24
Winter's pov:
"A dor não é um sentimento que você deva guardar. Então por favor, compartilhe ela comigo."
Na segunda-feira de manhã, fico surpresa ao encontrar Jimin parada em frente a minha casa com sua mochila nas costas. Geralmente nos encontramos no ponto de ônibus para irmos juntas até a faculdade, então essa novidade me deixa intrigada.
Fecho a porta rapidamente e me aproximo dela.
— Jimin, o que foi?
Entro em pânico ao ver o seu semblante cansado.
— Desculpe por não ter ligado para você ontem. Aconteceram algumas coisas lá em casa e acabei esquecendo de fazer isso. Se quiser que eu te explique o que aconteceu, posso fazer. É que... temos aula em alguns minutos.
— Não temos nada importante na faculdade pela manhã. Então entra aqui, vamos conversar.
Ela entra.
Passa as mãos nos cabelos e ri baixinho.
— Desculpe. Hoje não estou no melhor dos meus dias...
— Conversa comigo — falo de novo, guiando-a até o sofá da sala de estar. Minha mãe já saiu para o trabalho e meu irmão dormiu fora, então vamos ter privacidade para fazer isso aqui.
— É complicado — ela alerta, sentando.
Sento do lado dela. Jimin quase nunca fica desse jeito. Mesmo depois de tudo pelo que já passou, ela sempre tenta mostrar o seu melhor. Se algo a deixou tão incomodada, tão arrasada, definitivamente é sério.
— Está tudo bem — prometo.
— É meu amigo, Minho — ela sussurra, colocando as mãos sobre as minhas. Jimin ergue a cabeça, e seus olhos castanhos encontram os meus. — Ele foi expulso de casa, porque sua mãe descobriu que ele é gay.
Arregalo os olhos e, sem nem perceber, minhas mãos apertam as suas.
— Meu Deus — murmuro.
— Ele me disse há alguns meses que queria se assumir. Que ele não ligava para o que as outras pessoas pensavam. Mas que ainda tinha medo da reação da sua mãe. Ele a ama demais e não queria ser uma decepção para ela.
Jimin sorri, mas há muito mais por trás disso e eu vejo a dor em seus olhos. Afinal, eu sei que ela já passou por algo semelhante. E parte de mim entende perfeitamente todos esses temores, porque também já compartilhei deles por algum tempo.
— Eventualmente a mãe dele descobriu. Minho tentou conversar, mas sua mãe não é aberta para esse tipo de diálogo. O resultado foi um monte de lágrimas, palavras fortes e incompreensão. Agora ele está na casa de Joohyun. — Sua voz fica embargada. Sua tristeza só aumenta. — Queria que meu amigo não precisasse passar por algo assim. Queria que você não tivesse que lidar com algo semelhante.
— Jimin... — digo, puxando-a para perto e me sentindo completamente impotente.
— Ele está arrasado. E eu estou me sentindo uma pessoa péssima porque não sei como posso de fato ajudar meu amigo.
— Você não é uma pessoa péssima, Jimin — falo, tirando algumas mexas de cabelo do seu rosto. — Eu sei que está fazendo tudo o que pode para apoiar o seu amigo. Mas as vezes precisamos aceitar que não temos controle sobre algumas situações.
Jimin fica em silêncio. Seus dedos correm pelo meu cabelo e seus olhos castanhos continuam marejados. Ela se aproxima, me beijando na boca, envolvendo-me em seus braços. Eu não me afasto. Nossos lábios estão cobertos de sentimentos.
— Eu só queria que tudo isso se resolvesse — ela sussurra, me beijando de novo.
— Eu sei — digo, me afastando. Então me levanto do sofá e estendo a mão para ela. — Vem comigo. Eu tive uma ideia.
— Qual?
— Levanta. Você precisa me acompanhar até outro cômodo para essa ideia.
Mesmo hesitando um pouco, ela levanta. Peço para que deixe suas coisas na sala de estar e me acompanhe até a sala onde fica o piano. Mexo mas gavetas da mesa de escritório que tem ali, procurando uma partitura específica.
— O que você está fazendo? — Ela diz, rindo e se aproximando.
— Lembra quando eu estive na sua casa e você comentou que toda vez que estava com muita coisa na cabeça, levava seu violino para o bosque e começava a tocar até se sentir um pouco menos arrasada? Então, eu resolvi fazer algo diferenciado dessa vez. Sou eu quem vai tocar um pouco nessa belezinha aqui para você.
Ela sorri.
— Não tenho nenhuma objeção quanto a isso.
Me sento ao piano e sorrio quando Jimin senta ao meu lado. Toco algumas músicas para ela até que chegue a hora de irmos para a faculdade.
