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Natasha Torres
22:59h - em casa
Todos já se tinham retirado para os seus quartos. Todos deviam estar agora a desancar, eu também o devia estar a fazer.....mas impossibilitada pela falta de carinho e pela lembrança de meu pai não conseguia dormir.
Eu revirava-me na cama a todos os momentos, António já dormia. Todos estavam cansados devo confessar.....eu também o estava, porém saber que não mais veria meu pai isto matava-me por dentro.
Me levantei e sai do quarto, eu precisava ficar sozinha. Eu precisava ir ao antigo quarto de meu pai para processar tudo mesmo que isso me fizesse sentir completamente mal era a única forma de eu me inteirar que ele não voltaria nunca mais.
Abri a porta levemente, a janela estava aberta para o quarto arejar. A sua cama estava feita, o seu travesseiro estava intacto. Um cheiro de velas era presente e uma carta estava no cimo da mesinha de cabeceira. Meu irmão talvez já a tivesse visto, esta seria a minha primeira vez lendo-a.
Ah droga! Como isto pode doer tanto. Eu me sinto uma inútil....se eu tivesse estado com ele, se eu tivesse telefonado com ele todos os dias, se eu tivesse voltado antes do tempo marcado isto jamais aconteceria.
Comecei a ler e lágrimas vieram aos meus olhos. Eu não conseguia acreditar que eles já se estava a despedir mesmo antes do casamento, eu em senti ainda pior. Eu nunca pensei que meu pai já soubesse a hora da sua morte, mas pensando bem ele já estava doente dois meses antes do casamento acontecer.
— Natasha estás aqui? — António bateu na porta. —Amorzinho....fiquei bastante preocupado não te encontrei lá no quarto. Está tudo bem?
— Está......está sim.
— O que foi? Uma carta?!
— Meu pai, ele aparentemente a deixou antes de morrer e escreveu-a antes do casamento. Ele já sabia Torres.
Me abracei a ele e meu corpo desabou totalmente em tristeza e mágoa, meus olhos inchados voltaram a chorar e minha respiração começou a ficar ofegante novamente.
— Oh amorzinho! — ele acariciava minha cara. —Eu venho já, não saias daqui prometes?
— Hum hum.
Eu não sabia o seu intuito, mas com toda a certeza ele tentaria encontrar alguém para o ajudar. Ele estava simplesmente acabado de me ver neste estado e quanto mais eu chorava perto dele, mais motivos ele tinha para que seu corpo e sua alma se sentissem acabados.
Logo apareceu no quarto novamente e Aurora e Glória vieram ter comigo. Thor esteve comigo este tempo todo encostado com seu focinho em minha perna. Ele queria proteger-me de mim mesma.
— Ah minha querida! Tudo vai passar.
— Esta carta Aurora, ele.....
— É cunhada, ele a escreveu três dias antes do casamento na noite anterior a ele morrer ele me falou sobre ela, mas eu nunca pensei que ele....
— Eu devia ter estado com ele. Eu fui uma idiota eu o abandonei, eu abandonei o meu irmão.
António se colocou em cima da cama e me abraçou pro trás, encostou seu queixo no meu ombro e suspirou após sentir meus músculos relaxarem. Ele fazia-me sentir bem. Eu não queria chorar, eu queria sorrir e estar cá com o meu pai.
Todas as MINHAS lágrimas tinham sido gastas neste dia, mas a reserva sempre esteve cá. Eu é que não deitei conta.
— Não tens culpa! Ninguém tem culpa que o tempo seja injusto, as coisas acontecessem quando menos esperamos.
— ...
— Vou contar-te uma coisa, quando meus pais também morreram eu não me pude despedir deles. Eu senti-me culpada na época pois eu tinha brigado com eles dois dias antes.....eu tinha sido uma idiota e briguei com eles por uma coisa boba. Eu me sentia amargurada, mas sentir que estava sendo amada pelas pessoas queridas....pelo meu marido, pelos meus filhos e pelos meus netos foi a maior alegria que eu tive. Eles curaram tudo em mim!
Ela estava certa! Eu tinha que ser forte, mas neste momento mesmo que eu quisesse pedir isso ao meu corpo ele jamais me iria dar.
