27
Karina's pov:
"Há uma música que você precisa ouvir. Uma parte dela está nas estrelas e outra está em mim."
O outono começa na semana seguinte a alta de Minho do hospital. Dedico um tempo para ficar na casa de Joohyun, para garantir que ela está destinando parte do seu tempo para comer, para descansar, e não apenas para focar no trabalho e nos problemas. Faz algumas semanas desde o incidente, mas eu sei que situações assim afetam as pessoas por muito mais tempo. Além disso as coisas na faculdade estão agitadas. Falta apenas dois meses para a conclusão de alguns cursos, ainda que não pareça.
Minjeong tem me mandado mensagens de texto todos os dias, para garantir que eu estou bem e para saber como estão as coisas. Cada mensagem termina com a mesma frase: eu te amo.
Eu preciso disso.
Na noite de domingo, eu não consigo dormir. Sento-me na sala de estar com meu notebook nas mãos, trabalhando em uma composição sem parar, despejando todos os meus pensamentos em meus conceitos musicais. Escuto passos se aproximando por trás de mim. Viro-me e vejo minha tia segurando duas canecas.
— Chá? — Oferece. — É um dos sabores estranhos que Seulgi me recomendou certa vez, então pensei em experimentar. — Assinto e me ajeito no sofá para abrir espaço. Ela se senta e entrega-me uma caneca. — No que está trabalhando?
— Em uma composição.
— Aquela em que trabalhava com seu irmão?
Mordo o lábio inferior.
— Não. Mas enfim pensei em uma forma de finalizá-la. Te aviso quando ela estiver pronta. — Fechando o notebook, me viro para ela. — Mudando um pouco de assunto, você precisa saber que não tem culpa no que aconteceu — falo. — Eu sei que você tem pensado nisso, mas não posso permitir que continue seguindo por esse caminho.
Os olhos de Joohyun se fixam nos meus.
— É, acho que no fundo eu sei disso. Mas e você, como está lidando com isso?
— Eu? — Faço uma pausa. — Estou depositando minha confiança em Minho. Ele me disse que aceitou ajuda profissional.
Ela assente com a cabeça.
— É um começo.
Logo depois respira fundo, e tremo.
— Mas nossa... Foi horrível quando o pai dele me ligou dizendo o que tinha acontecido. — Sua cabeça baixa. — E se ele não tivesse chegado a tempo?
— Eu não sei. Vamos só tentar não pensar nisso por enquanto. — Tomo um gole do meu chá e imediatamente o cuspo na caneca. — Ai, meu Deus! Isso é horrível, tem gosto de mijo de cachorro!
Minha tia ri e levanta uma sobrancelha.
— E você sabe qual é o gosto de mijo de cachorro porque...
Aponto para a caneca dela.
— Experimenta. Você vai ver.
Quando o chá entra na sua boca, ela faz uma careta, cuspindo-o de volta.
— Tem razão, isso definitivamente tem gosto de mijo.
Ela sorri. Eu sorrio. Nós sorrimos. Não um sorriso constrangido, não um sorriso de duas pessoas que tiraram um tempo para ficarem juntas, mas um sorriso verdadeiro. O primeiro que compartilhamos em... semanas.
— Acho que vou viajar daqui algumas semanas. Seulgi me convidou para irmos até o seu chalé no campo.
Abro um sorriso malicioso.
— Não comece, Jimin — ela diz, erguendo um dedo. — Depois do que aconteceu, me parece uma boa ideia relaxar um pouco. Na verdade, eu já vinha pensando em fazer isso há um tempo.
— Tenho certeza que Seulgi vai adorar sua companhia, tia. Nesse momento estar em contato com as pessoas que gostamos é tudo do que precisamos.
Ela assente com a cabeça.
— Tudo bem para você ficar sozinha durante esse tempo? Seulgi comentou comigo sobre a finalização do projeto final da sua turma, então imagino que as coisas estejam agitadas.
— Eu vou ficar bem.
— Bom, de qualquer forma você pode me ligar quando precisar — Ela anda até o balcão da cozinha e pega uma caixa de presente. — Para você.
Confusa, passo os dedos no papel de embrulho.
— Mas o meu aniversário só é daqui a alguns meses — sussurro.
— Pois é... Pensei em comprar algo por todos os seus aniversários que perdi. Abra.
Abro o presente lentamente, sentindo como se fosse algum tipo de sonho do qual eu acordaria. Engulo em seco quando vejo o álbum em minhas mãos. Jascha Heifetz.
Minha tia pigarreia.
— Sei que pode parecer inusitado eu te dar algo assim, mas ouvi quando você praticou algumas músicas dele na última semana. — Ela faz uma pausa. — Jascha é seu compositor preferido, né? Mas, se não gostar do album podemos ver outra coisa. Posso levar você para fazer compras...
