Capítulo 10
|| Blair Stone ||
A solidão dentro do alojamento começou a se tornar incômoda assim que Cassius saiu para a reunião. Eu tentei ignorar a inquietação, me forçando a sentar no sofá com um dos livros perfeitamente alinhados na estante de madeira. Mas a curiosidade era um sussurro insistente no fundo da minha mente, crescendo, me chamando.
Eventualmente, eu cedi.
Levantei-me e comecei a explorar o espaço. O alojamento era simples e funcional, como tudo ali dentro. Além da sala integrada com a cozinha, havia um banheiro e três cômodos fechados. Um deles, um quarto, que obviamente era de Cassius. O outro, um escritório, com poucos móveis e pilhas de documentos organizadas com precisão militar. Mas o terceiro...
O terceiro era diferente.
Caixas lacradas estavam empilhadas ali, todas ostentando a insígnia oficial do governo. Um frio percorreu minha espinha ao me aproximar. Cada uma possuía etiquetas informando seu conteúdo, algumas com identificações técnicas que não faziam sentido para mim. Mas uma em especial me fez hesitar.
CLASSIFICADO. RESTRITO. ACESSO APENAS À AUTORIZADOS.
Meu coração acelerou. Meus dedos roçaram a borda da caixa, e uma onda de adrenalina percorreu meu corpo. Eu deveria parar. Eu deveria respeitar o limite. Mas a verdade era que, quando se tratava de Cassius, eu sempre quis mais. Mais dele. Mais da sua história. Mais do que ele relutou em mostrar.
Prendi a respiração e deslizei os dedos pelo lacre, sentindo-o ceder sob meu toque. O primeiro documento que puxei era denso, recheado de informações confidenciais.
MISSÃO: ORION
STATUS: CONCLUÍDO
OBJETIVO: ELIMINAÇÃO DE AMEAÇAS INTERNACIONAIS
NÚMERO DE ALVOS: 240
Meus olhos percorreram os detalhes, e uma pressão começou a se formar no meu peito. Nomes, coordenadas, relatórios de execução. Era metódico. Preciso. Frio.
Cassius não era apenas um agente.
Uma onda de náusea subiu pela minha garganta. Ver isso, ver a precisão cirúrgica com que ele havia eliminado cada alvo, fez meu estômago revirar.
Respirei fundo, forçando minha mente a processar tudo. Eu o conhecia. Conhecia sua lealdade, sua intensidade, o peso silencioso que sempre carregava no olhar. Mas agora, tudo parecia assumir um novo significado.
Meu peito subia e descia em um ritmo descompassado enquanto folheava as primeiras páginas. Eram registros de missões. Cassius estava lá, em cada uma delas. Não apenas como um nome citado, mas como a peça central.
Documentos. Relatórios. Fotografias.
O primeiro documento descrevia execuções. Cassius é calculista, frio e eficiente. Ele não hesitava. Ele era um predador treinado, um homem moldado para ser implacável. Cada nome riscado da lista era uma vida apagada por suas mãos.
Meu coração batia acelerado, mas a curiosidade ainda pulsava com força dentro de mim. Havia mais dois relatórios ali, e uma parte de mim gritava para parar, para fechar aquela caixa e fingir que nunca a tinha aberto.
Mas eu já tinha cruzado a linha.
Engoli em seco e puxei o segundo documento. As letras impressas pareciam pesadas, como se cada palavra carregasse um fardo impossível de suportar.
MISSÃO: SPECTRUM
STATUS: NÃO CONCLUÍDA
OBJETIVO: INFILTRAÇÃO E RECUPERAÇÃO DE ATIVO
RESULTADO: FALHA PARCIAL
O segundo relatório era diferente. A missão era de resgate. O tom do texto já não era tão clínico, tão brutal. Havia falhas. Havia risco. Mas alguma coisa naquela missão não foi concluída como deveria.
