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CHAPTER XVIII: Once Upon A Dream

| E S M E |
Suíça, ano 997 D.C.

A MULTIDÃO QUE HAVIA SE REUNIDO EM VOLTA DA VELHA PONTE de pedra agora se dipersava aos poucos, satisfeitos com o que seus olhos há pouco testemunharam. Os guardas reais de Veytaux, aprumados à beira da ponte, puxavam a corda atrelada ao corpo da jovem mulher que acabara de ser afogada nas águas do lago.

Uma pequena onda de aplausos, seguida de uma reza desarmônica, varreu o silêncio amedrontador que se instalou quando o corpo sem vida da garota fora puxado de volta para a superfície. A suposta bruxa passara aproximadamente uma hora sob a água, tempo suficiente para o padre e seus seguidores terem certeza de que todo o mal havia sido lavado para fora de sua alma profana.

Do outro lado do lago Léman, camuflada entre as árvores da floresta, Rowena chorava histericamente ao assistir o corpo da irmã mais nova ser levado pelos cavaleiros que haviam acabado de executá-la. Agatha — a velha mentora que cuidava das irmãs — tentava inutilmente acalmar os nervos de Rowena, mantendo-se firme para consolá-la ao tempo que lutava para esconder o próprio luto dentro de si.

A mentora, mesmo internamente abalada, não encontrou outra alternativa para diminuir a histeria de sua protegida, a não ser cantar a velha canção de ninar que sempre acalmara ambas as garotas em seus dias mais difíceis, também sendo a única música que conheciam. Agatha respirou fundo, tentou ajustar sua voz rouca e cansada para que não falhasse e, lentamente, cantou a chorosa cantiga francesa:

"Eu te conheço, andei com você uma vez em um sonho..."

Rowena e Genevieve haviam nascido em Montreux, um vilarejo vizinho, e assim que a mais nova completou doze anos de idade, sua mãe percebeu que havia algo de muito errado com ambas. Temendo ser acusada de bruxaria, a progenitora levou as garotas à cabana de uma velha senhora que vivia nas redondezas do reino de Veytaux — a qual era famosa entre o povo por vender ervas e chás medicinais —, e para que pudesse viver longe do risco de ser levada à fogueira, lá as deixou.

"[...] Eu conheço você, seu olhar tem um brilho familiar..."

O único motivo pelo qual Agatha aceitou as crianças fora porque era uma sábia Bruxa da Natureza com instintos que só outra bruxa poderia compreender, e no instante em que viu as duas jovens pela primeira vez, pôde sentir a aura de suas almas, e instantaneamente soube que também eram bruxas da natureza.

"[...] E eu sei, é verdade que as visões são raramente o que parecem..."

As irmãs tardaram a se adaptar e esquecer o passado, mas com os anos, conseguiram se habilitar à personalidade fria e insensível da nova mentora, e de certa forma, amoleceram moderadamente seu coração de pedra. Elas viveram por muito tempo na pequena cabana afastada do reino, sobrevivendo com a renda dos produtos naturais de Agatha.

"[...] Mas se eu conheço você, sei o que irá fazer..."

Os moradores de Veytaux viam a velha senhora — a qual aparentava estar entre os setenta e oitenta anos de idade — como uma curandeira, pois por décadas já havia ajudado quase metade da população do reino, com seus chás, ervas e remédios, sendo esta a única razão pela qual nunca fora acusada de ser uma serva do Diabo. Embora tivesse uma boa fama entre os humanos, Agatha proibira estritamente ambas as garotas de usarem seus dons desacompanhadas ou muito próximas do reino — especialmente Genevieve.

"[...] Você me amará outra vez..."

Genevieve, cinco anos mais nova que Rowena, havia nascido com uma deficiência que afetara a fisionomia de seu rosto, deixando-a irrevogavelmente com uma aparência que o século dez jamais iria tolerar. Com seus dezesseis anos, ela sabia que não deveria deixar a cabana, principalmente sob a luz do dia, mas sua irmã e a mentora haviam saído para colher ervas, e estava começando a se sentir entediada.

