XLV
Izzy
Finalmente chegou o dia do Antony retirar a tala. Por mais que eu não tenha me mostrado muito animada em vir com ele ao médico, eu não saberia expressar o quanto isso me deixa feliz.
Em alguns minutos ele vai sair daquele consultório, e será um homem livre de novo.
Será que agora que tudo voltará ao normal, ele ainda vai lembrar que eu estou por aqui? Ele poderá voltar para as noitadas que costumava ter, apesar da Crystal comentar que isso não era mais um costume constante dele, mas depois de ter passado todos esses dias sendo obrigado a ficar preso em casa, não me surpreenderia ele correr para fora de casa assim que pudesse.
E agora que eu não tenho mais motivos para estar tão próxima dele, possivelmente serei deixada de lado. Não tenho como negar que isso me entristece, e muito.
Sentada em um banco no corredor, ao lado do consultório, eu penso no que realmente farei depois que a festa da Crystal passar. Voltarei para a Guiana Francesa? Ficarei por aqui e cursarei a faculdade? Que curso eu faria? No que eu realmente me encaixo?
São tantas questões, que nem sei por onde começar. Por mais que eu saiba que uma graduação seja importante, nenhum curso me atrai de fato, mesmo que eu ache alguns bem interessantes, quando penso a longo prazo, sempre me pego suspirando pesarosamente.
E é exatamente assim, que estou me portando agora, suspirando pesarosa.
- Izzy...!?
Sou tirada de meus pensamentos maçantes por um Antony bastante sorridente.
Ah...esse sorriso é a minha desgraça com certeza.
- Antony!? - digo automaticamente, ainda encarando aquele sorriso.
- Está tudo bem? - pergunta curioso.
- Hã...sim!
- Podemos ir?
Só então olho para sua perna, e volto a realidade.
- Ah, desculpe. Eu estava...com a cabeça longe.
- Imagino que bem longe. - volta a sorri.
- É...
- Então vamos?
- Vamos!
No caminho de volta, ele parece bastante satisfeito em poder dirigir outra vez. Pela manhã, quando saíamos de casa, fui surpreendida pelas chaves do carro dele, que argumentava que não queria ter que pegar táxi de novo, e eu quem estaria responsável por nos levar em segurança, e na volta ele garantiria isso. Pelo menos foi o que ele me garantiu.
- Você está muito pensativa hoje. - ele observa.
- Você acha?
- Claro que sim. Geralmente é difícil fazer você ficar calada. - brinca.
- Ah, então você acha que sou tagarela? - entro na brincadeira.
- E quem não acha? - continua.
- Você anda bem atrevido. Não acha? - o encaro inquisitiva.
- Estou apenas relatando um fato. Nada mais. - sorri.
Ele sempre consegue fazer isso. Fazer com que eu me esqueça de tudo o que me preocupa, apenas com um sorriso. Imagina então quando se comporta assim, como se já tivesssemos intimidade de longa data.
- O que se passa nessa cabecinha, que faz com que você fique tão inerte? - questiona.
- Nada.
- Nada? Não creio que você fique tão pensativa por nada.
- Eu só...
A princípio penso em compartilhar parte de minhas questões internas, mas opto por me manter calada.
- É sobre o que houve no outro dia? - em parte sim. Mas não quero falar sobre isso. Não mesmo. - Sobre o nosso...beijo?
- Não tem nada a ver com isso. - desvio meu olhar.
- Izzy...
- Eu não quero falar sobre isso.
Quando entramos na garagem, eu me apresso em tirar meu cinto de segurança. Não pretendo dar tempo a ele para insistir nisso.
- Izzy, nós precisamos conversar sobre isso. - ele diz assim que estaciona o carro.
- Não, nós não precisamos.
- Izzy...Izzy!?
Saio do carro o mais rápido que posso.
Antony
Eu não posso deixar as coisas do jeito que estão. Isso está me deixando inquieto, e é evidente que está afetando ela também. Mas ela está sendo teimosa, eu não entendo o porquê.
Saio do carro às pressas, e consigo alcança-la assim que ela dá a volta no carro.
- Izzy!? - eu a seguro pelo braço.
- Por favor Antony, me deixa ir.
- Eu não entendo porquê você está fugindo disso, se está claro que está te afetando. - ela puxa o braço, e se solta.
- É melhor deixar tudo como está. Não quero sofrer com isso, mais do que já estou sofrendo.
Sofrendo? Ela está sofrendo por uma atitude que eu tomei? Então eu estava certo, as coisas não são mais como costumava ser.
- Olha Izzy, me desculpe pelo que eu fiz...
- Não! - sua voz é praticamente um lamento. - Não diga...por favor.
- Eu não sei...
- Aquele beijo foi tudo o que mais desejei por muito tempo, o que eu mais sonhei em muitos anos, o que eu mais quis em muitas de minhas fantasias...- seu olhos marejados demonstram a intensidade de cada palavra que diz. - E se você disser que aquele momento, aquele beijo, estar comigo daquela forma...se disser que foi um erro eu não sei o que seria de mim.
- Izzy...
- Eu não quero ser, ou fazer parte do erro de alguém...eu mereço e preciso, em algum momento, ser o acerto de alguém. Mesmo que esse alguém não seja você.
- Izzy...- me aproximo calmante dela, e pego suas mãos. - Eu jamais tive a intenção de dizer que havia sido um erro.
