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Player Two

Enquanto Jungkook trazia consigo da cozinha dois pratos com pedaços de bolo em cima, eu conectava o pen drive no seu notebook para que pudéssemos ver todas as mídias com calma e controle. Trouxemos também um cobertor para podermos nos enrolar, pois o clima da cidade estava consideravelmente frio, então tivemos a ideia de nos empacotar debaixo do tecido macio.

— Já tá tudo pronto aí? — ele pergunta, deixando os pratos no suporte que tinha no braço de seu sofá, já se aninhando no assento.

— Sim, está tudo pronto — olho para a televisão desligada a nossa frente e tenho uma ideia. — Não seria melhor se usássemos a televisão ao invés do notebook? A tela é bem maior.

— Por mim tanto faz, contanto que consigamos ver bem e aproveitar, eu aceito tudo. — dito isso, tiro o pen drive do computador móvel e conecto na televisão, configurando na pasta do USB. — O que acha de começarmos com as fotos e depois vamos para os vídeos? — dou de ombros e ele entende como um "como quiser".

Ao abrir a primeira foto, meu coração ficou quentinho. Era uma onde eu e Jungkook estávamos no carrinho de aluguel no parque de Seoul, quando fomos visitar o local. A grama parecia muito bem tratada, e atrás podia-se ver um grande lago e várias pessoas fazendo coisas banais. Jeon estava com uma carranca e eu lembro bem o porquê.  Meu sorriso banguela denunciava que dois dentes de leite haviam ido para debaixo do travesseiro, e mesmo assim não deixava de zoar da cara do meu melhor amigo após ter seu sorvete lambido por um cachorro quando o deixou de bobeira.

— Meu Deus — começo a rir. — Olha você todo bravinho.

— Nossa, eu lembro desse dia. Eu fiquei muito puto porque aquele cachorro estragou meu sorvete de menta — ele ri. — Mas olha lá você sem os dentes da frente, dava para passar um trem por ali.

— Você me respeite, meus dentes caíram primeiro que os seus — mostro a língua para ele, como qualquer pessoa de 22 anos. — Vamos passar para a próxima.

— Ah, não! Mentira! — o aniversariante ao meu lado caí em uma gargalhada engraçada e alta. A foto mostrava eu sorrindo enquanto era enterrada na areia da praia pelo acastanhado. Ele sorria aberto e, dessa vez, quem estava banguela era ele. — Olha só a gente! Você ficou com medo que te deixasse lá quando eu corri para buscar o picolé que a tia tinha comprado.

— Claro. Experimenta você ficar enterrado na areia e a pessoa que está te enterrando sai correndo do nada, sem mais nem menos — me defendi. — Eu comecei a chorar, eu lembro.

— Eu gostei bastante desse dia. Fizemos vários amiguinhos enquanto estávamos no mar.

— Ah… — suspiro. — Quando nós dois tínhamos uma ótima habilidade em socialização. Bons tempos…

Passei para a próxima foto, onde eu estava vestindo um Hanbok rosa com branco e o Jungkook um azul. Ele estava comendo um corn dog e eu estava muito feliz com meu tteokbokki, bem sentadinhos em alguma mesa de uma barraca. Era época de Chuseok e estávamos em um dos festivais em nossa viagem para Daegu.

— Essa viagem foi muito legal — comentou e eu concordei, passando para o próximo arquivo.

Desta vez era um vídeo gravado pela a tia Haeun, mãe do Ggukie. Era inverno e estávamos nas festividades natalinas. Jungkook se escondia atrás de um boneco de neve enorme e eu parecia procurar por ele.

— Jungkook-ah, vamos, apareça! Você não vai se esconder para sempre! — minha voz fininha de criança nos fez abrir sorrisos, encantados pelo vídeo nostálgico.

— Eunbi-ah, cuidado para não escorregar — advertia a que gravava, recebendo um "certo, tia" como resposta.

Quanto mais andava, a pequena garotinha do vídeo, de mais ou menos 5 anos — vulgo eu —, ia se aproximando do local onde seu melhor amigo estava, mais encolhido o garoto ficava, e, por um deslize, deixou seu pé aparecer um pouco para os lados. A garotinha sorriu, e sorrateiramente ia ao encontro do boneco de neve, ou melhor, da pessoa que estava atrás dele.