Percorri rapidamente as linhas de texto até encontrar o nome da pessoa que ele deveria trazer de volta.
CODINOME: SERAPH
Franzi a testa. Quem era Seraph? E por que o relatório dizia falha parcial?
Continuei lendo. O documento descrevia que Cassius havia conseguido infiltrar-se na base inimiga e encontrar Seraph, mas algo havia dado errado. Apesar de Cassius ter conseguido tirá-lo de lá, a missão não foi considerada um sucesso completo.
"Agente Davenport demonstrou comportamento instável após a extração. Pedido de afastamento negado. Ordem para continuar operações imediatamente."
Cassius pediu afastamento?
Minhas entranhas se reviraram. Peguei o terceiro e último documento, já temendo o que encontraria.
MISSÃO: NÊMESIS
STATUS: NÃO CONCLUÍDO
OBJETIVO: EXECUÇÃO DE AMEAÇA INTERNA
ALVO: CLASSIFICADO
Diferente dos outros relatórios, este continha partes censuradas, tarjas pretas cobrindo informações cruciais. Mas o que eu conseguia ler já era perturbador o suficiente.
Cassius recebeu a ordem de eliminar uma ameaça interna. Alguém dentro do próprio governo. Mas a missão nunca foi concluída.
Por quê?
Passei os olhos rapidamente pelas páginas, buscando qualquer pista. Então, meu olhar travou em um único parágrafo, uma única frase que fez minha pele gelar.
"O agente recusou-se a cumprir a ordem."
Meus dedos apertaram o papel.
O ar parecia rarefeito dentro daquele cômodo. De repente, todas as peças da minha visão sobre Cassius começaram a se rearranjar de uma forma nova, assustadora. Ele não era apenas um agente do governo. Não era apenas um agente altamente treinado.
Cassius não era apenas o homem que eu amava.
Ele era um executor.
Uma sombra se projetou sobre os papéis, e eu congelei.
— Não era dessa forma que planejei revelar essa parte da minha vida.
A voz grave e contida de Cassius cortou o silêncio como uma lâmina afiada.
Meu corpo reagiu antes da minha mente. Virei-me lentamente, minha pele arrepiando ao sentir sua presença atrás de mim. Meu coração estava acelerado, pulsando contra as costelas como se quisesse escapar.
Cassius estava parado na entrada do cômodo, a postura cautelosa, os olhos indecifráveis. As sombras da iluminação fria acentuavam as linhas do seu rosto, tornando-o quase esculpido.
— Cassius… — falei sentindo meu coração galopar pelo um caminho desconhecido — O que é isso?
Ele não respondeu de imediato. Seu olhar prendeu-se ao meu, analisando cada mínima reação minha, como se tentasse antecipar o que eu faria a seguir.
— É o que você está vendo. — Sua voz era grave, sem rodeios, mas não havia arrogância ali. Apenas uma verdade crua.
Meus dedos apertaram as folhas contra mim.
— Missões. Execuções. Alvos eliminados. Você matou pessoas, Cassius.
Ele fechou os olhos por um breve instante, como se já esperasse por isso.
— Sim.
A confirmação caiu entre nós como um trovão.
Engoli em seco.
— Por quê?
Ele inclinou levemente a cabeça, seu olhar queimando sobre mim.
— Porque era necessário.
Senti meu estômago revirar.
— Necessário? — Minha voz subiu uma oitava. — Você fala como se… como se fosse algo mecânico, como se...
— Como se fosse um dever? — ele completou, sua expressão fechada. — Porque foi.
Fechei os olhos por um instante e respirei fundo quando era confrontada com o meu próprio senso de justiça. Ele estava parado ali, a poucos passos de mim, mas parecia mais distante do que nunca. A expressão impassível que ele usava como armadura não escondia o peso invisível que carregava nos ombros.
Respirei fundo, tentando organizar os pensamentos antes que o turbilhão me engolisse.
