Capítulo 16. A Morte de Esther
Antes mesmo que Léo pegasse a arma que estava em cima de sua escrivaninha, a porta do seu quarto foi arrombada: seus pais entraram de súbito indo de encontro a Léo. Ele conseguiu guarda a arma e coloca-la em uma gaveta. Léo apenas fingiu escrever em um caderno, porém o seu aborrecimento era visível.
- Eu estava te chamando todo esse tempo filho, por que não abriu? - perguntou Suzane, com um semblante preocupado.
- Eu não queria ver ninguém, mãe. – respondeu Léo, sem tirar os olhos do caderno.
- Por favor, mantenha essa porta aberta, não quero saber de você trancado assim dessa maneira. Está na hora de você ir para a cama, bebê. – ordenou Suzane, com uma voz leve e carinhosa. Antes de sair do quarto, desferiu um beijo nas bochechas de Léo.
O beijo que Léo recebeu de sua mãe, o ajudou a superar a tristeza que estava naquela noite. Era um sinal de carinho que o ajudaria a suportar aquele momento. Decidiu que não pegaria aquela arma novamente. Dormiria e, amanhã, seria um novo dia para ele.
As rajadas de sol não demoraram a aparecer, a quinta-feira chegou na cidade. Léo, já de pé, arrumava-se para mais um dia de aula na escola Monsaber. O ritual de sempre foi seguido. Encontra-se com Douglas no percurso de ida até a escola. Energicamente triste e psicologicamente esgotado, não seria um bom dia para Léo. A aula seguiu rápida, a matéria daquele dia era a queda do muro de Berlim em 1989. Era um muro que Léo ainda mantinha em seu coração, inquebrável, alto, divisor. Queria estar bem com Esther naquele momento, queria ouvir sua voz no seu ouvido mais uma vez.
- Léo. – Esther o balançava na cadeira da sala de aula. Léo estava dormindo, a noite difícil que tivera contribuiu com seu cansaço.
Léo acordou, com um leve susto. Olhou em volta de toda a sala, estava vazia. Apenas Esther o observava com seus lindos olhos verdes em direção aos seus olhos jabuticabas.
- A aula terminou? Cadê todo mundo? – falou Léo, assustado.
- Terminou, todo mundo saiu. Eu fiquei aqui por que preciso falar com você. – disse Esther, enquanto puxava uma cadeira para sentar.
- Ah, Ótimo. Então é isso, enfim, a verdade. Espero que me conte tudo. – seguiu Léo em palavras repetidas, estava com sono. - Seja sincera comigo dessa vez, Esther. – pediu.
Esther suspirou profundamente antes de começar a sua versão.
- Então, vamos lá... Bem, como você sabe, eu não sou dessa cidade, eu morava em Angra dos Reis. Vim de uma família muito rica daquela região, meus pais eram donos de dois resorts e um restaurante na cidade. Era o suficiente para sermos uma família rica, bem rica. Beatriz e Victor também já eram meus amigos, estudávamos na mesma classe e eles também eram da alta burguesia, sempre estávamos nas mesmas festas, mesmas praias, mesmas baladas...
- Entendo, então todo esse dinheiro que você tem, deve ser dos seus pais, certo?
- Não, esse dinheiro não é dos meus pais, espere eu terminar de contar e você vai entender.
- Certo, continue. – pediu Léo, agora ainda mais curioso. Ao acordar do sono, ver Esther ali na sua frente trouxe calma e tranquilidade para ele, era disso de que precisava.
- Ok, era um dia normal, quer dizer, um dia, depois de três dias seguidos de muita balada, preparávamos para mais uma noite de festa. Meus pais tinham viajado para Miami, a casa estava vazia, e o carro, na garagem. Bem, percebia algumas coisas estranhas, algumas sensações e fatos incomuns, mas não demos a atenção que foi preciso. Na balada daquela noite, bebemos muito, usamos algumas drogas... – Esther falou com uma leve pausa, estava emocionada ao lembra daquela noite. Sua voz saia com leves pausas diante dos soluços emocionados.
- Quer parar por aqui? Tomar uma água? – perguntou Léo.
- Não, eu estou bem. – respondeu Esther enquanto enxugava algumas lágrimas do seu rosto. – Estávamos no carro, a uns 80 Km/h, o Victor dirigia, estava chapado e cansado, ninguém tinha colocado o cinto. O carro... O carro atravessou o farol vermelho e bateu em cheio no outro automóvel que vinha a esquerda. O nosso veículo deu cinco ou seis capotes ainda na avenida. Ficou destruído.
- A então é isso, vocês têm algum trauma do acidente, devem ter se mudado para outra cidade e estão sendo sustentados pelo seus pais. – disse Léo, cruzando os braços, acreditando ter desvendado o mistério.
- Não sobrevivemos aquele acidente. – afirma Esther, sem nenhum pudor.
- Meu deus! E como você pode estar aqui agora? Aquela loucura da Nete então é verdade? – quis saber Léo, agora com exaltação.
- Infelizmente, sim. – diz Esther. – Bem, voltando, após morrer naquele dia, pelo pouco que me lembro, nossas almas estavam ainda no local do acidente, quando ela apareceu.
- Ela quem, Esther? Pelo amor de Deus, essa história é loucura! – comentou Léo, enquanto olhava Esther espantando.
- A morte, ela estava lá. Ela se aproximou de nos três, tocou cada um dos corpos e começou a falar conosco.
- A morte, como é? – perguntou Léo sem saber ao certo o que pensar, estava confuso.
