21- Viagem. Rumo às Forças Ocultas!
(1892 palavras)
Edolon, andando com passos arrastados, seguiu Triny para o salão onde todos os outros já estavam. Niobe mostrava imagens da Dama de Vermelho.
Niobe explicava algumas imagens no ecrã. Um ser intermitente, com falhas na captação, que parece não existir, e logo reaparecer, como se fosse um holograma.
— Todos na polícia pensam que as câmaras, que registaram os eventos, são defeituosas, apesar de nós, presentes aqui, sabermos que são seres de outro mundo. Seres, como a Dama de Vermelho, têm dificuldade de se materializar por completo, mas que, com o tempo, parecem cada vez mais humanos. Não há imagens oficiais das câmaras do aeroporto, foram modificadas, e estas imagens foram captadas por uma câmara amadora. A Dama de Vermelho entrou no aeroporto, provavelmente de avião. No aeroporto encontramos este lenço vermelho, — disse Niobe, mostrando o lenço que a Dama de Vermelho usava nas imagens capturadas.
O Mestre, levantou-se da cadeira e disse:
— As forças ocultas que enfrentamos, têm uma magia poderosa, são seres de outra realidade. Controlam a informação que todos testemunhamos. Uma cidade foi erguida em menos de dois dias, mas todos os documentos oficiais e as pessoas que conhecem o local dizem que a construção começou há dez anos. Os poderes dessas forças do mal estão além da nossa compreensão. Não só construíram uma cidade, como a povoaram com seres humanos, que provavelmente também não são deste mundo. Mais grave foi as pessoas da aldeia Bemposta, que eu conhecia, terem sumido, reaparecendo como moradores da cidade. Nenhum deles me reconhece, sendo que antes, como sabem, todos me conheciam.
O mestre sentou-se e Niobe disse:
— Os sete zombies, vítimas da Dama de Vermelho, entraram em coma, e, passados vinte e quatro horas, levantaram-se como se nada tivesse acontecido. Estas pessoas, embora estejam vivas, também apresentam falhas de materialização, como podem observar pelas imagens. Essas entidades devem servir ao Corvos, o ser maligno, que ainda não vimos.
Edolon, naquele momento, experimentou uma felicidade incomum. Agora, poderia ser útil. Tinha algumas recordações, de que os outros não tinham conhecimento. — Conheço o Corvos — disse, surpreendendo todos. — É o rei dos corvos, controla os pássaros que espiam as pessoas. O Corvos coleta almas que depois as entrega aos corvos, que se transformam em criaturas metálicas. Não é uma pessoa, é uma criatura estranha que não tem um rosto definido. Possui uma boca na garganta e, através dela, expele as almas para os corvos. As pessoas da aldeia devem ter as suas almas nessas cápsulas voadoras de metal, com asas negras. — Quando Edolon terminou, estavam todos pensativos.
Todos pareciam chocados com as palavras de Edolon, mas suas ideias pareciam fazer sentido. A cidade misteriosa que apareceu do nada... As almas das pessoas que podiam estar nessas cápsulas voadoras, com asas de corvo, controladas pelo Corvos. Um ser bizarro e sem rosto definido.
A praga de corvos antecipava os acontecimentos. As certezas ganhavam forma diante dos fatos concretos. O terror pairava sobre a realidade assustadora.
Triny relatou os acontecimentos que tivera com Edolon. Pedro, um jovem de uma ilha paradisíaca, foi apanhado nas teias da Dama de Vermelho, atacado por sete monstros que disparavam setas de fumo cinza. Pedro, ficou obcecado pela Dama de Vermelho e ela transformou-o num zombie, desses que andam por aí apenas com desejos libidinosos.
O Mestre relatou o sonho que teve com Oraca, mencionando que as criaturas a que Triny se referia se chamavam monangis. Quando o mestre estava prestes a terminar de falar, o corpo entrou em convulsões e aos solavancos foi para o altar onde figurava, o grande quadro de Oraca.
