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Vamos conversar

Pov' Ludmilla

Já deve ser a terceira vez que a Bru tenta me dar o medicamento e eu fecho a boca e viro meu rosto para o lado. Eu sei que ela já está perdendo a paciência, pois respira fundo e me olha com as sobrancelhas fechadas e um semblante nada calmo. Na última tentativa falha, ela desiste e se levanta deixando os remédios sobre a mesa de centro da sala de estar da minha casa. Faço um bico com os lábios e sinto uma forte fisgada, por conta do corte.

- Amor, você está ficando brava comigo? - eu perguntei, mesmo sabendo a sua resposta. Mas ela veio bem pior do que eu estava imaginando.

- Não, Ludmilla. Eu já fiquei brava faz muito tempo. - me olhou, de pé - Está muito pior do que as crianças que eu já atendi. Tem vinte e seis anos, mas parece ter só seis. - reclamou.

- É que, vida... - procurei um bom argumento - Esses remédios devem ser ruim, e eu tenho dificuldade com essas coisas. Se eu tomar vou vomitar. - aumentei a situação.

- Não seja por isso. - me olhou óbvia, com uma agulha na mão - Eu comprei as coisas pra fazer acesso em você. - sorriu forçado.

- Ah não, Brunna. Você não vai fazer isso em mim. - encolhi meus braços - Porque você tá me maltratando tanto assim? - dramatizei.

- Eu estou querendo cuidar de você e estou errada? - perguntou indignada - Você não quer mesmo tomar os medicamentos e nem fazer o acesso? - questionou e eu neguei com a cabeça, sabendo que ela poderia ficar ainda mais brava - Tudo bem, então. Vai se arrumar que a gente vai pro hospital.

- Pro hospital? - questionei assustada.

- Ludmilla, você não quer tomar o remédio, e nem fazer a aplicação na veia. Vai ficar como? Assim com essa boca torta por dois meses, até se recuperar? - abusou.

- Não vou ficar com a boca torta por dois meses, vou? - perguntei e ela não me respondeu - Mas, Bu, porque você quer me dar isso tudo de remédio, sendo que disse que foi apenas um cortezinho? - questionei.

- Eu não disse que tinha sido um "cortezinho". Eu disse que foi bem menor do que realmente poderia ter acontecido. - ela voltou a se aproximar, agora mais tranquila - Deixa eu cuidar de você, vida. Prometo que os remédios não são ruim.

- Mas, Bu! - procurei outro argumento, mas não encontrei - Tá bom. Você promete que não são ruim? Promete pelo nosso namoro?

- Prometo. - pegou os medicamentos e um copo de água gelada - Pode tomar todos de uma vez. Não tem nenhum problema. - me entregou. Todos os remédios eram enormes.

- Eu vou me engasgar. - arregalei os olhos.

- Toma um de cada vez, então. Como você preferir. - falou e ficou atenta em mim. Eu criei coragem e coloquei um comprimido na boca. Dei um gole de água e ele desceu normal. Fiz a mesma coisa com os outros dois e ela sorriu satisfeita - Muito bem, meu amor. Gracinha!

- E a recompensa? - falei depois do último gole de água - Eu mereço, vai?

- Merece! Amanhã irei comprar um pacote de pirulito para te dar, toda vez que você tomar os remédios certinho. - falou juntando as caixas dos remédios - Fofa.

- Eu estava falando de outra coisa. - falei emburrada e ela gargalhou - Mas tudo bem, eu gosto de pirulito.

- Se eu fosse má, não te dava nada. Pra deixar de ser boba. - resmungou - E ainda mandava você ir pra casa da "Dani", pra ela cuidar de você.

- Amor, de novo isso? - perguntei cansada - Ela é só uma amiga. - expliquei - Senta aqui, vamos conversar. - pedi e ela obedeceu - Eu sei que passamos anos afastadas, mas sinto que estamos juntas a todo esse tempo. Você me conhece com a palma das suas mãos, e eu também te conheço muito. - sorri - Sei que você é ciumenta desde o início do nosso namoro. Sempre foi assim. - me lembrei de inúmeras brigas que tivemos por ciúmes - Eu sei que não tem como te mudar. É algo seu. E tá tudo bem. - sorri - Mas tudo que é demais, pode ser prejudicial. Não quero te perder por conta desses ciúmes sem cabimento. - falei triste - A Dani é uma amiga que Patty que assim como todos os meus outros amigos, vieram pro churrasco. Por uma pura coincidência, na hora que você chegou a gente estava animada conversando sobre um assunto. - coloquei a mão na boca, vendo que o sangue tinha voltado - A gente estava falando sobre coisas aleatórias. E eu nunca iria ser infiel com você. Se eu visse que estava passando do limite, iria falar com ela e eu mesma iria pedir para ela ir embora. Eu não sou infiel. - me ajeitei no sofá - Eu não quero ficar com nenhuma outra pessoa. Olha só, eu te assumi pra todo mundo, tamo sofrendo maior consequências disso. - me referi a sua demissão - E acha mesmo que eu quero te largar? - questionei e ela não respondeu - Eu não seria idiota de perder o seu amor, Bru. Então não precisa desse ciúmes todo, nada que é demais faz muito bem. Porque além de você se magoar, vai me magoar também.