"[...] como amou uma vez..."

Ela então decidiu que levaria um pouco de comida para sua amiga felpuda, a qual geralmente rondava os arredores da cabana. Genevieve carregava um pequeno pedaço de carne na mão, caminhando entre as árvores à procura da jovem raposa que acolhera há alguns dias — a qual batizara de Esme.

"[...] em um sonho..."

Não demorou muito para encontrar o pequeno animal, distante da casa, encolhido em uma toca improvisada na base do caule de um carvalho. Genevieve se abaixou para alimentá-la, afagando cuidadosamente a pelagem alaranjada da raposa, a qual não demonstrou medo algum enquanto aceitava de bom grado a comida que lhe foi oferecida. Genevieve perdeu a noção do tempo enquanto se divertia com Esme, e nem mesmo notou que havia se aproximado do reino. Ela também não percebeu quando um grupo de viajantes passava por perto rumo à cidade e a viu dançando e cantando entre as árvores.

Havia uma lenda entre as bruxas da natureza, a qual dizia que a Natureza sussurrava no ouvido dos animais no dia de seu nascimento: "Não confie nos humanos". Talvez tenha sido por este motivo que a pequena raposa fugiu quando viu a aproximação dos homens, e infelizmente não pôde alertar a amiga bruxa para fazer o mesmo. Genevieve não teve tempo de se explicar ou correr. Aqueles humanos a viram dançando e cantando sozinha em meio à floresta deserta, e se isso já não fosse o bastante, seu rosto deformado os deu toda a certeza de que aquela era uma aberração do Diabo.

Diferente das outras classes, bruxas da natureza não tem dons específicos, ou seja, todas podem fazer exatamente a mesma coisa: mexer moderadamente com a mente, matéria, tempo, carne, alma, realidade, vida e até destino. Isso se deve ao fato de a Natureza sempre prezar pelo equilíbrio, e por esta razão, existem dois tipos de bruxas da natureza: Bruxas Brancas e Bruxas Sifão. A cultura chinesa certa vez batizou essa dualidade de Yin-Yang, pois são um par de forças e princípios fundamentais do universo, ao mesmo tempo antagônicas e complementares, em perpétua oscilação de predominância. Duas forças fundamentais opostas que equilibram a balança da natureza.

Bruxas Brancas, relacionadas ao Yang — o princípio do sol, dia, luz e atividade —, são servas da natureza e possuem o éter claro em suas almas, o qual dá a consistência necessária para a utilização de seus poderes. Sua fraqueza está no fato de serem imutavelmente leais à natureza, podendo realizar unicamente aquilo que esta lhes permitia em outras palavras, a quantidade de éter em sua alma é limitada. Bruxas Sifão, relacionadas ao Yin — princípio da lua, noite, passividade e absorção —, são as filhas rebeldes da natureza, e seu éter escuro as impossibilita de usarem seus dons, a menos que absorvam o éter claro de uma fonte secundária — geralmente a própria natureza, mas também podendo ser outros Melius. Sua maior força estava no fato de poderem fazer o que quiserem com o éter absorvido, sem serem limitadas pelas rédeas da natureza.

Genevieve era uma Bruxa Sifão — assim como Agatha —, e não pôde absorver o éter da natureza para se defender enquanto era agarrada e violentada por aquelas pessoas. Eles a deixaram inconsciente enquanto a levavam ao reino, silenciando seus gritos antes que qualquer um pudesse escutá-los.

Agatha e Rowena chegaram à cabana pouco tempo depois, mas antes de entrarem em desespero pelo desaparecimento de Genevieve, deram início à uma procura ardilosa pelos arredores da cabana. O sol já estava se pondo quando Agatha conseguiu usar seus dons para rastrear o éter de Genevieve, e precisou usar toda a sua força para segurar Rowena quando chegaram à margem do rio e puderam ver a multidão reunida sobre a ponte de pedra que cortava o lago Léman. Elas sabiam exatamente o que aquilo significava, visto que não era a primeira vez que acontecia, e o éter que Agatha podia sentir vinha exatamente dali. Rowena gritou e se desesperou quando viu aquela cena, sentindo-se destruída e impotente.

