🖋️ • Nota e Dedicatória
Acho que meu problema é não aceitar logo de uma vez que sou a merda de uma humana. Sempre me enfiando em tornados e fechando os olhos para a imagem no meu espelho. Tenho medo de quando uma pedra cair contra minha cabeça e abrir uma ferida, então sei que ao olhar meu sangue vou ver os 70 miseráveis anos que ganhei ao total nessa vida, e que logo estarei morta. Não é bem isso o que dizem naquelas canções? Precisamos sangrar pra ver que estamos vivos? Ok, estou aguardando meu sangue escorrer agora.
Mas enquanto esse dia não chega, eu resolvi juntar umas palavras medíocres que tenho guardado e jogá-las aqui. E por Deus, juro que não é culpa minha. Mas dessa vez eu não quero falar de mim. Não quero falar do meu medo do tempo ou do meu medo de faltar humanidade dentro desse peito.
Quero falar de uma escritora que eu inventei. Uma escritora, que ao mesmo tempo que escreve, é também escrita; é personagem. Seja você dono de palavras ou de vidas, saiba que essa coisa aí que vai encontrar nos próximos capítulos é um troço incompleto e mentiroso. Mas também é verdadeiro, porque grita com vozes humanas. É um livro sobre amor e ódio, porque eles me odeiam.
Já me doei para descrever histórias antes, do mesmo jeito que eu também já me doei para parar de escrevê-las. Já me doei inteira, entregando nas mãos de personagens verdades que eu queria saber como mentir, mas eu não sei. Não sei de nada. Tenho me recusado a achar que sou boa, tenho me recusado a pensar que vai valer a pena escrever qualquer livrinho para agradar qualquer um do outro lado da tela. Mas sei que isso é só eu mentindo pra minha própria pele. Quero fingir pra mim que sou ruim, que mesmo me jogando no chão e socando a cerâmica, nada arranca os mundos verdadeiros daqui de dentro.
Odeio quando formam a imagem de que um escritor é louco e solitário. E odeio reforçar isso às vezes. Eu não sou louca, e nem solitária. Só me canso rápido demais das palavras, nem consigo sentir o gosto delas na ponta da língua, que é onde as papilas gustativas sentem o doce. Talvez eu seja amarga por dentro, mas não estou ligando. Só estou me entregando às mentiras verdadeiras de novo e de novo. E mais pra frente, eu vou ler isso aqui e dizer: "Ah, Rafaella, me dê ao respeito, por favor!", porque sei que vai sair algo bom. Mas entende? Como não dizer que um escritor não é louco quando ele mente para se ver bom?
Estou mentindo agora para me ver sangrar, como humana mesmo. É estranho me encarar como parte do mundo. E vai ser muito estranho falar dessa mulher que escrevi aqui, porque ela odeia algo que amo muito. Mas tudo bem, vamos ver se eu sangro até o ponto final dessas letrinhas. Não espero que sejam palavras de luxo, só espero que sejam palavras fiéis e verdadeiras.
Dedico esse livro à minha personagem, Cecília. Que anda pelas estradas esbanjando sua postura firme e um vestido colado, mas odeia as notas que escrevo para ela. Qualquer nota, de letra ou de música. Ela me odeia, e eu a odeio, mas ainda assim preciso escrevê-la. Obrigada, Cecília, pelo ódio e pelo sangue. Te vejo na próxima página, onde todas as letras não são mais minhas, e sim, suas.
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