— Quando foi? Como eles morreram?!
— O fogo deflagrou-se na cozinha da casa deles e eles morreram intoxicados com a fumaça mesmo antes de sentirem algo, tudo foi em 2008. O pior ano da minha vida, sim foi, mas eu sabia que tinha que continuar. Por mim! Por todos eles! Eles precisavam de mim a 100%.
— Neste momento cunhada é normal estares assim, mas a qualquer momento terás que estar no teu 100% para entreter ainda mais quando for o funeral! — era Glória.
— Mamãe? Papai?! — S/n esfregou os olhos após entrar. —Não vos encontrei na cama! Podemos ir dormir?!
— Claro! Claro que sim princesa vamos lá.
— Está tudo bem mesmo, porque estão todos chorando novamente? Vocês prometeram.
— Vem pequena vamos indo vá. — António cariciou sua face.
S/n tinha razão, nós prometemos-lhe a ela e á prima não chorar, porém nunca concordamos em não chorar longe delas......foi por essa razão pela qual eu vim para cá.
Eu precisava de um momento conectar-me em meus pensamentos e com o ESPÍRITO de meu pai. Eu tinha imensas, mas imensas saudades dele.
Apenas eu e Glória havíamos ficado no quarto, ela sentia-se culpada de alguma forma por não ter-me avisado, eu de alguma forma a CULPAVA por tal coisa, ninguém IMAGINOU que de facto tudo isto iria acontecer.
— Perdoa-me Natasha, eu pensei que essa carta seria para mais para a frente, eu pensei sinceramente que ele não estava a despedir-se de todos nós.
Ela culpava-se. Sabia, porém ela não tinha que o fazer.
— Ele os últimos dias antes de morrer ficava sempre no quarto, mal comia. Eu acho ele de alguma forma estava a preparar a sua hora.
— Não tens culpa. — surpreendeu-se. —Não podias prever nada disto, quanto médica tu fizeste o teu melhor. Deste o teu melhor e isso é que é o mais importante!
— Tu não me culpas disto tudo? Ele podia estar vivo.
— Não te sintas assim. Agora vem, vamos dormir o resto da noite.
— Obrigada. — recebi um beijo na minha testa. —Obrigada mesmo.
(...)
Arthur Costa
11:11h - em casa // 3 dias antes da morte
Eu estava piorando aos poucos. Não havia dito a ninguém, mas recentemente tinha tido uma queda na casa de banho.....não disse a absolutamente ninguém, mas eu sabia que a minha hora estava chegando aos poucos. EU tinha a CERTEZA.
Todos haviam saído para preparar o batismo de Levi que decorreria no início do próximo mês. Ele era uma gracinha devo admitir, bebés para mim era algo mágico, algo enviado por Deus para que enfim nossas vidas fizessem sentido.
— Senhor Costa! — Glória bateu á porta. —Está tudo bem? Posso entrar?
— Um momento.
Cobri a marca que tinha em meu peito com a camisola e logo abri a porta mostrando um sorriso no rosto como sempre o fiz. A dor era inquebrável e a cada minuto aumentava, todavia eu era forte e tinha que me aguentar.
Não queria estragar a LUA de MEL da minha princesa, isso seria desolador para mim.
— Não ouvi nada do seu quarto e como eu sei que o senhor acordou no mesmo tempo que todos nós eu estranhei.
— Está tudo maravilhoso. Estava apenas pensando na vida e o quanto ela foi favorável estes últimos, meus filhos e eu devemos muito a vocês.
— Não tem de quê. Venha, vamos lá para baixo comer um pouco.
— Só ficou a Glória? — acrescentei especulando algo. —Pois! Posso supor isso, porque sem os adolescentes esta casa fica um silêncio absurdo.
— É isso é verdade. Venha, depois também terei que sair para ir ao hospital tratar de uns assuntos.
— Eu ficarei no quarto.
Eu de forma algo queria sair, eu de forma alguma queria ser tocado. Ninguém precisava saber o que aconteceu, o que existia em mim. NÃO queria PREOCUPAR ninguém sobre isso.
Me sentei na cama e segurei minha costela, ela doía, mas não podia demostrar a ninguém isso. Depois de tanta existência por sua parte e de tanta relutância pela minha a morena saiu e logo fechou a porta.