— O que foi que aconteceu de diferente na missão Spectrum e Nemeses? Quem é Seraph? — perguntei, minha voz mais firme do que eu esperava.
Cassius não respondeu de imediato. Seus olhos deslizaram até um ponto indefinido da parede, como se estivesse buscando as palavras certas — ou se decidindo se as diria. Quando finalmente falou, sua voz saiu grave, carregada de algo sombrio.
— Spectrum foi uma missão de resgate e eliminação. — Ele fez uma pausa, seus dedos fechando-se em um punho ao lado do corpo. — Seraph era o codinome do meu amigo que foi capturado e estava sob a mira do inimigo.
Um frio percorreu minha espinha.
— Seu amigo?
Ele assentiu lentamente, os olhos escurecendo com lembranças que eu não conseguia alcançar.
— Estava ferido e debilitado. Quando o localizamos, havia poucas chances de tirá-lo de lá sem chamar atenção. Eu solicitei ordem para recuar e levá-lo comigo imediatamente.
Cassius parou, respirando fundo como se tentasse conter algo dentro de si.
— Mas foi negado.
A incredulidade se espalhou pelo meu peito como veneno.
— Negado? Como assim?
Os lábios dele se curvaram em um sorriso torto, sem vida.
— A prioridade era eliminar a ameaça, independentemente do custo. Vidas estavam sendo ceifadas pelas mãos dos terroristas… — ele desviou o olhar, sentindo a dureza da recordação e eu senti o nó se formar na minha garganta. — Mulheres, crianças, homens… vítimas de um regime que não hesitava em massacrar inocentes.
O silêncio entre nós pesou como chumbo. Sentir o ar deixar o meu corpo pesadamente.
— Eu tentei tirá-lo, Blair. Indo contra os meus superiores mas fomos detectados e o confronto foi travado.
Meu coração martelava no peito, cada palavra dele soando como um soco contra minha consciência.
— E então? — minha voz saiu mais baixa do que eu pretendia, como se temesse a resposta.
Cassius passou a mão pelo rosto, os dedos pressionando as têmporas antes de continuar.
— O fogo cruzado começou antes que eu pudesse arrastá-lo para um local seguro. — suspirou baixo — Ameaça foi contida e infelizmente não pude salvar o meu amigo. Foi encerrada como uma falha parcial porque perdi uma boa parte da minha equipe. Conseguimos eliminar a célula terrorista daquela região mas apreensão do armamento militar roubado já havia sido levado.
— Por isso você pediu o afastamento. — deduzi em voz alta.
— Sim. Não consegui lidar com a morte do meu amigo, mas o pedido foi negado.
— Eu… Eu sinto muito, Cassius. — minha voz saiu entrecortada.
Aquelas palavras caíram entre nós como um peso, e a sensação de perda que elas evocaram quase me derrubou.
Ele continuou:
— Nemeses foi para eliminar um superior de alto escalão. Envolvido com o submundo.
Minha respiração vacilou.
— Do próprio governo?
Ele assentiu devagar.
— Alguém que operava nas sombras, usando seu cargo para vender informações confidenciais e manipular operações em benefício próprio. Ameaça interna, foi assim que chamaram e relataram. Recebi a ordem de executá-lo sem deixar rastros.
Minhas mãos se apertaram contra minhas coxas. Algo estava errado.
— Mas a missão não foi concluída.
Cassius passou uma mão pelo rosto, seu olhar carregado de algo que eu ainda não compreendia por completo.
— Não.
Um silêncio pesado se formou entre nós. Não foi uma falha. Ele não perdeu o alvo. Ele…
— Você se recusou a cumprir a ordem.
— Sim.
Minhas entranhas se reviraram.
— Por quê?
Cassius fechou os olhos por um breve momento antes de encarar-me novamente.
— Porque a verdade não era tão simples quanto me fizeram acreditar.
Me inclinei para frente, a tensão crescendo dentro de mim.
