Capítulo 2 - Em território Somali
Com as caras besuntadas de tinta de camuflagem, a equipe CECOP aguardava Romano junto ao pessoal da aviação ligeira, que iria transportá-los até a base de Djibouti. Eles partiriam em um CH-47 – popularmente conhecido como ônibus escolar voador, devido a sua capacidade de transporte.
Lá chegando, eles embarcariam num C-130 para realizar um salto HAHO direto no ponto X.
Os SEAL e os Mariners, por outro lado, saltariam no ponto Y, ou seja, sobre os alvos em alto mar. Mas, antes, enviariam um de seus HSAC. Alguns poderiam considerar o C-130 tão sutil quanto um elefante numa loja de cristais. Mil vezes os BlackHawk ou os Apaches para missões de ataque surpresa, como aquela. Mas o Hércules era tudo o que dispunham para o momento, dada a natureza da missão. Pelo menos, seria um salto em alta altitude – o HAHO.
Os Atobás vestiam os coletes táticos blindados por baixo do tradicional uniforme verde caqui, com o gorro verde musgo, mais uns trinta quilos de equipamentos. Romano girou o dedo e apontou na direção do helicóptero estacionado ao final da pista, cujas hélices já começavam a girar. Os homens o seguiram em silêncio.
-Só falta uma aeromoça gostosa para nos servir – comentou Nelson, cutucando Dumas nas costelas
Alexandre "Dumas" sorriu, mas Romano podia sentir a sua apreensão. Era a primeira missão do garoto como um Atobá recém aprovado e cabia a ele, como seu líder, fazer com que seu desempenho fosse excelente. Dava pra ver que Nelson já o tinha colocado sob suas asas. Portanto, estava em boas mãos.
Os motores roncavam alto, quando os ST6 e os Mariners pularam pra dentro da área de transporte. O líder dos franceses veio até Romano e estendeu a mão. Um ato muito pouco típico para o que tinham pela frente, mas com significado óbvio. Romano aceitou o cumprimento. Foi um gesto de homem para homem. Significava que o francês queria deixar de lado não só o incidente anterior, como toda a antipatia que rolou desde que se conheceram. Por ele, tudo certo, já estava esquecido... Mas como bom Atobá, ele se manteria alerta.
Romano varreu o ambiente ao redor, com seu olhar experiente, observando os homens. Então, notou que faltava um. O outro novato da equipe... Ou semi-novato, já que entrou seis meses antes que Alexandre.
Como se tivesse sido chamado por seus pensamentos, Kurt saltou para dentro. O último a embarcar, logo depois dos americanos... Imperdoável. Ou quase... Romano virou para os seus homens e disse pelo headfone: - Dêem espaço pro "apagado".
Kurt foi zoado pelos companheiros, de leve... Mas as expressões nos rostos de Ulrich e Salésio diziam que não deixariam passar um trote em algum momento mais tarde. Até que seria divertido – eles tinham três calouros pra azucrinar um pouquinho. E isso era algo muito raro.
Os novatos - Kurt, Alexandre e Álvaro - estavam em treinamento. Romano era muito rigoroso nesse estágio da candidatura. Não faria nada do tipo código vermelho de "Uma questão de honra". Não, ele não tinha vocação para ensinar matando ou torturando. Todos diziam que ele parecia mais com veludo recobrindo o aço... E estavam certos. Ele até parecia amigável, às vezes, mas era quando ficava mais perigoso e exigente. A exigência trazia a excelência e a excelência podia fazer a diferença entra a vida e a morte.
Ele zelava pela missão e pelo bem-estar dos seus homens. Sempre.
-K-novo– ele chamou em voz alta. – Qual o lema dos Atobás?
Kurt arregalou os olhos, enquanto se ajeitava no chão do helicóptero.
-Senhor! Devotio in Patria, senhor! – respondeu, gritando por sobre o barulho das hélices.
-E o senhor é devoto à pátria, calouro K-novo?
-Senhor! Sou sim, senhor!
-Então, espero que nunca mais chegue atrasado ao baile. Entendeu?
Kurt não iria tentar se explicar. Dizer que teve um baita desarranjo intestinal não era desculpa para um Atobá. Ele só teve tempo de preparar a combinação caseira que Nelson lhe ensinou mais cedo e correr com seus trinta quilos de apetrechos para a nave.