Quando Agatha finalmente terminou a cantiga melindrosa, seus braços ainda estavam ao redor do tronco de Rowena, mas esta já não lutava para escapar. Simplesmente se rendeu a um choro ameno e silencioso.

Agatha, movida pelo luto, entendeu que aquele era o ciclo de vida da maioria das bruxas, e soube que não havia nada o que pudesse ser feito para mudar — a natureza é composta por cadeias alimentares, onde as espécies predatórias estão sempre no topo. Rowena também sabia disso, mas diferente de Agatha, um sentimento perigosamente poderoso trovejava em seu interior. Dizem que o luto é composto por cinco estágios: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. Rowena, no entanto, resolveu acrescentar mais um: vingança.

O que os humanos chamavam de "feitiços", para bruxas da natureza era ressignificação: alterar ou incrementar uma função em um corpo ou adicionar um novo significado. Pausar seu envelhecimento era o "feitiço" mais usado entre elas, contudo, seus dons também poderiam ser utilizados para outras finalidades consideravelmente mais agressivas.

Pouco mais de uma semana após a morte de Genevieve, não foi complicado ou custou alguma coisa à Rowena apanhar duas maçãs de uma macieira próxima à cabana, e adicionar a elas uma função especial. Diferente de Agatha e Genevieve, Rowena era uma Bruxa Branca, e precisava da bensão da natureza para realizar suas ressignificações. Normalmente, a mãe natureza não as permitia "enfeitiçar" para causar dano a algo, pois isso seria interferir no ecossistema — algo que Natureza não tolerava —, mas naquela ocasião, usando as palavras certas, a jovem bruxa branca conseguiu convencê-la a compactuar com seu plano de vingança.

Era aniversário da rainha, e as portas do Castelo de Chillon estavam abertas para todos os moradores do reino. Havia uma longa fila de plebeus diante dos dois tronos ocupados, vigiada e controlada por duas dúzias de guardas reais que cercavam todo o salão principal. As pessoas tinham direito a apenas alguns instantes da atenção do rei e da rainha, os quais mantinham-se sentados imponentemente em seus tronos enquanto, de um em um, seus súditos se aproximavam para prestar homenagens e entregar presentes.

Em um certo momento, uma figura misteriosa encapuzada se aproximou. Os guardas que encontravam-se entre os tronos e a fila fizeram menção de interromper sua passagem, mas desistiram quando notaram que era apenas uma mulher carregando duas maçãs. Ela vestia uma túnica de farrapos, com um capuz cobrindo a maior parte de sua cabeça. Não era possível estipular uma idade, mas pela voz e a coluna curvada, aparentava não ser jovem.

"Minha rainha," ela clamou a uma certa distância dos tronos elevados "venho humildemente vos ofertar tudo o que tenho de melhor. Não é muito, mas minhas maçãs certamente possuem algo especial".

Ela ergueu as frutas ao fazer uma reverência, mantendo a cabeça baixa a todo momento, e o intenso brilho vermelho das maçãs imediatamente capturou a atenção dos dois monarcas. Foi quase como uma abelha seguindo o pólen de uma flor, ou um rato sendo atraído pelo queijo de uma ratoeira, a diferença era que, naquele caso, não havia nada de natural na forma como o rei e a rainha ficaram instantaneamente hipnotizados pelo vermelho daquelas maçãs.

O rei fez um gesto para que a mulher se aproximasse, e os guardas não a impediram. Ela deu de bom grado uma maçã para cada, e eles não hesitaram em mordê-las no mesmo instante, imediatamente configurando a seus rostos uma expressão de prazer ao saborear o gosto agridoce da fruta. Aquela foi a deixa para a mulher se retirar, e então deixou o salão a passos lentos, atravessando a multidão com a cabeça baixa e impedindo que as pessoas vissem o sorriso diabólico de satisfação em sua face.

