2. Vou morrer
Vou morrer. É isso, eu vou morrer.
O tum, tum, tum incessante nas caixas de som. As luzes. A fumaça. Os monstros ao meu redor. Um garoto que gira o próprio intestino como se fosse uma bolsinha. Fantasmas e demônios e zumbis e outras criaturas horripilantes.
Pouco mais de uma hora na festa e já estou tonta e sem ar e parece que vou cair. Quando a náusea sobe de uma forma que torna vomitar quase inevitável, corro para o pátio externo e me apoio na mureta que impede que eu caia alguns metros sobre o gramado do jardim.
E respiro. Fundo.
— Você está aí — minha amiga fala com a voz embargada, enquanto se apoia ao meu lado na mureta, aos tropeções. Com o impacto, a faca de mentira nas costas balança como Maria-Mole. — Procurei você por tooooodo canto.
— Um-rum — resmungo, olhando com o canto do olho para ela, me sentindo melhor ao ar livre. — Na boca do Rogério é que não estou.
Minha amiga dá um arroto sonoro e ri.
— Nem num copo de cerveja — completo.
— Ah, meu Deus — ela diz.
— Desculpa — começo, com um tom mais suave. — Não queria ser tão dramática. Mas é que não conheço ninguém mais lá dentro... ou acho que não conheço. Difícil de saber com todas essas máscaras... E aí você meio que me abandonou para dar uns pegas no... E nada de cosplay de Shawn Mendes...
— Ah, meu Deus! Aquele não é...? — Carol começa antes de se interromper com mais um arroto.
Olho sem expectativas para a direção geral que minha amiga encara de olhos arregalados.
De supetão, me abaixo e caio sentada por trás da mureta.
Apoio minhas costas na pedra gelada, enquanto ofego, tentando pensar em como escapar. Aí lembro do lençol e rapidamente o puxo de volta para cobrir meu rosto.
De todas as pessoas, ele não poderia estar aqui.
Carol se ajoelha desajeitada ao meu lado.
— Tá tudo bem? — pergunta, parecendo repentinamente mais sóbria.
— É, Rebeca, o que foi? Você está branca como um fantasma! — Rogério fala por trás dela.
Carol revira os olhos, enquanto ele ri sozinho do próprio comentário.
— Ele beija melhor do que faz piada — minha amiga se justifica. — Escuta... Aquele não é o baterista gatinho da sua igreja?
— Pior do que isso — sussurro, apavorada, tentando olhar por cima do ombro pelas frestas da mureta. — Cadê ele?
— Quem é ele? — Rogério se aproxima e pergunta, com humor na voz.
— Ninguém. — Carol diz apressada. — Fica na tua.
Por debaixo do lençol, aperto os olhos e meto as palmas das mãos sobre meu rosto.
— Ninguém? — O sorriso na voz de Rogério me apavora. — Sempre quis conhecer ninguém! Acho que vou me apresentar para saber mais a respeito.
— Vai o caramba — Carol ralha, puxando o braço do rapaz para baixo.
— É o filho do pastor da minha igreja — confesso, desesperançada.
— Mas se ele está aqui e não deveria, então isso significa que os dois estão ferrados juntos, certo? — Minha amiga relembra.
— Eu sei! — dou um grito sussurrado. — Eu sei... Não sei! Não sei. O Timóteo não é do tipo que vem numa festa escondido. Não sei...
Rogério gargalha e quero espancá-lo.
— Tá... — O tom de voz da Carol é resoluto. — Nós vamos entrar. Você vai ficar com sua fantasia de Gasparzinho e nós vamos nos divertir, como planejamos, tá?
Engolindo seco e sem voz, balanço o rosto efusivamente, na esperança do gesto ser expressivo o bastante para ficar visível do outro lado do lençol.
— Aliás, que fantasia é aquela, gente? — minha amiga resmunga antes de sua risada ser engolida pelo som explosivo da festa no salão que adentramos.
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