aniversário do vô Gabriel
**RAFHAEL NARRANDO**
Eu e Gustavo nos mudamos para Margarida há 6 anos. Antes disso, tínhamos um relacionamento a três com Felipe, com quem temos três filhos adolescentes de 16 anos que moram aqui conosco. Sempre que podem, visitam o Felipe, que atualmente mora em outro estado desde que o relacionamento acabou há 6 anos. Mesmo com o fim da relação, nós nos damos muito bem e somos amigos até hoje.
**MIGUEL NARRANDO**
Às vezes, a angústia chega a um ponto em que ela infla tanto que você pensa que vai explodir. A tristeza não sai mais de você. Você chora e não sabe explicar o porquê, mas na verdade está chorando por todas as vezes que segurou. Chega um certo momento em que seu coração não aguenta mais ficar tão cheio que o sentimento sai pelos olhos. É quando você chega a um limite no qual não aguenta mais ficar fingindo que está bem.
Você só quer estar isolado em um lugar onde possa gritar o máximo que puder. Às vezes, temos tantas coisas guardadas no peito que pensamos não ter mais solução. Errado, para tudo há uma solução.
Muitas vezes, o choro já não alivia o suficiente, pois você chora cada vez mais.
Sabe, às vezes me pego pensando: por que será que o ser humano às vezes é tão vulnerável? Tão fraco? Tão vazio? E às vezes, tão sentimental?
Quando pensamos que não dá para piorar, parece que tudo desaba. A vida é repleta de surpresas e nós nunca devemos duvidar disso.
Espanto meus pensamentos e limpo o choro ao ouvir alguém me chamando e batendo na porta.
- Entra (respondo ainda soluçando um pouco).
- Oh, meu filho, o café está pronto. O que foi? Por que está chorando?
- Não é nada, não pai, eu já vou.
- Fala a verdade para mim, Miguelzinho, o que está acontecendo? Eu sei que você se abria mais fácil com o Felipe, mas saiba que eu e o Rafha estamos aqui para você.
- Ah, pai, tem alguns garotos na escola que não me deixam em paz.
- Rafhaaa (meu pai Gustavo grita tão alto que acho que dá para escutar lá da rua).
- O que foi, amor? O que está acontecendo? Onde pegou fogo? (Meu pai Rafhael entra no quarto já preocupado).
- Ainda não pegou em lugar algum, mas vai pegar se eu tiver que ir naquela escola. Ninguém vai tratar o meu filho como inferior!
- Eu fui lá, Gustavo, e conversei seriamente com o diretor, que suspendeu os garotos por uma semana e conversou com os pais. A suspensão deles acabou hoje, mas já disse, meu filho, nós estamos aqui. Nada de mal vai te acontecer! Vem cá, me dá um abraço.
- Eu também quero (meu pai Gustavo fala).
Nos abraçamos os três e descemos para o café da manhã. Chegando na cozinha, vejo que Matheus e Vinicius já estão na mesa.
- Que demora, gente. Tô morrendo de fome aqui (Vinicius fala).
- Esfomeado (Matheus fala).
- Sou mesmo (Vinicius retruca).
- Calma, meninos, chegamos (Rafhael fala).
Nos sentamos e nos servimos.
- Meninos, hoje vou trabalhar na capital e o Rafha também, então a vó Stella vai pegá-los na escola porque é aniversário do Gabriel e não podemos deixar de ir. Assim, já iremos direto para lá depois do trabalho (Gustavo fala).
O Gabriel é o meu avô, pai do meu pai Felipe, casado com a minha vó Stella, mãe do meu pai Rafhael. Eles moram na cidade vizinha. Eu sei, minha família é bem misturada (risos).
- Tá pai (falamos os três juntos).
Terminamos o café e, alguns minutos depois, nossos pais já estão nos deixando na porta da escola.
- Tchau, meus amores (Rafhael fala).
- Tchau, pai (falamos os três e entramos na escola).
No pátio, já vejo logo Letícia, vou até ela e nos abraçamos.
- Oi, Lele.
- Oi, Mi.
- Oi, pessoas (Eduardo fala se aproximando).
- Oi, Edu (falamos juntos).
- Vocês já sabem da nova? (Edu pergunta).
- Não. Qual? (Letícia pergunta toda curiosa).
- O pai do Ricardo, depois do diretor ter chamado na escola para falar sobre o Ricardo incomodando o Miguel, assumiu para quem quisesse ouvir que ele também é gay. A escola toda já está sabendo.
- Nossa, nossa, nossa, bem feito (Letícia fala com um ar vitorioso).
Nesse momento, Ricardo entra na escola e alguns alunos vão logo zoar ele.