No dia seguinte foi dada a notícia de que o rei e a rainha haviam contraído uma doença desconhecida. Todos os curandeiros e anciões do reino foram convocados à prestar seus serviços em prol da melhora do casal, mas ninguém conseguiu descobrir o que se passava. Naquela mesma noite a situação se agravou, e ambos caíram em um coma profundo, a ponto de nada conseguir despertá-los. Alguns dias depois, seus corpos não puderam suportar a desidratação e desnutrição, o que ocasionou o falecimento de ambos.

Houve muita tristeza durante os dias seguintes, mas a coroação não pôde esperar, e o filho mais velho dos governantes mortos acabou recebendo a posse do trono que outrora pertencera a seu pai. Tudo aconteceu muito rápido, a ponto de o mais novo rei não ter tido tempo para encontrar sua rainha antes da coroação. A tradição foi quebrada pela primeira vez, mas um baile da realeza fora marcado para o mês seguinte, com o intuito de que o rei encontrasse entre as mulheres da nobreza a companheira ideal para ocupar a posição de rainha de Veytaux. Esse baile, no entanto, nunca chegou a acontecer.

"Eu conheço você, andei em sua companhia uma vez em um sonho. Eu conheço você, seu olhar tem um brilho familiar."

Durante um de seus passeios a cavalo na floresta, o rei Phillip III e seus guardas foram abruptamente surpreendidos por uma cantoria melancólica que soou como um sopro de ar fresco naquela tarde de outono. Os cavalos pareceram estranhamente incomodados quando o som os alcançou, mostrando um comportamento inquieto e característico, o qual, no entanto, foi ignorado.

"E eu sei, é verdade que as visões são raramente o que parecem, mas se eu conheço você, sei o que irá fazer."

O jovem rei, ao mesmo tempo intrigado e encantado, desceu de seu cavalo rapidamente e se enfiou entre as árvores, seguindo cegamente a voz misteriosa que deleitava sua audição com um êxtase inigualável. Era quase como uma corda amarrada firme em seu pescoço, puxando-o suavemente para o coração da floresta e não permitindo que pensasse em qualquer outra coisa.

"Você me amará outra vez, como amou uma vez..."

O rei não era o único hipnotizado pela canção encantadora. Seus guardas o seguiam com o mesmo empenho que tinham em encontrar a dona daquela voz, e após alguns minutos se aprofundando na floresta sombria, finalmente chegaram a uma clareira estranhamente escura.

"[...] em um sonho."

A canção havia chegado ao fim, e o silêncio que se estendeu naquele momento foi sepulcral. O sol se punha no horizonte quando os olhos do rei pousaram sobre uma figura feminina colhendo flores no meio da clareira, próxima a um velho tronco cinzento de uma árvore morta. O crocitar de corvos não muito longe dali pareceu um aviso de perigo, mas mesmo os guardas reais, levemente confusos pelo fato de não entenderem o porquê haviam adentrado na floresta em busca de uma voz, não conseguiram impedir Phillip de se aproximar.

A camponesa, de costas para os homens e abaixada entre as flores, ainda não havia notado sua presença. Temendo assustá-la, o rei se aproximou a passos leves, mas o estalar de um galho sob sua bota fez a mulher virar-se para finalmente encontrar o pequeno grupo de homens que a observava. Sua expressão não foi de surpresa, e definitivamente não parecia assustada, mas Phillip não conseguiu sustentar seu queixo quando por fim pôde contemplar a beleza da mulher misteriosa.

Ela tinha longos cabelos dourados, caindo para um pouco além da cintura, olhos verde-escuros e profundos como abismos sem fim, e um rosto que só os anjos haveriam de ter posse. O canto de seus lábios se ergueu em um sorriso suave, mantendo o olhar voltado unicamente para a expressão boquiaberta do rei.

"Vossa alteza" ela saudou, sua voz sedosa provocando um arrepio na espinha de Phillip.

"O que uma jovem como você faz sozinha no meio da floresta?" ele se aproximou com um sorriso brando e uma mão apoiada no cabo da espada ainda na bainha.

"'Uma jovem como eu'?" ela repetiu, voltando a colocar flores em sua cesta.