Respiro fundo. Meus braços se estendem para Joohyun e a abraço.
— Obrigada, tia. É perfeito! — Quando me afasto, volto para o chá e tomo outro gole sentindo ânsias.
— Por que continua bebendo essa coisa horrível? — Ela pergunta, olhando para o chá.
— Não é tão horrível — argumento. — Além disso, Insoo amava chá, ele é a razão pela qual comecei a beber chá.
Ela baixa o olhar.
— Você pode me contar mais sobre seu irmão?
Meus lábios se curvam para baixo e sinto os batimentos cardíacos acelerarem com a ideia de compartilhar as coisas maravilhosas do meu melhor irmão com uma das minhas pessoas preferidas no mundo.
— O que você quer saber?
Sua voz sai num sussurro, quase sem som:
— Tudo o que você quiser compartilhar.
\[...]
Na quinta-feira, a aula de prática instrumental é algo que eu temo. Não quero que Minho precise enfrentar os comentários desnecessários de alguns alunos. Não quero que ele precise encarar o julgamento nos olhos deles.
Quando meu amigo entra na sala de aula, escuto todos sussurrando. Eu não tenho certeza se é porque Minho está vivo ou porque ele pensou em tirar a própria vida, mas continuam sussurrando. Ele está agindo como se não estivesse incomodado, e quando me vê abre um pequeno sorriso.
Seus lábios se curvam um pouco.
De modo singelo, pequeno, minúsculo, mas o suficiente para mim por enquanto.
— Oi — Ele me cumprimenta antes de se sentar em seu lugar.
— Como ele está? — Minjeong sussurra, sentada ao meu lado.
— Está aceitando bem o acompanhamento profissional — Digo e chego mais perto dela. — Parece que a relação familiar também está evoluindo aos poucos, entende?
— É claro, Jimin. As vezes é preciso que algo assim aconteça para que as pessoas percebam o quanto estão sendo egoístas.
Seguro sua mão. Eu quero puxá-la em meus braços e beijá-la, mas não o faço. Minjeong sabe da história de Minho com a família dele. Além dela própria ter que lidar com algo parecido por conta do seu pai. É óbvio que ela sabe exatamente do que estou falando.
— Você é uma pessoa incrível, Minjeong — sussurro, com convicção na voz. — Independente do que algumas pessoas digam, você precisa saber disso.
Ela sorri para mim, e meu coração é acalentado com isso. Quanto mais tempo passamos juntas, mais o amor que sinto por ela parece crescer em meu peito, mesmo que não haja necessidade de falar. Descobri que nos comunicamos melhor em silêncio. Alguns olhares aqui, alguns sorrisos ali. Talvez nossa conexão não precise de palavras nem de sons.
E ela é tão inteligente.
Metade das pessoas aqui provavelmente nunca teve ideia de como ela é inteligente. Ela é apenas mais uma aluna metida para eles. Mas eu estou encantada pela forma como sua mente encontra maneiras de se comunicar com a música. Como ela consegue me incentivar, a dar uma chance para novos conceitos.
— Jimin — Ela fala, rindo baixinho. — Você está me encarando de novo.
— Eu sei. Só estou admirando a garota linda que é minha namorada.
Seu sorriso se alarga ao mesmo tempo que a professora Kang entra na sala. Hoje ela está vestindo um blazer largo que em qualquer outra pessoa ficaria desajustado, mas nela tem o caimento perfeito. Seus cabelos estão soltos e ela segura uma pasta em mãos.
Ela coloca seu material na mesa e anda até o quadro, onde está escrito “Apresentação Final”.
— Vamos lá, senhoras e senhores! Alguém deve ter alguma ideia de que dia acontecerá a Apresentação Final dessa turma. Basta começar a falar.
— No ano que vem — Minho sorri.
— Passou perto... — A professora Kang ri. — Mas não exatamente. — Levanto a mão. Seulgi vê e abre um sorriso. — Sim, Jimin?
— Em menos de dois meses. — Digo. Ser sobrinha de uma das administradoras da faculdade tem lá suas vantagens. Principalmente quando ela namora sua professora de prática instrumental.
Yeji, uma das únicas pessoas do grupinho da Yuna com quem eu consigo me dar bem, ri.
— Isso é impossível. A professora Kang precisaria ser muito cruel para fazer algo assim com a turma preferida dela.
— Não exatamente — argumento em voz baixa.
Os olhos da professora Kang se estreitam para mim. Ela ergue uma sobrancelha e um dos cantos de sua boca transforma-se em um sorriso. Tenho certeza que ela sabe que minha tia comentou algo comigo enquanto conversávamos.