Eu simplesmente ignoro e vou para a minha sala acompanhado de Letícia e Eduardo.
**MATHEUS NARRANDO**
Entro na escola e Lucas vem ao meu encontro.
- E aí, cara, vamos jogar hoje depois da aula? (Ele pergunta).
- Hoje não vai dar. É o aniversário do meu avô, sabe como é, né?
- Sei sim. Mas e amanhã, tá de pé?
- Amanhã tá sim. Inclusive, meu pai Gustavo disse que vai fazer uma comemoração no final de semana e conta com a presença do meu melhor amigo.
- Opa, comemoração, pode contar comigo (ele fala animado).
De onde estamos, escutamos algumas risadas e nos aproximamos um pouco para ver o que está acontecendo.
Ricardo está sendo motivo de muita chacota no pátio. Não sei bem o motivo, mas decido me aproximar e ajudá-lo.
Entro no meio da confusão e me aproximo dele. Ele está com o nariz sangrando.
- Quem encostar nele vai se ver comigo.
- Viraram amiguinhos agora? Depois de tudo que ele fez com o seu irmão? (Um aluno pergunta).
- Não, não virei amigo dele, não esqueci o que ele fez com o Miguel. Não sei nem o que está acontecendo aqui! Mas não vão bater nele com tantos contra um.
Depois do que eu disse, os alunos vão se afastando até que só ficamos eu e Ricardo no local.
- Valeu, cara.
- Eu ainda te acho um otário (falo saindo e indo em direção à minha sala).
**VINICIUS NARRANDO**
Entro na escola e vou direto para a sala. Depois de alguns minutos, Miguel, Letícia e Eduardo entram e, mais alguns minutos depois, entram Lucas, Matheus e, em seguida, Ricardo, segurando um algodão no nariz, o que não dou muita importância. A primeira aula é de matemática, que eu odeio...
**MIGUEL NARRANDO**
Ao iniciar a segunda aula, um garoto novo entrou na sala. Tudo que sei é que ele veio de outra cidade.
Logo já é o intervalo e sigo para a cantina acompanhado por Letícia, Eduardo, Matheus e Lucas.
- Você não vem, Vini?
- Vou encontrar a Fabiana e encontramos vocês lá.
- Tá bom então (falo e continuamos a caminho da cantina).
Escolhemos uma mesa e logo estamos todos sentados.
- Os meus pais vão fazer uma comemoração para o aniversário de 18 anos de casados deles e gostaria muito que vocês fossem. Vai ser no final de semana.
- Claro, vou sim, Mi. Pode contar comigo (Letícia fala).
- Festa, opa, tô dentro (Eduardo fala animado).
- Como eu disse ao Matheus mais cedo, podem contar com a minha presença (Lucas fala).
Algum tempo depois, Vinicius e Fabiana se aproximam de nós.
- Oi, gente (Fabiana fala).
- Oi, cunhada (eu e Matheus falamos juntos).
- Oi, os outros falam.
- De onde será que veio o menino novo, gente? (Letícia pergunta).
- Eu ouvi meio por cima que é de uma cidade chamada Girassol, mas não tenho certeza (Eduardo fala).
O sinal toca e retornamos à sala de aula. A aula de artes começa e a professora pede que o aluno novo se apresente lá na frente.
- Me chamo Enzo e vim da cidade de Girassol.
- Seja bem-vindo, Enzo (a professora fala).
Ele agradece e volta ao seu lugar. O restante da aula passa bem rápido. Ao sinal tocar, nós nos despedimos de nossos amigos e caminhamos até o carro da vó Stella, que já está nos esperando.
- Oi, vó (falamos os três juntos).
- Oi, meus queridos, que saudades (Stella fala).
Entramos no carro e, cerca de 30 minutos depois, já estamos na capital. Chegamos na casa dela, cumprimentamos o vô Gabriel e demos os parabéns. Como ainda era cedo, resolvemos dar uma volta no shopping. Andamos por várias lojas e fomos ao McDonald's. Depois, fui à biblioteca devolver um livro que peguei da última vez que vim à casa da vó Stella e tive que pagar uma multa por atraso.
Horas mais tarde, voltamos para a casa da minha vó e meus pais já haviam chegado, inclusive meu pai Felipe. Nós abraçamos os quatro, já não nos víamos há alguns meses pessoalmente por ele morar longe. Minha vó fez um jantar digno de novela, com direito também a lasanha, muitas pizzas e sorvete de sobremesa, sem contar o bolo, que não poderia faltar por ser aniversário do meu avô. Meu celular toca e, ao olhar no visor, vejo escrito "Desconhecido". Penso em não atender, mas acabo resolvendo.