Mais tarde rolaria o trote dos calouros. Ele sabia disso, e se resignava. Desde que sua diarréia não se tornasse severa... Senão, ele estaria em maus lençóis.
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Mal o Chinook tocou o solo, Romano já estava saltando, seguido pelos seus homens. Os gringos fizeram o mesmo. Os grupos seguiram em uma fila ordeira rumo à entrada do prédio da base americana de Djibouti. A noite estava fresca por causa da leve brisa que soprava do Golfo.
Conferindo no relógio, Romano constatou que era quase meia-noite, horário local.
O comandante da base saiu pela porta para recebê-los.
-Senhores, bem vindos a Djibouti. Estamos no horário. Os senhores precisam de alguma coisa, antes de partir?
Os líderes de equipe olharam para seus homens e negaram com a cabeça.
-Muito bem – prosseguiu o comandante. – A nave está quase pronta. Os senhores podem aguardar na sala de musculação.
Ele indicou o caminho para dentro do complexo em reforma. Havia latas de tinta e escadas encostadas à parede. O cheiro de tinta fresca era pungente.
-Ainda estamos decorando, sabe como é? – gracejou o comandante, sem olhar para trás.
Os homens o seguiram pelo corredor estreito. Ao virar uma esquina, Romano viu, pela visão periférica, o exato instante em que Kurt disparou por uma porta lateral. Estava escrito WC. O olhar do líder Atobá recaiu sobre Salésio, como quem diz: "O que foi isso?" Salésio fez que não, com a cabeça, como quem diz que isso não foi nada... Mas na cabeça de Romano, não cabia que o recruta tivesse deixado para ir ao banheiro justo agora. Como ele iria tirar e botar de volta metade daqueles acessórios antes do tempo de embarque. Não havia dúvidas que estariam decolando, no máximo, em cinco minutos. Se bobeasse o K-novo ficaria para trás e Romano estaria decolando com um homem a menos. Que beleza!
-Vai atrás dele!
Salésio não podia ter feito melhor a cara de um cachorro que acabou de levar um chute do dono.
-Vai me fazer babá de calouro?
-Isso mesmo – disse Romano.
Salésio foi... Mas, não sem xingar um monte (em pensamento).
Os homens se distribuíram pela sala de musculação da base. O local era amplo, porém, tinha apenas alguns poucos halteres, três bancos supinos e três racks de agachamento. Enquanto esperavam, eles utilizaram o espaço para verificarem seus cartuchos, os equipamento de salto, e as armas presas ao corpo.
Salésio retornou sem o calouro, dispondo-se a conferir a calibragem de seus rifles Mk-11 com JJ, que também era atirador de elite.
Romano olhou para ele. Salésio suspirou, sentindo-se desconfortável com a situação.
-Escute, ele está com cólicas... Mas já está vindo!
-O quê? – Romano não podia ter ficado mais puto. – E ele não me comunicou isso!
-Já deve estar passando – argumentou Salésio, tentando acalmar o seu líder de equipe.
-Deve?
Romano revirou os olhos. JJ, que foi do BOPE do Rio antes de ingressar na Marinha e já viu os calouros passarem pelo diabo durante a seleção e treinamento, torceu os lábios.
-Deve ter pegado disenteria – disse.
Romano arrancou o gorro e passou a mão pelos cabelos. – Que ótimo!
Salésio e JJ sorriram de leve. Depois que a missão acabasse, a bronca no calouro iria ser monumental.
Kurt apareceu na sala, branco feito papel. Estava todo suado e trazia na mão uma garrafa de soro caseiro, da qual bebia aos golinhos. Todos pararam de falar e ele lançou um olhar mortal para Salésio.
-Aí, foi mal, mas não ia dar para esconder a sua caganeira por muito tempo, garoto – respondeu o Safo, e todos caíram na gargalhada (exceto o desventurado recruta).
Romano se aproximou dele e o encarou por um longo tempo, antes de dizer:
-A mim, não importa que você se borre todinho, mas se por causa da sua merda, você perder um alvo ou o seu cheiro denunciar a nossa presença, não queira saber o tamanho da rolha que vamos providenciar para enfiar neste seu cu, entendido marinheiro?
Kurt engoliu em seco.
-Entendido, senhor!