- A morte, quando a vimos, ela era uma mulher linda, de cor pálida igual a nossa, cabelos loiros grandes e volumosos. Vestia um minivestido amarelo e carregava um guarda-chuva na outra mão. Ela tinha um batom vermelho bem destacado nos lábios, era alta e magra, como uma modelo. Bem diferente de qualquer coisa que se possa imaginar.
- Você só pode estar brincando, meu deus, só pode ser isso.
- Quer você acredite ou não, preciso terminar de contar. Após ela aparecer, ela explicou o porquê estávamos indo embora tão cedo. "Culpa do destino", dizia ela.
- Repentina... - repetia Léo incrédulo.
- Talvez, essa morte fosse tão repentina, que resolveu nos dar uma nova chance. Então, ela começou a explicar que a partir daquele momento, tudo seria diferente para a gente. Deveríamos esquecer nossas antigas vidas, esquecer nossos pais, nossas casas, amigos, escola... E passaríamos a viver em outro lugar, para cumprirmos uma missão. - explicou Esther.
- Uma missão? – falou Léo, sua cabeça estava um turbilhão de pensamentos.
- Sim, uma missão. Se a cumprirmos, teríamos um pouco mais de tempo de vida. – explicou Esther, enquanto balançava o pé sentada na cadeira.
- E qual seria essa missão? – perguntou Léo.
- Bem, primeiro ela explicou as regras do jogo. Teríamos nossos corpos de volta, porém, sem a coloração e, o sangue perdido, não poderiam ser reestabelecidos. Por isso de sermos tão pálidos, e de que, naquele dia que você cortou o meu lábio, não saiu sangue. Teríamos a ajuda dela, ganhamos uma casa, um carro, e ela também me deu auxílio quando naquele sorteio dos pares da escola, motivo pelo qual o seu nome ter saindo junto com o meu.
- Não tinha ninguém lá além dos alunos e do professor. – disse Léo relembrando o dia do sorteio. Esther o repreendia balançado a cabeça.
- Ela é a morte, Léo. Ela pode tudo. Então, deixe-me ver, a missão era bem simples, ainda está correndo, deveríamos impedir a morte de duas pessoas: Léo, Douglas. – falou Esther.
- Então é isso... E Beatriz? – Explanou Léo pensativo.
- Beatriz estar aqui para ajudar a mim e ao Victor. – explicou Esther.
- Ajudar? Essa história toda não tem sentido nenhum Esther. – assegurou Léo.
- Tem mais, acontece que, vocês também são os responsáveis por fornecerem energia para nossos corpos. Na verdade, podemos captar energia de diferentes formas, as principais são pelo contato interno. O beijo, ou sexo, as duas formas que um homem pode entrar dentro de uma mulher sem machuca-lo. Não necessariamente precisam ser vocês dois, porém, a sua energia em contato com a minha, é bem melhor. É o que a morte chamou de "perfect match" *. (*Par perfeito).
Léo estava sem resposta, apenas abaixou a cabeça, pensava que tudo aquilo que Esther sentia por ele não passava de um oportunismo; para viver mais, por mais estranho que fosse tudo aquilo.
- O nosso tempo está correndo, quando a morte voltar, será o fim para mim, contudo, enquanto eu estiver com você, mais tempo eu vou ganhar para continuar aqui. – comentou Esther.
- E onde está o seu amor por mim nisso tudo? – perguntou Léo, de cabeça baixa.
- Apesar de tudo isso que aconteceu, te conhecer, para mim, foi maravilhoso. Mesmo estando morta, eu te amei como nunca amei em toda minha curta vida.
- E como posso acreditar nisso, se você mentiu para mim todo esse tempo? – indagou Léo.
- E você acreditaria em mim? Se eu contasse tudo antes, você me chamaria de louca, e nunca mais falaria comigo.
- Essa história Esther, eu não consigo, eu não quero acreditar...
- Você precisa, por mim, e por você também. – falou Esther, por fim. Apesar de toda a dificuldade que trazer aquele assunto a tona traria, mantinha-se calma explicando claramente tudo que Léo precisava saber.
- Eu não consigo, eu não consigo... – Léo repetia a frase enquanto sai da sala com as mãos na cabeça, sentia-se confuso.
- Léo... – Gritou Esther, entretanto, ele já saia correndo pelos corredores da escola.
Esther não tinha terminado de explicar aquilo que pretendia, mas sentia que Léo já estava sabendo tudo que era mais importante naquele momento. Encontrou com Beatriz no corredor, ela mascava um chiclete.
- Deu certo? Vocês voltaram? – perguntou Beatriz, que se encontrava encostada no armário do corredor, o chiclete rosa formava uma pequena bola na sua boca.
- Falei, ele saiu correndo, confuso e com medo. – explicou Esther que, agora, guardava seu caderno no armário.
- Ele vai dar trabalho, tem uma índole muito forte. – assegurou Beatriz.
- Vou dar mais tempo para ele, não vai adiantar nada insistir. – esclareceu Esther, terminado de guardar seus livros no armário.
Nos corredores, um aluno chamava a atenção de todos. Um moreno alto, de cabelo curto militar e um longo sorriso brilhante passeava pelos corredores. Vestia uma jaqueta jeans sem mangas, mostrando o tamanho de seus braços. Era forte e alto, possuía olhos fortes e pretos. Passou altivo e rápido pelos corredores, ao se dirigir a onde estava Esther, desferiu um sorriso em sua direção. Ele passou sorrateiro e com velocidade nos pés.
- Quem é esse? – perguntou Esther, admirada.
- Aluno novo, um gatinho, amiga. Acredito que já está na hora de você recarregar as energias. – disse Beatriz, enquanto cuspia o chiclete fora.
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