"Não sabe como essa região é perigosa?" ele se aproximou mais quando ela voltou a atenção unicamente para a coleta de flores.

"Oh, sei sim," ela respondeu com um sorriso doce, novamente pousando seus olhos escuros sobre Phillip "Mas ultimamente todos os lugares são. Especialmente se houver homens por perto".

"Provavelmente está certa." ele riu "Posso perguntar o seu nome?"

"É claro que pode,", ela mais uma vez voltou a colher as flores, "mas será que deve?"

"E por que eu não deveria?"

"Como vossa alteza disse, essa é uma região perigosa".

"Uma bela camponesa com uma cesta de flores não me parece um grande perigo" ele replicou, se abaixando em frente à mulher.

"Os maiores riscos tem os rostos mais belos."

"Então acho que vou correr esse risco".

"Que assim seja" a mulher se levantou, Phillip fez o mesmo. Graciosamente ela esticou o braço na direção do jovem rei, o qual se curvou  para beijar delicadamente as costas de sua mão. "Me chamo Rowena".

O baile foi cancelado no mesmo dia, mas os preparativos, não. Menos de uma semana depois, o evento da data em que aconteceria o baile da realeza fora substituído por um casamento, deixando a nobreza enfurecida. Os conselheiros reais e aqueles da nobreza que esperavam ter suas filhas como rainha desaprovaram completamente a decisão de Phillip de se casar com uma camponesa qualquer. O casamento aconteceu mesmo assim, ainda que os olhares tortos de grande parte dos convidados incomodassem o rei.

Rowena se tornou a mais nova rainha de Veytaux, e tudo parecia estar saindo conforme o plano, até que o imprevisto aconteceu. Durante os primeiros dias como rainha, ela evitou Phillip o máximo que pôde, primeiro alegando enfermidade, depois alegando não estar preparada para se deitar com um homem. Rowena só precisava aguentar por mais algumas semanas, até que pudesse canalizar poder o suficiente para finalizar a última parte de seu plano de vingança. O rei esperou pacientemente, e não a pressionou, mas os sentimentos de Rowena estavam à flor da pele.

Durante muitos anos, Agatha alertara às duas garotas sobre os homens, e como seus destinos seriam arruinados caso se envolvessem com um. Rowena não contestava, e nunca sentiu a necessidade de ter um homem em sua vida, mas Phillip parecia diferente de tudo o que Agatha dissera. Ele era gentil, atencioso e até romântico. Realmente se importava com Rowena, e esta nem ao menos precisou "enfeitiçá-lo" como imaginava que faria. Aquele sentimento a preocupou. Não poderia deixar que nada atrapalhasse seus planos de pôr um fim àquele reino.

Em uma certa noite, seus sentimentos tomaram conta de seu corpo, e a razão deixou sua mente quando os desejos, por alguns momentos, a controlaram. A rainha se deitou com o rei, em uma noite de amor aguardada desde o casamento. Os dois se entregaram de corpo e alma, e durante toda a noite Rowena esquecera o motivo de estar naquele castelo. Esquecera até mesmo que estava se deleitando no calor do homem cujos pais ela havia provocado a morte. Na manhã seguinte, ela tentou sentir arrependimento, mas ao pousar seu olhar sobre o rosto adormecido de Phillip, não conseguiu. Imaginou a decepção de Agatha quando descobrisse, e seu estômago se contorceu com o pensamento.

Faltavam apenas algumas semanas para que pudesse deixar o castelo para sempre, mas no décimo quinto dia após aquela noite, Rowena sentiu algo muito diferente em seu interior. O éter de sua alma estava mais intenso, mas a natureza, por uma razão desconhecida, cortou a conexão que mantinha consigo, impedindo que sua energia fosse canalizada. Rowena não entendeu o porquê de aquilo estar acontecendo, e por várias noites tentou secretamente reestabelecer a conexão, mas sem êxito.

Ela cogitou a possibilidade de visitar a mentora confidencialmente — esperando que esta pudesse lhe fornecer as respostas que procurava —, mas na quinta semana, os primeiros sintomas se revelaram, e Rowena finalmente pôde entender o que se passava. Com pesar e consternação, seu plano foi adiado. Quando recebeu a notícia, Phillip nunca parecera tão feliz, mas a reação de Agatha quando descobrisse era o que realmente preocupava Rowena.

