05_ Vai me sequestrar?
ㅡ Quer dizer um sequestro? ㅡ Minha voz irrompeu o som das gotas pesadas de chuva batendo por todo o carro.
ㅡ Não, se você concordar. ㅡ Ele acelerou.
Estávamos na pista, carros apressados passavam ao nosso lado, assim como motos e carretas. A chuva não parecia amedrontar os motoristas lá fora e nem o motorista aqui dentro.
ㅡ E por que eu concordaria? Eu nem te conheço! Não sei pra onde vai me levar e é o seu pai quem quer me matar! Por que eu confiaria em você? ㅡ Drake não pareceu ter resposta para isso, ele só acelerou mais e eu coloquei o cinto de segurança.
ㅡ Você não tem escolha.
ㅡ Pelo visto, não tenho mesmo.
ㅡ Olha só, eu só to fazendo isso pra te ajudar.
ㅡ Como posso saber? Até onde eu sei, você é filho do seu pai. ㅡ Seus olhos encontraram os meus brevemente pelo espelho. Eu parecia estar enchendo a paciência dele, o que não me importa, minha vida acabou de virar de cabeça para baixo e minha última preocupação é estar irritando Drake Grove.
ㅡ Vai ser uma longa viagem, pode descansar se quiser. ㅡ Ele mudou o assunto após me deixar no vácuo por vários minutos.
ㅡ Ótimo. ㅡ Joguei minha cabeça para trás e cruzei os braços. ㅡ Quem era aquele cara?
ㅡ Que cara?
ㅡ O que estourou os miolos do outro na nossa frente. Vocês são amigos?
ㅡ Por aí. ㅡ Drake diminuiu a velocidade e relaxou um pouco no banco. ㅡ Ele trabalha pro meu pai.
ㅡ E ele não vai contar pro seu pai onde estou? Ou para onde você vai me levar? ㅡ Pendi a cabeça para o lado e o olhei pelo espelho.
ㅡ Não.
ㅡ Como sabe?
ㅡ Confio nele.
ㅡ Ah, claro. ㅡ Assenti. ㅡ Então, no momento, eu preciso confiar minha vida ao filho e ao funcionário do cara que quer me matar, certo? E acreditar que eles são diferentes do Grove e não vão me fazer mal, né? Fácil. ㅡ Dei com os ombros. ㅡ Acho que vou tirar um cochilo, de tanto que eu confio em você.
Novamente ele não me respondeu. Encarei a janela sem reconhecer o lugar onde estava, só sabia dizer que não era na minha cidade. Por que eu entrei naquele lugar? Por que fui tão burra? Mesmo que não houvesse esse tiroteio e essa coisa toda, ainda era muito perigoso entrar num lugar onde não conheço ninguém e só tinha homens. O que deu em mim?
Eu devia estar na competição agora. Devia estar colocando o figurino, ou me apresentando, talvez ganhando, me comparando com as bailarinas super magras que ficam bem de coque e depois voltando pra casa com o dinheiro ou sem grana nem pra jantar.
Droga, eu to com fome.
ㅡ Estou com fome. ㅡ Anunciei.
ㅡ O que você gosta de comer?
ㅡ Eu posso escolher? ㅡ Arqueei uma sobrancelha.
Drake me olhou pelo espelho com um olhar sério. Será que eu to brincando com a minha vida? Drake provavelmente é alguém que está acostumado a ter tudo que quer do jeito dele, todos os obedecem. Irrita-lo deve ser muito fácil.
Esperei que ele, sei lá, sacasse a arma dele, mas ele saiu da pista e entrou no drive thru do McDonald's.
Faz tanto tempo que não como McDonald's que nem me lembro mais do gosto.
Chegamos ao local de pedir e Drake esperou que eu dissesse. E agora? Eu não como McDonald's há anos, o que significa que eu não sei o nome de nada. Nem sei se é hambúrguer que ainda se come num fast food.
Me inclinei pela janela e consegui ler um pedaço do menu. Escolhi algo que pensei ser um sanduíche e Drake pediu, junto a uma porção de batata frita, um refrigerante e um milkshake.