- Eu tenho medo de te perder. - falou triste - Não consigo controlar esse turbilhão de coisas que sinto. - confessou - Eu não gosto quando alguém está muito próximo ou quando... - desistiu de falar.

- Bru, sempre vai ter alguém muito próximo de mim. - toquei seu rosto - Eu sou uma pessoa pública. É como se eu também fosse pública. - falei - Talvez você ainda não esteja pronta pra lidar com essa situação. Mas com o tempo vai entender. - suspirei - Por mais que eu não queira, alguém sempre vai invadir a minha área de conforto. Esse é o preço que eu sofro e já me acostumei. - sorri fraco - Mas por isso, não quer dizer que eu estou gostando de algo ou que estou dando confiança pra outra pessoa. Eu só estou sendo educada. Tá bom?

- Tá, vida. - disse simples - Mas a Dani...

- Puta que pariu, Brunna. Esquece a Dani, tá bom? - a puxei para mais perto - Eu estou começando a achar que é você que quer essa Dani. - debochei e ela fez uma careta - Ela é só uma colega, amor. Conheci ela hoje e ela me pareceu ser gente boa. Foi só isso.

- Se você estivesse no meu lugar iria entender. - resmungou, mas eu não dei confiança, o que fez ela começar um outro assunto - Acho que vou ter que dormir por aqui. Você vai ter que tomar remédio as duas da manhã e se eu for embora, irei ficar preocupada.

- Você pode dormir aqui quando quiser, amor. - destruí muitos beijos em seu rosto - Mas agora que a gente já conversou sobre esse ciúmes, temos que conversar sobre uma outra coisa...

- Sobre o que, vida? - questionou com a cabeça apoiada em meu peito e as pernas sobre a mesa de centro.

- Sua demissão. - falei e ela negou com a cabeça, não querendo tocar no assunto - Bru, isso é uma coisa muito séria. - suspirei - Você foi demitida por conta do nosso namoro. Não porque cometeu algum erro ou colocou a vida de um paciente em risco. - falei - Foi só por causa do nosso namoro.

- Talvez ele já esteja querendo me demitir a muito tempo e usou isso de desculpa. - disse simples e eu neguei com a cabeça.

- Amor, não somos bobas, né? Ficou muito claro que ele te demitiu por ser um homofóbico. - expliquei - E não te deu uma justificativa sobre isso, o que pode fazer você processar ele e ganhar por justa causa.

- Isso não é a minha maior preocupação do momento, Lud. Não estou nem aí com esse dinheiro de processo. - falou sem vontade.

- O que está te preocupando? - perguntei.

- Existe toda uma conexão entre os diretores e a essa altura, ele já deve ter contato a todos que me demitiu. - suspirou - Tenho certeza que se eu procurar um outro hospital pra trabalhar amanhã, nenhum vai me aceitar.

- Eles podem fazer isso? - questionei e ela concordou com a cabeça - Eu vou achar uma solução pra esse problema, tá bom? - beijei sua testa - Nem que eu tenha que fazer o seu consultório amanhã mesmo.

- Não diga isso. - choramingou - Meu pai já encheu o meu saco com essas coisas de fazer um consultório. Trabalhar em parceria com um amigo dele e etc.

- Você não gostou da ideia? - negou com a cabeça - Porque, amor?

- Eu não sei, amor. Só não quero me sentir presa em quatro paredes e com horário marcado pra atender as pessoas. - se ajeitou no sofá, ficando sentada ao meu lado - Mas se caso nada der certo, vai ser a opção.

- Vai dar tudo certo, mô, relaxa. - apertei sua bochecha - Vamos subir? Tomar um banho pra gente comer alguma coisa e dormir.

Pov' Brunna

Antes da gente subir as escadas em direção ao segundo andar, a porta da sala abriu e a gente viu o Yuri, entrar a casa, com um copo de açaí na mão esquerda e uma sacola cheia de picolé na mão direita. Paramos o que iriamos fazer e encaramos o menino que sorria satisfeito - talvez por ter dado conta de trazer tudo o que estava em sua mão, sem derrubar nada - retribui o sorriso e me apoiei no corrimão.

