Capitulo 1
-Eca! Que cor horrível! -Becca segurava uma camiseta laranja neon diante do nariz enrugado. Estávamos decidindo qual seria o novo uniforme do "Grupo de Apoio para Vítimas de Bullyng e todo tipo de Racismo e Discriminação" no colégio San Simon. Assim como o nome comprido, o grupo tinha um grande significado. Eu sugeri sua criação depois de presenciar por anos como meus tios sofram com a homofobia. Quando eu falei com o diretor, a dois anos atrás, eu estava chateada. Tinha acabado de ver como uma mulher se levantava e dizia com todas as letras aos meus tios que "eles não podiam se beijar em público porque aquilo iria influenciar as crianças". Aquilo foi demais para mim. Eu precisava fazer algo, nem que fosse no lugar que eu passava a maior parte do meu tempo; o colégio. Ele adorou a ideia e acabou criando uma atividade extracurricular, para que as pessoas se animassem a participar do grupo. Para mim aquilo era um bom começo e meus tios ficaram tão felizes quando souberam, que eu soube que estava fazendo a coisa certa.
-Essa cor é chamativa, é justamente o que precisamos, chamar a atenção para nossa causa, Becca. -Respondo e minha amiga me olho de cima a baixo balançando a cabeça em negativa.
-Como você pode ser tão bonita, mas não saber nada de moda, Mel? -Becca amava moda. Ela via todas as temporadas de um programa sobre modelos, e quase sempre opinava nas roupas das concorrentes. Seus vários piercings nas orelhas e nariz, faziam com que muitas pessoas pensassem que ela era uma daquelas punks loucas e malvadas, mas não, minha linda amiga de olhos castanhos e cabelo rosa choque, era a pessoa mais doce que eu conhecia. Nos conhecemos quando eu criei o grupo de apoio. Ela foi uma das primeiras a participar... como vítima. Becca sofreu tanto bullyng por sua personalidade extravagante, que chegou até a tentar se suicidar. Eu a encontrei um dia chorando no banheiro e a levei para o grupo. Conversamos durante a tarde inteira e ela me prometeu que me ligaria quando fosse dormir e quando acordasse, do contrário eu ligaria para a polícia. Pode até parecer exagero, mas ela precisava daquilo. Becca precisava de alguém que estivesse ali para ela. Sua mãe era uma pessoa boa, mas lamentavelmente era muito ocupada, trabalhava praticamente dezenove horas por dia e não prestava atenção na filha. Saber daquilo me partiu o coração. Eu a levava para dormir na minha casa, saiamos, víamos um filme qualquer no cinema... tudo para que ela se sentisse querida. No começo foi difícil, não vou negar. Becca não deixava ninguém passar pelo muro que ela levantou, mas uma vez que ela confiou em mim, eu finalmente pude vê-la de verdade. E desde então somos inseparáveis.
Tiro a blusa laranja da mão dela em um puxão e levanto acima da cabeça para que todos possam ver.
-Pessoal. Pessoal! Prestem atenção, tá na hora de votar! O que vocês acham dessa cor? -Balanço a peça laranja no ar e vejo mais caras de nojo incrivelmente iguais às de Becca. -Os que quiserem essa cor, levantem a mão.
Espero, espero e espero e ninguém se atreve a levantar a mão. Viro minha cabeça e Becca está se segurando para não rir.
-Tudo bem pinkhead -a chamo pelo apelido que inventei, mas que sei que ela odeia, e acabo ganhando uma cara feia da menina-, você ganhou! Qual cor você sugere?
-Eba! -Ela esquece do apelido rapidamente e batendo palmas com as mãos, começa a cavar nas amostras de blusas que a costureira trouxe de manhã. Becca tira uma blusa de uma cor e diz que é perfeita, logo tira outra e diz o mesmo. A cena se repete por quase dez minutos até que já não aguento mais perder tempo e acabo puxando uma blusa que estava lá no fundo da pilha de tecido.
O tecido é de uma cor marengo com mangas e golas roxas. Vejo os olhos castanhos de Becca brilharem e sei que ela acaba de se decidir.
