O frio do ar-condicionado tomou meu corpo assim que entrei no aeroporto. Passei pelas pessoas a minha frente, meus olhos em busca de minha avó, mas eu não a via. Avisto um pequeno cartaz com o meu nome feito a mão, uma mulher de cabelos escuros longos o segurava. Com um doce sorriso no rosto. Ela era belissima e extremamente fofa ao mesmo tempo, seu maior ponto era seu eye-smile. 

Hesito em ir até ela, mas não custava nada perguntar.

⎯⎯ Oi! ⎯⎯ aceno para a morena a minha frente.

⎯⎯ Você é Hwang Yeji, certo?

⎯⎯ Sim, sou eu ⎯⎯ sorrio aliviada por ser realmente eu quem ela procura.

⎯⎯ Me chamo Jisu, sou amiga de sua avó. Ela infelizmente não pôde vir buscá-la, mas eu irei levá-la ⎯⎯ ela sorria sem parar, com uma alegria sem fim. Era estranhamente confortante.

⎯⎯ Ela está bem? Sentiu algo? 

⎯⎯ Não, ela está muito bem sim! Está tão feliz com sua vinda que se ocupou com várias receitas. Irá fazer um banquete para você.

Sorrio, pois isso é realmente a cara de minha vó. E posso dizer que estou ansiosa para comer sua comida deliciosa novamente.

⎯⎯ Vamos? ⎯⎯ acompanho Jisu até o lado de fora.

O sol quente do verão atinge minha pele deixando para lá todo o frio do ar-condicionado. Nunca tinha pisado em um lugar tão quente como essa ilha. 

Adentro a caminhonete com cheiro de laranjas de Jisu e seguimos o caminho. Podia reconhecer algumas coisas, mas ao todo tudo estava tão diferente.

Fecho os olhos e respiro fundo sentindo o ar fresco e limpo. Você vai ficar bem Yeji, não se preocupe e esvazie a mente.

Me deixei levar tanto pela calmaria do tempo que não percebi quando já estávamos chegando. Por último passamos por uma feira de comerciantes onde se tinha de tudo, frutas, verduras, peixes e especiarias. Lembro-me que sempre vinha aqui acompanhada de minha avó quando era mais nova, fazia amizade com vários comerciantes e ganhava maçãs de graça. 

 A grande casa de minha avó pôde ser vista a minha frente e Jisu para. Desço da caminhonete e corro para dentro da casa onde encontro minha avó na cozinha. A cozinha tinha o mesmo cheiro de hortelã e acerola.

⎯⎯ Yeji! ⎯⎯ ao me ver ela abre os braços e vem até mim para me abraçar. 

⎯⎯ Vovó! ⎯⎯ a abraço de volta. 

⎯⎯ Finalmente minha netinha está de volta, senti tanto a sua falta.

⎯⎯ Eu também senti dona Sarang. 

⎯⎯ Aqui estão suas malas Yeji ⎯⎯ Jisu aparece com minhas malas deixando ao lado da mesa.

⎯⎯ Obrigada pela ajuda Jisu.

⎯⎯ Qualquer coisa estou aqui, pode visitar minha plantação se quiser, vou amar recebê-la.

⎯⎯ Com certeza irei. ⎯⎯ ela acena e vai embora. 

⎯⎯ Quer ir guarda suas coisas no seu quarto? Estou preparando sua torta de maçã preferida.

⎯⎯ Irei guardar minhas coisas e logo desço para provar a torta. ⎯⎯ a abraço mais uma vez sentindo a mesma sensação confortante e seu cheiro de morango e óleos essenciais. 

Subo para o meu antigo quarto e o encontro da mesma forma em que o deixei quando saí da ilha aos 14 anos. É ótimo voltar para cá, relembrar toda a minha infância antes de meus pais se mudarem. 

 Passo a mão pelos pequenos quadros dos meus antigos amigos e paro em um onde estava eu pequena de cabelos bagunçados na frente, meu primeiro amor ao lado, Jaemin e o neto bagunceiro da amiga da minha avó do outro lado, Yeonjun.

Ao olhar a paisagem pela pequena janela em cima da cama penso novamente no motivo em que vim parar aqui. Foi ideia de Ryujin e Yuna, elas disseram que eu precisava esfriar a cabeça em um lugar paradisíaco e tentar esquecer o fato de que o agora meu ex me traiu.

Foi uma mudança e tanto ter que largar tudo lá para vir para cá, sei que não irei esquecer algo tão recente até porque é impossível, mas espero poder ocupar minha mente o bastante. Tirar a imagem de Jeno em cima de minha cama com sua amiga de infância.