Em uma noite entre a sétima e oitava semana, a mentora a visitou em um sonho. Rowena sabia que Agatha não era coisa de sua cabeça, pois logo sentiu o éter de seus poderes agindo sobre sua mente. Aquela realmente era ela, e Rowena não conseguiu segurar as lágrimas quando a viu lhe encarando com o olhar vazio. Surpreendentemente, Agatha não estava aborrecida. Ela envolveu a protegida em um abraço, e delicadamente afagou seus cabelos dourados enquanto esta, envergonhada, chorava e implorava por perdão.

"Se esta criança fosse um deles, eu jamais conseguiria encará-la novamente, mas ao que parece, você teve sorte, ela é uma de nós. Posso sentir o éter em seu ventre."

"Eu sinto meu poder intensificado, mas perdi a conexão com a natureza." Rowena confessou, ainda chorando, "Não entendo porquê isso está acontecendo".

"Você está mais forte porque agora tem o dobro de éter em seu corpo." Agatha explicou "No entanto, a natureza não irá deixá-la canalizar tanto poder, visto que colocaria a vida da criança em risco, mas ela está impedindo porque acredita que você realmente quer este bebê."

"Então eu irei esperar." Rowena declarou com firmeza "Depois do parto, poderei seguir com o planejado, e deixaremos este reino para sempre quando acontecer".

Oito meses mais tarde, Rowena dava à luz uma linda e saudável garotinha. No quarto estavam um médico, um padre, duas parteiras, Phillip, e seu irmão mais novo. O médico ergueu a criança com orgulho, retirando o cordão umbilical e cobrindo-a com uma manta antes de entregá-la à mãe. Rowena, exausta e com dores por todo o corpo, apenas a observou com curiosidade, sua expressão era indecifrável para as outras pessoas no quarto. Phillip estava ao seu lado, recostado sobre a cama com um sorriso caloroso ao admirar a filha recém-nascida. Ele não parecia alarmado, então Rowena imaginou que deveria ser normal um bebê chorar tanto assim.

"Seu nome será Genevieve" ela balbuciou, e por um instante os cantos se seus lábios quase se ergueram.

"Espere" uma das parteiras falou, com certa incredulidade na voz, examinando o estrago deixado pela saída do bebê "Ainda não acabou!"

"Do que está falando?" Philip pôs-se de pé, vagando na direção da mulher.

No mesmo momento, as dores se intensificaram, fazendo Rowena sentir como se o bebê ainda não houvesse saído.

"Tem mais um!" alarmada, a parteira anunciou.

Phillip pegou Genevieve no colo e a levou até seu irmão quando Rowena começou a enfrentar as dores do segundo parto. O padre iniciou outra reza em murmúrio, e a rainha teve que lutar contra si mesma para não quebrar seu pescoço com a força do pensamento. Dolorosos instantes depois, outra garotinha fora erguida pelo médico, e entregada à mãe após ser lavada rapidamente. O rei se aproximou com a primeira bebê nos braços, e com um sorriso ainda maior, posicionou-se ao lado da rainha para conhecer a outra filha.

A segunda bebê não chorou tanto quanto a primeira, e logo caiu no sono. Phillip ordenou que todos deixassem o quarto por um momento, ficando a sós com a esposa e as filhas pela primeira vez. Rowena encarava a segunda criança com o olhar distante, imaginando que fugir com dois bebês seria ainda mais complicado do que fugir com um. Involuntariamente, voltou-se para Phillip, e ao se deparar com a felicidade genuína em seu rosto — alternando o olhar admirado de uma filha para a outra —, não pôde imaginar como conseguiria arrancar aquilo de si. Receosamente, decidiu adiar o plano mais uma vez, tanto para que pudesse dar a ele mais tempo com as filhas, quanto porque não conseguiria fugir com duas crianças de colo.