-É perfeito! O marengo e o roxo combinam tão bem, mesmo sendo duas cores tão diferentes! É justamente o que queremos transmitir, que mesmo nas diferenças, podemos nos unir e formar algo... divino! -
Solto uma risada abafada, minha amiga definitivamente era louca, mas era perfeita para esse grupo.
Passamos as seguintes duas horas terminando os cartazes, com a ajuda dos outros participantes do grupo. Alguns para ganhar pontos extras no currículo e outros como voluntários.
Becca vez ou outra fazia algum comentário engraçado e todos riam. No começo, o pessoal tinha um certo receio com ela, mas quando começaram a ver que ela era muito mais do que mostrava no exterior, eles a amaram. Minha amiga era assim. Ela praticamente te obrigava a gostar dela. Eu me pegava pensando várias vezes em como ela se deixou abalar pelo bullyng. Mas quem era eu para julgar afinal...
-Bom pessoal, vocês fizeram um ótimo trabalho! Podem ir para casa. -Libero a todos e Becca me pergunta se preciso que ela fique comigo mais um pouco.
-Não Becky pode ir para casa. Eu só preciso avisar à senhora Moreira que terminamos e vou embora.
-Eu já te disse para não me chamar desses apelidos que você adora, Mel. Já basta com Becca. -Ela dá um peteleco na minha cabeça me fazendo rir. Garota estranha. -Bom, eu vou indo nessa então, qualquer coisa, pode me ligar. Até amanhã, Mel! -Becca praticamente corre para a saída sem nem esperar minha resposta. Com certeza tem algum encontro hoje, por isso a pressa toda.
Depois de colar o ultimo cartaz, vou até a sala da diretora para avisar que já está tudo terminado, mas a secretaria me impede de entrar.
-Ela está ocupada, Mel. Parece que um aluno novo está se transferindo e ela está conversando com ele e com o pai. -A secretaria respondeu apontado para a porta.
Antes que eu sequer pudesse pensar em responder alguma coisa, a porta que ela acabava de apontar se abriu de repente e um homem loiro muito bonito saiu primeiro, seguido de um garoto e por último a diretora.
O garoto tinha alguma semelhança com o pai, mas os seus cabelos eram castanho-escuros e os olhos de um azul quase cinza. O nariz meio torto como se tivesse sido quebrado, a boca carnuda e o maxilar angulado eram só a cereja do bolo. Ele era alto (alguns centímetros a mais que meus 1,73cm), sua postura era aquela que diz "foda-se todo mundo", mas eu podia ver a tristeza e a amargura no seu olhar quando os olhos azuis se focaram em mim.
-Está gostando do que vê, garota? -Ele perguntou debochado.
-Na verdade... não. -Respondi olhando de cima para baixo.
Ficamos por alguns minutos naquela guerra para ver quem desviava primeiro, mas seu pai nos interrompeu, quando deixou de falar com a diretora.
-Ariel, temos que ir... -Sua frase perdeu força quando ele me viu. Que homem estranho. -Você... -seu olhar não desviou do meu rosto e eu podia sentir minhas bochechas quentes. Droga, eu estava corando? O que aquele homem estava pensando, afinal de contas?
-Eca pai, agora você gosta de menores, é? -Ariel pergunta com uma cara de escarnio.
-Primeiro, me respeita que eu sou seu pai, filho. E segundo, me desculpa senhorita...-Ele deu a deixa para que eu me apresentasse, mas eu sinceramente não estava a fim de dar meu nome a um estranho. Fiquei calada e ele continuou falando mesmo assim. - É que você é muito parecida com uma pessoa que conheço. -Disse balançando a cabeça.
-Tudo bem... -prolonguei a última palavra. Aquela situação era muito desconfortável.
-Senhora Moreira, está tudo terminado e pronto para amanhã, os cartazes estão colados e a sala está trancada. -Entrego o molho de chaves para ela. -Estou indo para casa, obrigada por nos esperar.
-Não foi nada, Mel. Até amanhã senhor Albuquerque. E não chegue atrasado Ariel, você já sabe as regras do colégio. -Ela se vira e volta para a sua sala.
A senhora Moreira, odiava atrasos. Era uma das principais regras do colégio, mas pela cara que Ariel fez, ele não é muito o tipo que chega na hora certa.
Ele ainda está olhando para mim, o que me deixa extremamente desconfortável. É contraditório, mas não gosto muito de chamar a atenção. Não desse jeito.
Me despeço da secretaria e do pai do garoto, dou meia volta e saio do colégio. Quero minha cama estou tão cansada que só posso pensar em dor... Mas que diabos? Uma moto enorme está estacionada bem atrás do meu carro. Eu só posso imaginar um dono para essa monstruosidade.
-É uma Kawasaki... as garotas amam ela sabia? -Ariel sussurra no meu ouvido me assustando.
-Babaca! Você me assustou! E será que você pode tirar essa coisa do lugar? Não posso sai com meu carro.
-Ei! Não chame assim o meu bebê, ela pode se ofender! -Ele estava falando sério?
-Escuta aqui garoto, eu estou muito cansada e preciso voltar para casa, então tira essa moto daí ou vou passar por cima dela, você escolhe.
Sua expressão é hilária. Entro no carro e espero que ele saia do meu caminho.
-Você não teria coragem. -Ele se debruça na janela do passageiro me assustando pela segunda vez.
-Qual é o seu maldito problema? -Estou praticamente gritando. -Eu não vou pedir novamente, ou você sai ou te atropelo. -Acelero o carro para que ele veja que não estou de brincadeira.
Sua risada rouca me tira do sério e ao mesmo tempo me traz sensações que não quero nem imaginar.
Ele finalmente sobre na moto e acelera sem sair do lugar, como se estivesse me desafiando. Idiota! Ele não sabe com quem está mexendo.
Engato a ré e o carro começa a se mover lentamente até que estou a centímetros do seu precioso bebê.
-Ei, ei! Tudo bem, eu saio. Garota louca! -Grita.
-Louco é você, princesa! -Mostro o dedo do meio e acelero rumo a casa.
[***********]
-Mãe, cheguei! -Grito ao passar pela porta. Passo pela sala e encontro minha família sentada na mesa da cozinha jogando banco imobiliário.
-Oi Melissa, como foi seu dia? -Mamãe pergunta sem me olhar enquanto pula algumas casas no tabuleiro. Ela cai na prisão.
-Eu te disse mamãe, você ia acabar presa. -Max faz um high five com o papai.
-Vocês, são dois trapaceiros. -Ela olha com carinho para os dois. Minha mãe ama loucamente ao meu pai. Eu sei que eles passaram por muitos problemas antes de poder ficarem juntos finalmente e eu espero encontrar alguém que me olhe desse jeito, algum dia quem sabe.
-Vamos, vou te ajudar a ganhar desses dois traidores. -Me sento do seu lado e ela me abraça rapidamente.
Mamãe sempre nos abraça e nos beija a cada oportunidade, com o papai não é diferente. Eles nos amam e nunca deixam de repetir a sorte que tiveram quando nascemos. Eu os amo muito.
-Maximus! Roubando notas de novo? -Levo um susto com o grito de mamãe. Ela está rindo enquanto meu irmãozinho faz aquela típica cara de quem foi pego no flagra. -Agora sei porque compram tantos apartamentos! Roubando é claro!
-Eu te disse para ter cuidado, Max! -Papai sussurra no seu ouvido, mas escutamos claramente.
-Papai, é isso que você quer ensinar ao seu filho? -Digo seria e seu rosto fica serio de repente, pensando que eu realmente estava o repreendendo.
Eu e mamãe explodimos em gargalhadas e os dois homens da casa se juntam minutos depois. Eu não poderia ter uma família melhor.
Depois de jantar e de recolher toda a louça suja, dou um beijo no rosto de cada um e vou para o meu quarto. Preciso fazer minha tarefa de literatura para amanhã, senão vou acabar levando uma advertência da professora Erica Martins. Ela é uma mulher legal e entende que eu tenho que dividir meu tempo com o grupo de apoio, mas como ela mesma disse, não pode me dar privilégios, seria como ir contra o próprio grupo de apoio.
Começo a escrever minha redação e meu pensamento acaba se desviando para um par de olhos azuis quase cinzas. Garoto idiota. Quem ele pensa que é para me tratar daquele jeito? Eu deveria ter batido na moto dele, nem que fosse para fazer só um arranhãozinho, para ele aprender a tratar as pessoas com mais educação.