Suspirei e logo em ajoelhei no chão com dor. Merda! Eu queria dizer, mas não queria prejudicar a felicidade da minha filha.
(...)
...
10:00h - em casa / dia seguinte
Estava totalmente cansada. Havia dormido um pouco, mas parece que nada dormi, meu corpo doía por completo.....minha sensação era que tinha passado um camião por cima de mim partindo todos os meus ossos. Droga! Isto está a matar-me por dentro.
— Mamãe?! — S/n falou com voz sonolenta. —Bom dia! — sorriu e logo acariciei seu cabelo.
Ainda estávamos deitadas. António parece que já havia levantado e Hannah também não estava cá, talvez eles tivessem saído e eu nem dei conta, pois eu só consegui dormir um sono profundo apenas uma hora atrás.
— Papai está no banheiro e Hannah foi com a vovó comprar algo para comermos.
— Porque não foste também princesa?
— Quero fazer-lhe companhia. Eu amo-te muito mamãe. — me abraça.
Suas carícias era como anjos tocando minha pele tentando levar-me para o paraíso, sua voz era meiga e seu olhar era simplesmente divino. Ela não tinha um só erro que eu não conhecesse. Ela fazia tudo perfeito para uma jovem de 13 anos de idade, era simplesmente FENOMENAL.
— Vem vamos levantar-nos também. Vá!
— Papai ainda não saiu.
— Papai é um lentinho né princesa?
— Eu ouvi isso eu hem!!! — abriu a porta. —Bom dia.
— Vou me arrumar. Fica bem mamãe.
— Eu fico.
A pequena saiu e logo António veio ter comigo com o cabelo completamente molhado, era estranho pois ele ficava ainda mais perfeito com o cabelo molhado. Eu amava isso, mas hoje eu não estava nos meus dias para tais conversas.....eu sabia o amor que eu tinha com ele assim. Ele me alegrava sem nem pensar duas vezes.
— Passaste bem a noite? Remexeste-te muito desde que voltaste para o quarto.
— Dormi pouco só isso. — o beijei.
Entrei na casa de banho, liguei o chuveiro e liguei a água para ela aquecer enquanto tirava a minha roupa. Eu estava de rastos e um simples banho quente tiraria toda a minha angústia que foi liberta em volta de mim.....meu pai sempre me ensinou que banho quente relaxava os músculos, nunca errou.
Sai o mais depressa possível e vi o moreno ajeitando a cama, bom mais ou menos, ele era muito ruim mas nem falei sobre. Entrei no closet e coloquei a minha roupa mais confortável, em nenhuma HIPÓTESE e em nenhum MOMENTO iria sair de casa.
— Pronta para tomar o seu pequeno-almoço? — veio ter comigo. —Eu estarei contigo fica tranquila.
— Obrigada! Obrigada por tudo mesmo Torres.
— Amorzinho! Amorzinho, deixa disso vá vamos.
Fechou a porta, segurou minha mão e logo descemos as escadas. Thor estava no último degrau deitado, ele tinha imenso calor e divagamos que a casa estava bastante quente para ser sincera. Fui para a mesa e logo S/n e Hannah me cercam dando dois beijos em minha bochecha e logo nas de Vitor. Elas eram uns amores, elas era magníficas.
— Trouxeram tanta coisa só para um café da manhã? Especulando tudo isto suponho que a minha querida irmã teve um enorme dedo nisto. — Thomas esbravejou rindo. —E eu ainda como pouco!
— Quando paras de ser chato.
— Meninos chega! — Glória se exaltou.
Ela nunca tinha sido assim.
— Vá! Vamos comer um pouco. — era Duarte. —Chega de brincadeiras na mesa.
— Tudo bem. — Thomas atira um guardanapo á sua prima.
— THOMAS CHEGA! Já falei.
Bateu com os seus punhos na mesa e logo saiu da mesa. Glória estava estranha desde a conversa que teve comigo ontem de noite, eu acho que de alguma forma ela sentisse culpada por tudo estar a acontecer. Aurora e eu nos levantamos e fomos procurá-la, ela estava na cozinha com a sua cabeça apoiadas nas suas mãos.