— Impossível? — Ela murmura. — É? — Pergunta, indo novamente para o quadro. Ela escreve: “Apresentação Final dia 26 de novembro."
A sala fica em silêncio. As palavras do quadro me fazem tremer, embora eu já soubesse que esse dia estava mais próximo do que distante.
Minho é o primeiro a falar:
— Derrotada pela professora, Yeji!
A turma cai na risada, e eu não consigo parar de sorrir. Queria estar chocada por meu amigo estar se permitindo recomeçar de forma tão positiva, mas é claro que ele faria isso. Minho é incrível além da conta.
A professora Kang levanta as mãos, fazendo a turma, às gargalhadas, silenciar.
— Muito bem. Então, o que eu quero de vocês é que peguem as composições que criaram para mim ao longo do ano, nas quais fiz algumas anotações... — Ela levanta uma pilha de pastas e começa a entregá-las para nós —, e quero que pratiquem com toda dedicação. Daqui a algumas semanas, vocês irão apresentá-la para um corpo de professores e músicos profissionais selecionados. — Ela coloca a composição em que venho trabalhando com Minjeong em nossa mesa e sorri. — Façam cada minuto valer a pena.
Quando entrega a de Minho e seu parceiro, Seulgi faz uma pausa.
— Talvez este seja o seu melhor trabalho, Minho. Continue assim e você terá grandes chances no futuro. — Meu amigo sorri e agradece.
A aula é encerrada e todos se apressam a sair da sala. Eu não entendo por que tem sempre tanta pressa para sair. É a minha aula favorita, da qual me despeço lentamente. Antes de me levantar da cadeira, olho para Minjeong sentada ao meu lado.
— Você pode ficar mais um minuto? — Pergunto, enquanto pego a pasta em minha mochila. — Quero te mostrar algo.
Minjeong olha para mim como se já soubesse ao que me refiro. Ela fica em silêncio, e, por algum motivo, isso faz meu coração acelerar de excitação.
Eu quero impressioná-la. Quero que ela saiba o quanto meu irmão é eu nos empenhamos para dar vida a essa composição. As palmas das minhas mãos começam a suar, e eu as esfrego na minha calça. Pego meu violino no estojo, vou até a frente da sala onde posiciono a partitura.
Minjeong me encara com seus olhos escuros, mas posso perceber que parece tão ansiosa quanto eu.
Fecho os olhos e começo a tocar. Me apoio corretamente enquanto deslizo o arco de um lado para o outro no ritmo da música. Meus dedos se movem suavemente sobre o pescoço do violino, sem me esquecer de nenhum detalhe.
Quando abro os olhos e encaro Minjeong, ela sorri de forma gentil e se inclina um pouco para a frente em sua mesa.
Me afasto de onde estou e começo a me aproximar dela. Então simplesmente me entrego, sentindo como se eu estivesse libertando minha alma. Como se nada mais importasse além de nós duas e aquele momento. Na parte final da música, paro na frente de Minjeong e toco os últimos acordes vendo a emoção em seus olhos.
Quando levanto a cabeça, vejo seus olhos em mim. Parece que tiro um grande peso dos ombros quando nossos olhares se encontram. Sinto que seu corpo também se livrou desse peso. Ela ainda está aqui. Minjeong não é apenas minha namorada, ela é a pessoa que melhor me entende nesse mundo.
Eu nem sei o que isso representa para nós; minha composição, o fato de enfim tê-la tocado para ela. No entanto, não me importo. É o suficiente por agora. Acho que o melhor nome para isso é esperança. Eu realmente amo a esperança em seus olhos.
Seus lábios se transformam em um meio-sorriso e os meus lábios seguem, dando-lhe a outra metade. Fazemos uma a outra sorrir, sem dizer uma palavra sequer.
Esses são os meus sorrisos favoritos.
Minjeong se levanta da cadeira e se aproxima de onde estou, envolvendo minha cintura com os braços. Coloco o violino de lado, abraçando-a junto ao peito, como sempre faço, e, quando me afasto, encontro o seus olhos e toda a intensidade neles.
— O que você achou? — Sussurro. Meu coração ainda está acelerado dentro do peito. — Ainda pretendo fazer alguns ajustes, mas...
— Está perfeita. — Ela diz, deslizando os dedos por meu rosto.
Seguro seu queixo entre o polegar e o indicador. E sorrio.
— Sério?
— Sério.
Eu me inclino para a frente, e quando nossos rostos então bem próximos, tomo seus lábios nos meus.
_________________________________________
E aí, galera. Tudo bem com vocês?
Passando aqui para avisar que essa história está na reta final. Mais alguns capítulos e ela será finalizada.
Também quero muito agradecer a cada um de vocês que está acompanhando e fazendo essa fanfic crescer. Muito obrigada!
Até o próximo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro