Capítulo 18
Capítulo 18
Vince parecia entender que eu precisava do meu espaço. Mesmo deitados na mesma cama, ele não ficou me pressionando para falar e nem tentou fazer com que desistisse da ideia de ir até o meu pai. Depois que eu fizesse isso, a Ana que atendia em um restaurante da família e tinha ambições de casar, ter uma casa com cercas brancas e filhos, não existiria mais. No lugar dela, ficaria uma Ana que eu ainda desconhecia. Era nítido que eu jamais sonharia ser da máfia, e nem muito menos administrar. Enzo Mazzini, o meu pai, parecia ser inflexível com as tentativas de Franz em um acordo. Envolta em meus pensamentos e planejamentos, dormi.
Em algum momento da madruga eu acordei, olhei para o lado onde Vince dormia e ele não estava lá. Aos poucos fui me adaptando ao ambiente taciturno e escutei gritos abafados. Esfreguei meus olhos para focar melhor no caminho que levava até a escada. Não sei bem o que me fez descer os degraus, mas mesmo assim eu fui. Desci e continuei andando, tentando não fazer barulho, seguindo o som até chegar em escritório com porta de vidro esfumado. Parei por um instante, eu precisava prestar atenção no que estava acontecendo.
— Então, seu filho de uma puta... — aquela voz era do Franz. Ele meio que rosnava ao proferir as palavras — quem mais está por trás dos ataques a fortaleza?
— Se gritar, eu quebro o outro dedo da sua mão — Vince ameaçou calmamente.
— Eu não sei... — a voz masculina já estava com o tom choroso — eu sei que o seu sobrinho é responsável por subornar metade da sua equipe... — o som de algo sendo espancado veio junto com o grito de dor — Ah! Vince!
— Você está gritando — escutei Vince falar um pouco sem paciência.
— E você esmagou o meu dedo, seu filho... — outra vez, o mesmo som de algo sendo espancado e um grito abafado de dar agonia.
— E eu não me importo de arrancar, quebrar ou queimar você vivo — eu nunca tinha ouvido Vince falar daquela maneira, mas foi perturbador.
— Meu grande amigo, Castilho... — Franz começou a falar, quase como se achasse engraçado. Então aquele era o cara que eles estavam esperando pela manhã? Só restava saber o que ele sabia e o porquê dele está sendo torturado — Gabriela está em Paris, correto?
— Por favor, Franz.. — ouvi o Castilho implorar — deixe a minha mulher fora disso. Por favor, eu te peço...
— Ha! — Franz riu — claro que eu não vou deixar, afinal, você foi à minha casa e tentou matar o meu filho e a filha do Mazzini — explicou.
Eu queria vê tudo que estava acontecendo, por sorte, bem no cantinho tinha um pedaço pequeno do vidro da janela quebrado e daria para espionar sem ser notada, já que tudo estava escuro o suficiente e a minha sombra não apareceria.
A sala estava um pouco iluminada, e na verdade, só destacava o Castilho, o homem sendo torturado. Ele tinha duas mãos amarradas nos braços da cadeira, a sua roupa estava ensanguentada e rasgada, o rosto do homem tinha ferimentos abertos no supercílio esquerdo e nariz. Enquanto ele gemia de dor, Franz estava o observando, enquanto Vince se tornava o carrasco.
— Ganhou muito dinheiro, não foi? — Vince o interrogava e tinha um desprezo total por ele. Ainda com a missão de torturar o homem que permanecia amarrado a cadeira, Vince caminhou até uma pequena bancada e de lá, pegou um alicate. Dava para perceber o quanto ele estava determinado a escavar toda verdade, seja lá como fosse.
— Tudo bem! — Castilho desesperado, cedeu quando Vince com a ponta do alicate, arrancou a primeira unha do dedo da mão, o fazendo chorar — tinha outra pessoa envolvida e essa queria a cabaça da moça...
— Quem é essa outra pessoa? — a voz de Franz era ainda mais ameaçadora do que eu imaginava.
— Só sei que era uma mulher, Castello... — resmungou Castilho.
— Nome. Preciso do nome — Vince disse com a voz mais firme, pronto para arrancar quantas unhas fossem necessárias.
— Não sei o nome... — Castilho falou em meio a dor de ter outra unha arrancada por Vince — pelo amor de Deus! Eu não sei! Me deixem em paz...