— Ei! Filha o que se passa?
— Eu sou horrível! Eu sou, eu devia ter tomado conta dele.....eu devia ter visto os sinais.
— O que eu te falei ontem? — puxei uma cadeira e logo me sentei perto dela. —Ninguém tem culpa. Vou contar-te um segredo, meu pai era muito forte quando queria, meu pai não demonstrava a sua fraqueza a ninguém, meu pai nunca admitiu que estava doente.
— Ele! Ele tinha uma marca na costela! Deve ter sido da queda que ele teve e ninguém soube.
— Eu sei. Eu vi, eu o fui visitar na morgue. É doloroso tudo isto, sim, mas temos que encarar a realidade. Agora vem, não te sintas culpada.
— Eu sou médica, eu devia ter notado.
Ela estava AMARGURADA por não ter suspeitado de nada diferente no meu pai. Ninguém suspeitou e meu pai conseguia esconder muito bem tudo o que se passava nele....por vezes eu até me chateava com ele por ele não admitir que tinha dores.
— Tinhas imensas coisas não podias estar sempre de olho nele filha.
— ...
— Vês? Não é assim tão difícil, não tens culpa do que aconteceu. Agora, vais limpar essas lágrimas e aparecer na sala com um ligeiro sorriso entendidas?
— Tudo bem convenceram-me.
— Que ótimo.
Lavou a sua cara, respirou fundo duas vezes e a acompanhamos de volta para a sala, todos estavam esperando por nós para começar a comer. A família era unida e neste momento era a única coisa que mais importava. Tempos difíceis nos faziam absorver quem era as pessoas reais que tanto nos amavam.
Todos eles eram especiais, todos eles tinham um enorme cantinho no meu quente e delicado coração. Eu sabia que eles o estavam curando aos poucos.
💄💋⚽️
• 8 dias depois •
Natasha Torres
08:10h - do funeral ao cartório
Estava sentada no banco perto da igreja, existia uma sombra e lá estava eu. Toda vestida de preto, nunca amei esta cor.....porém em meu armário nunca faltava uma única peça quando necessitava dela e a partir deste momento em pelo menos três meses usaria esse tom de cor em alguma peça de roupa.
Eu estava processando tudo o que estava a acontecer. António estava em pé falando com Jonnas e com seu pai, algo quem nem mesmo eu sabia ao certo o que eles estavam a falar.
— Mamãe! Para a senhora. Ferran me levou ao café da esquina depois de eu tanto insistir com ele. Pegue irá fazer-lhe bem a água.
— Obrigada querida. Queres sentar-te comigo.
— Sim! Vamos nos conectar apenas com nossas mãos. — seus olhos brilharam como as maiores estrelas. —Não falarei nada.
Droga! Ela era simplesmente perfeita. Sem erros e uma jovem nota dez devo confessar, ela estava a saber lidar muito bem com tudo isto sendo ainda tão nova. Ela tinha um psicológico enorme, ela tinha uma enorme paz e um enorme coração. Ela não podia sofrer, isso partiria o meu coração.
Olhei para o meu lado direito e logo ouvi a voz de minha mãe. Ninguém a tinha convidado, pelo menos não que eu saiba.....me ausentei de perto da morena por um momento e foi para outro local, eu não queria em momento e em hipótese alguma que ela me visse.
Me encostei no muro e a todos os instantes tentava controlar a minha mente. Minha mãe fez de propósito para hoje estar presente, ela nunca amou o meu pai verdadeiramente, ela nunca se importou com ele todos estes anos e agora quando tudo ficou a seu favor resolveu aparecer.
— Amorzinho? Ei! Amorzinho. — me abraçou desesperado. —S/n tinha dito que vieste para cá. Ei! Está tudo bem?
— Minha mãe Torres! Ela....ela apareceu. O que eu faço, eu não a quero ver.
— Quem a chamou? — ficou tenso. —LOPEZ!
— Sim senhor?!
— Descobre quem a convidou. Pergunte á minha filha em primeiro lugar, ela sabe de tudo.
S/n apareceu triste. Algo no olhar dela tinha mudado de um momento para o outro, juntos suas mãos uma na outra e abaixou a cabeça em direção ao chão de pedra. Ela estava de alguma forma incomodada.