Após guardar minhas coisas e lutar contra minhas próprias memórias eu desço as escadas e vou de encontro a minha avó ainda cozinhando. 

⎯⎯ Quer caminhar um pouco para se familiarizar novamente com o local? ⎯⎯ minha avó sugere.

⎯⎯ Pode ser. Por que está cozinhando tanto? 

⎯⎯ Irei fazer um grande jantar pela sua volta! Convidarei Jisu, Sol-I... se lembra de Sol-I? E também o neto dela, Yeonjun. Se lembra dele também, né? 

⎯⎯ Lembro sim, não sabia que ele ainda estava aqui.

⎯⎯ Ele saiu para estudar fora, mas voltou a dois anos. 

⎯⎯ Espero que ele não tenha continuado insuportável como era. Enfim, vou passear um pouco, volto para o jantar. ⎯⎯ vou abraçá-la.

⎯⎯ Cuidado no caminho. 

Saio para fora sentindo o sol queimar minha pele novamente. Passo pelos comerciantes e vou andar perto dos barcos, escutando o som do mar e o cheiro do peixe em que me traz as mesmas lembranças confortáveis de minha infância. 

Tudo realmente mudou por aqui, mas ainda posso reconhecer algumas pequenas coisas. Ao chegar perto do pier vejo um homem empurrar uma pobre senhora que cai no chão derrubando uma sacola de cebolas. Como alguém pode ser tão bruto dessa forma? Não posso deixá-lo sair impune.

⎯⎯ Ei! Está maluco? ⎯⎯ Vou até à senhora e a ajudo a levantar. ⎯⎯ Seu covarde, faz isso porque ela é uma senhora indefesa. Se meta com alguém do seu tamanho.

⎯⎯ Do que está falando? ⎯⎯ Ele se faz de desentendido. 

⎯⎯ Não seja cínico! Eu o vi empurrando essa senhora, e isso é podre. ⎯⎯ Ele coloca as mãos na cintura e suspira. E só então percebi o quão alto ele era. 

É, eu estou em desvantagem.

⎯⎯ Olha, eu não sei o que você viu mas posso lhe assegurar que não derrubei ninguém.

⎯⎯ Está me dizendo que sou cega? ⎯⎯ me aproximo sem medo.

⎯⎯ Sim, estou dizendo que você é cega! ⎯⎯ ele rapidamente perde a paciência.

⎯⎯ Está tudo bem mocinha, obrigada pela ajuda, mas esse moço não está errado, ele realmente não me empurrou ⎯⎯ a senhora entra na discussão. 

⎯⎯ Como? ⎯⎯ a encaro de uma vez. 

⎯⎯ Ele estava me ajudando com o (cadarço) de meu sapato e eu perdi o equilíbrio e cai, sabe como são os idosos, já não temos mais força nos ossos. 

Encaro o homem a minha frente em que estava com uma feição bem clara de "eu não te disse" no rosto e eu respiro fundo. Primeira vergonha do primeiro dia paga. Muito bem Yeji, você é incrível.

Continuo encarando seu rosto assustadoramente simétrico, os cabelos escuros bagunçados pelo vento, a boca carnuda e vermelha que combinava com os longos cílios em seus olhos felinos, de fato são os olhos mais lindos que já vi em toda a minha vida e fiquei hipnotizada por eles. Tinham um brilho quente enquanto me olhavam.

⎯⎯ Não vai pedir desculpas? ⎯⎯ Ele me tira de meu transe em seus olhos.

⎯⎯ Desculpa, eu estou cega. ⎯⎯ assumo a culpa e ele confirma com a cabeça indo embora. 

Paguei o maior mico na frente de um cara bonito. Uau Yeji, mais um pouco e você consegue algo pior. Muito bom! 

Derrotada volto para a casa de minha avó onde já a vejo colocando a mesa e decido ajudá-la. A lembrança dos olhos dele vieram a mente vezes de mais.

⎯⎯ Está tudo bem? Voltou tão calada ⎯⎯ minha avó percebe.

⎯⎯ A senhora tinha que ver, eu passei vergonha na frente de um cara super gato.

⎯⎯ Sério? Mas essas coisas são normais, não se sinta culpada Yeji ⎯⎯ bufo ainda irritada comigo mesma. ⎯⎯ Em falar em caras, você não está mais namorando aquele tal Jeno? 

E mais uma vez a mesma lembrança.

