechadas. Segui Bruna até a fileira onde íamos nos sentar. A visão para o palco era muito boa, e eu agradeceria por isso mais tarde.

— Pode colocar os fones quando quiser. — Disse ela. — Não vai atrapalhar seu entendimento na peça.

Eu preciso confessar que tenho um ódio tremendo de não prestar atenção nas coisas, e só no futuro perceber que elas eram importantes e mereciam ser lembradas. Não gosto de danças. Pelo menos eu acreditava não gostar, até porque, em minha cabeça naquela época, dança só se ligava com música e era isso aí. Não existia alegria nos movimentos do corpo sem algum toque vindo de fora.

Então, infelizmente, não me lembro de muitos detalhes daquela apresentação. Sei que, de primeira, entraram alguns dançarinos vestidos de branco. Eles mexiam para lá e pra cá, trazendo seus personagens à tona. Eram bons atores, mas não parecia ser nada a mais que uma apresentação de balé. Em certo momento, o pé do senhor da cadeira de trás chutou as costas do meu assento. E percebi ele chegando mais perto da cadeira, mas não ouvi suas desculpas. Acreditei que pelo sorriso e olhos bondosos, tenha sido isso o que ele disse. Eu forcei as bochechas para cima, e logo me virei para o palco outra vez. Bruna Luana me deu uma cotovelada e apontou com a cabeça para o palco. Seus olhos estavam fixos em uma das dançarinas, e entendi que aquela era sua paciente.

A moça, visivelmente a personagem principal já que sempre estava na frente, era muito bonita. Talvez uma das melhores ali, honrava o lugar em que pisava. Tinha cachos como eu, mas os dela estavam bem presos num penteado bonito, e eram de cor preta. Sua pele, igualmente pintada por um tom forte de marrom, refletia elegantemente sob a fantasia prateada. Escrevi uma personagem parecida com ela certa vez, mas a que escrevi não tinha olhos tão confiantes.

Comecei a prestar um pouco mais de atenção a partir daí. A paciente de Bruna procurava por algo importante. Seus passos de dança percorriam o palco, à medida que os outros dançarinos se afastavam, dando-a espaço para ficar no meio. Ela não parava de procurar, e levava a mão no pescoço como se estivesse perdendo ar. Estava morrendo, perdendo cada vez mais energias após tanto procurar algo e não encontrar.

Ela se agachou e colocando as mãos trêmulas sobre suas pernas, passou a chorar. Os ombros chacoalharam, deixando-a sem energia para pôr-se de pé. Parecia chorar de verdade; pois eu conseguia ver lágrimas descendo por sua bochecha e caindo em seu colo. Talvez estivesse vazia, perdida, solitária, não sei. De repente, uma outra dançarina toda vestida de preto chegou por trás da que estava morrendo, e a sugou como se fosse dona de sua vida.

A paciente de Bruna estava praticamente morta, deitada no chão com as pedras de seu vestido espalhadas pelo palco. Sua respiração era fraca, e por mais que tentasse se levantar, não conseguia, continuando presa ao chão ao passo que a parecida sombra da morte andava ao seu redor, com os braços sob sua silhueta, movendo-se como se lançasse um feitiço sob o corpo quase morto.

Mas a paciente de Bruna não queria morrer. Não podia morrer, tinha que continuar procurando. Ela parecia segurar seu último sopro de vida quando as luzes se escureceram, mantendo-se um pouco mais claras sob ela. A sombra da morte havia sumido, ela já estava sozinha em seu campo escuro. Fraca e trêmula, se levantou, forçando-se a sair vagando pelos cantos da floresta assustadora que aparecia à sua volta. A luz seguia seus passos, iluminando pouca coisa do palco. Ela estava perdida, sem saber onde ir.

Já devia ter morrido para estar em um lugar como aquele; com árvores de troncos grossos e folhas assustadoras, sombras de pássaros grandes passeando pelo véu do teto. Mas mesmo morta, continuava a procurar. Quando finalmente parou de andar e se apoiou em uma árvore, olhou para a bola que imitava a lua acima de sua cabeça e se ajoelhou, rezando e chorando como se implorasse por sua vida de volta.

A luz ficou um pouco mais tensa, e por trás da lua, surgiu um alguém. Todo o cenário parecia mudar para se encaixar perfeitamente com sua chegada, e, com os pés descalços e pele cintilante como a de uma estrela perdida na vasta noite, ele surgiu no palco.