— Fui eu.....fui eu, eu sinto muito, eu não sabia! Eu, eu pensei que ela devia uma última vez despedir-se dele. Me perdoem.
Olhamos um para o outro incrédulos, não estávamos de alguma forma que tinha sido ela ou ela estava mentindo ou simplesmente estava ocultando quem de facto tinha feito tal convite inusitado. Nada me tirava da cabeça a segunda opção.
— Fui eu. — Ferran apareceu.
— Não! Fui eu. — era Thomas.
Isto estava cada vez pior.
— Não!!!!! Parem de ser mentirosos. Fui eu, eu a convidei eu pensei....
— Parem! — António se enfureceu. —Saiam daqui! Me deixem sozinho com ela agora!
— Sim senhor.
António tinha o seu corpo tenso. Eu não queria a mim mãe aqui ainda mais na última despedida que eu e meu irmão daríamos a ele, mas falar assim com os seus filhos e os seus sobrinhos neste meio to não foi uma boa escolha.
— Era preciso isso?
— Tu precisavas te acalmar e eles não estavam a deixar.
— Não faças mais isso! Nem hoje nem nos próximos três meses Torres.
— Amorzinho! — segurou minha mão. —Perdoa-me.
— Desta vez passa, mas da próxima.
— Tudo bem.
Ambos entrelaçamos as nossas mãos e caminhamos até perto da entrada da igreja. O caixão já havia chegado e as enormes portas da igreja tinham sido abertas. Nós colamos bem perto delas e quanto mais os homens caminhavam com meu pai mais meu coração doía, meu coração estava despedaçado.
Entramos atrás dele e eu e meu irmão em nenhum instante o queríamos deixar, era simplesmente doloroso. O ver nesta situação era horrível, uma sensação na qual eu não queria ter que estar a viver tão cedo em minha vida.
Não demorou muito para que o padre finalmente chegamos. Nos sentamos na primeira fila e logo inclinei a minha cabeça para o ombro de António enquanto eu e meu irmão estávamos de mãos dadas. Em nenhum momento eu vi meu pequeno e amado irmão chorando, ele havia chorado mais nestes últimos dias do que em sua vida até este momento.
Ele estava tenso e todos estávamos devastados.
A cerimónia já tinha começado á mais de dez minutos e cada vez mais meu coração ia morrendo, saber que a despedida definitiva estava cada vez mais perto matava-me por dentro. Esta era sem dúvida umas das piores sensações do mundo.
— Quero falar algo contigo hermanita. — sussurrou em meu ouvido. —Posso?
Não tinha o que discutir. Ele podia e mil vezes eu diria sim ao seu pedido. NOSSO pai merecia umas últimas palavras de ambos os filhos.
— Claro que sim. — acariciei sua mão.
— Os filhos querem dizer algumas palavras? — o padre questionou olhando para nós.
— Sim!
Ambos nos levantamos, fomos em direção ao palanque e ter passado novamente pelo nosso pai foi simplesmente algo terrível. Seus lábios estavam completamente roxos, sua pele estava mais fria do que a própria neve.
— Bom dia a todos! — mais lágrimas desceram sobre meu rosto, minha respiração tornou-se ainda mais ofegante. —O que dizer? Bom....nosso pai sempre foi aquele tipo de pessoa amorosa, cuidadora, gentil, prestativo, um pai exemplar. Fazia tudo para que tanto eu quanto meu irmão não sentíssemos amados. — olhei para António que me encorajou a continuar. —Ele! Ele nunca admitia que sentia dor, ele podia estar a sofrer por dentro, mas quando a questão era preocupar os outros eles não dizia absolutamente nada.
— Nosso pai.... — era Vitor. —Nosso pai foi sempre um anjo da guarda para nós. Sempre cuidou de tudo, sempre estava disposto a dar a roupa do corpo para que nós não passeássemos necessidades, nunca nos queria ver chorando e sempre encontrava um jeito de nos fazer sorrir com qualquer coisa. Ele contava as melhores piadas, contava as melhores histórias, nos ajudava em tudo. Nossa pai sempre será lembrado por tudo o que ele pôde dar a mim e à minha irmã.