A rainha voltou a encarar a segunda filha adormecida em seus braços, e sua mente encontrava-se exorbitantemente exausta para passar mais do que apenas dez segundos pensando em um nome para a criança. Por algum motivo, recordou-se da pequena raposa da qual sua irmã muitas vezes falara sobre. Ela forçou suas lembranças em busca do nome que Genevieve muitas vezes repetira, e após alguns instantes, declarou:

"Você se chamará Esme."

Mesmo cansada e com dores por todo o corpo, Rowena encontrou forças para cantar a antiga canção de ninar que costumava ouvir de Agatha desde que a conhecera. Ela começou com um cantarolar fraco, até que conseguiu liberar as estrofes de sua garganta exausta:

"Eu te conheço..."

As princesas diversas vezes escutaram aquela cantiga por uma boa parte de suas vidas. Genevieve adorava ouví-la e cantá-la, já Esme, em contraponto, escutara tantas vezes que faria qualquer coisa para nunca ouví-la novamente. Elas cresceram com segredos e mistérios que sua mãe as fizera prometer que jamais revelariam a alguém, nem mesmo ao seu próprio pai. Phillip certas vezes notara que suas filhas pareciam esconder algo, mas todos os afazeres e responsabilidades de rei não o deixavam pensar muito sobre o assunto. Ele jamais chegou a perceber que as gêmeas não eram humanas, e ninguém podia imaginar ao certo qual teria sido sua reação se algum dia houvesse descobrido.

"[...] andei com você uma vez em um sonho."

Genevieve era como um sopro de verão em uma manhã calorosa. Sempre sorrindo, sempre contente, e sempre curiosamente tentando saber mais sobre tudo o que a cercava. Esme era o exato oposto. Fria como uma noite de inverno, seu rosto raramente denunciava o que poderia estar sentindo, sua expressão sendo indiferente e indecifrável na maior parte do tempo. Esme era uma Bruxa Branca da Natureza, assim como a mãe, já Genevieve, uma Bruxa Sifão da Natureza. Agatha pôde decretar suas classes no exato instante em que as visitou em um sonho pela primeira vez.

"[...] Eu conheço você..."

Rowena aguardou pacientemente até completarem dezesseis anos. Quando aconteceu, seu plano não pôde mais ser adiado, e precisou desligar todas as suas emoções para realizar o que faria em seguida. Um dia após o aniversário das princesas, a rainha as despertou no meio da madrugada e as levou através de uma passagem secreta até o exterior do castelo. Mesmo confusas, as gêmeas a seguiram, encontrando Agatha à sua espera no final do trajeto. Aquela era a primeira vez que se viam pessoalmente, mas Agatha sempre as visitara em sonhos, então sabiam que podiam confiar.

"O que está acontecendo?" Genevieve inqueriu, levemente atordoada e com resquícios de sono em sua voz "Onde está o papai?"

"Mãe?" Esme pressionou quando a mulher não respondeu, mas sua expressão era pura indiferença.

"Não vem conosco?" Agatha perguntou quando Rowena abraçou as gêmeas como uma despedida silenciosa.

"Preciso acabar com isso." ela respondeu quando prendeu a mentora em um abraço suave, logo antes de retornar ao castelo pelo mesmo caminho, "Vocês podem ir na frente."

Agatha não questionou, mas imaginou que soubesse o que aquilo significava. Pegou as garotas pela mão, e juntas adentraram na escuridão da floresta. Agatha respondeu aos questionamentos de Genevieve da forma mais breve que conseguiu, mas não foi o suficiente para acalmar a garota.

"[...] seu olhar possui um brilho familiar."

A rainha retornou ao castelo, sendo instantaneamente engolida pelo silêncio fúnebre que varria os corredores de pedra como uma lufada de ar. Ela usava sua coroa e as vestes da realeza quando chegou ao salão principal, onde os tronos elevados eram expostos mais adiante. Antes que comessasse, a voz de Phillip a atingiu como um soco no estômago:

"As garotas não estão no quarto" ele declarou com certa consternação em sua voz, como uma pergunta implícita.