— Quem era essa pessoa, Cassius?
— Isso é irrelevante.
— Irrelevante? Você desobedeceu uma ordem direta. Você se colocou em risco. Isso não é irrelevante. — disse expondo minha preocupação.
Cassius permaneceu imóvel, mas seus olhos me perfuraram.
— E você acha que eu fiz isso sem motivo?
Engoli em seco.
— Então me diga qual foi.
Ele respirou fundo, como se estivesse decidido a não dizer, mas então cedeu, sua voz saindo quase um sussurro.
— Porque se eu tivesse apertado o gatilho… teria matado um inocente.
Meu coração parou por um segundo.
— Como assim?
— Eu investiguei por conta própria. Cruzei informações. Encontrei inconsistências. A verdade é que ele não estava vendendo dados. Ele estava tentando expor aqueles que estavam.
Minha mente girava.
— Eles queriam silêncio-lo. — disse o óbvio.
Cassius confirmou com um aceno lento.
— E me usaram para isso.
Minha boca secou.
Cassius era uma prova viva de que até mesmo os homens que carregavam armas sob o pretexto de proteger também eram peças em um jogo muito maior.
— O que aconteceu depois? — sussurrei.
— Eu me neguei a matá-lo. Isso me transformou em um problema. Fui caçado por um tempo. Não diretamente, mas o suficiente para saber que meu tempo estava contado. Se eu não estivesse sempre um passo à frente… — Ele deu de ombros, mas o gesto era carregado de tensão.
— E ele?
— Ele sobreviveu.
Minha cabeça se ergueu rapidamente.
— O quê?
— Consegui tirá-lo de lá antes que outro executor fosse enviado. Ele conseguiu as provas de que precisava e o esquema foi exposto. Toda a rede de infiltrados caiu.
Meus olhos se arregalaram.
— Você salvou a vida dele.
Cassius ficou em silêncio por um momento antes de responder:
— Talvez ele tenha salvo a minha também. — respirou fundo e levou as mãos ao bolso da calça — Esse é o momento que você desisti definitivamente de nós… Blair. — disse, a voz quase um sussurro, como se estivesse temendo a resposta que poderia vir. — Minhas mãos estão manchadas de sangue e meu passado é sombrio.
Eu não podia negar que estava assustada. Não podia negar que tudo aquilo era muito maior do que eu imaginava.
Mas eu também não podia negar o que sentia.
— Eu não vou desistir de você, Cassius.
Seus olhos brilharam por um instante, como se a esperança estivesse ali, lutando para existir. Para permanecer.
— Blair…
— Apesar de estar com o coração cheio de preocupações — continuei, sentindo minha própria voz vacilar — isso não me impede de querê-lo, de senti-lo… e de te amar.
A tensão que Cassius carregava nos ombros parecia se quebrar naquele instante. Ele desviou o olhar, prendendo o lábio inferior entre os dentes, como se estivesse tentando se conter. Como se não pudesse acreditar no que estava ouvindo.
Então, quando voltou a me encarar, vi algo diferente em seus olhos.
Algo bruto. Algo vulnerável.
Algo que ele nunca havia deixado transparecer antes.
— Você sabe o que está dizendo? — Sua voz saiu rouca, carregada de algo que eu não conseguia definir.
— Sei. — Me levantei do chão e dei um passo à frente, encurtando a distância entre nós. — Sei que o homem diante de mim não é apenas um soldado. Não é apenas um executor. Sei que há mais em você do que o passado que tenta carregar sozinho.
Ele piscou lentamente, como se cada palavra minha se infiltrasse em sua alma.
— Não sou um homem simples, Blair — murmurou, a sinceridade crua de sua voz fazendo o silêncio tremer.
— E eu nunca desejei nada simples — respondi, minha voz firme, mesmo enquanto meu coração pulsava em um ritmo selvagem, ecoando a intensidade de cada palavra.
