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A carta pairava na mão de Loreta, a dúvida do que poderia haver nela e o medo do que fazer após lê-la. A mesma se encontrava em seu quarto, usava um vestido de mangas curtas, florido e rosé, um palmo acima do joelho e levemente rodado, seus cachos cheios de um longo cabelo castanho, envoltos por uma faixa combinando com o vestido. Sentada sobre a cama, com todas as cartas próxima a ela, em ordem crescente para que ela lesse caso precisasse.
Um súbito medo surgiu, ela não queria ler a atual carta, arranjou certa curiosidade sobre as outras, em uma clara fuga, aceitando isso, retirou da caixa a primeira carta, simples, apenas um papel branco dobrado envolto ao cesto de sua menina.
Se esta chegou até você, acredito que a criança sobreviveu.
Espero que quer que seja o leitor desta, tenha o mínimo de coração bom, cuidando e auxiliando Mariel.
Eu não posso, julgue-me, mas a sociedade não permite-me cuidar de uma bastarda.
A mãe morreu ao seu nascimento, adquira doença durante a gestação.
Creio piamente que a menina adquiriu alguma sequela.
Perdoe-me pela frieza nas palavras e pelo modo em que lhe incito, mas é o que posso oferecer no momento.
Cuide dela, é o que peço.
Sem mais
G.V
Fechou o simples papel, o passando para trás, cumpriu o que lhe pediram, mas jamais entendeu o porquê das palavras. Sentia-se entre a cruz e a espada, por um lado sentia certo rancor por tais palavras. Por outro sentia-se grata pela existência de Mariel em sua vida, pensava sobre contar sobre tais cartas. Puxou a próxima, onde recebeu quando ela estava para fazer cinco anos.
Olá, como vai? Estou tentando ser menos frio. Ok, isso é estranho.
Continuando, com alguns telefonemas descobri que Mariel ainda continua nesse recinto, perguntei sobre a doença e suspeitam de uma cegueira, sim?
Bom no outro envelope há uma quantia, peço que a levem para um médico especializado, acredito que será o suficiente, há algo para um presente.
Penso que ela deve estar acostumada e que a tratam muito bem, não pretendo vê-la ou coisa do tipo, pretendo manter minha imagem na sociedade. Julgue-me o quanto quiser. E pretendo não me envolver muito.
Ela logo irá fazer cinco anos e creio que poderemos manter essa ordem cronológica de cinco e cinco anos.
Espero que use a quantia como indicado.
Não espero respostas, por favor, não o faça.
Sem mais.
G.V
Terminou a leitura, devolvendo a carta ao envelope, passando o dedo indicador sobre o brasão que havia no fecho da carta, em cor vermelho queimado, quase terracota, com um G e um V entrelaçados. Pensava em como deveria ser o nome deste senhor. Nunca lhe respondi nenhuma de suas cartas, mas as vezes gostaria.
Guardou a carta atrás do bilhete e começou a segunda, onde recebeu com duas semanas antes do aniversário de dez anos de Mariel.
Olá, dez anos, certo? Aqui estou eu.
Como no anterior, descobri que nada mudou sobre a doença, mas que usam métodos com cores, sim?
Lhe envio dinheiro para o médico e para um presente.
Ela ja lê? Creio que não, em uma viagem descobri sobre o braile e livros em braile, há uma quantia de cerca de quinhentas libras para comprar livros deste tipo.
Bom estou meio sem tempo e nem sei porque escrevo isso.
Lembre-se sem respostas.
Sem mais
G.V
Loreta termina a carta, lembrando que sua menina aprendera a ler com seis anos, onde ela ja havia lido sobre o braile e lhe comprava coisas coloridas pensando exatamente na leitura e cálculos. Havia sido na mesma época em que lhe cortou os cabelos e fez uma franja que quando cresceu ficava sobre os olhos de Mariel, que dizia sentir cócegas sempre. Nesse instante ela retira da caixa o plástico, onde havia pequenas mechas do cabelo de Mariel. As vezes ela se sentia uma boba por guardar tantas coisas, olhou os desenhos, eram sempre coloridos e excêntricos, isso sempre fazia se perguntar o que passava na cabeça da Mariel ao desenhar e pintar coisas como essas. Passou o dedo sobre o brasão fechando a carta e repetindo o gesto anterior, retirando a terceira carta.
Aqui estou eu. Quinze anos. Uau! Quanto tempo se passou. Estou velho e penso sobre conhece-la, mas sou rancoroso demais, medroso demais, nunca aceitei uma carta sua. Imagino que seja uma mulher, mas que não seja a Sra Lucrécia.
Segue o valor para o que você sabe o que. Não sei sua idade e por um súbito momento lhe enviei algo como um pagamento, não se ofenda, ou se ofenda.
Eu não me importo, creio que estou bêbado, estive na festa de meu amigo. Bom isso você não precisa saber.
Como ela está? As vezes pego-me pensando em como ela é.
Mas sinto lhe dizer que antes dela, está a sociedade, não sei se entende, não a sociedade no geral. Mas mantenho uma visão forte e correta para meus sócios e uma bastarda quebraria meu mandato, tornando-me um hipócrita. Me odeie o quanto quiser.
Imagino como deve ser as coisas, ela gosta do quê? Como é? O que faz?
Essas dúvidas vem me atormentando, mas sou orgulhoso.
Sem mais.