Quando o lanche chegou em minhas mãos e Drake voltou a pegar a pista, senti o cheiro que só fez o meu estômago doer mais. Não quis parecer uma morta de fome, mas me lembrei que Drake mora em frente a minha casa, o que significa que ele sabe bem o quão pobre sou, então comi sem preocupação.
As horas foram passando, o sono começou a me bater e me arrependi de ter feito a piadinha sobre tirar um cochilo. Eu estava exausta!
Dormi tarde ontem... Digo, dormi tarde todos os dias da minha vida e acordei cedo hoje, mas cedo do que estou acostumada. Depois de toda adrenalina de tiroteio e sequestro e ameaça de morte, meu corpo começou a ficar mole. O som da chuva também não ajudava e não tem nada melhor que chuva para dormir.
Bocejei. Bocejei de novo. Eu ia dormir e o bonitão no volante ia entender isso como um: eu confio em você, sequestrador.
E não. Não confio nele. Não conheço ele. Tudo o que sei sobre ele é que ele é envolvido na máfia, anda armado, ver corpos não o afeta e que, provavelmente, me via com frequência.
Ele pode estar sendo sincero? Talvez. Pode mesmo estar querendo me ajudar e me proteger? Talvez também. Mas, não consigo entender. Não vejo motivo pra isso. Por que um cara aleatório desafiaria o próprio pai para me salvar? Para me proteger? Ele está tentando provar algo para alguém? Está só se rebelando contra o pai? Está tentando fazer alguma coisa boa? Ou é um homem decente que resolveu ser meu anjo da guarda?
Será que ele quer mesmo me ajudar? Será que suas intenções são boas? Será que...
[...]
O chacoalhar do carro me fez despertar. Olhei em volta e percebi que tinha dormido. Minhas pernas estavam por cima do banco e eu ocupava todo o espaço da parte de trás. Além de uma almofada embaixo da minha cabeça, também tinha uma manta me cobrindo.
Drake ainda estava dirigindo quando me sentei e cocei os olhos. Ele me olhou pelo espelho, sua expressão já não era mais estressada, mas eu não sabia o que ele estava sentindo agora.
ㅡ Onde estamos? ㅡ Olhei pela janela. Eu nunca tinha visto aquele lugar, era uma cidade, uma cidade de interior, levando em conta o comércio sem altos prédios ou ruas largas e lotadas.
ㅡ Interior do Colorado. ㅡ Foi tudo o que ele disse, como se bastasse.
ㅡ E por que exatamente estamos aqui? ㅡ Tentei tirar mais dele enquanto ele virava uma rua.
ㅡ Porque meu pai não pisa os pés aqui. ㅡ Silêncio.
Não continuei, não sei se quero saber muito sobre o pai dele.
O carro passou pelas ruas do centro da cidade. Vi lojas de ferramentas, cafeterias, pequenas mercearias, um teatro muito menor do que o que eu trabalho, um cinema, farmácias, clínicas e tudo do básico que uma cidade precisa. Haviam árvores a cada cinco metros nas calçadas e também passamos por uma praça de grama verde no meio de tudo. Era pequena, mas tinha um coreto, bancos e uma feira de frutas, legumes e verduras.
Era uma verdadeira cidade de interior nos Estados Unidos. Eu já tinha visto uns vinte senhores de idade, o que eu quase não via na cidade grande. Tinha criança andando sozinhas de bicicleta, o que eu também não via, já que lá é perigoso crianças andarem por aí sozinhas, até vi um cara vendendo rosas.
Eu precisava admitir, era uma linda cidade. As pessoas andavam sorrindo e se cumprimentavam como se fossem todos amigos. Por um momento pensei que estava em Stars Hollow, mas minha meus olhos focaram no cara dirigindo o carro e minha realidade voltou.
Eu não estava de férias viajando pelo país, não estava só conhecendo lugares bonitos, estava fugindo com um cara que não conheço e não confio porque um mafioso quer me matar.