— Meu doce, você me faz tão feliz… — Sua voz saiu rouca, carregada de algo que fez meu peito se apertar.
Cassius encurtou o espaço entre nós, os dedos firmes segurando meu rosto com um cuidado que contrastava com a intensidade no seu olhar. Seu polegar deslizou suavemente sobre minha pele, como se quisesse gravar aquele momento, como se eu fosse algo precioso demais para ser perdido.
— Eu não quero mais viver uma vida sem você ao meu lado — sua voz era densa, carregada de um peso que eu podia sentir no fundo da alma. Seus olhos, sempre tão intensos, refletiam uma verdade crua, uma necessidade que transcendia palavras.
— Você entende o que isso significa, Blair? — Ele se inclinou um pouco mais, nossos rostos tão próximos que sua respiração aquecia minha pele. — Eu não estou falando de algo passageiro. Não estou falando de um momento. Estou falando de sempre.
Meu coração pulsou forte contra minhas costelas, como se tentasse responder antes mesmo de mim.
— Cassius… — comecei, mas a emoção prendeu minha voz por um segundo.
— Essa parte da minha vida é sigilosa, falar é considerado quebra de protocolo. Não esperava revelar a você dessa forma mas nunca esconderia quem de fato sou de você, Blair. — Seus olhos pousaram no meu e meu coração tremeu ao ver algo profundo ali, que só pude entender quando ele sussurrou:
— Fique, me escolha. Porque eu sou totalmente seu desde quando te conheci.
Eu não ia fugir, a resposta estava visível e escancarada para que todos vissem.
— Eu não vou a lugar algum, Cassius. — meus dedos deslizaram pelo seu rosto com ternura e devoção — Eu te amo.
A certeza de que o queria na minha vida ficou mais evidente após descobrir ainda mais sobre a sua vida de agente. Eu ainda estava absorvendo as informações sobre a vida dupla de Cassius. Uma coisa era certa, envolvia perigo e risco de falhas.
Nada era certo.
Isso afligiu o meu coração. O medo de perdê-lo seja pela missões que executa ou pelo que a sua família pode fazer ao descobrir a conspiração para a derrubá-la… me deixa desnorteada só em pensar na hipótese.
Suspirei fundo.
— E Laila? — perguntei o inevitável.
Moralmente ele ainda era comprometido.
— Já tem tudo pronto para o divórcio. — Ele falou sem rodeios, sem hesitação. — Eu iria fazer o pedido depois do festival de luzes e cores, mas… — Ele parou, desviando o olhar por um breve momento antes de voltar a mim. — Os planos mudaram quando eu vi você sair.
Meu peito subiu e desceu em uma respiração trêmula.
— Simples assim? — indaguei descrente — Ela vai aceitar o pedido sem se opor?
— Ela não terá escolha, Blair. — disse — Ou ela assina ou as fotos com o amante dela vão parar na família dela.
Encostei minha testa em seu peitoral pensando, como nossa vida é marcada pelos desvios e pela complicação da vida. Eu não podia me envolver com Cassius até ele resolver essa parte da sua vida.
Suspirei baixinho e levantei minha cabeça para olhá-lo.
— Só poderei estar com você, quando finalmente resolver essa pendência Cassius.
— Eu sei. — disse compreensivo. — Será logo. Já tenho tudo pronto, só preciso da assinatura dela.
Suspirou fundo, seu dedo indicador segurou o meu mindinho em um gesto carinhoso.
— Lembra quando falei que tinha provas sobre aquela noite? — indagou, balancei a cabeça confirmando.
— Eu acredito em suas palavras, Cassius. Não precisa me mostrar nada.
— Eu quero, Blair. — disse decidido — Me acompanhe por favor….
Cassius estendeu a mão para mim, e sem hesitação, segurei-a. Seu toque era firme, quente, uma âncora silenciosa em meio ao caos que nos cercava. Deixei-me ser guiada por ele até seu escritório, onde a atmosfera mudava, tornando-se mais densa, mais carregada.
