Capítulo 4 - Ajudando Minha Alma Gêmea
***
Por mais que quisesse, Chris não conseguiu dormir naquela noite. Ficou repassando o que Ashley havia lhe contado, e se perguntando quem poderia ser tão cruel, a ponto de tirar a vida de uma garota tão pura.
Finalmente, desistindo do sono, ele ligou o computador e começou a pesquisar sobre o crime. Encontrou diversos artigos de jornais, e em portais de notícias, relatando o caso:
"Ashley Paige, 25 anos, foi encontrada morta, estrangulada atrás do palco no salão de baile da Universidade Westbury, na manhã de 1° de novembro do ano anterior. Foi encontrada pelos funcionários da limpeza. O legista encontrou vestígios de abuso sexual, e hematomas latentes nos pulsos."
De acordo com o depoimento de uma colega de quarto, Claire Thompson, Ashley e as amigas chegaram à festa por volta das 21h30. Conversaram com algumas pessoas, dançaram um pouco, e cerca de uma hora depois ela foi vista dançando com um rapaz fantasiado de Avatar. Esta foi a última vez que Ashley foi vista por suas amigas.
"Por ser uma fantasia popular, a polícia ainda investiga a identidade do Avatar, mas até a publicação deste artigo, ele ainda não havia sido identificado".
Chris se deparou com inúmeros artigos semelhantes, datados até o final da primeira semana de investigações, e trazendo poucas ou nenhuma informação adicional. Com base nos depoimentos das amigas, e na perícia do corpo, a hora da morte foi estimada entre 22h30 e 00h30.
Também encontrou o perfil de Ashley no Facebook, transformado num memorial, onde os amigos postaram diversas mensagens carinhosas. Uma delas chamou sua atenção:
Joyce Keller escreveu: "Você era a melhor de nós. E enquanto houver estrelas no céu, seu brilho não se apagará dos nossos corações. Vá em paz, Ash".
De repente ele se perguntou por que Joyce nunca mencionara Ashley antes?
Infelizmente, não poderia lhe perguntar agora. Eram 3h40 da manhã. Esta conversa teria que ficar para mais tarde.
***
Devia ter cochilado. Tinha visto o relógio marcar 5h10, mas já eram 8h20, e ele acordara graças ao chacoalhão de seu amigo PD.
— E aí, Bela Adormecida? Vai ficar na cama o dia todo?
— Cara, perdi a hora — murmurou Chris, despertando assustado.
— Nem vou perguntar por onde anda a sua cabeça. Dormiu com o laptop ligado. Fui tirá-lo de cima de você, e ele saiu do descanso de tela. Por que você estava vendo fotos da garota morta?
— Estava pesquisando sobre o caso — disse Chris, vestindo a calça a toda pressa.
— Está pensando em mudar de curso? Vai entrar para o ramo criminal?
— Não, só estava curioso, mesmo. — E lembrando-se de como ele se esquivou na noite anterior, decidiu perguntar. — Você a conhecia bem?
— Eu não diria isso... — desconversou PD.
— Pelo que você disse ontem, achei que fossem amigos — supôs Chris, lembrando-se de que ele dissera que "aquilo fora difícil para todos eles".
— Eu digo muitas coisas quando estou querendo me jogar numa festa. E vamos ser jogados pela janela da classe se não nos apressarmos. Anda!
Sem tempo para mais perguntas, Chris e PD correram para chegar a tempo de sua primeira aula. Todavia, durante todo aquele dia, Chris não conseguiu se concentrar em mais nada. Não compreendia porque, dentre tantas pessoas, Ashley aparecera justamente para ele. A mulher da faxina, ele até conseguia entender, foi quem a encontrou na manhã seguinte ao crime. Mas por que ele?
E pior, por que estava permitindo que seu coração se apegasse tanto a uma garota que ele obviamente não poderia ter? Estava tão confuso.
Achou que o almoço era uma boa hora para abordar Joyce e ver o que ela sabia.
— Olha só, se não é o nosso Casanova aposentado — riu-se Joyce, ao vê-lo se aproximar da mesa que ela dividia com as amigas no refeitório, debochando da fantasia que ele escolhera usar na primeira noite, mesmo não tendo intenção de conhecer ninguém.
— Talvez seja uma boa hora para voltar à ativa — disse ele, aproveitando a abertura para se sentar ao lado dela.
— Está pronto para conhecer a Jade, então?
— Jade?
— A amiga que eu te falei na festa. Alô-ô! — ela deu uma batidinha na testa dele com as pontas das unhas compridas e vermelhas. — Tem alguém em casa?
— Ah, Jade... Certo. Mais tarde você me apresenta.
— Já vi que está com a cabeça no mundo da lua — comentou Joyce, dando uma garfada em sua salada Caesar.
— Está é com cara de apaixonado — comentou Diana, uma das amigas de Joyce, baixinha e de lindos olhos verdes.
— Longe disso — desconversou Chris.
— Guarde este coração para a Jade — disse Joyce. — Ela já está com a senha há dois dias.
— Tudo bem. Na verdade, estava distraído com outra coisa — disse Chris, tentando achar uma maneira de introduzir o assunto. — Eu vi um memorial na entrada do prédio de arte, em homenagem a uma garota assassinada no ano passado. Ashley... — ele fingiu não se lembrar.
— Ashley Paige — ajudou Kimberly, a amiga morena de Joyce.
— Isso! Estava me perguntando o que aconteceu com ela.
— Ninguém sabe direito — disse Diana. — Ela sumiu durante a festa de Halloween no ano passado. E no dia seguinte encontraram o corpo dela atrás do palco. Foi assustador.
— Como assim, ela sumiu?
— Ela chegou junto com umas amigas, ficaram juntas no começo, mas aí, você sabe, cada uma foi encontrando seu esqueminha, e foram se dispersando. Acho que a última que ficou perto dela naquela noite foi a Lucy Doyle. Ela não estuda mais aqui. Ficou traumatizada, pobrezinha, elas eram melhores amigas. Parece que ela ficou com um cara... Mas depois de algum tempo, ninguém mais a viu.
— Sabem quem era o cara?
— Um dos imbecis que se fantasiou de Avatar — comentou Kim. — Devia ter uns quinze deles naquela noite. Eu não saberia dizer com qual deles a Ashley ficou.
— E a Claire Thompson, ela ainda estuda aqui? — perguntou Chris. — Soube que elas eram colegas de quarto.
— Ela é da nossa turma. Também estuda moda. — E vasculhando o refeitório, Joyce avista a garota, sentada numa mesa a poucos metros de distância. — Olha ela ali!
Chris seguiu o olhar de Joyce e avistou uma garota de pele cor de chocolate, com o corte de cabelo de Cleópatra. Uma deusa, em toda sua forma e beleza. Ele se perguntou como nunca havia reparado nela antes?
— Não se empolga, não — aconselhou Kim. — O namorado dela é filho de um Lorde. Ninguém nessa universidade chinfrim tem a menor chance.
Chris ergueu as sobrancelhas, impressionado.
— Se quiser, eu apresento vocês — propôs Joyce.
— Isso seria ótimo, obrigado — disse Chris.
— Vem cá, por que você ficou tão interessado nessa história? — indagou Diana, desconfiada.
Ao que Chris deu de ombros, já esperando que lhe fizessem essa pergunta, mais cedo ou mais tarde.
— Curiosidade.
E após uma pequena pausa:
— Vocês acham que ela pode ter sido drogada? — indagou.
— Não, a Ashley não era dessas. Ela não aceitava nem bala que as pessoas ofereciam — disse Joyce. — Naquela noite mesmo, eu lembro que o Fred Branson passou com um saco daquelas balinhas cítricas... Ela só aceitou depois de muita insistência. Mas, drogas, a Ashley nunca teria aceitado.
— Não digo que ela soubesse o que estava tomando — explicou Chris. — Digamos... O ponche, por exemplo. Poderia estar batizado?
— Sei nem se a Ashley tomou ponche naquela noite — disse Joyce.
— Tomou sim, que eu vi — disse Diana —, quando já estava com o Avatar. Eu a vi com um copo do ponche azul na mão.
— Mas muita gente tomou aquele ponche, e ninguém reclamou de efeito colateral — disse Joyce. — Eu mesma tomei, e não senti nada.
— Nem eu — disseram Diana e Kim, em seguida.
— Se bem que... — Kim disse, após um segundo. — Pensando bem, agora que mencionou, me deu um sono insuportável lá pelas dez e pouco. Será que foi o ponche? Mas eu não me lembro se o que eu tomei foi o azul ou o rosa...
— Amiga, não tinha ponche rosa — corrigiu Joyce. — Era violeta.
— Que seja! — disse Kim. — Acho que foi esse que eu tomei.
— Mas alguém podia ter colocado alguma coisa diretamente no copo dela, não é? — considerou Chris.
— O Avatar? — considerou Joyce. — Suponho que poderia.
***
Claire desapareceu do refeitório antes que Joyce pudesse apresentá-los, então Chris achou melhor tentar falar com ela em outro momento. Quando as aulas terminaram naquela tarde, ele decidiu fazer uma visita ao tio Carson Thorne, no departamento de polícia de Westbury.
Era, felizmente, uma tarde tranquila, sem grandes ocorrências que exigissem atenção policial. A bem da verdade, Westbury não era das cidades mais violentas do condado de Wiltshire. O assassinato de Ashley foi uma das nove ocorrências graves que a cidade registrou no último ano.
A sala de seu tio era pequena e apinhada de arquivos. Duas mesas dividiam espaço de cada lado da sala, sendo a principal ocupada por Carson, e a outra por seu parceiro, Ethan Lewis, que, na frequente falta de funcionários no departamento, costumava fazer as vezes de escrivão.
Depois de alguns minutos conversando amenidades, Chris decidiu dizer a que veio.
— Esta semana, fizeram alguns memoriais lá na Universidade, para uma aluna que morreu no ano passado — comentou Chris, sem demonstrar grande interesse.
— Aquele foi um caso horrível — disse Carson, recostando-se na cadeira, e ajeitando o bigode.
— Foi mesmo. E uma amiga, que a conhecia, disse que ainda não pegaram o assassino — comentou Chris, floreando a verdade, para não revelar que a amiga em questão era a própria vítima.
— Nem sempre a polícia consegue agir em tempo hábil, meu filho — disse Ethan, fazendo anotações num relatório em sua mesa.
— Desculpe, não quis ofender — disse Chris, sentindo que o outro não gostara de seu comentário.
— Não ofendeu, mas acho que os civis não entendem como este trabalho é complicado.
— Calma aí, Ethan, o rapaz só fez uma pergunta! — ralhou Carson. — Curiosidade ainda não é crime. — E voltando-se para Chris: — É verdade. Todas as nossas linhas investigativas até agora levaram a becos sem saída. Mas ainda estamos no caso.
— Imagino que sim. Posso perguntar que tipo de becos sem saída?
Chris lançou um olhar ligeiramente amedrontado para o parceiro de seu tio.
— Como ele disse, perguntar não é crime — disse Ethan, dando de ombros.
— Basicamente, o problema são as lacunas temporais — disse Carson. — Ela foi vista por algumas pessoas até determinada hora, e depois, não mais. Não sabemos ao certo em que momento da noite o crime foi cometido. O criminoso deixou DNA no corpo, mas não achamos correspondente no sistema...
— Não conseguiram identificar o cara com quem ela ficou? Um tal com a fantasia de Avatar?
— Identificamos, sim, mas ele tinha um álibi sólido. Deram com uma garrafa na cabeça dele por volta das 23h00, e depois disso ele passou o resto da noite sob supervisão de uma enfermeira. Levou pontos e tudo.
— Mas se eu entendi bem, ela pode ter sido morta antes desse horário...? — observou Chris.
— A hora da morte é estimada. Digamos que o cara teve uma meia hora entre a última vez em que ela foi vista e o momento em que levou a garrafada. Ou menos, porque houve testemunhas dizendo ter estado com ele no salão umas 22h40, 22h45, mais ou menos. Na prática, ele sumiu por dez minutos. Até daria tempo, mas... Não conseguimos nenhuma evidência sólida o bastante para sustentar a acusação.
— Sabe se ela foi drogada?
— O exame toxicológico apontou vestígios de uma substância soporífera no organismo dela. Lignana, ou alguma coisa assim...
— O que é isso? — indagou Chris.
— Alguma bodega para colocar gente para dormir — disse Ethan.