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Todos sabiam o que fazer, portanto, o tempo de vôo foi usado para concentração. Sobrevoando o Oceano Índico, o avião virou de maneira súbita, perigosa e competente, em direção a costa da Somália – deixando para trás a base de Dijibouti e o Golfo de Aden. Então, a nave estabilizou o vôo. Os militares receberam o sinal de cinco minutos e se levantaram para dar uma última checada em seus equipamentos. De onde estava, Romano podia ver que os agregados dos gringos estavam apavorados com a ideia de fazerem um HAHO. Ele trocou um olhar eloqüente com JJ, quando eles foram "amarrados" para os saltos duplos com os SEALs e os mariners. Havia um capitão e um técnico da Zeën-Zingen, responsáveis pelo resgate do cargueiro abandonado; havia um operador da CIA que iria para manusear a carga tecnológica do container; e havia um capitão e técnico para o DeWitt. Os dois capitães eram da Marinha Mercante – um francês e um holandês.
O cargueiro e o navio turístico estavam ancorados próximos ao porto de Alula.
Os Atobás checavam os comunicadores, enquanto Romano repassava as imagens geradas pelos drones sobre os pontos de referências locais. Os americanos faziam o mesmo.
-Qual o conteúdo da carga, capitão? – quis saber Salésio.
-Não faço ideia e acho que nem eles sabem. Ultrassecreto... – as sobrancelhas de Romano se ergueram, denotando o seu cinismo. – Mas estou aliviado de não ser a nossa missão. Precisamos garantir que os reféns sejam libertados e conduzidos adequadamente para a embarcação que vai estar a nossa espera, no litoral.
Os homens trocaram um olhar grave. Infelizmente, a costa da Somália era uma das regiões mais perigosas para se navegar, devido à crescente ousadia dos piratas. Vários tipos de viajantes - casais, adolescentes, mulheres ou homens solitários – eram seqüestrados e mantidos em cativeiro por semanas, meses e até anos, em troca de resgates milionários. Alguns dos sequestrados, quando libertos, contavam ter passado por terríveis privações... Havia relatos de pessoas que tiveram de comer ratos para sobreviver. Ocorreram situações em que os cativos foram mortos, em represália às tentativas das forças armadas especiais em resgatá-los.
O peso da responsabilidade – o sucesso ou o fracasso da missão – recaía irremediavelmente sobre os militares.
Romano pensou sobre todas essas questões e decidiu que faria o maior estrago possível, enquanto estivesse em território Somali. Os bandidos levariam muito tempo para conseguir se reorganizar como facção criminosa dos mares.
-Será tudo sincronizado e em cima do laço – ele disse pelo headfone. - Sem margem para erros.
-E quando nós já tivemos margem para erros? – Ulrich comentou, com sua voz cavernosa.
É verdade. Os Atobás só eram chamados quando não podia haver erros.
-Se os bandidos perceberem nossa chegada, irão matar os reféns – concluiu Romano.
Spencer fez um sinal para Romano, que retribuiu. Os americanos começaram a se enfileirar. A missão deles era levar o pacote para o ponto de extração Alpha. Se o pacote estivesse comprometido, deveriam destruí-lo. (E matar todos os ativos que tiveram conhecimento ou que conseguiram extrair informações de como reproduzir aquela tecnologia). Para isso, eles tinham informações que lhes foram entregues de última hora pelos agentes da CIA.
As missões seguem sua própria lógica. Muito diferente do que Hollywood mostra, nem sempre as escolhas envolvem questões morais. Existe uma missão a ser cumprida. As discussões morais ficam nas esferas políticas e operacionais. A cúpula determina a execução de uma ordem, e os soldados a executam. Eles confiam na cadeia de comando. Quando essa confiança é quebrada, as forças vão mal das pernas – o fracasso se torna o resultado óbvio.
Os civis não têm a dimensão das escolhas que precisam ser feitas em campo. Existem os caras maus. E os caras maus não podem vencer os caras bons. Romano crê estar do lado certo, dos caras bons, servindo e protegendo os interesses do seu país.
A rampa começou a se abrir com um som agudo, porém, abafado pelo barulho alto dos motores. O sinal verde acendeu. As embarcações de assalto de alta velocidade – HSAC foram as primeiras a descer na escuridão, levando a tripulação SEAL.
Os pára-quedistas franceses receberam o aviso de três minutos. Eram os próximos a saltar. Fizeram uma fila até a borda da rampa. A luz verde acendeu e eles pularam.