Para ajudar, o garoto é um gato. Um prato cheio para o ego dele.
Balanço a cabeça e tento me focar novamente na redação. Não posso perder meu tempo pensando naquele idiota. Vamos Melissa, esse texto vale nota, caramba!
Quase meia hora e depois de muita dificuldade, termino a tarefa e resolvo ligar para Becca para ver o que ela está fazendo. Qualquer coisa para não pensar no babaca de olhos azuis quase cinzas.
-Oi Mel, quais as novidades? -Becca atende depois do terceiro toque e pergunta do outro lado da linha.
-Nada de interessante... na verdade, conheci um garoto hoje. -E meu plano de não pensar nele foi por agua abaixo.
-Hum... isso é uma notícia boa ou ruim? -Eu nunca contei coisas do tipo a Becca, afinal nunca namorei... beijei alguns garotos por aí, mas foram só isso.
-Eu diria que ruim, já que ele é um tremendo idiota. É um aluno novo, acaba de se transferir para o colégio...
-Serio? Pode me contar tudo então! -Exige animada.
-Não sei muito dele, só que se chama Ariel e tem uma monstruosidade que ele chama de moto. -Afasto o telefone da orelha para não ficar surda com o grito que Becca solta.
-Ele tem uma moto? Meu Deus, isso é tãaaao sexy! Como ele é, é bonito? -Não consigo nem responder pois a louca me enche de perguntas absurdas. -Oh não me diga que ele é feio!
-Becca! Acaso isso importa para você? -A repreendo.
-Não... -responde arrependida.
-Ele não é feio... é só um... um idiota.
-Eu sabia! -Outro grito.
-O que?
-Você gostou dele!
-Becca, eu sequer o conheço. Além do mais, do pouco que pude ver, ele é um ogro.
Era verdade. O cara era um ogro. Um bonito ogro de olhos azuis quase cinzas... Mas que droga, esquece esse garoto, Melissa!
-Ah Mel... só um ogro para conseguir derreter esse seu coraçãozinho!
-Meu coração está muito bem, obrigada! Bom tenho que desligar, nos vemos amanhã na escola, adeus Becky!
Desligo o telefone enquanto escuto seus gritos sobre usar o apelido "infantil" segundo ela.
Pelo visto, ligar para minha amiga para deixar de pensar em Ariel não foi lá uma boa ideia.
Saio do quarto apenas para dar boa noite aos meus pais e a Max e me jogo na cama, caindo no sono alguns minutos depois e sonhando com um par de olhos azuis, mas esses não pertenciam a Ariel.
-Oi maninho.
-Mel! Você veio hoje!
-Eu sempre venho te ver.... fiz uma promessa, lembra?
-Sim... lembro. Você já o conheceu?
-Quem?
-Você tem que o ajudar Mel... ele está muito perdido.
-De quem você está falando, Jonah?
Meu irmãozinho dá uma risada travessa e logo desaparece me deixando sozinha...
Sou acordada pelo despertador do celular. Silencio o aparelho e passo a mão pelo meu rosto. Sempre que sonho com Jonah, acabo acordando cansada, como se realmente tivesse ido para outro lugar.
Tomo banho, coloco meu uniforme e como um café da manhã rápido. Papai e mamãe já devem ter saído para deixar Max no colégio e ir direto ao trabalho, então tranco tudo e desço até a garagem.
Hoje amanheceu meio frio, então coloquei uma jaqueta de couro preta e um cachecol azul por cima do uniforme. Em dias assim, é permitido usar outra coisa por cima da tradicional camisa branca e calça azul marinho.
Dirijo até o colégio e me surpreendo ao ver a moto de Ariel estacionada, bem aonde acostumo estacionar. Mas é babaca mesmo.
E eu que pensei que ele não chegaria cedo.
Demoro alguns minutos para achar outro lugar para estacionar e quando finalmente saio do carro, me deparo com uma cena que me corta o coração.
NOTA DO AUTOR
Galerinha vejo que mta gente não sabe que cor é o tal do marengo kkk por isso BF ao resgate!
Tcharam! Marengo é essa cor:
Eu sei parece cinza, MAS NÃO É! kkkk
Espero que tenha esclarecido essa dúvida,
Bjinhosss BF
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