Seus olhos nos meus demonstram confusão ao ouvir minhas palavras, e lançam em seu rosto lágrimas de uma agonia que não pensei estar presente dentro dela nos últimos dias.
- Eu pensei que pudesse ter sido precipitado, mas jamais um erro.
- O quê? - seus lábios trêmulos pronunciam.
- Eu quis aquele beijo, eu quis estar com você, eu quis você...- toco seu rosto, e passo calmamente os dedos por suas lágrimas, secando-as. - Eu já não conseguia mais pensar em outra coisa que não fosse beijar você. - toco seu nariz com o meu, me aproximando cada vez mais de sua boca.
- O que quer dizer...? - questiona ofegante.
- Durante essas semanas em que estivemos juntos, eu passei a desejar cada vez mais ouvir sua voz, o seu sorriso, estar com você, e receber toda a sua atenção.
- Antony...
- Eu gosto de você Izzy...e quero muito beijar você agora...
Ela fecha os olhos, e inclina levemente a cabeça em minha direção, então levo a minha mão até sua nuca, e por fim beijo sua boca.
A suavidade que ela coloca suas mãos sobre meus ombros, indicam que ela tem medo; talvez medo de que aquilo não seja real, ou talvez tenha medo que eu esteja confuso, e tudo não passar de engano. Então tento deixar tudo ainda mais claro.
- Eu gosto mesmo de você Izzy, e quero mais beijos como aquele, ou como esse...- volto a beijá-la.
Envolvo o outro braço em sua cintura, e puxo contra mim, para que ele possa sentir que realmente estou ali, que tudo aquilo é real.
Ao fim do beijo, eu beijo também sua bochecha, e seu pescoço, antes de me enterrar em seus cabelos, e por fim abraçá-la forte.
- Eu quero você Izzy. Não como um erro, e sim como um acerto. Quero você ao meu lado.
- Antony...
Ela me abraça forte, e deita sua cabeça em meu ombro.
- Eu também quero você. Mais do que tudo!
Depois do que houve no estacionamento, a Izzy não desgrudou de mim. Quando subimos, eu tomei um banho e vim para a varanda, em seguida ela veio também, sentou ao meu lado, e permaneceu abraçada a mim. Até que adormeceu. Com sua cabeça sobre meu peito, eu deixava leves carinhos, mantendo-a tranquila.
Quando eu poderia imaginar estar assim com ela? Nunca. Mas aconteceu, não sei como, mas nesse momento, isso me deixa feliz. Me pego sorrindo ao olhar para seu rosto calmo e sereno sobre meu peito.
Suavemente ela desperta, e a primeira coisa que faz, é olhar pra mim. Talvez seja para ter certeza de que tudo aquilo não tenha sido um sonho.
- Eu ainda estou aqui.
Ela apenas sorri. Então se aconchega mais em mim, e coloca a cabeça na curva do meu pescoço.
Então, de um segundo pra outro, ela levanta em um sobressalto.
- O que foi? - pergunto confuso.
- A Crystal!
- O que tem ela?
- Ela chegou em casa. - se senta na outra ponta do sofá.
- E qual o problema nisso? - pergunto ainda sem entender.
- Ela não pode saber sobre o que nós temos. Pelo menos ainda não. Eu vou contar, mas não agora.
Eu não sei qual é o problema da Crystal saber, mas se ela precisa de tempo pra contar, não vejo problema. Mas a questão é...
- E o que nós temos?
Ela me encara inicialmente perdida, depois parece convicta.
- Isso! - ela aponta pra mim, depois para si.
- Isso?
- Você sabe do que estou falando! - cochicha.
Eu me aproximo dela, mas ela não se move. Então coloco minha mão em sua nuca, e a puxo para sussurrar em seu ouvido.
- Não, Izzy, eu não sei. Você pode me explicar? - provoco.
- Não consigo. - diz baixinho.
- Então com esse nosso isso, eu poderei beijá-la, abraçá-la e...- deslizo suavemente meu nariz em seu pescoço. - tocá-la sempre que eu quiser? - vejo a pele do seu pescoço arrepiar.
- Sim...- responde baixinho e ofegante.
- Então isso, quer dizer que você aceita namorar comigo?
Ela se afasta, e olha em meus olhos totalmente incrédula.
- Na-namorar? - eu apenas afirmo com a cabeça. - Está falando sério?
- Com certeza estou.
- Sim! Claro que sim. - ela me abraça empolgada, mas logo me solta, e olha para dentro do apartamento. - Eu aceito. Mas não pode se comportar assim quando a Crystal estiver em casa. - diz séria.
- Mas eu queria tanto te beijar agora...- continuo a provocá-la me aproximando novamente.
- Antony! - se levanta rapidamente. - Estou falando sério.
Eu não consigo resistir a essa reação dela, e caio na gargalhada.
- Você é realmente única, Izzy.
- E você, - ela aponta o dedo pra mim. - Vai me pagar por isso.
É tão bom o jeito como ela eleva meu humor. Eu não consigo resistir em provocá-la, e ver esse seu jeito arisca, me arranca vários risos.
- Eu vou ver a Crystal.
- Não demore, você ainda me deve um beijo. - digo alto.
Ela já estava próxima a porta, mas volta e desfere um tapa no meu braço. E eu só consigo continuar rindo.
- Caramba Antony! - corre para dentro, não me dando mais chances de provocá-la.
E para um dia que comecou com incertezas, ele está fluindo muito bem com ações concretas.
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