Rowena vagou rapidamente em sua direção, e o respondeu com um beijo pesado, o mais intenso e demorado de toda a sua vida. Ela não conseguiu abrir os olhos quando seus lábios se separaram, mas suas testas ainda estavam unidas e os braços de Phillip continuavam envolvendo sua cintura. Ela delicadamente acariciou seu rosto confuso quando murmurou:

"Me perdoe."

Um estalar de dedos diante de seu rosto foi o suficiente para desligar a consciência do rei antes que este pudesse responder. Ele despencou nos braços da rainha, sendo poupado de vivenciar toda a dor da traição que viria a seguir. Ela beijou sua testa uma última vez quando a única lágrima que escorrera por sua bochecha naquela noite atingiu o chão frio de pedra polida.

"[...] E eu sei, é verdade..."

Rowena voltou até o centro do salão e removeu a enorme tapeçaria a qual escondia o grande pentáculo que fora desenhado no chão há algumas noites. Ela arrastou o corpo adormecido do rei para dentro do pentáculo antes de começar seu ritual de destruição. Foram necessários alguns instantes de concentração para finalmente sentir toda a natureza lhe dando forças. Ela estava de pé com os olhos fechados, canalizando o éter da natureza, sentindo cada centímetro do solo do reino e cada gota de água do lago que o rodeava.

"[...] as visões são raramente o que parecem."

Com apenas a força do pensamento, a rainha abriu uma cratera no meio do vilarejo, a qual engoliu as primeiras casas. O forte terremoto que se seguiu causou o desmoronamento da igreja, e mais uma cratera se abriu antes de as águas do lago engolirem o reino. A destruição continuou por alguns minutos antes de o castelo começar a tremer.

"[...] Mas se eu conheço você..."

Rowena não estava fazendo aquilo apenas para vingar sua irmã. Estava fazendo para punir todos aqueles que foram coniventes ou contribuíram para o assassinato de centenas de mulheres e crianças ao longo dos anos — as quais na maioria das vezes nem eram realmente Melius —, e para evitar que algum dia suas filhas corressem o risco de sofrerem o mesmo destino. Os humanos acreditavam que a água do lago Léman lavava os pecados das bruxas, então a rainha achou justo que também lavasse os seus.

"[...] sei o que irá fazer."

O castelo começou a afundar no abismo obscuro que era formado por todas as crateras unidas que se abriram pelo reino. Rowena se abaixou e abraçou o corpo de Phillip, cantando suavemente sua canção favorita enquanto afagava seus cabelos com a ponta dos dedos. O plano inicial não era ficar, mas ela jamais conseguiria viver consigo mesma se deixasse Phillip para morrer sozinho, e este nunca a perdoaria se descobrisse que a própria esposa fora a causadora da morte de seus pais. Em seus últimos instantes de vida, ponderando sobre perdão antes de todo o reino ser engolido por completo, Rowena tristemente torceu para que algum dia suas filhas pudessem perdoá-la.

"[...] Você me amará outra vez..."

Do outro lado da ponte de pedra, Genevieve chorava histéricamente quando o castelo desmoronou e a água engoliu os destroços. Agatha fazia força para segurá-la, não muito surpresa pela decisão inesperada de Rowena. Esme não gritou ou fez menção de correr até lá. A garota simplesmente observou a cena com um olhar vazio, e com as costas do dedo, enxugou a única lágrima que escorreu por sua bochecha.

[...] como amou..."

Agatha estava ainda mais abalada do que quando perdera a primeira Genevieve, mas mais uma vez teve de se conter para servir de apoio à uma de suas protegidas. Ela sofrera a perda de suas duas primeiras garotas, e naquele instante, prometeu à si mesma que nenhuma força no universo a impediria de proteger as duas novas. Aquele dia ficaria marcado para sempre na história Melius, e séculos mais tarde, bruxas de todos os covens do Planeta saberiam que fim teve o reino de Veytaux. Rowena seria lembrada para todo o sempre como a A Grande Rainha Branca, e todas as Bruxas da Natureza saberiam o seu nome.

"[...] uma vez em um sonho...

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