Aos brasileiros restava aguardar que a nave deixasse a costa em direção ao interior do país. Eles receberam o sinal de três minutos e se enfileiraram na rampa. Logo receberam o aviso de que restava um minuto... Eles já tinham checado seus equipamentos e estavam à espera.
Romano julgou ter ouvido o novato Kurt gemer, atrás dele. Virou-se e perguntou:
-Tem um PS, calouro?
-Não, senhor – respondeu Kurt, com uma voz estrangulada.
-Se estiver tão ruim assim, pode ficar na aeronave e voltar com eles para a base – ofereceu o capitão.
-Não, senhor – ele se empertigou todo - Isto é, obrigado senhor, mas, não, senhor.
Romano balançou a cabeça.
-Positivo, cagão! – ele disse e ouviu as risadas dos demais pelo headfone.
-Atenção! – gritou o mestre de salto, a bordo. – Trinta segundos!
Alguns conferiram os batoques e os arnês, enquanto a rampa revelava diante deles a escuridão tempestuosa de ventos erráticos lá fora. A calma tomou conta do grupo, acostumado as mais diversas condições de salto. Inclusive com um céu abarrotado de nuvens, sem luz e ventos fortes, como aquela.
Romano ajustou os óculos de visão noturna e se posicionou na descida, observando ao longe os pára-quedas abertos dos franceses. Apesar da máscara de oxigênio, o vento fustigou suas faces como mil agulhas. O mestre de salto inclinou-se.
A luz verde acendeu.
-Vai! – gritou, sinalizando para Romano, que avançou até a borda da rampa, com a ponta das botas para fora a fim de não bater as canelas quando deixasse a nave. Ato contínuo, ele mergulhou em direção ao vazio. O gesto foi repetido pelos demais.
-Vamos seus bocós! – gritou Salésio, com uma gargalhada. Ele se jogou de costas, como se estivesse mergulhando numa piscina.
Foi uma chuva de bonequinhos escuros pipocando no céu coberto de Afgooye. Um salto perigoso, mas a noite sem luar lhes dava a cobertura perfeita. Na altura ideal, eles puxaram seus cordéis e abriram o velame principal a fim de controlar o salto. O pára-quedas estalava acima de suas cabeças... Os Atobás controlaram o vôo, planando rumo ao ponto Y.
O avião se distanciou em meio à camada de nuvens pesadas. Os pára-quedistas direcionavam a queda, com os ouvidos pressionados pelo vento sibilante a golpeá-los violenta e repetidamente.
As casinhas de barro ficaram para trás. À esquerda de Afgooye, as plantações verdejantes de bananeiras encheram o campo de visão dos Atobás. Sendo o líder de salto, Romano avisou pelo rádio que iria inclinar à esquerda. Seus olhos tinham outro alcance com os óculos de visão noturna - por causa das lentes especiais do NVG em seu capacete.
-Movimento a oito horas – avisou Álvaro, pelo rádio.
-Movimento à zero hora – também avisou Kurt.
"Isso não é bom", pensou Romano. Mas poderia ser pior... Pelo rádio por satélite, Romano usou a rede da tropa para avisar que os Atobás estavam se aproximando do ponto Y. Depois, repetiu pela rede de comando. Assim, a mensagem foi ouvida na base americana e também pelos controladores de aviões não tripulados.
-Roger that - disse Spencer. – Boarding the freighter now. Over and out.
Entendido. Subindo a bordo do cargueiro agora. Câmbio e desligo.
-J'ai copie – veio a resposta sem fôlego do francês. - Nous sommes déjà à DeWitt.
Copiado. Nós já estamos no DeWitt.
Os Atobás desceram no ponto Y, um descampado por trás de um muro natural feito de árvores altas. Logo mais, ficava a estrada e as fazendas com suas plantações de banana a perder de vista. Eles puxaram os batoques, livraram-se dos arneses e recolheram os pára-quedas. Em seguida, iniciaram o reconhecimento.
O ponto de referência era a ponte sobre o rio Shebelle – onde começava a estrada geral que cruzava as plantações de banana das fazendas da região. Eles sabiam que na parte baixa, era necessário monitorar a presença das milícias e das patrulhas da Harakat al-Shabab al-Mujahideen, "Movimento do Jovem Guerreiro".