— Te peguei! — disse saltando para a frente dele. Pobre pequena Eunbi, mal sabia que acabaria assustando o garoto que se levantou em um pulo e se desequilibrou, caindo em cima da mesma.

— Crianças! — ditou Haeun com uma voz apreensiva e correu para ver como estavam os mais novos, deixando um suspiro aliviado escapar ao ver os dois pestinhas rindo muito. — Puxa vida, que susto vocês me deram.

— D-desculpa, omma — Jungkook se pronunciava pela primeira vez naquele vídeo, com dificuldade pois não conseguia para de rir. Após se recompor, Jeon deu a ideia de irem fazer anjos na neve, e em um instante estão os dois deitados de braços e pernas esticados, movendo para cima e para baixo no meio do quintal enquanto riam muito. Tudo era filmado pela sra. Jeon com sua filmadora portátil, super moderna para a época.

— Tudo bem, anjinhos. Vamos para dentro, já está ficando frio demais para vocês — disse ela ouvindo um coro de "aaah". — Nada disso, vocês brincaram a tarde toda aqui fora.

— Mas queremos ficar mais! — eu protestei. Olha, eu realmente era irritante às vezes, confesso.

— É! Queremos ficar mais! — Jungkook falou, cúmplice.

— Não tem mais nem meio mais. Vamos entrando, já está começando a nevar de novo — uma voz masculina surgiu ao fundo, e a câmera apontou para a porta, onde meu pai estava de braços cruzados.

— Appa… — choraminguei. Corajosa, viu.

— Nada de “appa”. Vamos.

— Não precisa ser tão duro com eles, Jiyoung — tia Haeun interveio e virou-se para nós. — Anjinhos, nós só queremos que vocês entrem para não pegar algum resfriado e ficarem dodóis. É ruim ficar doente, não é? Vocês podem brincar lá dentro e quem sabe amanhã não podem brincar aqui fora de novo, hm? Além do mais, a mamãe da Eunbi está fazendo chocolate quente e biscoitos, mas vocês só irão comer se entrarem agora e tomarem um banho para ficarem limpinhos — quando as palavras “chocolate quente e biscoitos” foram ditas, nossos olhos brilharam mais que as luzinhas de natal que appa já começava a ligar.

— Tudo bem, omma. Trato feito — Jungkook se levanta e estende a mão para mim, que rapidamente pego. — Vamos, Eunbi-ah. Nós aproveitamos que vamos tomar banho e podemos testar aquele barquinho que eu ganhei da minha tia de natal — zarparam para dentro da casa e, assim, o vídeo se encerrava.

Olhei para o lado e vi Jungkook vidrado na televisão a nossa frente, parecendo estar absorto em memórias que pensou que tinha perdido. Não o julgo, estou do mesmo jeito.

— Meu… Deus… —  fez questão de parar entre as falas. — Eu nem lembrava desse dia, mas foi tão divertido.

— Somos dois, então. Olha pra isso! Eu sequer lembrava que você não tinha equilíbrio nas pernas. — Quis tirar sarro pelo fato dele ter caído em cima de mim e ele sorriu, entrando na brincadeira.

— Ah, nem vem. Você me assustou. Ah, e você só me achou por conta do meu deslize. Todos sabem que você é péssima no esconde-esconde — tive que concordar. Se tem algo em que eu sou horrível, esse algo é esconde-esconde. — Nossa, eu não lembrava que seu pai tinha essa pose de durão, só lembrava que ele nos colocava na linha junto ao meu pai.

— É verdade. Todavia, na medida em que fomos crescendo fomos aprendendo a nos comportar, e não era necessário os “carões”.

— Você percebeu que ainda tomávamos banho juntos? — rimos. — Se quiser, podemos voltar aos velhos tempos — disse, sugestivo, com uma das sobrancelhas arqueadas e um sorriso de cafajeste barato, e tudo o que fiz foi rir da sua cara. Não se engane, eu e Jeongguk somos íntimos o suficiente para fazermos propostas indecentes um ao outro, obviamente, levamos tudo na esportiva. Dei de ombros e continuei a passar os arquivos.