G.V
Essa carta lhe trouxe certa raiva, um pagamento? Equivalente a todos os anos? Isso a irritou de forma grotesca, lembra-se que foi uma temporada vazia, o orfanato tinha épocas assim, épocas que não havia criança nenhuma. Lucrécia era boa de lábia, como um vendedor e uma falsa mercadoria.
Nesta temporada, Lucrécia quis viajar. A cozinheira tinha uma irmã doente e fora visitá-la. Ficando somente Loreta e Mariel no recinto, com o dinheiro do presente comprou brinquedos, tintas, telas e roupas. A levou ao médico e descobriram que poderia ser cirúrgico, o caso, mas havia altas chances de não ser um sucesso. Com o tal pagamento comprou um fino colar de prata com uma turmalina negra, pequena que formava um pequeno coração. E com o que sobrou viajaram para a praia, Mariel amava a sensação de areia e o mar, quase não voltaram. Nessa época ela se questionou por que raios nunca havia adotado sua menina. Isso era um ponto que a surpreendeu. É! Por que nunca havia pensado em adota-la? Era muito bem formada em enfermagem e poderia ter sustentado uma vida melhor a ela, sempre houve dinheiro guardado e daria os mesmos cuidados com ou sem o dinheiro enviado pelas cartas. Como perdera tanto tempo! Dezessete anos! E perdeu sua menina, por tanta ingênualidade. Não podia crer em como foi idiota em nunca ter pensado nessa possibilidade.
Olhou a última carta com certa raiva, sabia que algo estava errado, pois a próxima deveria ser aos vinte anos e não aos dezessete, mas o que estaria errado?
Creio que se está carta chegou antes dos vinte, é porque temos problema.
Desculpe, não escrevo muitas cartas e você é quase uma confidente.
Estou velho e doente, uma fraqueza no corpo, ossos doem tanto que mal aguento água do banho.
Enfim, estou um velho e doente.
Sem herdeiro para minha fortuna, não sei se o problema foi comigo ou com ela.
Apesar que nunca fomos bons em nada, um mero casamento de negócios, creio que você não queira que eu envolva Mariel nisso, quer?
Bom, eu não sei se gostaria de vê-la, que tipo de pai faz isso?
Se quer saber todos os meus sócios estão comigo, são fiéis, então nisso não me arrependo. Me odeie o quanto quiser.
Mas é o fato é que a morte se aproxima, se recebeu antes dos vinte talvez esteja mais próximo ou já concluinte.
Aires sempre foi meu braço direito, desde menino, um filho que nunca tive.
Deixarei minha empresa e minha casa principal a ele.
Precisamente cinquenta por cento das ações da empresa é dele, dez por cento para a esposa. Os outros quarenta é do acionistas.
Cinquenta por cento de todo meu dinheiro está nesse envelope junto de três escrituras de casas e um chalé. Sou cruel eu sei, mas sempre pensei nela.
Vinte e cinco por cento para a esposa com duas escrituras de propriedades.
Aires com a propriedade principal e os outros vinte e cinco para Aires Caperini.
As vezes gostaria de ter pedido respostas, saber seu nome, sinto se estou sentimental, pense que é a morte cada vez mais próxima, as vezes sonho como uma garota como ela e fico pensando será? Creio que fui cruel e o tempo me devolveu em dobro. Penso na mãe dela e o que faria se soubesse, foi um erro, mas financeiramente eu fiz minha parte. Me apunhale mas é a verdade, a quantia dada sempre fora bem gorda, não me arrependo, mas confesso ter certa curiosidade.
Mas o tempo passou, ela ainda está como você, imagino
Que a adotou. Sou grato pois sei que o dinheiro foi bem usado.
Continue com sua missão, gostaria que respondesse algo, mas não sei se estou vivo para ler.
A papelada está valendo a partir de minha morte. Não é necessário assinar nada, entendo que devem usufruir disso sem qualquer envolvimento, eu até prefiro assim.
Obrigada pela confidência, por ouvir minhas lamúrias, por nunca ter vindo atrás de mim e me recriminar.
Eu realmente sou grato, apesar da minha frieza e rancor.
Nessa última frase que pretendo escrever, deixo lhe a pergunta:
Você ja falou de mim para ela?
Gostaria da resposta, no endereço escrito ao verso.
Sem mais.
George Vistovo.
A carta caiu de sua mão em completo choque. Pai? Ela sempre suspeitou, isso era um fato, mas a verdade, a comprovação lhe deu um tipo de choque que a mesma não esperava.
Ela abriu com certo medo o outro envelope, havia quatro, três dentro de um só. Abriu o primeiro envelope que havia o número 1 em cor dourada, havia cinco conjuntos de dinheiro no envelope, havia um papel escrito: cada um contém quinhentas mil libras.
No envelope com o número 2 estava as três escrituras, um chalé na praia, uma propriedade no centro e uma propriedade no exterior. Aquilo a assustava cada vez mais. Mas e o outro envelope? A curiosidade se atiçou, o que haveria ali? Com certa agilidade abriu o quarto envelope, havia duas fotos da mãe, um anel com o mesmo brasão das cartas, um anel fino de ouro branco com uma turmalina negra, pequena por cima, um pequeno camafeu de prata com a foto da mãe e um espaço para colocar outra, vazio. Levantou em súbito pegando um foto onde havia as duas com Mariel pequena, uma foto bonita, pequena por erro que nunca entendeu direito, mas coube em perfeito no local do camafeu. Havia um bilhete no envelope:
Para ela saber que fez parte de algo, que tem algo, mesmo que pequeno.
George Vistovo
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