Quando estávamos saindo de casa, no entanto, o celular de Jimin toca e eu vejo o nome Joohyun na tela. Ela atende rapidamente. O que começa com um sorriso e um “oi, e aí?” rapidamente se transforma em Jimin franzindo o rosto e endurecendo o maxilar.
— Estou indo agora.
Ela desliga o telefone e volta sua atenção para mim.
— Eu... não vou poder ir a faculdade hoje.
— O que aconteceu? — Pergunto, tocando no seu antebraço.
— Minho está no hospital. Desculpe, eu, hum... — Ela começa a gaguejar, passando as mãos no cabelo. — Eu... eu não vou poder te acompanhar hoje. Minha tia disse que a ambulância levou ele para o Hospital de Seul... Ainda não sei o que aconteceu, mas estou indo para lá agora.
Seu corpo inteiro está tenso, então reajo do mesmo modo. Balanço a cabeça para a frente e para trás.
— É onde minha mãe trabalha. Fica perto daqui. Eu vou com você.
Ela assente com a cabeça e sussurra um obrigada. Eu também assinto e rezo.
\[...]
Chegamos no hospital, e Jimin quase esquece de pagar o táxi antes de correr lá para dentro. Eu vou logo atrás. Ela está agitada e corre até a recepção, com sua mochila ainda nas costas.
— Estou procurando meu amigo — ela diz, o nervosismo voando junto com as palavras. — Trouxeram ele para cá não faz muito tempo.
Eu fico atrás dela e tiro sua mochila, colocando-a sobre meu ombro. E, simples assim, a realidade nos atinge. O mundo real vem com tudo.
— Desculpe, só preciso de alguns detalhes — ela tenta explicar calmamente a recepcionista.
Coloco a mão no ombro de Jimin para consolá-la, mas não vou tirá-la por nada.
— O nome dele é Lee Minho. Ele, hum, ele tem 23 anos, e eu... olha, eu só preciso saber se ele está bem.
— Tudo bem, só um segundo...
Ela demora mais do que Jimin quer. A alma dela continua tensa diante de mim.
— Pode ir um pouco mais rápido? — Ela reclama, algo que raramente faz.
— Jimin — diz uma voz atrás de nós.
É o sr. Lee, o pai do amigo dela, parado no corredor. Corremos até ele.
— Minho está bem, ele está descansando.
— O que aconteceu? Cadê ele? Quero vê-lo.
Jimin está com lágrimas nos olhos, e pisca para tentar afastá-las.
— Ele me ligou dizendo que tinha encontrado alguns remédios e feito uma besteira. Que estava sentindo dor no peito e com dificuldade para respirar. Joohyun e eu fomos correndo até lá. A situação piorou, então chamamos uma ambulância. Eles ajudaram com os primeiros socorros, e agora ele está descansando.
Jimin começa a tremer, e o sr. Lee a abraça rapidamente.
— Eu achei... — ela murmura. — Achei que ele...
— Eu sei, garota. Eu sei.
Depois de alguns instantes, o Sr. Lee acompanha Jimin até o quarto do amigo dela enquanto eu fico esperando na recepção.
— Você precisa ligar para sua mãe e dizer que está aqui — diz Joohyun, aproximando-se de mim com a mesma expressão cansada que o pai de Minho. — Talvez possa ir até o setor dela. Acho que vamos ficar aqui por um bom tempo.
— Ela está trabalhando — respondo, cruzando os braços, sabendo que eu devo avisar minha mãe entes que algum dos funcionários me reconheça e faça isso. — Vou ficar bem, Srta. Bae.
Ela me lança um olhar preocupado, mas eu digo que ela pode ir ficar com sua família.
Quinze minutos depois, mando uma mensagem para a minha mãe e ela vem correndo até a recepção.
— Minjeong! — Ela exclama, saindo do elevador.
Eu sei que ela vai discutir comigo por não estar na faculdade a essa hora. Eu sei que ela vai querer uma explicação plausível para eu estar no hospital, principalmente por estar acompanhando Jimin.
Eu me levanto e começo a falar antes dela.
— Desculpe, mãe. Sei que não deveria estar aqui a esse horário, mas o amigo da Jimin passou mal, e a gente precisou vir pra cá e...
Não consigo terminar porque minha mãe me abraça.
— Meu Deus, Minjeong! Achei que tinha acontecido alguma coisa com você! Você não pode mandar uma mensagem dizendo apenas que está aqui no hospital! Você está bem?
Ela se afasta, analisando meu rosto, garantindo que tudo está bem antes de me abraçar de novo. Imediatamente me sinto culpada por tê-la deixado preocupada. Puxo seu jaleco para que ela se aproxime mais ainda.
— Me desculpe, mãe.
Ela beija minha testa e continua me abraçando.