ㅡ Chegamos. ㅡ Drake estacionou o carro e eu voltei a olhar pela janela. Era uma casa. Uma casa azul oceano, com janelas e portas de madeira pintadas de branco. Dois andares, uma varanda na frente, um belo de um gramado verde, a bandeira dos Estados fincada na coluna de madeira que segurava o teto da varanda e tudo isso numa rua de casas bonitas e com pessoas gentis.
Eu tinha chegado ali a exatos dois segundos e já vi crianças brincando pelas ruas, pessoas passeando com cachorros e vizinhos se cumprimentando. Eu estava num filme?
Drake saiu do carro e deu a volta para abrir a porta pra mim. Saí de dentro do carro e pisei na calçada. Ali não estava chovendo, pelo contrário, era um belo fim de tarde com o sol já fraco.
ㅡ Vem. ㅡ Ele seguiu na direção da casa. Eu demorei a conseguir sair do lugar, uma moça passou com um Bulldog por mim e me deu um sorriso tão cativante que eu precisei sorrir de volta.
Segui na direção da casa quando Drake olhou para trás e me viu parada na calçada.
ㅡ O que estamos fazendo aqui? Eu não estou entenden... ㅡ Parei de falar quando adentramos a casa.
Era linda. Móveis bonitos, decoração impecável, o sol do fim de tarde batendo na janela e iluminando o sofá da sala. Uma lareira muito chique deixava a sala parecendo mais cara. Parecia que uma família morava ali.
ㅡ Você vai ficar aqui por um tempo. ㅡ Ele explicou. ㅡ Não é grande coisa, mas é seguro.
ㅡ Não é grande coisa? ㅡ O encarei desacreditada. ㅡ Ah, é, você mora numa mansão gigantesca. Essa casa é perfeita! Nunca na minha vida me imaginei passando se quer um dia numa casa assim.
ㅡ Bom... Que bom, então. Quero que se sinta a vontade aqui, porque não sei quanto tempo ficará aqui. ㅡ Ele passou a mão na nuca e foi abrir as janelas.
ㅡ Eu sei que eu não posso voltar pra casa, mas... O que vai ser de mim quando tudo se resolver? Eu vou perder o meu emprego no teatro e no restaurante que trabalho nos fins de semana. Eu já mal conseguia viver com esses dois trabalhos, o que vou fazer sem eles? ㅡ Me sentei no braço do sofá.
ㅡ Não fique se preocupando com isso. ㅡ Ele foi até outra janela e a abriu. ㅡ Quando tudo se resolver... Não vou deixar você sofrer com nada. Eu cuido disso, agora só fique aqui e, por favor, não faça a besteira de tentar ligar para alguém ou para a polícia. Meu pai tem um hacker muito bom e eles te achariam no mesmo instante.
Concordei e quis rir. Como se eu tivesse alguém para ligar. Tem a Mary, mas eu jamais meteria ela nessa confusão.
ㅡ Eu vou pegar a sua bolsa no carro e preciso resolver umas coisas. Vou deixar um dinheiro caso sinta fome ou queira dar uma volta, pode andar livre pela cidade, a cidade inteira é segura quando se trata do meu pai.
ㅡ Mas, seu pai não vem aqui, mas e se alguém contar pra ele que te viu aqui ou que me viu?
ㅡ Não conhece as pessoas dessa cidade. ㅡ Pensei ter visto um curto sorriso em seus lábios. ㅡ Ninguém vai contar nada pra ele. Não se preocupe. ㅡ Drake voltou até a porta e foi até o carro. O esperei na frente da porta e peguei minha bolsa em suas mãos. ㅡ Não vou demorar. Você vai ficar bem? ㅡ É aquela preocupação. Ela está em seu rosto de novo.
ㅡ Eu espero que sim. ㅡ Cruzei os braços soltando a bolsa nos meus pés.
Drake me olhou por mais uns segundos até virar as costas e sair com o carro.
Eu poderia fugir agora. Ou poderia ligar pra polícia. Poderia fazer qualquer coisa, mas escolhi fechar a porta e me sentar no sofá. Eu ainda não confio em Drake e nem sei se vou, mas essa parece a pausa na turbulência da minha vida que eu tanto queria.
•••
Continua...
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