⎯⎯ Não vó, não estamos. Eu vou tomar um banho. 

⎯⎯ Daqui a pouco todo mundo chega. 

Subo de volta para meu quarto e suspiro sentando na cama. Eu passei quatro anos namorando Jeno, foram quatro anos sensatos da minha parte, e fazia três anos que ele estava com sua amiga de infância. Foi três anos sendo enganada, foram três anos ignorando as suspeitas. Talvez a burra tenha sido eu, sim. Eu me senti burra. Burra, humilhada, feita de trouxa ou palhaça. 

Mas está tudo bem Yeji, não vamos pensar nessas coisas.

Pego uma roupa confortável e vou logo tomar meu banho.

A cozinha estava barulhenta pelas risadas, quando desço vejo Jisu, minha avó e Sol-I. Sol-I não mudou nadinha desde que fui embora.

⎯⎯ Yeji, é você? ⎯⎯ Sol-I vem até mim. ⎯⎯ Está tão linda.

⎯⎯ Obrigada, e a senhora parece que não envelheceu nada ⎯⎯ ela sorri tímida.

⎯⎯ São seus olhos, estou no meu auge da velhice já. É bom reencontrá-la.

⎯⎯ Igualmente. 

⎯⎯ Vamos nos sentar, daqui a pouco Yeonjun e um convidado surpresa chega ⎯⎯ minha avó fala animada.

⎯⎯ Convidado surpresa? 

⎯⎯ Você irá ver quando ele chegar.

⎯⎯ Ele? ⎯⎯ arqueio uma sobrancelha e ela sorri. Quem será que ela chamou? 

Será que ela descobriu quem eu passei vergonha na frente hoje? Eu espero não vê-lo nunca mais. Ele poderia ser bonito, mas me pareceu um tanto arrogante, mas não posso culpá-lo, eu fui muito precipitada e só falei coisas ruins, ele só estava no modo de auto defesa. 

O começo do jantar estava confortável e nostálgico, relembrar minha infância com vovó e Sol-I é incrível, e conhecer melhor Jisu é melhor ainda. Eu rapidamente me canso em conversas, mas com elas era impossível ficar cansada. 

Mas tudo foi interrompido quando alguém chegou. Meus olhos arregalam e minha respiração corta. Queria forçar a mim mesma a não acreditar nisso, mas era real demais. 

⎯⎯ Yeonjun, chegou cedo ⎯⎯ minha avó o recebe.

Yeonjun... Yeonjun, o garoto que me tirava do sério na minha infância é a porra do cara em que passei vergonha mais cedo. Isso só pode ser brincadeira. Como pude me esquecer de seus olhos felinos.

Yeonjun me encara e pareceu tão surpreso quanto eu. Ele comprimenta Jisu e se senta ao lado de Sol-I. 

⎯⎯ Yeonjun, se lembra de Yeji? ⎯⎯ Não vovó...

⎯⎯ Claro, lembro sim. Lembro claramente dos cabelos bagunçados e aquela onça horrível.

⎯⎯ Era um coelho. ⎯⎯ tanto faz.

⎯⎯ Me desculpa, é que eu sou cego ⎯⎯ Eu não acredito nisso. Ele de fato não mudou. 

⎯⎯ Vejo que continua o mesmo. 

⎯⎯ Você também, não mudou nadinha. Continua julgando as pessoas logo de cara.

⎯⎯ Foi um pequeno erro, entenda o meu lado.

⎯⎯ A claro, eu super entendo ⎯⎯ Podia sentir a aspereza do deboche em sua voz. Como pode ser tão insuportável? 

⎯⎯ Perdi alguma coisa? ⎯⎯ a voz de minha avó me faz perceber estarem todos olhando para nós dois. 

⎯⎯ Não vovó, não foi nada. Só estamos relembrando o passado. 

⎯⎯ Um passado bastante recente. ⎯⎯ o fuzilo com o olhar para tentar fazê-lo ficar calado. 

⎯⎯ Já está ficando muito tarde, será que ele não vem? ⎯⎯ dona Sarang olha o relógio na parede. 

⎯⎯ Vovó quem você convidou? 

⎯⎯ Alguém do seu passado.

⎯⎯ Yuri? ⎯⎯ abro um grande sorriso ao lembrar de uma velha amiga.

⎯⎯ Não. 

⎯⎯ Então quem é vó?

⎯⎯ Desculpa pelo atraso. ⎯⎯ uma voz conhecida invade a cozinha e quando olho vejo ninguém mais ninguém menos que Jaemin, meu primeiro amor.