Vestido de branco, banhado por enfeites e cabelos prateados. Eu me lembro deste momento como se estivesse acontecendo agora: como se eu pudesse vê-lo pela primeira vez todas as vezes que observo seus olhos. Isso é pra mim como uma bênção, uma dádiva da vida que eu nem sei se mereço. Ele tem esse poder de pisar no chão e provar que está ali, presente, como se o mundo fosse dele e eu só estivesse observado do lado de fora, por uma janelinha, enquanto ele domina todos os continentes e países que quiser dominar.

Estava vestido de branco. A roupa era larga, e eu conseguia ver a pele de sua barriga conforme ele andava. Se aproximou por trás da moça agachada no chão e tocou seus ombros, chamando a atenção dela para si. Quando viu que ela o assistia, ele começou a andar para trás, nunca tirando os olhos dela, como se tentasse falar alguma coisa que somente seus movimentos poderiam ser capazes de dizer. Então, talvez em forma de salvação, ele começou a dançar.

De repente não sei o que escrever. É possível que algo seja tão bonito que não possa ser descrito por palavras? Por que eu continuo escrevendo? Não sei, não consigo saber. Tudo o que me lembro é de assisti-lo dançar como se fosse um filho perdido do sol, e então fui tomada pela solidão interior do meu peito. Estou absolutamente amarrada a essa solidão, mas não como se ela fosse ruim. Na verdade, ela me abraça o peito, e fica quieta. E por sua solidão e silêncio, agradeço baixinho, pois na quietude da agitação de meu peito consegui escutar cada toque dos pés dele no chão enquanto ele dançava.

Ele se movia com graça, levando-se à provável música que eu não ouvia devido aos fones. As pálpebras estavam fechadas e os fios prateados de seu cabelo caiam como chuva fina em sua testa, e eu sabia que ele tinha noção do impacto de cada passo que dançava. Em sua mão havia um lenço branco, e ele guiava o lenço como se fosse uma parte de seu corpo; tão sagrado e memorável quanto.

Acredito que, por ignorância de minha parte, naquele momento já o amei um pouco. Não o amor de romance, mas um amor que acendeu o fogo de letras que me canta nos ouvidos. Eu o amei por um milésimo de segundos, enquanto sua dança continuava, enquanto ele me fazia sentir como se a falta do ouvir não fosse um problema. Como se, por conseguir ouvir sua dança sem precisar escutar de fato, renasci para ele; eu fui completa. Pela primeira vez, completa.

Ele me inspirou desde o primeiro giro ao redor do palco. E enquanto ele dançava em frente à paciente de Bruna, entendi que a peça não se tratava de um romance. Eles não se amavam; eles se completavam. Eram apenas um. Ela estava morrendo, mas ele era a luz do sentimento que ela procurava para continuar viva. E conforme ele girava graciosamente ao seu redor, eu agarrei o tecido de dentro dos bolsos do casaco e segurei um suspiro.

Ele era perfeito. Se entregava como se a dança fosse ele, e nada além dele. Não precisava de uma música para compreender aquilo; porque ele era sua própria música. Eu não sabia se aquilo era proposital ou não, mas quando finalmente a morte foi embora e as luzes voltaram a ficar claras, eles dançaram em conjunto como se luz e trevas fossem destinados a ser um só.

Eu o escutei através dos meus fones aquela noite. De repente, eu não tinha medo de seus movimentos e nem prestei mais atenção ao ambiente à minha volta. Tudo o que eu sabia era que tinha acabado de descobrir a única nota musical que não me fazia doer aqui dentro.

Ele provavelmente se instalou como o conjunto mais cheio de interpretações pessoais que já consegui guardar no peito. Porque, como eu só inventei letras a vida toda, achei que aquela euforia do momento ao vê-lo dançar havia sido a coisa mais forte que já havia sentido em tantos anos, mas a verdade é que ela não chegava nem perto de um sentimento puro de verdade.

Porque, por só ter mentido a vida toda, achei que somente assistí-lo seria o suficiente, ou que escrevê-lo como se fosse uma letra perfeita fosse fácil. Mas tudo o que posso dizer é que mesmo quando o espetáculo acabou e eu tive de voltar para casa, o toque dos pés descalços dele no chão ainda me assombrava como um demônio querendo atenção.

E eu não pude dormir, pois lhe dei toda a atenção do mundo.

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