— Ele sempre foi aquele tipo de pessoa que amava brincar connosco, passear connosco, se divertir connosco. Ele fazia tudo para não ver sorrir, ele estava doente, lá estava ele nos ajudando, estávamos nos brigando e ele lá com a sua paciência e sua voz sempre gentil nos mostrando que a vida tem muito mais do que além de discussões. Nós nunca te esqueceremos papai. — completei olhando para o caixão.
O padre não agradeceu e logo retornamos para os nossos lugares. Mais algumas pessoas foram dar as suas últimas palavras e logo o caminho para o cemitério começou. A DOR estava a cada momento aumentando mais e mais. A esperança já havia ido embora quando percebi que ele não vinha nunca mais para as nossas vidas.
António me abraçava com todas as suas forças, S/n estava ao meu lado dando-me a mão e fazia carinho nela. Eu sinceramente não estava mesmo preparada para nada disto, eu não estava preparada para ver o meu pai dentro da terra. Eu o queria aqui comigo, eu queria abraçá-lo, beijá-lo, acarinhá-lo e dizer que tudo ia ficar bem.
Merda! Eu não o posso fazer.
Deitamos rosas brancas e por último deita uma vermelha. Ele era apaixonado nessa cor. Eu sentia cada vez mais a angústia ir embora. Acariciei sua cara e logo António se aproximou de mim.
— Tudo vai ficar bem agora! — murmurou em meu ouvido. —Vamos ultrapassar juntos. — beija minha cabeça.
Um.....dois....três, estavam a fechar o caixão, e foi esta, foi esta a última vez que olhei para a cara de meu pai. Quatro....cinco....seis, estavam a transportá-lo para o jazigo. Sete....oito....novo, meu pai estava sendo colocado em seu jazigo. Dez.....a dor era infinita.
Eu chorava mais do que qualquer coisa neste momento, meu irmão veio ter comigo e me abraçou. Eu sentia um peso enorme, eu sentia neste momento a responsabilidade a dobrar, tinha que cuidar de tudo praticamente sozinha. Eu tinha que cuidar dos bens de meu pai, de meu irmão e sobretudo de mim e de António.
Eu precisava de uma ajuda.
— Hermanita!
— Sim irmãozinho!! Tudo bem?!
— Porque a mamãe está aqui? Não a quero aqui.
— Depois eu explico-te tudo bem? Quando chegar em casa.
— Tudo bem, mas, eu não a quero perto de nós!
— Nós não deixaremos. — Aurora interveio. —Fiquem o tempo que precisarem com ele. Ficaremos mais afastados.
Ficar com ele seria a minha rotina diária nos meus próximos três meses. Acordava e vinha para cá, meu coração recusava-se a aceitar que ele estava morto, que ele estava embaixo da terra. Isto era imensamente terrível!
— Papai nós amamos muito o senhor! Eu farei de tudo, eu irei proteger a minha irmã como o senhor sempre disse para fazer. Nós vamos ser os melhores filhos do mundo.
— Nunca iremos esquecer o que o senhor fez por nós, tudo o que senhor teve que dar de si para que eu e meu irmão estejamos hoje onde estamos. Nós amamos-te muito papai.
Fica só por mais um pouco no jazigo e logo saímos do cemitério. Olhei mais uma vez para trás e as minhas lágrimas cessaram, meu coração começou a perceber que ele nunca mais voltaria, nunca mais estaria connosco.
Fomos para os carros, mas logo recebi uma chamada de um número desconhecido, atendi e era do cartório. Não sabia o que estava acontecendo por isso pedi para que me esperassem por dez minutos mais.....eu tinha que entender o que estava a acontecer.
— Aurora! — captei sua atenção. —Preciso de ir no cartório, poderá dizer a António que eu fui a casa de meu pai com meu irmão?
— Querida!
— Por favor.
— Tudo bem! Vá vai lá, António já está na carrinha também.
Eu não queria de alguma forma que António descobrisse onde eu ia pois começaria a imaginar um MILHÃO de coisas mais, ele até poderia pensar que depois disto tudo quereria acabar o casamento com ele, não eu não o queria por isso tive que por mim ir ao cartório e arrastei o meu irmão comigo, Vitor não estava com vontade....mas tive que o fazer.