Era outro vídeo que, com certeza, fez o Jeon ter ótimas lembranças. Era no seu primeiro torneio de Taekwondo, e ele havia ficado em terceiro lugar. Mas nas imagens mostrava o momento exato da sua luta, onde ganhava do seu oponente. Eu e nossos pais gritamos quando ele foi declarado campeão. Momentos depois, Jungkook já corria em nossa direção enquanto gritava “olhem, olhem, eu consegui!”

— Sim, meu amor, você conseguiu — tia Haeun dizia toda orgulhosa.

— Parabéns, filhão — tio Jisung parabenizou o primogênito.

— Yeah, Jungkook-ie, você venceu — fui abraçá-lo e ele logo me agarrou e começou a rodopiar, enquanto me apertava. Não é por nada não, mas esse abraço foi muito lindo.

— Você viu o que eu fiz? — perguntou todo animadinho.

— Vi sim, estou orgulhosa de você — e depois disso ele foi chamado para o pódio, para receber sua medalha de bronze. Quem filmava dessa vez era minha mãe, e ela deu zoom na hora em que a medalha foi colocada no pescoço de Jeon e todos pularam de alegria.

— Nossa, esse dia foi muito importante para mim — se pronunciou assim que o vídeo acabou.

— Imagino que sim, foi seu primeiro torneio e ainda ficou em terceiro lugar — sorriu. — Quantos anos você tinha mesmo?

— 9 anos.

— Ah, você só continuou mais alguns meses no Taekwondo, não foi?

— Foi sim. Porém foi por causa da minha perna que quebrou quando andei de bicicleta naquela época. Acabou que esqueci do esporte e me vi viciado em videogame.

— Errou, acabou que nós nos vimos viciados em videogame.

— Ah, é, você era minha parceira.

— Meu amor, eu sou sua parceira em tudo. Entenda isso — passamos para o próximo arquivo.

Nesta foto, eu estava ao lado da minha avó e Jungkook estava do outro lado, segurando um pote com biscoitos de gengibre. Tínhamos em média 11 anos e, novamente, era época de natal, pois estávamos com gorrinho de gnomos e minha avó com o de Papai Noel (acho que seria melhor dizer Mamãe Noel).

— Foi no dia em que eu fui pra casa da sua avó junto com seus pais.

— Foi sim. Lembro que fizemos uma bagunça na cozinha da vovó, quase que ela desistia de nos ensinar a fazer os biscoitos e nos expulsava logo dali — Jungkook riu com os olhinhos quase fechados.

— Será que daria certo se fôssemos fazer uns agora?

— Olha, não vem com essas ideias, não. Já não basta o sufoco por conta do bolo e ainda quer fazer biscoitos de gengibre!

— Noona… — ele se agarrou em mim todo manhoso e ainda por cima me chamou de "noona", coisa que ele só faz quando quer algo.

— Não, Jeon Jungkook — ele fez bico. — Se fizer bico, eu mordo — arregalou os olhos, mas não tirou o bico da boca, e eu mordi. É, eu mordi, mas não o bico.

— Ai! Por que você fez isso? — levou a outra mão massageando seu antebraço.

— Eu avisei — e prossegui com o entretenimento do dia.

A próxima foto foi uma no fliperama que frequentamos sempre desde os 11 anos, onde eu jogava Pac-Man em uma máquina e Jeongguk jogava Mario Kart em outra. Pela minha feição, já tinha perdido mais uma vez e Jungkook se aventurava para quebrar seu recorde no joguinho.

— Ah, meu Deus! Chegou onde eu queria — comentou. — Será que tem vídeo da gente aí?

— Vamos ver — passei os arquivos e encontrei um.

Dessa vez quem gravava era o Jeon, e eu brincava na máquina do Marvel vs Capcom 2: Age of Heroes, além de aparentar estar perto de vencer o oponente.

— Vai, vai, vai! — ansiedade e expectativa era algo nítido em mim.

— Vamos, EunHa, você consegue! — Jungkook me encorajava atrás da câmera. E assim que eu venci, o abracei de imediato e fiquei pulando que nem gazela com ele no meio do fliperama.

— Hey, vamos apostar? — disse olhando para a máquina do Mortal Kombat.

— Ah, quer mesmo perder, não é? — soou competitivo.

— Eu não vou perder.

— É claro que vai — retrucou. — E o que vamos apostar?