- Espero que alguma coisa aí, seja pra mim, em. - brinquei e ele caminhou até mim, e me entregou o copo de açaí - Eu tava brincando com você, bebê.

- Mas eu comprei pra você mesmo, Bru. - ele voltou a oferecer e eu acabei pegando - A minha mãe disse que você estava por aqui e eu pedi meu pai pra parar na sorveteria antes de me deixar aqui. - explicou.

- Foi eu quem me machuquei, sabia? - Lud falou triste - E você deu o açaí pra quem riu de mim, e ainda me fez tomar vários remédios.

- Eu não ri de você. - me defendi.

- A mamãe falou que você chorou. - o menino gargalhou - Bebezona.

Ele sabia que Ludmilla não deixaria isso por isso. Então rapidamente correu, e feito uma criança, a cantora correu atrás dele. Eu só conseguia escutar as risadas altas do menino e a Ludmilla mandando ele parar de correr enquanto ainda dava tempo. Eu sabia que seria impossível parar os dois, então deixei para agradecer o Yuri quando eles parassem de brincar.

Terminei de subir as escadas e adentrei o quarto da Ludmilla, abri as cortinas que davam a vista para a sacada e abri também as portas de vidro. Havia uma mesa com quatro cadeiras por ali e eu me sentei em uma delas, para tomar o açaí, enquanto observava a lua cheia no céu. Os irmão ainda brigavam no andar de baixo e agora Silvana entrou na situação para defender o caçula da família.

Minutos depois disso, Ludmilla subiu para o quarto e não fez esforço nenhum para me achar na sacada. Apenas me olhou com um bico nos lábios - seu machucado voltou a sangrar - Sorri negando com a cabeça e ela disse que iria tomar um banho. Enquanto isso, terminei de tomar o açaí e me direcionei até o closet, procurando algo pra vestir. Em todo esse mês, eu já tinha me dado liberdade de fazer essas coisas.

Separei os pijamas e quando a morena saiu do banheiro, eu lhe entreguei para vestir e adentrei o cômodo, para tomar o meu banho. Demorei menos de vinte minutos e vesti a minha roupa. Deixei meus cabelos soltou, passei um hidratante e também meu perfume, para só então sair do banheiro e me deitar ao lado da cantora, que mexia em seu celular.

- Vou pedir uma pizza pra nós duas. - ela comentou depois de um tempo e eu concordei com a cabeça - Vai querer mais alguma coisa?

- Não, vida. Só a pizza vai ser suficiente, já que é só pra nós duas. - falei simples e ela concordou com a cabeça - Pede refrigerante, por favor.

- Bru, como você ainda não deu uma pedra nos rins? - questionou enquanto fazia o pedido e eu gargalhei - É sério, mô. Você toma muito refrigerante.

- Esse é meu único vício. O resto da minha alimentação é boa. - expliquei - Inclusive, eu preciso ir na academia, deve ter duas semana que eu não vou.

- Eu já desisti. - deu de ombros - Meus fãs me amam assim, do jeito que sou. Sem acadêmia, sem dieta, só vivendo.

- Eu também te amo assim. - me aproximei pra dar um beijo, mas me lembrei do seu machucado, me fazendo parar no meio do caminho - Eles vão surtar quando você mostrar esse machucado.

- Vão é rir. - revirou os olhos - Vou gravar uns stories!

📱

- Pessoal, eu tô aparecendo aqui só agora, né? - fez a observação - Mas é que hoje aconteceu um monte de coisa.

- Olha isso aqui. - mostrou o machucado - Eu fiz um churrasco hoje cedo e fui brincar na piscina com meus amigos e me fodi.

- Mas graças a Deus eu tenho uma namorada muito boa, que é médica. - me puxou para mais perto, para me gravar e pela primeira vez eu decidi não me esconder - Cuidou de mim, tá me dando remédio...

- Gente, ela está falando assim, mas fez o maior drama. - falei aceitando o meu cabelo, olhado na tela do celular - Foi pior que cuidar de criança.

- Gente isso é mentira, não acredita nela. - falou com um tom divertido - Eu tomei tudo direitinho, agora tô aqui esperando nossa pizza pra comer.

- E o meu refrigerante. - completei.

- Galera, eu juro, a Brunna é viciada em refrigerante. É a primeira coisa que vocês precisam saber dela. - Ludmilla falou rápida - Se querem conquistar ela, dê refrigerante.

- Pode ser qualquer um. - observei e ela gargalhou, encerrando a gravação.

📱

- Você não presta né! - me olhou - Agora eu vou te chantagear, pra gravar stories. A cada 15 segundos de vídeo 1 lata de refrigerante.

- Você está começando a falar minha língua, Ludmilla! - sorri maliciosa.

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