Todos se levantaram, Triny pegou na mão de Edolon, pasmado, e dirigiram-se para o altar onde se ajoelharam com os restantes, ficando apenas o mestre de pé. Agora o mestre parecia mais calmo, com as pupilas dilatadas falou:
— Corvos faz várias experiências, cada experiência é um passo, em cada passo há uma escolha. O escolhido será excluído. A verdade se revelará. — disse com um tom de voz diferente do habitual, como se fosse mais do que uma pessoa a falar.
Edolon, lembrou-se da primeira vez que o Mestre falou com ele, na montanha, com a mesma voz, e de quando o mestre discursava e se evaporou em notas musicais.
— O Mestre saiu do transe. — Triny explicando a Edolon que quando Oraca queria transmitir uma mensagem usava o corpo do Mestre, por isso a voz dele parecia diferente e continuou a falar:
— Imagina teres outra voz em ti, uma voz com um conhecimento mais amplo que o teu, a tua fala misturar-se-ia, com a outra voz. Pensamentos diferentes, conhecimentos diferentes, só podem ser harmonizados por uma única voz se forem falados por enigmas, algo desconexos. Quando Oraca fala tudo se concretiza, apenas temos dificuldade em perceber de que forma, pois por vezes a mensagem não é clara.
— Porque vou ser excluído? — perguntou Edolon.
— Não sei, Oraca fala por enigmas, nem tudo o que parece é, devíamo-nos concentrar mais na última frase, "A verdade se revelará", que pode ser algo em grande ou apenas uma parte de um todo, mas o nosso conhecimento aumentará, como sempre que Oraca fala. — Triny, tentou acalmar Edolon, mas também estava ansiosa, embora soubesse que nunca excluiria Edolon, não, isso não. Oraca havia dito que se apaixonaria pelo escolhido, que era o seu destino, e ele era o escolhido, tinha a certeza, pois já estava apaixonada.
Niobe, entregou o lenço a Dionísios pedindo para este procurar.
Dionísios juntou as palmas e abriu lentamente, e no ar apareceu, uma esfera transparente, o geoastrolábio, raios elétricos pareciam segurar um ponteiro. O interior da esfera era semelhante a dois astrolábios perpendiculares que se intersetavam no topo e no fundo.
Apolíneo já tinha evocado o seu mapa holográfico que se estendia pela sala, onde se podia ver todos os continentes, como num mapa-mundo. Dionísios colocou o lenço em cima do geoastrolábio, e este voou por cima do mapa. Parou, algo indeciso, entre o Porto Santo e o Ilhéu da Cal.
O Porto Santo é uma ilha do arquipélago da Madeira situado no oceano atlântico. Uma ilha paradisíaca, com cerca de cinco mil habitantes, mas que no verão tem cerca de quarenta mil pessoas devido ao turismo. É conhecida pela ilha dourada, pela cor da areia da praia. A temperatura da água é sempre de 22 graus Celsius, a areia é fina e bonita, a temperatura é estável, sem calor excessivo, fazendo da praia a melhor praia do mundo, segundo alguns turistas.
Logo o «geoastrolábio», se dirigiu para a ilha dourada e, nessa altura, parou. Niobe, disse:
— Agora que sabemos onde está a Dama de Vermelho, precisamos partir.
— Comam qualquer coisa rápida, e estejam aqui em meia hora — disse o mestre, pensativo.
Triny, Edolon, Dionísios e Apolíneo dirigiram-se à cozinha.
— Triny, Edolon não está mais bonito agora, com estas roupas, — disse Dionísios, ele havia emprestado as roupas a Edolon.
— Conseguiste orientar-te com o meu carro? — perguntou Triny, a Dionísios, beliscando suavemente o vestido, tentando mudar de assunto.
Edolon, pensava que: "A amnésia não leva apenas a memória, ela usurpa a identidade. Não interessa a roupa que se veste por dentro sinto-me nu. Que caminhos percorri para perder a minha identidade? Como cheguei ao mundo sem lembranças da minha existência?"
— Eu, oriento-me sempre, o teu carro está são e salvo, as chaves estão no chaveiro da entrada. Que seria do Apolíneo sem as minhas orientações?
— O que é relevante não é o rumo que se traça, mas sim o caminho que se percorre — disse Apolíneo, sorrindo.