Mais conhecida como Al-Shabab.
Enquanto atravessavam as plantações, escutaram o farfalhar atrás deles. Virando a sua submetralhadora H & K MP7 com silenciador, Romano usou a mira laser para vasculhar a região. Era Nelson, arrancando algumas bananas do pé.
O chef encolheu os ombros, enquanto guardava o produto do roubo na mochila.
-Podemos precisar de comida extra – argumentou.
-Você não vai passar no teste físico se continuar comendo assim – lembrou-o Romano, secamente. – Talvez seja você quem devesse estar com diarréia.
- Credo, capitão – Nelson fez o sinal da cruz. – E por falar nisso...
Eles olharam ao redor a tempo de ver Kurt fechando as calças e saindo de trás de um aglomerado de bananeiras. Pela sua expressão de alívio, foi fácil deduzir o que esteve fazendo.
Quando o calouro estava longe o suficiente, Nelson perguntou a Romano:
-Pergunto eu, ou pergunta você?
-O quê?
-Se ele cuidou de não descobrir a bunda em cima daqueles parasitas que existem por aqui? Ele pode estar com aquelas coisas penduradas ao redor do cu.
-Deixo essa importante informação pra você dar, parceiro – disse Romano, fazendo um sinal para que todos se reunissem ao seu redor.
-Claro que deixa – resmungou Nelson, com uma careta. – Ei, K-novo, venha cá!
Romano ordenou que JJ prosseguisse. JJ costumava atuar como batedor da equipe. Eles fizeram sua formação em "L" e avançaram silenciosamente.
-Atenção – disse Romano, pelo rádio, ao alcançarem uma estrada secundária que cortava as plantações. – Quase lá.
-Limpo – avisou o batedor.
Chegaram ao rio Shebelle, o qual atravessa toda a Etiópia, parte da Somália e do Quênia, irrigando as plantações em seu caminho sinuoso. Margearam-no por cerca de um quilômetro até encontrarem a referida ponte.Uma vez lá, estabeleceriam a estratégia de reconhecimento, explorando as opções de invasão ao cativeiro. Dispunham de dez minutos para isso. Nesse meio tempo, os americanos abririam caminho para eles alcançarem o litoral com os reféns. A não ser que algum imprevisto acontecesse.
De repente, Daniel se aproximou dele com o rádio na mão. Romano acionou o seu a tempo de ouvir Spencer Tracy comunicar, pela rede do comando, que a carga da CIA não estava em parte alguma do cargueiro. Isso não era nada bom, porque significava que os piratas somalianos já sabiam da importância dela. Nesse instante, começou a transitar uma série de informações desencontradas, vindo da equipe operacional, na base de Djibouti. Eles estavam procurando como loucos, a carga ou qualquer pista dela.
-Vejam as imagens por satélite do navio, quadro a quadro, após o sequestro – sugeriu Romano, pela rede de comando. Conseguir as imagens de quaisquer satélites, a qualquer tempo, era mamão com açúcar para a CIA. A luta contra o terrorismo se fazia arduamente. De missão em missão. Algumas mais sujas que outras. Algumas mais secretas do que outras.
-E está feita a bagunça – debochou Salésio.
De repente, os operadores descobriram a resposta na sugestão de Romano. Localizaram a carga a bordo de um caminhão, depois de ser retirada do cargueiro. O veículo seguiu em direção ao cativeiro. Isso foi há dois dias. Era bem provável que ainda estivesse lá. Agora estava explicado porque o grupo terroristo AlShabaad estava a caminho para executar os reféns, sem fazer questão de obter o resgate. Eles perceberam que a carga tecnológica traria um lucro infinitamente maior. Eles iriam vendê-la a algum dos países inimigos dos EUA.
Considerando a distância entre o litoral e as fazendas produtoras de bananas, Romano refletiu que os piratas tinham conexões profundamente enraizadas no interior do país, já que o cativeiro ficava num ponto recuado do litoral. Eles não eram só pescadores, mas peças de uma engrenagem maior.
Os Tugada Badda, como eram chamados, vinculavam-se ao grupo Al-Shabab, igual a um peão num jogo de tabuleiro, com metas estabelecidas pelo grupo principal. Era o mesmo que um punguista ou uma gangue procurar (ou ter que aceitar na marra) a proteção da máfia, ficando subordinada a sua regra. Os membros do AlShabaad, por sua vez, associavam-se à Al Qaeda. Pelo menos foi isso que a Inteligência descobriu.