Ele me acomodou em uma das cadeiras de frente para sua mesa, enquanto se sentava em sua poltrona de couro preta. O som do couro rangendo sob seu peso ecoou no silêncio do ambiente.
Então, sem pressa, Cassius abriu uma das gavetas e retirou uma pasta amarela. Estava lacrada, como se o seu conteúdo fosse algo que deveria permanecer intocado até aquele momento. Ele me entregou sem uma palavra, e ao pegá-la, senti a textura áspera sob meus dedos.
Engoli em seco antes de abrir.
Ao afastar a aba, fui recebida por um choque frio que percorreu meu corpo.
As fotos estavam ali. As mesmas que saíram na mídia, as imagens que viraram manchetes e alimentaram fofocas. Mas não eram apenas aquelas. Meus olhos percorreram os detalhes, captando algo que antes não havia percebido. Os ângulos das fotos, a posição dos corpos… Era uma encenação.
Junto às fotos, havia mais provas.
Dublês. Pessoas contratadas para reproduzir aquela cena com uma precisão assustadora. Tudo milimetricamente planejado para parecer real. Meus dedos apertaram as bordas da pasta quando tirei um laudo médico. Meu olhar correu pela página, absorvendo cada detalhe, cada informação.
A dosagem da substância encontrada no organismo de Cassius.
— Isso é… — minha voz saiu falha, e precisei respirar fundo antes de continuar. — Isso é o que usaram para te drogar?
Cassius permaneceu em silêncio por um instante, observando-me. Então, assentiu.
— Sim. Usada para me apagar.
— Eu sinto muito. — digo, não posso imaginar o que é carregar durante esses anos o peso da traição e da armadilha planejada por sua própria mãe.
— Já passou. — disse sem hesitar. — O que verdadeiramente importa é o que tenho aqui e agora.
— Porque você foi embora sem se despedir?
— Ellen ligou avisando que a mãe havia trancado-a no quarto como forma de punição. — revelou.
— Posso imaginar. Eu vi a forma como ela trata a menina.
— Esse é outro detalhe que terei que recorrer na justiça. Não posso deixá-la nas mãos de Laila.
Me levantei da cadeira em um movimento quase automático, a mente ainda processando tudo o que vira naqueles papéis. Meu peito estava pesado, a garganta apertada, e a única coisa que parecia certa naquele momento era a necessidade de estar perto dele. Dei a volta na mesa, e antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, Cassius estendeu a mão, puxando-me suavemente para seu colo. Seus braços envolveram minha cintura, o toque firme, mas sem pressa, como se estivesse me moldando ao seu corpo, garantindo que eu estava ali, com ele.
Minhas mãos tocaram seu rosto com delicadeza, os dedos traçando o contorno da sua mandíbula forte, o polegar deslizando suavemente pela sua bochecha. Foi um toque de carinho, mas também de reverência. Como se, naquele instante, eu quisesse que ele soubesse o quanto eu o enxergava além do peso que carregava. Cassius fechou os olhos, respirando fundo. Sua pele aqueceu sob meus dedos, e pude sentir a tensão em seus ombros diminuir um pouco. Era como se ele estivesse absorvendo cada toque, guardando aquele momento como um refúgio silencioso em meio ao caos.
— Você não está sozinho nisso. — murmurei, mantendo meu olhar sobre ele.
Seus olhos se abriram lentamente, encontrando os meus com uma intensidade que fez meu coração vacilar. Havia algo ali, algo bruto, vulnerável e ao mesmo tempo avassalador.
— Eu sei. — sua voz saiu rouca, quase um sussurro. — Mas tenho medo de que tudo o que sou, tudo o que fiz, seja demais para você.
Inclinei-me ligeiramente, deixando que nossas testas se tocassem.