Chegamos e logo fomos atendidos pelo moço da recepção que nos indicou a sala. Bati na porta e logo a permissão foi dada do outro lado da porta, eu não sabia o que estava a acontecer, todavia ver a minha mãe aqui foi o COLAPSO tanto para mim como para meu irmão.
— Também receberam o telefonema! — diz em tom irónico. —Que excelente agora tenho os meus dois filhos comigo.
— O que se passa aqui? — meu irmão interveio.
— Seu pai tinha uma casa em seu nome e a casa dos seus avós também!!
— O que temos haver com isso? — exclamei. —Não estou a entender de facto?
— As propriedades tem um valor monetário alto. A casa dos vossos avós ficará para vocês todo o dinheiro quando a venderem e a casa de seu pai terá que ser dividido por vocês os os três.
— Nós não queremos dinheiro nenhum!!
— São as regras senhora Torres.
— Claro que não queres filha, estás casada com um homem rico o que mais queres?! — riu para mim.
Ela testava a minha paciência ao limite. Nunca me enervei com nada que ela disse, mas neste dia as coisas iam mudar ainda mais depois de termos enterrado o meu pai bem á pouco.
— Olha só eu sou tua filha, ok! Não o queria ser, sim eu não queria, mas agora se vens faltar ao respeito quando eu e meu irmão estamos em luto faz um favor a ti própria e mantém a tua boca calada. — meu irmão me agarrou pelo braço.
— O que fazemos agora senhor? — meu irmão tentou apaziguar a situação.
— Quando existir compradores para essas duas vivendas eu entrarei em contacto com vocês, até lá as casas ficaram ao encargo de vocês.
Eu tentava respirar fundo para me tranquilar, porém ver minha mãe testando os meus limites a todos os momentos era sem dúvida catastrófico.
— Posso continuar a viver lá?
— A casa era de seu marido, se seus filhos deixarem poderá sim permanecer na casa.
— Eles eram divorciados.....
— Amorzinho!!!!!! — Antonio abriu a porta com força. —Não tem calma, vamos pensar por favor, não te divorcies de mim. Por favor eu preciso de ti! Vá Natasha vamos trabalhar em conjunto.
Me abraçou.
— Torres tudo bem! Não irei divorciar-me, estou resolvendo outros assuntos.
— Não?! — falou confuso e logo olha para minha mãe. —Ah desculpa. — sorriu ligeiramente.
Eu sabia que mais cedo ou mais tarde ele descobriria onde eu estava. Ele é muito bom a achar as pessoas e digamos que o seu desespero não me surpreendeu nem um pouco.....pois isso fez com que eu visse que ele lutaria até ao fim mesmo a nossa relação tivesse desabando.
— Então sendo assim senhor não poderá permanecer lá. Terá que fazer as suas malas!
— Vão deixar a vossa mãe na rua? — nos questionou. —Por favor vá! Já não tenho idade para viver na rua. Para onde irei?!
Meu irmão olhamos um para outro e pedimos permissão para falar mais afastados deles. Eu não queria que ela se apoderasse de tudo o que nosso pai conquistou e muito menos Vitor, mas pro outro lado ela era nossa mãe e não podia viver na rua. Isso seria terrível e carregaríamos esse peso pro toda a nossa vida.
— Tomamos uma decisão! — todos olharam para Vitor. —Nos deixaremos, todavia com algumas regras.
— Tudo bem!
Dizer aquilo matava-me por dentro. Dizer tudo em constância e tempo era doloroso, nossa mãe nunca foi uma excelente mãe, mas nós simplesmente não a podíamos deixar na rua.
Ficamos por mais um pouco dentro da sala e logo saímos. Agradecemos a hospitalidade e logo António me abraçou a meu do corredor.
— Me perdoa! Eu pensei, eu sinceramente pensei que já não mais me quisesses depois de tudo, eu morreria sem ti amorzinho.
— Tudo bem seu bobinho. Agora vem quero descansar.
— Tudo bem. Ficarei contigo, não quero que fujas de mim novamente!
— Eu não irei fica prometido. — o beijei.
[...]
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