-Alpha (1) a caminho – disse Spencer, pela rede do comando. Isso significava que ele iria ao encontro dos Atobás. – Qual a sua posição, Bravo?
- Bravo sob o ponto de encontro X menos 1 – respondeu Romano; e mandando às favas as pro words previamente combinadas, acrescentou: – Se vierem, perderemos o elemento surpresa e eles podem não só matar os reféns como fugir com a sua carga. Melhor mantermos o plano original.
Spencer ficou em silêncio.
-Não depende de mim, Bravo...
-Se vocês vierem agora, irão por nosso plano a perder.
-O que sugere? – soou a voz do contra-almirante, pela rede de comando.
-Que a gente entre lá e pegue a tal carga enquanto extraímos os reféns. Vocês nos dão apoio aéreo com os IRS e Alpha nos dá cobertura no caminho para a praia.
-Precisamos contatar a Águia – respondeu o comandante operacional do esquadrão SEAL.
Águia significava a cúpula do comando. Muito provavelmente, o Pentágono.
-Façam isso... – respondeu Romano. - Vocês têm exatos vinte minutos. Do contrário, vou executar a minha missão e explodir o lugar com ou sem carga.
- Estamos desembarcando na praia e faremos marcha forçada até vocês – propôs Spencer. E para os caras dos drones, ele acrescentou: – Aguardando Águia.
-Vinte minutos – repetiu Romano, pela rede de comando, de forma inflexível. –Câmbio e desligo.
-Copiado – respondeu Spencer, desligando.
-Alguém errou feio nesse planejamento, hein? – comentou Nelson, cuspindo o seu tabaco. – Os SEALs podiam ter saltado com a gente. Não tem jeito de se juntarem a nós agora, sem alertar meio país sobre a nossa presença.
Romano não podia negar que houve falha da Inteligência. Agora, eles tinham que lidar com o fato. O elemento surpresa estava por um fio, com os SEAL cortando terreno pelo litoral. Poderiam ser vistos por qualquer um nesse meio tempo – civil, militar, terrorista, etc. A não ser que eles roubassem um veículo de transporte no meio do caminho. E mesmo assim, envolver civis iria tornar a missão uma lambança mais fedida que a diarréia do K-novo.
Romano não estava a fim de esperar pelos SEALs para começar a festa. Queria pegar os piratas desprevenidos e concluir logo a missão...
- Assumam suas posições – ele se decidiu. Daniel retransmitiu as instruções do líder para os demais Atobás.
Nelson e Salésio trocaram olhares divertidos. O capitão era tinhoso.
...E assim, a equipe começou a se espalhar pela plantação.
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(1) - Note que os atobás costumam ser chamados de alphas em suas missões. Mas esta é uma missão em conjunto entre três países. Cada qual assumiu uma tarefa que simbolicamente a letra designa. Alpha ou alfa lidera, bravo apoia e charlie transporta. Mas de uns tempos para cá, vi uma configuração diferente na série do Seal Team da CBS, onde a equipe deles é sempre chamada de bravo, mesmo em operações conjuntas. Não sei se para não confundir o espectador; se para martelar a propaganda da marca; se realmente o tempo e os procedimentos que depreendi estão ultrapassados/datados; ou se a cabecinha de vento aqui entendeu errado.
Foi dificil obter qualquer informação séria. Eu consegui mais militares americanos que me responderam, e nenhum brasileiro. Dentre os americanos, foi um da aeronáutica e dois SEAL para me esclarecer alguns detalhes mais específicos. Ninguém do Grumec brasileiro se manifestou, então, eu tive que estudar vários livros, blogs, sites oficiais. Foi uma pesquisa divertida, mas muito difícil. Nem tudo, eu posso afirmar aqui com 100 por cento de certeza. Algumas certezas eu só consegui depois que o livro tava pronto. Eu tive que voltar ao texto e mudar. Outras incertezas, eu tive que improvisar. Vida de escritor é assim kkkkk Um único SEAL me deu uma confirmação muito importante, que permitiu eu bater a cabeça do Derek até rachar... 🤔😂😂😂 Claro que paguei o maior mico perguntando a ele 😳🤣🤣🤣🤣🤣
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