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Capítulo 3 - Surpresa

Cheguei ao set já procurando por Jay, no que fui completamente mal sucedida. Assim que me viu, a chefe dos maquiadores me chamou para resolver uma pequena crise. Em seguida, James quis me mostrar as gravações com a equipe de apoio, feitas na noite anterior. Mesmo sabendo que eles atendiam ao meu pedido de informarem a respeito de tudo (pedido que quase culminou na saída do diretor, que não gostou da ideia de ser controlado por uma produtora inexperiente e mandona), estava um bocado irritada com tudo aquilo. Só queria achar meu marido e falar com ele a sós por cinco minutos. No fim da manhã, fugi para o trailer com um pacote de salgadinho na mão. Abri a porta e encontrei Josué dormindo na minha cama.

_ Sai pra lá, estou com sono. - reclamei.

_ Já me achou, né. Que horas são?

_ Quase meio dia. Minha vez de descansar.

_ Caramba! Dormi mais de duas horas. Michael deve estar atrás de mim.

_ Se você se refere ao roteirista gatíssimo de quem você devia ser chefe, o vi, de longe, entrando no carro com o Jay. Eles iam para a LBV, vai ter gravação lá mais tarde. Provavelmente, estavam resolvendo algo que você poderia ter feito, mas estava aqui, na minha cama e usufruindo do meu umidificador.

_ Esse humor vai durar até o fim da parada? Porque se for, me mudo pro Nepal e só volto pra conhecer o sobrinho.

_ Nada a ver. Só não consigo falar com ele, Agda já contou até pras crianças. Daqui a pouco está todo mundo sabendo antes dele. Queria contar de um jeito fofo e inesquecível, agora o tempo trabalha contra mim.

_ Tá bom, mas controla o chilique. O que é isso na sua mão? - escondi o pacote atrás das costas.

_ Café da manhã.

_ Isso não é comida. É Cheetos!

_ Foi a unica coisa que não embrulhou meu estômago. E preciso de sal para não ficar tendo vertigens.

_ Pelo visto você vai precisar é de uma babá. Me dá isso aqui, Aurélia! Isso não te faz bem nenhum. - ele agarrou o saco sem a menor feição de estar brincando.

_ me zoando? Me dá isso aqui! - puxei com força. 

Ele puxou de volta e começava a ficar zonza pelo esforço quando a porta fez um estalo, e depois de aberta, vi Bela entrando com um joelho ralado, seguida de Jay. O mundo inteiro girou e acabei vomitando a gosma amarela em que os cheetos haviam se transformado do colete de couro da garota. Nem tive tempo de pedir desculpas, a tontura piorou muito e eu teria me estatelado no chão se Jay não tivesse empurrado a colega de lado e me amparado. Mal me lembro de ver Josué levando Bela para fora, supondo que procurariam algo para ela se limpar e talvez, dar um jeito no joelho.

Eu ainda estava de olhos fechados, deitada com ele na cama de casal, quando começou a falar.

_ Eu disse pra você descansar. Toda vez que fica estressada, as vertigens pioram. Você sabe disso.

_ Só um minuto. - fiz sinal para que se calasse, sentindo a náusea voltar. 

_ Caramba, Aurélia. Eu já te falei, você quer abraçar o mundo. Escrever dois livros de uma vez, abrir editora, produzir filme, cuidar dos meninos. É claro que não vai aguentar.

_ Para de falar, por favor. - pedi baixo e entrei no banheiro para vomitar mais uma vez e lavar a boca em seguida.

_ Você está bem? - ele perguntou do outro lado da porta.

_ Ótima. - respondi abrindo a porta, obviamente abatida. - Não estou doente.

_ Você parece bastante doente. É sério, meu bem, você precisa de um tempo.

_ Jay, por favor... Eu não estou doente, nem cansada além da conta.

_ Você acabou de vomitar duas vezes e quase desmaiar. Para mim, isso é a definição de doença.

Respirei fundo, tentando não perder a paciência. Segurei o rosto dele entre as mãos  e o olhei direto nos olhos.

_ Tenta de novo. Eu não estou doente, eu acabei de passar muito mal...

_ Hmmm... - ele olhava para baixo com um vinco na testa e eu já queria rir. - É o que eu estou pensando? - ele responde tentando conter um sorriso.

_ Eu não sei o que você está pensando, papai. - ele desceu a mão para a minha barriga com um sorriso meio bobo.

_ Jura? - ele já estava ajoelhado e com os olhos marejados. Eu também começava a chorar e assenti com a cabeça.

_ Eu te amo demais! - declarou me enchendo de beijos e me levantando nos braços, o que me causou uma tontura e nos fez deitar mais uma vez.

_ Agora, me promete uma coisa. Você não vai ficar me protegendo de tudo, nem tentando me fazer ficar quieta. Vida normal, por favor.

_ Aham, Aurélia! Se você prometer cuidar bem de si e dele, fico quieto. Mas se eu vir algum absurdo do tipo "cheetos no café da manhã",  - ele viu o pacote pela metade no chão - fico mais chato que a sua mãe.

_ Nós vamos ficar bem. Já trouxe dois ao mundo e eles estão tão bem que até já são desaforados antes de entrarem na adolescência. Sou maluca, mas não sou irresponsável. Vou cuidar bem do bofinho.

_ Bofinho?

_ Agda. Ela me escutou falando com o Josué e está sabendo desde ontem.

_ O Josué e a Agda estão sabendo antes de mim. Pensei que eu fosse o maior interessado. - reclamou, sentando-se na cama.

_ Sim. Josué percebeu assim que chegou, ela escutou a gente conversando e acabou contando para as crianças.

_ Tá de sacanagem... todo mundo ficou sabendo antes de mim? - ele agora estava chateado de verdade.

_ Assim que peguei o exame, fui te procurar. Sempre tem alguém perto de você, seja alguém da equipe técnica, seja uma amiguinha precisando de conselhos. Josué prestou atenção em mim e percebeu, você não teve tempo para isso porque estava fazendo coisas mais importantes.

_ Isso não é verdade. Custava me chamar de canto? Nunca deixaria de te atender.

_ Jeremiah, eu tentei várias vezes falar com você. Era cena sendo rodada, produtor te chamando toda hora e quando pensei que teria um momento antes de dormir, você fica até nem sei que horas de papinho com a querida Bela. Não ouse reclamar por outras pessoas terem prestado mais atenção em mim.

_ Você está sendo incrivelmente injusta, mas não vou discutir.  Vou buscar o nosso almoço e você fica aqui. Dorme, toma banho, escreve, descansa, lê... faz o que quiser. Mas, se cuida. Já sei que vou ter que passar mais tempo que o normal sem poder ficar bravo com você. - com um beijinho, ele se despediu e saiu pela porta. Pensei por alguns segundos antes de me jogar na cama e apagar em seguida.

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