— Você é demais para mim, Cassius. Mas não no sentido que imagina. Você é tudo o que eu quero, tudo o que eu escolho.
Havia uma necessidade crescente em meu peito. De cuidar dele, de tirar aquele peso que o assombrava, que o perseguia há anos. Nossos corações estavam marcados pelas cicatrizes do passado, pelos erros que não eram nossos, mas que carregávamos como se fossem. Meus dedos deslizaram suavemente por sua pele, como se pudessem apagar um pouco daquela dor silenciosa. Eu queria encontrar um jeito de libertá-lo, de fazê-lo sentir que não precisava mais lutar sozinho contra os fantasmas que o atormentava. Seus dedos apertaram levemente minha cintura, como se precisasse daquela conexão para se manter firme.
— Um dia não precisaremos nos esconder ou temer pelo nosso futuro. — Ele disse com a postura relaxada, encostado na poltrona, mas seus olhos, tão intensos, me fitavam como se quisessem gravar esse momento em sua memória.
Meu coração apertou. O peso do que vivíamos, das incertezas, das ameaças veladas e das sombras que pareciam sempre nos cercar, tornava aquela promessa ainda mais preciosa.
O futuro era desconhecido e sombrio.
— Eu quero acreditar nisso. — confessei, minha voz saindo como um sussurro entrecortado.
Cassius ergueu uma das mãos, deslizando os dedos pelo contorno do meu rosto, um gesto ao mesmo tempo terno e possessivo.
— Então acredite, Blair. Porque eu não vou permitir que ninguém nos tire isso.
A firmeza em sua voz, a certeza cravada em cada palavra, fez algo dentro de mim estremecer. Eu queria confiar que o destino nos reservaria um caminho menos tortuoso, mas sabia que nada seria tão simples.
— Cassius... — comecei, mas ele me silenciou, seus lábios roçando suavemente os meus.
— Eu vou resolver tudo. — prometeu contra minha boca. — Por nós.
Seus lábios tomaram os meus com uma intensidade que fez meu coração tropeçar dentro do peito. Não havia mais hesitação, apenas um desejo contido por tempo demais, uma necessidade que ia além das palavras.
Cassius me puxou para mais perto, suas mãos deslizando pela curva da minha cintura, firmes, seguras, como se quisesse me fundir a ele. O beijo era profundo, carregado de promessas silenciosas e emoções não ditas.
Meus dedos deslizaram por sua nuca, sentindo a rigidez de seus músculos, a tensão que ele carregava nos ombros. Ele suspirou contra minha boca antes de aprofundar o beijo, como se quisesse me mostrar, sem precisar de palavras, que eu era a âncora que o mantinha de pé. O calor que emanava dele se espalhou pela minha pele, um fogo que me consumia de dentro para fora. Meus dedos se enterraram em seus cabelos, puxando levemente enquanto seu beijo se tornava mais profundo, mais faminto.
Ele inclinou a cabeça, explorando minha boca com intensidade, como se quisesse se perder em mim, gravar cada sensação, cada suspiro. Só existia ele. Seu gosto, seu toque, a forma como seu corpo se encaixava perfeitamente ao meu. Cassius soltou um grunhido rouco contra meus lábios antes de puxar meu rosto para ainda mais perto, aprofundando o beijo até que o ar se tornou escasso, até que tudo dentro de mim gritasse por mais.
Meu coração só faltava se espremer com tanto amor que sentia por ele. Era avassalador, intenso, como se cada batida dentro do meu peito clamasse por ele, como se meu corpo e minha alma soubessem que não existia mais volta. Seus lábios se movendo sobre os meus com uma necessidade crua, desesperada. Quando se afastou, seus olhos estavam carregados de algo que fez meu peito apertar ainda mais.
— Você é tudo para mim, Blair. — Sua voz saiu rouca, carregada de emoção. — E eu nunca mais vou deixar nada nos separar. — prometeu.
*
4118 palavras.... 🔥❤️
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