— Hm… — fiquei pensativa. — Que tal sorvete?

— Fechado — aperta a mão que eu tinha estendido. Jungkook vira a câmera para si assim que selamos a aposta. — Vai estar gravado aqui a cara de decepção de Jung Eunbi quando for me pagar uma taça de sorvete de morango. Agradeço a toda torcida feita para mim, meus fã- — e antes que ele acabasse seu discurso para a câmera como se fosse esses YouTubers de hoje em dia, minha voz apressada interveio: "Anda logo com isso, Jungkook e para de ficar conversando com a câmera”. — Quando voltar, estarei muito feliz tomando meu sorvete pago por ela, até logo — e tudo ficou escuro. Pensei que ele tinha desligado, mas logo a imagem do acastanhado todo emburrado, tomando o sorvete dele na força do ódio tinha aparecido no televisor.

— Oi, fãs do Jungkook — eu segurava a câmera com um sorriso no rosto. — Eu sinto informar a vocês que o seu amado Jeon perdeu para mim no Mortal Kombat, o jogo que ele ama, vale salientar. E agora estou eu contente com meu sorvete de maçã verde pago por ele, e o mesmo está aproveitando seu sorvete de morango — virei a câmera para ele. — Então, dongsaeng, como se sente ao acabar de perder para sua melhor amiga no seu jogo favorito?

— Não me faça jogar esse sorvete na sua cabeça! — ele desmontou e eu ri.

— Pois é, pessoal. Não vão cantar vitória antes da hora, pode acabar mal para vocês hein — dou uma piscadinha e desligo a câmera.

Eu não me aguentava de rir no sofá, estava a ponto de doer a barriga.

— V-você perdeu para mim no Mortal Kombat! — tive que falar pausadamente, já que eu estava recuperando o fôlego.

— Olha, pode parar, tá bom? Não dá para ser bom em tudo sempre — emburrou a cara pela vigésima vez naquele dia.

— Awnnn, para com isso, Ggukie — me aninhei nele. — Você ainda não superou essa derrota?

— Ah, vai se lascar.

[...]

Eu simplesmente não acreditava no que estava vendo.

O vídeo que era nos mostrado parecia estar sendo gravado às escondidas, onde eu e Jungkook estávamos perto, perto demais, atrás da quadra do condomínio em que a vovó mora. Eu lembro desse dia e lembro muito bem o que aconteceu. Olhei para meu lado e Jeon me encarou com a mesma reação que a minha: chocado. Ao fundo, podia escutar nossas mães cochichando e dando risadinhas, e no momento que Jeongguk se aproximou mais de mim, tocou meu rosto, eu logo repetindo o ato e nossos lábios se tocaram em um selar singelo, nossas progenitoras surtaram baixinho, comemorando dando pulinhos.

Pois é, é isso mesmo que você está pensando/lendo. Eu e Jeon trocamos o nosso primeiro beijo. Tipo, sim, perdemos o BV juntos.

E não fique com essa cara, por favor. É constrangedor para nós dois. Minha mãe deve ter colocado esse vídeo de propósito, digamos que ela sempre me "shippou" com o carinha que está ao meu lado.

Olhe onde chegamos! Nem na própria mãe se pode confiar mais.

— Não sei nem o que falar — comentou ao meu lado. — Eu… — suspirou antes de continuar. — Lembro desse dia. Lembro muito, aliás. Não imaginava que tínhamos espectadoras.

— Muito menos eu — fiquei da cor de um tomate e olhei para o vídeo pausado.

— EunHa… — me chamou baixinho e eu virei minha cabeça devagar. De repente ele segura meu rosto e me rouba um selinho, me deixando mais vermelha do que já estava e com os olhos arregalados. — Não pense em outras coisas, isso só foi para relembrar, e também quis brincar com a situação — deu uma risada e pegou o controle da minha mão, passando para outra arquivo.

— Por Deus, Jungkook, você não era gay?— ele ri — Agradeça por ser seu aniversário, senão não acordaria amanhã — dei um tapa no seu braço.

E assim foi nosso resto de tarde e nossa noite. Passamos o tempo todo juntinhos, dando risadas altas, comendo bolo de chocolate queimado e aproveitando a presença um do outro.

Eu amo demais ter Jungkook como melhor amigo.

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