**Ligação on**
- Alô? Eu gostaria de falar com Miguel Brandão.
- É ele! Quem é?
- Meu nome é Gael e eu encontrei a sua carteira na biblioteca. Tinha seu número nela, estou ligando para devolver.
Nesse momento, bato a mão no bolso e percebo que está vazio.
- Oh, Gael, obrigado! Onde posso te encontrar para pegar?
- Eu levo para você. Me passa o endereço de onde você está que eu levo.
- Não precisa. Eu busco onde você estiver. Você já fez muito me avisando.
- Eu insisto.
- Tá, beleza, então.
Passo o endereço da casa da minha vó e vou até a frente do portão esperar.
**Ligação off**
Alguns minutos depois, um Uber para e um rapaz moreno, alto, de olhos cor de mel, de mais ou menos uns 17 ou 18 anos, desce vindo em minha direção.
- Miguel?
- Eu mesmo. E você deve ser o Gael?
- Isso mesmo (ele responde). Aqui está sua carteira (ele fala, me entregando).
- Nossa, cara, valeu! Eu nem tinha percebido ainda que havia perdido. Você me salvou, ainda mais porque moro em outra cidade.
Nesse momento, meu pai Felipe sai no portão.
- Miguel, o que está fazendo aqui fora? E quem é esse rapaz?
- Pai, esse é o Gael. Ele encontrou minha carteira que perdi mais cedo e veio devolver.
- Prazer, senhor.
- Felipe (meu pai responde). Chama o rapaz para dentro. Miguel, tá muito frio aqui fora.
- Não, não, senhor Felipe. Vim só mesmo devolver a carteira do seu filho.
- Vem, Gael, entra. Eu insisto. Só não repara que tem bastante gente, hoje é o aniversário do meu avô.
- Já que vocês insistem, eu vou entrar alguns minutos e, em seguida, vou para casa (Gael fala).
Entramos para dentro e sirvo refrigerante e salgados para ele.
- Quem é esse rapaz bonito? (Gustavo pergunta se aproximando).
- Esse é o Gael, pai. Ele encontrou minha carteira que perdi mais cedo e veio trazer para mim.
- Prazer, Gael. Eu sou o Gustavo, pai do Miguel (Gustavo fala, pegando na mão de Gael, que retribui o gesto).
- Muito prazer, senhor Gustavo (Gael fala).
E logo já estamos andando pela casa mais uma vez.
- Você tem dois pais? (Gael pergunta curioso).
- Na verdade, três (eu falo rindo). Nesse momento, meu pai Rafhael está passando.
- Pai (chamo e ele vem até mim).
- Oi, filho (Rafhael responde).
- Gael, esse é o meu pai Rafhael.
- Prazer, senhor Rafhael.
- Prazer, Gael. Seja bem-vindo.
Eles se cumprimentam e logo meu pai volta ao que estava fazendo e eu e Gael nos sentamos em um canto.
- Nossa, cara, que maneiro, você tem três pais.
- É, eu também acho, mas a maioria das pessoas não.
- Liga para as outras pessoas não, cara. Você tem pais maneiros, avós incríveis. Simplesmente viva e seja feliz, e quem não se agradar, só deixe para lá.
- Isso mesmo, Mi. Segue esse conselho que é dos bons (Vinicius fala se aproximando de nós, acompanhado por Matheus).
- Gael, esses são meus irmãos, Vinicius e Matheus (falo, apontando).
- Prazer (Gael fala).
- Prazer (os dois respondem juntos).
Continuamos conversando por muito tempo e, algumas horas depois, meu pai Gustavo veio nos chamar para ir para casa, que já estava tarde e tínhamos aula amanhã...
- Como vai ir vocês três e os seus três pais em um só carro? (Gael pergunta curioso).
- Eles são separados, e nós só moramos com o Gustavo e o Rafhael, que ainda estão juntos, mas os três ainda são muito amigos, como pode ver (Vinicius explica).
- Que bom que se dão bem. É tão bom quando as pessoas separam mas a amizade e o respeito continuam (todos concordamos). Miguel, salva meu número aí para a gente continuar conversando. Você é muito legal, cara, assim como a sua família. Mas agora tenho que ir para casa também que já está tarde...
- Claro, cara, salvo sim. Foi um prazer imenso conhecer você! Mas espera aí um pouco que peço para o meu pai Felipe te levar em casa!
- Não precisa não, cara. Eu chamei um Uber. Deve estar chegando já...Alguns minutos depois, o Uber chega e nos despedimos de Gael, que vai para casa. Nos despedimos também dos nossos avós e do meu pai Felipe e entramos no carro para casa...
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