— Está tudo bem, querida. Mas preciso que você me conte o que realmente aconteceu.
\[...]
Mais tarde, Jimin aparece na minha janela. Abro e digo que entre, mas ela não quer.
— Meu amigo não quis ir para a faculdade hoje a troco de nada — Jimin diz. — Achei que Minho só quisesse um tempo para refletir depois de tudo o que aconteceu, mas a verdade é que ele estava planejando acabar com tudo. No último minuto, no entanto, parece ter se arrependido e ligou para o pai.
— Jimin...
— Ele realmente cogitou cometer suicídio — ela sussurra. — Os médicos disseram que se o socorro tivesse demorado mais alguns minutos, ele poderia não ter sobrevivido. Consegue acreditar? — Ela pergunta, dando uma risadinha. — Se isso tivesse acontecido, Minho não estaria mais aqui. É impossível prever o rumo que situações assim podem tomar.
— Entra — falo.
Ela balança a cabeça.
— Não, é melhor eu voltar. Eu só queria dizer que lamento a maneira como o dia terminou.
— Entra — repito.
— Eu estou bem.
— Jimin, por favor.
Ela respira fundo e entra. Ficamos sentadas na minha cama na escuridão, com os dedos entrelaçados.
Eu não sei o que dizer para que ela se sentir melhor. E acho que eu nem devia tentar fazer isso. Talvez não seja uma questão de consertar corações partidos. Talvez sejam mais uma questão de amar os pedaços partidos da maneira como eles são.
Quando uma pessoa que você ama está sofrendo, talvez só precise ficar de dedos entrelaçados com ela para fazê-la entender que não está sozinha.
— Estou com medo de que Minho volte a fazer isso — Jimin diz. — Fico pensando em ligar para o hospital para saber se ele está realmente bem. Já imaginei várias maneiras de como ele pode fazer uma besteira, e depois penso no quanto isso vai afetar a família dele. E começo a pensar no futuro e percebo o quanto tal atitude seria desastrosa. Depois eu choro porque estou pensando demais e me preocupando demais com o futuro.
Mas a verdade é que o futuro é incerto. E não importa o quanto nos preocupemos com as pessoas, de fato existem situações que estão além do nosso controle. Existe apenas o aqui e o agora, e se a gente se preocupar demais com o que vai acontecer no futuro, vamos perder a melhor parte: estarmos juntas aqui uma com a outra.
— Estou apaixonada por você — ela diz baixinho, quase como quem pede desculpas, massageando meu ombro. — Às vezes penso em você e quero passar o resto do dia pensando em você. Porque quando eu penso em você, o mundo me parece melhor. Mas depois eu lembro que não posso ficar pensando em você porque essa não é uma escolha sábia. Você é como um sonho. E eu não sou a garota que tem direito aos sonhos. Eu só fico com os pesadelos.
Ela põe as mãos no meu peito, sentindo meu batimento cardíaco.
— Você não deveria ter feito isso comigo, Minjeong. Não deveria ter deixado eu me apaixonar por você. Muito menos amar você. Porque tudo que eu já amei terminou desmoronando, e a ideia de perder você é demais para mim. Não deixe que eu continue seguindo por esse caminho. Por favor, me coloque no meu devido lugar.
As palavras são carregadas de dor, cruas, sem nenhuma censura.
Eu vejo medo e a mágoa que existem dentro dela. E também os sinto.
A maneira como a vida funciona não parece justa. Enquanto algumas pessoas têm o direito a uma vida relativamente equilibrada, outras precisam lutar diariamente por uma pequena fração disso.
Eu queria que os problemas fossem meus, e não de Jimin. Ninguém merece sofrer tanto quanto ela vem sofrendo. Ela foi bondosa desde o primeiro instante, e o fato de que seu coração continua se partindo faz o meu coração se partir também.
— Podemos nos beijar de novo por um tempo? — Pergunto, querendo que ela saiba que eu sou mais do que um sonho.
Ela assente com a cabeça.
— Eu adoraria.
Nosso beijo não é como os anteriores. Quando sua boca encontra a minha, eu choro. Sinto o quanto ela está triste quando me beija, e isso me deixa triste. Sinto suas lágrimas se misturando com as minhas enquanto nossos lábios pressionam um ao outro com força. Estamos nos esforçando ao máximo para viver no presente, juntas nessa escuridão. Ambas arrasadas. Ambas exaustas das vidas que vivemos.
Mas nesse momento nos beijamos com nossos pedaços partidos. Nos beijamos com tudo que temos dentro de nós. E depois nos beijamos mais. Até ficarmos cansadas juntas, criando nosso próprio tipo de melodia. E nesse momento descobrimos que, às vezes, as músicas mais lindas são criadas pelas almas mais solitárias.
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