— Quem é que dirige é o cavaleiro ou o cavalo? — perguntou, Dionísios.
Apolíneo ia responder, se era o piloto ou o copiloto que dirigia, mas pensou que haveria outros temas para discutir e que os sorrisos que via nos rostos bastavam por enquanto.
Já na cozinha, sentados, exceto Apolíneo que preparava umas sandes para todos. Triny explicou que a magia entre Dionísios e Apolíneo se complementavam, Dionísios indicava as coordenadas, bem como a altitude, enquanto Apolíneo conseguia se teletransportar a si e a quem estava ao seu redor. Apolíneo conseguia teletransportar-se para lugares que já tinha visitado, mas precisava da ajuda de Dionísios para chegar aos outros...
— Caso contrário, ia acabar no meio do oceano ou, pior ainda, ia acabar preso numa parede — disse. Dionísios, com um sorriso.
Triny olhou para ambos e sorriu. Era fascinante ver como os seus amigos de longa data mantinham em conjunto, como as suas habilidades se complementavam e como confiavam um no outro. Já Edolon, imaginava ter um guia que o orientasse, ou pelo menos um cavalo que soubesse os trilhos a que estaria destinado. Bem não se podia queixar e estar sempre a lamentar-se quem é que mais tem um leopardo, e, além disso, há a Triny.
Enquanto conversavam, o aroma das sandes fazia-se sentir, ficando mais intenso. Apolíneo serviu primeiro, Edolon:
— Primeiro para Edolon que é o nosso ilustre convidado.
Logo que Dionísios provou a sandes, declarou:
— Retiro o que disse, eu não era nada sem as sandes de Apolíneo, ele é a felicidade do meu estômago.
— O prazer da memória está na satisfação do corpo —continuou Dionísios, sorrindo.
Edolon, perplexo pela naturalidade de Dionísios e Apolíneo pensava:
"Provavelmente, o corpo cria registos, que nos ajudam a desenvolver a perceção de acontecimentos futuros. O prazer corporal como criador de memórias, não é nada desagradável, à primeira vista.
Nem só de pão vive o homem, talvez a massa que forme a identidade seja também a amizade e o amor. Todas as experiências podem ser encorajadoras, para a formação de uma memória. Possivelmente o corpo é a massa, a memória o fermento e a identidade o pão, que nos define."
— Está bom, posso não ter memória, mas a minha boca nunca irá esquecer este sabor — disse Edolon, sorrindo e tentando integrar-se no ambiente.
Estava na hora, indicada pelo mestre, e dirigiram-se ao salão, onde todos já se encontravam, o mestre disse:
— Foi por este momento que treinamos, durante anos, não será o último, mas a guerra começou, vamos vencer — ergueu o punho em sinal de vitória
— A escolha será vossa, — ele continuou. — Iremos enfrentar forças desconhecidas que tentarão corromper-nos, mas só assim poderemos descobrir o que está por trás de tudo isso. Este é o preço a pagar pela verdade. Se aceitarem, preparem-se para a viagem. Ela será difícil e perigosa. E, acima de tudo, terão de estar preparados para enfrentar o que quer que seja que encontrem pelo caminho.
Olharam uns para os outros, e então, sem dizer uma palavra, tomaram a decisão. Eles sabiam que não poderiam ficar parados, enquanto o mal se espalhava pelo mundo. Tinham de agir.
Niobe, disse:
— Vamos à luta, juntem-se todos, para Apolíneo nos conduzir. Corvos anuncia a chegada de uma nova era de escuridão e medo, onde os seres humanos serão escravizados pelas forças ocultas, mas estaremos juntos para o impedir!
Edolon, não mais iria esquecer o momento: "É a memória que nos permite conectar experiências existentes e criar uma ideia de continuidade, ao longo do tempo, para formar a identidade. Quero lutar!" Tinha mais esperança em ganhar experiência do que sentia medo, já tinha sentido medo, com os corvos, agora queria lutar, pelos amigos e principalmente por si, ter algo que recordar, algo para contar.
Elaboraram um círculo à volta de Apolíneo, uma luz branca expandiu-se e se contraiu, deixando o salão vazio.
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