— Não é uma substância tóxica, nem a mais comum encontrada nos chamados "Boa noite, Cinderela" — explicou Carson. — Aliás, comparado com aquelas substâncias, essa é bastante inócua. Mas pode, ocasionalmente, ser potencializada pelo álcool, e também foi detectada uma pequena concentração alcoólica no sangue dela.
— Então, podem ter drogado o ponche que ela tomou naquela noite? — perguntou Chris.
— Eu não ficaria surpreso. Mas se o fizeram, foi só no copo dela. As tigelas e os copos descartados no lixo foram examinados, e nenhum apresentou qualquer vestígio da substância. Mas por que ficou interessado no caso agora?
— Por causa dos memoriais — disse Chris. — Minhas amigas a conheceram, e eu só queria saber como andavam as investigações. Eu vi que estão patrulhando o campus essa semana, durante as festas de Halloween...
— Sim, estamos querendo garantir que nada parecido se repita — disse Carson.
— Mas eu não vi nenhum policial dentro do salão de baile — comentou Chris.
— Vai ver estão fantasiados — riu-se Ethan.
— Eu não dei permissão para isso — disse Carson, embarcando na brincadeira. E perguntou diretamente ao parceiro: — Sabe o que me deixaria muito feliz agora?
— O quê?
— Que você se fantasiasse de moça do café e trouxesse alguns para nós.
— Vou me queixar disso ao departamento — debochou Ethan, levantando-se.
— Não esqueça as rosquinhas — gritou Carson, quando ele saía.
— Esse cara é uma figura... — riu-se Chris, apontando com o indicador para a porta por onde Ethan saía.
— Sim, e aproveitando que ele saiu... Eu não posso dar detalhes do caso para você, Chris, espero que entenda...
— Entendo, sim, tio.
Carson lançou um olhar para a porta, e não vendo qualquer coisa na curva do corredor à sua frente, baixou a voz:
— Mas, extraoficialmente... — Ele se debruçou sobre a mesa, sinalizando para Chris chegar mais perto. Então falou bem baixinho: — Não acho que a moça tenha sido morta no mesmo local onde foi encontrada.
— Como assim?
— Pense bem... Ela foi achada atrás do palco, onde qualquer um que errasse o caminho do banheiro poderia ter testemunhado o crime. Um dos rapazes da banda que tocou naquela noite disse que esteve ali, desligando os instrumentos, depois das duas da manhã, e não viu ninguém. O corpo ainda não estava lá, mas sabemos que ela provavelmente já estava morta a essa hora.
— Quer dizer que colocaram o corpo dela ali? — indagou Chris, também sussurrando.
Carson assentiu.
— Mas, por quê? — insistiu Chris.
Carson abriu as mãos, indicando que não tinha essa resposta.
— Quem era o Avatar com quem ela ficou naquela noite? — indagou Chris.
Olhando por cima do ombro do sobrinho, Carson viu a sombra do parceiro retornando pelo corredor, e tornou a se recostar na cadeira, sinalizando a Chris para disfarçar.
— Aqui está o café — disse Ethan, colocando os dois copos de isopor sobre a mesa, e também a caixa de rosquinhas.
— Acho que suas amigas podem ficar sossegadas — disse Carson. — O campus está muito bem guardado desta vez. É improvável que outro crime aconteça. O Ethan ali é o responsável por comandar essa patrulha.
— E como vê, eu sou quem mais trabalha por aqui — debochou Ethan. — E não ganho o suficiente.
— Bem, melhor eu ir andando — disse Chris. E voltou-se para Ethan. — Obrigado pelo café.
— Disponha — disse Ethan.
— A propósito, Chris, você precisa aparar o gramado da tia Sue — disse Carson, enquanto ele se levantava. — Ela andou se queixando com a Shirley. Disse que não te paga 230 libras por semana para morar numa floresta.
Sem esboçar qualquer reação, Chris se perguntou quem diabos era tia Sue? Mas conhecia seu tio o suficiente para saber que ele lhe dava uma pista para seguir. E que ela lhe traria as respostas que procurava.
— Vou dar um jeito de passar lá — concordou.
— Lá pelas oito pode ser uma boa hora — disse Carson, acenando em despedida.
***
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