— Acha mesmo que vamos deixar você em paz? — Franz imediatamente sacou uma arma em direção a cabeça do homem torturado — acha mesmo que a família Castello ou a Mazzini vai deixar você viver para contar história? Em que canto da sua cabeça, você achou que iria fazer o que fez e sair ileso de tudo?
— A minha família, Franz! A minha família — Castilho implorou chorando.
— Pode deixar que eu cuido deles — e de repente, Franz apertou o gatilho. Eu soltei um grito devido ao susto. Tudo foi tão rápido, que mal deu tempo de processar o que estava acontecendo.
Castilho estava morto.
Uma mulher me queria morta.
Ser da máfia era uma bosta.
Não me dei conta que Vince estava do meu lado, até sentir que ele sacolejava meus ombros repetidas vezes. Tudo era um zumbindo na minha cabeça, junto com o flashback do que havia acabado de vê.
— Ana! — escutei ele, quando me abraçou.
— Vocês... O homem... A unha... — eu não falava coisa com coisa, de tão confusa que fiquei.
— Droga! — Vince segurou meu maxilar entre as mãos e me encarou — essa era uma das coisas que eu não quero a que visse...
— Tudo bem — franzi o cenho para ele, juntando as informações e o fato de que eu não estava mais em um ambiente pacífico.
— Cuide dela, Vincenzo — pude escutar Franz falar, mas não tive coragem de me virar para olhá-lo — vou chamar alguém pra limpar a bagunça.
***
Não me lembro bem como voltei para cama, mas dessa vez, Vince dormia abraçado comigo, aquecendo o meu corpo. Estávamos um de frente para o outro, e pude me acalmar ao lembrar do que tinha ocorrido. Observei cada traço do rosto daquele homem, como se eu não fosse o ver nunca mais. Parecia que a cada segundo que passava, não seriam o suficiente para aproveitar ao seu lado. Se não fosse a máfia, talvez eu nem o tivesse conhecido: e nem ele a mim. Com calma, tracei com a ponta do dedo a linha do seu maxilar forte, e senti os pelos de sua barba macia. Seus lábios um pouco rosados e carnudos, eram de tirar o fôlego. Me atrevi até a passar a mão em seu cabelo, fazendo carinho.
— Admirando o que é seu? — não vou negar e falar que não me assustei, porquê me assustei. Ele ainda estava com os olhos fechados, quando sorriu para mim, mas na mesma proporção que ele sorriu, o mesmo desapareceu da sua boca — desculpa você ter visto tudo...
— Não vou esconder de você que fiquei em choque — continuei a fazer carinho em seu rosto, deixando o cabelo de lado — porém, sei que agora esse é o meu mundo também.
— Falando assim, eu vou tentar me acalmar. Parece que você está lidando com o que houve... — disse ele devagar, mas dava para perceber o medo em sua voz.
— Meu maior medo agora e perder a minha família e você, Vince... — eu não queria ficar relembrando o ocorrido de horas atrás, pois só em pensar, já me deixava sem saber o que fazer.
— Ana, como a gente sabe que ama outra? — meu coração acelerou no mesmo instante em que ele perguntou, olhando para mim com carinho.
— Acho que quando entendemos que o outro não é posse, mas sim, uma parte boa nossa que podemos confiar... — e quem seria eu, para responder aquela pergunta. Eu não tinha me apaixonado de verdade por ninguém, a não ser por ele na adolescência. Claro que eu tive alguns caras bem legais na minha vida, porém falar que era amor, seria um grande mentira.
— Quando dormimos e acordamos do lado querendo que a felicidade nunca acabe, mesmo sabendo que ela tem liberdade para ir até a casa do pai, e ela confrontar ele? — ele já havia dito que me amava, porém, estava ficando cada vez mais intenso a forma como ele se expressava.
— Sim. Mesmo assim — finalmente respondi depois de alguns minutos em silêncio, ainda me sentindo tonta.
— Então, Ana Delmondes, eu amo você — Vince colocou uma de suas mãos na minha cintura, me puxando para mais perto — promete que não vai deixar ele nos separar? Eu juro que moverei o inferno e o céu para ficar com você, se for preciso, mas eu só preciso saber se você sente o mesmo...
— Sim, eu amo você. Não sei como você ainda consegue sentir alguma dúvida... — e por um instante, os problemas foram esquecidos com o seu beijo. Foi lento, carinhoso e cheio de medo. Talvez medo pelo futuro que nos aguardava, medo das famílias, dos negócios, do conselho... De tantas outras coisas, que também eram os meus medos.
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